Acórdão nº 603/19.0T9STC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDO PINA
Data da Resolução09 de Março de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I. RELATÓRIO A – Nos presentes autos de Processo de Recurso de Impugnação Judicial de decisão do Presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, nos termos do disposto no artigo 148º, nº 13, do Código da Estrada e do disposto nos artigos 59º e sgs. do Regime-Geral das Contra-Ordenações, proferida no processo de cassação nº 136/2018, que declarou verificados os requisitos da cassação e determinou a cassação do título de condução nº (…) de que era titular o ora recorrente, (...), melhor identificado nos autos.

Enviados os autos ao Ministério Público junto do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, remeteu-os a juízo, Juízo Local Criminal de Santiago do Cacém - Juiz 2, nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1, do artigo 62º, do Regime Geral das Contra-Ordenações.

Com dispensa da realização de audiência de julgamento, foi proferida sentença em 16 de Maio de 2020, que negou provimento ao recurso interposto pelo arguido (...) e, em consequência, manteve integralmente a decisão administrativa que determinou a cassação do Título de Condução nº SE-1411385.

Inconformado com esta decisão, o arguido (...), dela interpôs o presente recurso, formulando as seguintes conclusões (transcrição): A. Em princípio, o presente recurso não poderia ser admitido, porquanto o mesmo, em bom rigor, não preenche todos os pressupostos legais/formais para o efeito – tudo conforme melhor enunciamos supra, nos artigos 1º a 7º desta petição de recurso; não obstante, poderá este recurso ser admitido, e julgado, ao abrigo do disposto, designadamente, nas normas, conjugadas, dos artigos 73º, nº 2 e 74º, nº 2, ambos do RGCO.

B. A douta sentença aqui recorrenda (na qual o Meritíssimo Juiz a quo manteve a decisão administrativa da ANSR de cassação da carta de condução do ora recorrente, por este ter “perdido” os doze pontos de que dispunha) não pode manter-se e deverá ser alterada, porquanto em 08-07-2020 (ainda antes de ter sido notificado daquela sentença) o recorrente “adquiriu” três pontos, pelo que, desde essa data que não estão mais reunidos os requisitos legais/formais fundamentadores da referida cassação – tudo conforme melhor enunciamos supra, nos artigos 8º a 15º desta petição de recurso.

C. A douta sentença recorrenda não se pronunciou quanto às inconstitucionalidades por violação do disposto nos artigos 2º, 18º, nº 2 (neste caso, no que tange aos princípios fundamentais da necessidade e da subsidiariedade), 29º, nºs 1 e 4, 30º, nº 4, 32º, nºs 1, 5 e 10 e também no artigo 266º, nº 2 (neste caso, no que se refere aos princípios fundamentais da proporcionalidade e da justiça), todos da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidades essas que foram expressamente invocadas pelo arguido na petição de impugnação judicial da decisão administrativa de cassação da sua carta de condução – tudo conforme melhor enunciamos supra, nos artigos 16º a 21º desta petição de recurso.

D. Tal omissão de pronúncia do Meritíssimo Juiz a quo consubstancia uma nulidade da respetiva sentença, prevista no artigo 379º, nº 1, alínea c), 1ª parte, do Código de Processo Penal, nulidade essa a ser arguida ou conhecida em recurso, conforme se prescreve no nº 2 daquele mesmo artigo 379º – o que agora aqui fazemos.

E. Nos termos do disposto no artigo 75º do RGCO, esse Venerando Tribunal da Relação de Évora (TRE), enquanto Tribunal de segunda instância, apenas conhecerá da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões, sendo que na decisão deste recurso o TRE poderá agora: a) alterar a decisão do tribunal recorrido, sem qualquer vinculação aos termos e ao sentido da decisão recorrida, salvo o disposto no artigo 72º-A; ou b) anulá-la e devolver o processo ao tribunal recorrido.

F. Ora, parece-nos que, daquelas duas opções, ou alternativas, de decisão deste recurso nesse TRE, a que melhor se coaduna com a motivação supra expressa é a (decisão) de anular a douta sentença recorrenda e devolver o processo ao tribunal recorrido, para que o Meritíssimo Juiz a quo possa pronunciar-se, expressa e detalhadamente, sobre todas as questões que ficaram por responder na impugnação judicial da decisão administrativa proferida pela ANSR, e agora e aqui, nesta petição de recurso, novamente invocadas.

Termos em que, e com os fundamentos de facto e de direito acima aduzidos: a). Requer-se agora a Vossas Excelências que este recurso seja admitido, e julgado, ao abrigo do disposto, designadamente, nas normas, conjugadas, dos artigos 73º, nº 2 e 74º, nº 2, ambos do RGCO.

b). No mais, dando total provimento a este recurso, deverão agora Vossas Excelências anular a douta sentença recorrenda e mandar devolver o processo ao tribunal recorrido, para que o Meritíssimo Juiz a quo, possa, designadamente, corrigir a omissão de pronúncia ora verificada – o que também desde já se requer.

