Acórdão nº 62/15.6IDSTR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 19 de Fevereiro de 2019

Magistrado ResponsávelJOÃO AMARO
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de processo comum, com intervenção do tribunal singular, com o nº 62/15.6IDSTR, do Juízo de Competência Genérica do Cartaxo, mediante pertinente sentença, decidiu-se: “I - Absolver os arguidos R…, LDA. e PB, da prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6.º n.º 1 al. b), 7.º n.º 1 e 105.º n.º 1, 2, 4, 5 e 7, do Regime Geral das Infrações Tributárias (doravante RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho, na redação dada pela Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro.

II - Condenar R…, LDA., pela prática em autoria material, na forma consumada e continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 6.º n.º 1 al. b), 105.º n.º 1, 2, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias e 30.º do Código Penal, na pena de duzentos e cinquenta dias de multa à taxa diária de vinte euros, o que perfaz a quantia global de cinco mil euros; III - Condenar PB, pela prática em autoria material, na forma consumada e continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelos artigos 7.º, 105.º n.º 1, 2, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias e 30.º do Código Penal, na pena de um ano e dois meses de prisão; IV - Suspender a execução da pena de prisão aplicada ao arguido por igual período sujeita à condição de proceder ao pagamento das quantias devidas à Autoridade Tributária no prazo de três anos; V - Condenar os arguidos no pagamento das custas do processo, fixando em três UC’S a taxa de justiça”.

Inconformado com a sentença condenatória, dela interpôs recurso o arguido PB, extraindo da motivação do recurso as seguintes (transcritas) conclusões: “I – Em primeiro lugar a sentença em crise padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

II – E concreto, dá como assente nos números 7, 8, 9, 10, 14, 21 que a sociedade recebeu o montante das vendas e prestações de serviços faturadas aos seus clientes.

III – O crime em que o arguido foi condenado exige que este tenha recebido os valores das faturas no prazo para o cumprimento da obrigação tributária.

IV – Por outras palavras só o recebimento da prestação tributária no período de tributação em causa justificará o comportamento ilícito.

V – Ora, se no caso em apreço não se apuraram as datas do recebimento das quantias faturadas pela sociedade arguida, haverá sempre insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.

VI – Nesta linha, de 31 a 34 do probatório refere-se que a sociedade arguida foi integrada no plano prestacional PERES, tendo o arguido sido condenado em pena de prisão, suspensa na sua execução por um prazo de 3 anos na condição de proceder ao pagamento das quantias devidas à Autoridade Tributária e Aduaneira.

VII – O plano especial de regularização de dívidas ao Estado (Decreto-Lei n.º 67/2016, de 3 de novembro) – PERES – admite o pagamento até 150 prestações mensais.

VIII – Haverá sempre insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, pois a determinação da suspensão da execução da pena de prisão exigia a fixação do número de prestações ajustado e se o mesmo se encontra a ser cumprido.

IX – Razão pela qual se invoca que a decisão em crise padece do vício previsto no art.º 410.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal, o que se invoca para todos os efeitos legais.

X – Mais, crê-se que é inconstitucional a interpretação do art.º 410.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo Penal que permita a condenação sem que tenham sido dados como provados todos os factos que preencham o tipo objetivo e subjetivo do crime, no qual se inclui as datas de recebimento dos valores faturados.

XI – Por violação do art.º 32.º, n.º 5, da CRP, que consagra a estrutura acusatória do processo penal, inconstitucionalidade que aqui se invoca, para todos os efeitos legais.

XII – Consequentemente, não pode tal norma ser aplicada ao caso sub judice com o referido sentido interpretativo.

XIII – Em segunda linha, a factualidade descrita em 27 e 28 do probatório denota implicitamente que a sociedade arguida tenha recebido € 59.293,27, € 4.209,65 e € 22.710,42 nos períodos de tributação objeto dos autos, isto é, até ao dia 10 do 2.º mês seguinte ao período de tributação.

XIV – Sucede que, não se crê que esse recebimento, temporalmente delimitado, tenha ficado provado, pelo contrário, não ficou provado que a sociedade arguida tenha, como refere a sentença ora em crise, «(...) a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA (...) não tendo feito a entrega daquele imposto nos cofres do Estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (...)» – 7, 8,9, 10, 14,15 e 21 do probatório – por isso se dirá que a sentença padece de erro de julgamento.

XV – Em concreto, no que respeita à matéria de facto, em 7 dos factos assentes foi dado como provado que: «No período de Dezembro de 2014, a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA no valor de € 18.581,95 não tendo efetuado a entrega daquele imposto nos cofres do estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (10.02.2015), ou seja, até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele que se referia, mas apenas de € 4,77, nem supriu essa falta nos 90 dias seguintes ao termo do mesmo».

