Acórdão nº 00167/17.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
Data da Resolução | 06 de Abril de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Nos autos acima referenciados em que é Autor JMMLF e Réu o CHP, E.P.E, ambos neles melhor identificados, pelo TAF de Braga foi proferida decisão que, por julgar prescrito o direito do Autor, absolveu o Réu dos pedidos formulados.
Desta vem interposto recurso.
Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: I- Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou totalmente improcedente a acção administrativa comum intentada pelo recorrente, absolvendo a ré dos pedidos.
II- Assim atendendo ao elenco dos factos provados, e após as considerações de direito, concluiu o Senhor Juiz pela improcedência da acção administrativa comum apresentada pelo recorrente, por considerar que se encontra prescrito o direito indemnizatório que o mesmo pretendia fazer valer.
III- Ora, não pode o recorrente, conformar-se com tal decisão.
IV- A prescrição é uma forma de extinção de direitos, que assenta na necessidade de pôr termo à incerteza sobre o seu exercício e na presunção do seu abandono por parte do respetivo titular.
V- Na base do instituto da prescrição está, portanto, a negligência real ou presumida do titular do direito, que não o exercendo dentro do prazo fixado legítima a presunção de abandono desse exercício (vide, Carlos Alberto da Mota Pinto, in, Teoria Geral do Direito Civil, 2ª edição, págs. 371).
VI- O prazo da prescrição começa a contar a partir do momento em que o direito pode ser exercido (cfr. artigo 306º nº 1 do Código Civil).
VII- Sendo que no âmbito específico da prescrição do direito de indemnização por responsabilidade civil extracontratual o legislador estabelece a presunção de que o mesmo pode ser exercido a partir do momento do conhecimento de tal direito por parte do lesado (cfr. artigo 498º nº1 do Código Civil).
VIII- Dispõe o artigo 5º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, sob a epígrafe “prescrição” que “o direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado, das demais pessoas coletivas de direito público e dos titulares dos respetivos órgãos, funcionários e agentes bem como o direito de regresso prescrevem nos termos do artigo 498.º do Código Civil, sendo-lhes aplicável o disposto no mesmo Código em matéria de suspensão e interrupção da prescrição.” IX- O n.º 1 do artigo 498.º do Código Civil estatui que “o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso.” X- Mas dispõe o nº 3 do mesmo artigo que “se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, este é o prazo aplicável.” XI- Assim, o artigo 498º do Código Civil fixa no seu nº 1 como prazo regra da prescrição do direito de indemnização o de três anos, mas abre as portas, no seu nº 3, a prazos de prescrição extraordinários nos casos em que o facto ilícito que alicerça o pedido de indemnização civil constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo.
XII- Assim e desde logo a letra do n.º 3 da norma supra citada refere-se apenas à circunstância de o facto que fundamenta o pedido indemnizatório constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo e não faz depender a extensão do prazo da apresentação de queixa nem faz qualquer distinção entre as situações em que o procedimento criminal depende da apresentação de queixa daquelas em que não disso não carece; de resto, a apresentação de queixa é um direito que a lei atribui ao lesado e deixa na sua total disponibilidade e não um dever.
XIII- Acresce que o alongamento do prazo, independentemente da apresentação ou não de queixa, encontra justificação bastante na circunstância da maior gravidade do facto danoso, a ponto de alcançar relevância penal.
XIV- É desta norma que o recorrente se pretende socorrer, pugnando que o direito à indemnização pretendida está sujeito ao prazo prescricional mais longo por estarem subjacentes factos que integram o crime de ofensa à integridade física grave por negligência.
XV- Todavia entendeu o Tribunal a quo que o recorrente não alegou factos suscetíveis de consubstanciar responsabilidade criminal e, consequentemente, gozar do respetivo prazo mais longo de prescrição (5 anos), a petição teria de ter dado entrada, o mais tardar, em 24.09.2016.
XVI- Sucede, porém, que perscrutada a petição inicial constata-se que o Autor/recorrente alega factos que diz e sustenta corresponder a conduta ilícita da Recorrida, constata-se assim que o autor fez uma descrição circunstanciada do contexto em que ocorreu o evento danoso (vide designadamente os artigos 2º a 37º da Petição Inicial), em termos de tempo, modo e lugar, explicitando concomitantemente em que medida não foram observadas as regras de segurança que no seu entender eram devidas invocando o respetivo quadro normativo (vide designadamente os artigos).
XVII- Assim, foram alegados na petição inicial factos que, a provarem-se, possam constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, para que esse seja o prazo prescricional aplicável, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 498º do Código Civil.
XVIII- Assim, não há dúvida que é ao autor que compete alegar e demonstrar a natureza criminal do facto gerador do dano de onde faz emergir a responsabilidade civil em que funda o seu pedido, sentido em que vai a jurisprudência quer dos Tribunais Administrativos Fiscais quer dos Tribunais Comuns.
XIX- Como explicitou o Supremo Tribunal Administrativo no seu acórdão de 07/05/2003, Proc. 0448/03, in, www.dgsi.pt/jsta, que citamos a título ilustrativo “...
o prazo previsto no nº 3 do artigo 498º é excecional, dependendo de um pressuposto, que é o de os factos constituírem crime, e, por isso, o lesado que queira usufruir do direito à utilização desse prazo, terá o ónus de alegar e provar que se verificam os pressupostos em que a lei admite a sua utilização, como resulta da regra basilar do ónus da prova que consta do nº 1 do artigo 342º do Código Civil”.
XX- A alegação foi feita, como se viu, ainda que não invoque a concreta norma jurídica criminal que o prevê e pune.
XXI- Afigurando-se, todavia, poder querer remeter para o crime previsto e punido no artigo 148º nº 3 do Código Penal, cuja epígrafe é “Ofensa à integridade física por negligência” XXII- Desta feita, dúvidas não restem que o recorrente beneficia do prazo mais longo de prescrição, constante do nº 3 do artigo 498º do código civil.
XXIII- Mas se o alongamento do prazo de prescrição nos termos constantes do n.º 3 do artigo 498º do Código Civil importa a verificação de que a factualidade geradora de...
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