Assim se fazendo Justiça.

O Ministério Público junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso interposto, concluindo por seu turno (transcrição): 1. A situação prevista no art. 101º do Código Penal, nada tem que ver com a carta por pontos, com a cassação por inexistência de pontos, em suma, com o art. 148º do Cód. da Estrada.

  1. A decisão de cassação do título de condução, tornou-se efetiva, com a notificação ao recorrente, mas só será definitiva, após o trânsito em julgado da douta sentença.

  2. Isto é, a carta de condução do recorrente está cassada.

  3. Donde, não opera qualquer sistema de ganho de pontos.

  4. A perda de pontos não constitui qualquer sanção ou medida de segurança penal, antes se prefigura como uma medida de avaliação negativa da conduta estradal dos condutores, conforme a gravidade da infração cometida.

  5. A cassação do título de condução constitui uma das medidas de segurança rodoviárias, visando evitar e reduzir os perigos decorrentes da circulação dos veículos automóveis.

  6. Não se verifica qualquer incompatibilidade entre o regime de cassação do título de condução decorrente do artigo 148º do Código da Estrada, e os artigos 2º, 18º, nº 2, 29º, nºs 1 e 4, 30º, nº 4, 32º, nºs 1, 5 e 10, e 266º, nº 2, todos da Constituição da República Portuguesa.

  7. Por tudo isto, este recurso é manifestamente improcedente.

    Nos termos vindos de expor e nos mais de direito que V. Exas. como sempre, mui doutamente suprirão, devem julgar totalmente improcedente o presente recurso e por consequência, deverão manter nos seus precisos termos a douta sentença recorrida, com o que será feita a costumada Justiça.

    Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso interposto, conforme melhor resulta dos autos.

    Cumpriu-se o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, não tendo o arguido apresentado qualquer resposta.

    Procedeu-se a exame preliminar.

    Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

    B - Na sentença recorrida consta o seguinte: Com interesse para a apreciação do presente recurso de contra-ordenação é a seguinte a matéria de facto provada: 1. (...) é titular da carta de condução nº (…) 2. O Recorrente foi condenado no âmbito do processo nº 172/16.2GGSTC, da Instância Local de Competência Genérica de Santiago do Cacém, por sentença proferida no 28 de Novembro de 2016 e transitada em julgado no dia 20 de Dezembro de 2016, pela prática no dia 17 de Setembro de 2016, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 meses, pela qual foram retirados 6 pontos da sua carta.

  8. O recorrente mais foi condenado no âmbito do processo nº 134/17.2GBSTC, do Juízo de Competência Genérica de Santiago do Cacém, por sentença proferida em 10 de Julho de 2017, transitada em julgado em 25 de Setembro de 2017, pela prática no dia 08 de Julho de 2017, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 8 meses, pela qual foram retirados 6 pontos da sua carta.

    Factos não provados: Não se provaram quaisquer outros factos relevantes para a decisão da causa.

    Motivação: A convicção do Tribunal baseou-se, no que respeita à factualidade objectiva, na análise da decisão administrativa, vista no seu conjunto.

    O Arguido não coloca em causa a factualidade em que se baseia a decisão administrativa, mas apenas a sua valoração jurídica e a conformidade constitucional do quadro legal, pelo que aquela se julgou integralmente provada.

    Para além do exposto, a factualidade apurada encontra-se devidamente suportada na prova documental constante dos autos de fls. 1 a 15.

    Face ao sentido da decisão, não se julga relevante julgar qualquer outra matéria como provada, sendo a mesma irrelevante.

    Fica deste modo explanado o raciocínio que justificou a resposta à matéria de facto.

    Fundamentação de Direito: Cumpre, nesta fase, verificar se estão preenchidos os pressupostos da cassação do título de condução ao Arguido.

    Estabelece o artigo 121º-A, nº 1, do Código da Estrada, que a cada condutor são inicialmente atribuídos um total de 12 pontos, sem prejuízo de os mesmos poderem ser aumentados ou recuperados, até certos limites, nas condições previstas no subsequente artigo 148º, nºs 5 e 7, do mesmo Código.

    Por seu turno, o artigo 148º, nº 2, nº 4, al. c), nº 5, nº 6, nº 7, e nº 10, do Cód. da Estrada, igualmente com interesse para este caso concreto, mais nos dizem o seguinte: “ (…) 2 - A condenação em pena acessória de proibição de conduzir e o arquivamento do inquérito, nos termos do nº 3 do artigo 282º do Código de Processo Penal, quando tenha existido cumprimento da injunção a que alude o nº 3 do artigo 281º do Código de...

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