Acórdão nº 00514/17.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 17 de Dezembro de 2021

Data17 Dezembro 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: M.

veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 29.12.2019, pela qual foi julgada (totalmente) improcedente a acção intentada contra a Auto-Estradas do Litoral, S.A., e a Auto-Estradas de Portugal, S.A.

para pagamento de uma indemnização global de 14.984€77, por danos patrimoniais e morais, resultantes de um acidente de viação ocorrido no dia 10 de Abril de 2017, pelas 22h40m na auto-estrada A17, ao Km 33,7.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida ao absolver em vez de condenar as Rés, como foi pedido, violou as seguintes normas legais: Base XLV, Base XLVI, Base LXXVI, Base XXX, n.º 1, anexas ao Decreto-Lei n.º 215-B/2004, nº 1 da Base XXXVII, Base XXXVI, e o nº 1 da Base XLIX, anexas ao Decreto-Lei nº 294/97, de 24.10, artigos 12, nº 1, da Lei nº 24/2007, de 18.7., 350º, n.º 2, 483º, 487º, 493º, 494º, 496º, 562º, 563º, e 566º, todos do Código Civil.

Apenas a Recorrida B. contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso.

O Ministério Publico neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1ª O recorrente não se conforma com a decisão proferida, porquanto se considera que ocorreu incorreto julgamento da matéria de facto, assim como fez o Tribunal recorrido uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  1. Para justificar a absolvição das RR. dos pedidos contra si formulados, o Tribunal a quo considerou que as RR. cumpriram todas “…as obrigações de segurança que sobre elas recaem, não lhes sendo exigível, nem pelas leis aplicáveis, nem pelos contratos celebrados, outra atuação de modo a evitar que objetos sejam arremessados para a via ou nela permaneçam, não devendo, como tal, ser condenada a título de responsabilidade extracontratual por facto ilícito, na medida em que provou que não lhe era exigível outro comportamento para além daquele que observou”.

  2. Para isso, o tribunal a quo bastou-se com os Factos Provados números 12., 16., 17. e 18. Da Sentença recorrida.

  3. De forma simples, a grande questão é saber se os patrulhamentos efetuados pela B., e designadamente um patrulhamento realizado pelo oficial de mecânica G. 2h00 antes de ter sido chamado ao local do embate, não tendo sido nada detetado no local, são suficientes para ilidir a presunção de incumprimento que recai sobre as concessionárias. O recorrente entende que não.

  4. Com efeito, nos termos do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Processo 339/16.3T8SXL.L1-7, com data de 05-06-2018, ficou consignado que: “- O art. 12 da Lei nº 24/2007, de 18.7, ao definir os direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como autoestradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares, faz recair sobre o concessionário o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança quando os acidentes verificados sejam causados por objetos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem, por atravessamento de animais ou, ainda, por líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais; · Para ilidir a presunção de incumprimento que recai sobre tal entidade de acordo com o referido normativo, não basta a prova genérica de que houve passagens da equipa de assistência e/ou de que não foi detetada ou comunicada a presença do objeto, do animal ou do líquido na via que deu causa ao acidente verificado, mesmo que tal abranja o tempo e espaço em que ocorreu o acidente”. (negrito e sublinhado nosso).

  5. Ora, tendo o acidente ocorrido em autoestrada concessionada pelas RR., recai sobre a concessionária uma presunção legal de culpa nos termos do art. 12, nº 1, da Lei nº 24/2007, de 18.7.

  6. No caso concreto, entende o recorrente que, não obstante o ficou provado na Sentença recorrida, as RR. não ilidiram a presunção de cumprimento que sobre ela impendia, desde logo porque para que se possa afastar a presunção legal de culpa contida nas alíneas a), b) e c), do n.º 1, do art.º 12.º, da Lei n.º 24/2007, de 18 de Julho, não é suficiente que a concessionária alegue e demonstre que cumpriu genericamente as suas obrigações de vigilância ou que procedeu à implementação de medidas destinadas a evitar a presença de objetos, de pneus, animais ou de líquidos nas faixas de rodagem, incluindo durante o intervalo temporal em que os mesmos permaneceram na via e no local onde o sinistro teve lugar, antes se exigindo que aquela demonstre que, na situação concreta, a presença do objecto, do animal ou do líquido na via não se deve a incumprimento seu da obrigação de impedir essa presença.

  7. Da factualidade assente não conseguimos extrair como é que o objeto em causa alcançou a faixa de rodagem e veio nela a permanecer, nem durante quanto tempo, nem a razão pela qual ali permaneceu o tempo suficiente para ocasionar a colisão, apenas se sabendo que não pertencerá à infra-estrutura da auto-estrada e sim a algum veículo.