XVI – No que respeita à matéria de facto, em 8 dos factos assentes foi dado como provado que: «No período de Fevereiro de 2015, a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA no valor de € 13.600,42 não tendo efetuado a entrega daquele imposto nos cofres do estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (10.04.2015), ou seja, até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele que se referia, nem supriu essa falta nos 90 dias seguintes ao termo do mesmo».

XVII – No que respeita à matéria de facto, em 9 dos factos assentes foi dado como provado que: «No período de Abril de 2015, a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA no valor de € 9.123,98 não tendo efetuado a entrega daquele imposto nos cofres do estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (10.06.2015), ou seja, até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele que se referia, mas apenas de € 4,77, nem supriu essa falta nos 90 dias seguintes ao termo do mesmo».

XVIII – No que respeita à matéria de facto, em 10 dos factos assentes foi dado como provado que: «No período de Junho de 2015, a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA no valor de € 17.986,92 não tendo efetuado a entrega daquele imposto nos cofres do estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (10.08.2015), ou seja, até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele que se referia, nem supriu essa falta nos 90 dias seguintes ao termo do mesmo».

XIX – No que respeita à matéria de facto, em 8 dos factos assentes foi dado como provado que: «No período de Fevereiro de 2015, a sociedade arguida liquidou e recebeu dos seus clientes IVA no valor de € 13.600,42 não tendo efetuado a entrega daquele imposto nos cofres do estado até ao termo do prazo para cumprimento da obrigação (10.04.2015), ou seja, até ao dia 10 do segundo mês seguinte àquele que se referia, nem supriu essa falta nos 90 dias seguintes ao termo do mesmo».

Relativamente ao Proc. 57/16.2IDSTR (apenso A) XX – No que respeita à matéria de facto, em 14, 15, 16, 17 e 18 relativo a Dezembro de 2015 dos factos assentes foi dado como provado que: «A sociedade arguida recebeu no período em causa a quantia (€ 615.059,56) sendo que a quantia de € 71.777,03 era referente a IVA liquidado, recebido e declarado no período em causa. Pelo que a sociedade arguida até à data legalmente imposta para a entrega da declaração e para a liquidação do imposto, 10.02.2016, já havia recebido e tinha na sua disponibilidade todos os montantes pecuniários referentes ao IVA desse trimestre a entregar/pagar ao Estado que faturou, no montante de € 12.584,93. A sociedade arguida procedeu ao pagamento desse montante, acrescido de juros de mora e de despesas que totaliza € 13.030,76, no dia 18.05.2016, ou seja, antes de ser notificada para o pagamento da mesma (...), mas depois do prazo legal estipulado para o pagamento, 10.02.2016, e após terem decorrido mais de noventa dias sobre essa data. Contudo a mesma não procedeu ao pagamento da coima correspondente, no valor de € 4.209,65, nem aquando do pagamento do imposto, nem decorridos noventa dias sobre essa data, nem quando foi notificada pela A.T. para, em 30 dias, procederam ao pagamento da coima aplicável e em falta. Mediante esta conduta, a sociedade arguida e o arguido Pedro batalha lograram apropriar-se no valor total de € 4.209,65, correspondente à coima devida em face do não pagamento atempado do imposto e que por isso era devido, bem como o montante referente ao imposto, no valor de € 12.584,93, montantes que fizeram seus, que integraram nos seus patrimónios pessoais e da sociedade arguida, e que utilizaram em proveito próprio e da sociedade arguida, não obstante saberem que não lhes pertencia».

XXI – E em 21: «A sociedade arguida recebeu no período em causa a totalidade da quantia referida supra…», concluindo desta forma, «Os arguidos enriqueceram deste modo os seus patrimónios, em igual montante, e prejudicando o Estado, pelo menos, em valor equivalente, ao montante não entregue e desse modo obtendo vantagens patrimoniais e benefícios que sabiam ser indevidos e proibidos por lei».

XXII – Sucede que, o arguido PB, gerente da sociedade arguida, em sede de audiência de discussão e julgamento explicou o funcionamento da empresa e as dificuldades que esta tem na cobrança de dívidas, nomeadamente nos períodos de tributação de 2014/12, 2015/02,04,06,12, 2016: «a empresa estava praticamente falida porque nós temos uma dificuldade porque importamos equipamentos, o dinheiro é sempre avance, por vezes as cobranças não são eficazes estamos a falar de valores de milhares de euros e que basta um pequeno deslize e a tesouraria fica logo a abanar e nesse período...

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