  8. Não se apurou qualquer facto apto a demonstrar ser imputável ao condutor do veículo a produção do sinistro.

  9. O objeto em questão, uma carcaça de um pneu de camião que se encontrava no meio da via, pode ter saído involuntariamente de outro veículo, mas – embora não seja muito provável - também pode ter sido arremessado por um utente da autoestrada (condutor ou passageiro), ou pode tratar-se inclusivamente de algum vestígio de sinistro anterior que a R. não removeu, sendo inúmeras as causas subjacentes à permanência do objeto na faixa de rodagem, as quais são desconhecidas.

  10. Em todo o caso, pelos factos provados, o que resultou demonstrado foi o cumprimento genérico das obrigações que sobre a R. impendem de vigilância e de conservação da A17, impostas pelo contrato de concessão.

  11. As RR. não conseguiram, no entanto, fazer prova do cumprimento do concreto dever de assegurar permanentemente, em boas condições de segurança, a circulação viária no lanço concreto, uma vez que aquela carcaça de pneu, não obstante os factos provados, encontrava-se efetivamente na faixa de rodagem e nenhuma das RR. fez prova de que tal facto não lhe é imputável. Assim, nada de concreto se provou quanto à real causa do aparecimento da carcaça de pneu na via.

  12. À R. incumbia, para ilidir a presunção de culpa que sobre si incide, provar que, neste concreto caso, o objeto permanecia na faixa de rodagem da A17 de forma incontrolável para si ou que lá foi colocado por determinado terceiro, propositada ou negligentemente, o que não alegou e, logo, não demonstrou.

  13. Perante quanto se deixou exarado, conclui-se que a R., ou as RR., não conseguiram ilidir a presunção de culpa que sobre si impende, além de ter o A. demonstrado que foi praticado um facto ilícito (porquanto violador de norma destinada a proteger interesse alheio) e gerador de danos, incumbindo, pois, à R. o ressarcimento das perdas causadas.

  14. Nos termos do disposto na Base XLV anexa ao Decreto-Lei n.º 215-B/2004: 1 - Constitui estrita obrigação da Concessionária, nos termos do presente contrato, a manutenção em funcionamento permanente dos Lanços identificados no n.º 1 da base II, após a sua abertura ao tráfego, em bom estado de conservação e perfeitas condições de utilização, em tudo devendo diligenciar para que os mesmos satisfaçam plena e permanentemente o fim a que se destinam.

    2 - A Concessionária é responsável pela manutenção, em bom estado de conservação e funcionamento, do equipamento de monitorização ambiental, dos dispositivos de conservação da natureza e dos sistemas de protecção contra o ruído.

    3 - Constitui ainda responsabilidade da Concessionária a conservação e manutenção das praças de portagem, dos sistemas de contagem e classificação de tráfego, incluindo o respectivo centro de controlo e ainda dos sistemas de iluminação, de sinalização e de segurança nos troços das vias nacionais ou urbanas que contactam com os nós de ligação até os limites estabelecidos na base V.

  15. Já a Base XLVI anexa ao Decreto-Lei n.º 215-B/2004 dispõe: 1 - A Concessionária deverá assegurar, de forma permanente, que a circulação nos Lanços da Auto-Estrada a explorar e conservar por si decorra em boas condições de segurança e comodidade.

    2 - A Concessionária deverá respeitar os padrões de qualidade, designadamente para a regularidade e aderência do pavimento, conservação da sinalização e do equipamento de segurança e apoio aos utentes, fixados no Manual de Operação e Manutenção e no plano de controlo de qualidade.

  16. A Concessionária responderá, nos termos da lei geral, por quaisquer prejuízos causados no exercício das actividades que constituem o objecto da Concessão, pela culpa ou pelo risco, não sendo assumido pelo Concedente qualquer tipo de responsabilidade neste âmbito. - Base LXXIII, anexa ao DL n.º 215-B/2004.

  17. Por sua vez, estipula a Base LXXVI anexa ao DL n.º 215-B/2004 que são casos de “Força maior”: 1 - Consideram-se unicamente casos de força maior os acontecimentos imprevisíveis e irresistíveis cujos efeitos se produzam independentemente da vontade ou das circunstâncias pessoais da Concessionária.

    2 - Constituem nomeadamente casos de força maior actos de guerra, hostilidades ou invasão, subversão, tumultos, rebelião ou terrorismo, epidemias, radiações atómicas, fogo, raio, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais que directamente afectem as actividades compreendidas na Concessão.

    3 - Consideram-se excluídos da previsão dos números anteriores os eventos naturais cujo impacte deva ser suportado pela Auto-Estrada, nos termos dos projectos aprovados, e dentro dos limites por estes previstos.

    4 - Sem prejuízo do disposto no n.º 6 desta base, a ocorrência de um caso de força maior terá por efeito exonerar a Concessionária da responsabilidade pelo não cumprimento das obrigações emergentes do...

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