Acórdão nº 12/14.7JAPTM.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelANA BARATA BRITO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal: 1.

No processo comum colectivo nº 12/14.7JAPTM, da Comarca de Faro, foi proferido acórdão em que se decidiu condenar o arguido JF, como autor de: 13 crimes de abuso sexual de crianças agravado, dos art.s 171º nº 1 e 177º, nº 1, al. a), do CP, nas penas de 5 anos de prisão por cada um deles; de 52 crimes de abuso sexual de menor dependente agravado dos art.s 172º, nº 1 e 177º, nº 1, al. a), do CP, nas penas de 5 anos de prisão por cada um de 51 crimes e 6 anos de prisão pelo crime descrito em 10. dos factos provados (cópula oral); 1 crime de maus tratos do art. 152º-A, no 1, al. a) do CP, na pena de 2 anos de prisão; em cúmulo jurídico, na pena única de 18 anos de prisão.

Inconformado com o decidido, recorreu o arguido, concluindo: “1. Condenou o douto Tribunal “a quo” o arguido, ora, recorrente, pela prática de 13 (treze) crimes de abuso sexual de criança, agravados, p.p. pelas disposições dos artigos 171º nº 1 e 177º/1 alínea a) do Código Penal, pela prática de 52 (cinquenta e dois) crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, p.p. pelas disposições dos artigos 172º nº 1 e 177º nº 1 alínea a) do Código Penal e pela prática de 1 (um) crime de maus tratos, p. e p. pelo artigo 152º-A, nº 1 alínea a), na pena única de 18 (dezoito anos de prisão).

  1. Impugnam-se os pontos 5., 7., 8., 9., 10., 15., 20., 21., 23., 24. da matéria de facto provada.

  2. Nos mencionados pontos da decisão de facto vem referido que a vítima era filha do arguido, no entanto, e conforme resulta do assento de nascimento de fls. 260 a 261 dos autos, a filiação foi apenas estabelecida por sentença proferida em 09 de Janeiro de 2015, ou seja, muito posteriormente à data dos últimos contactos entre arguido e ofendida.

  3. A circunstância de que, a colheita das amostras biológicas, terem dado entrada no Gabinete Médico Legal de Portimão em 11.10.2012 não constitui presunção de que aquele, ao se sujeitar a tal exame, já concebesse a possibilidade de ser pai de AM.

  4. Impõe, assim, a referida prova documental modificação da decisão de facto proferida, devendo ser eliminado, em qualquer um desses pontos, toda e qualquer referência ao vínculo de filiação entre arguido e vítima.

  5. Impugnam-se os Pontos 5., 6. e 8. da Matéria de Facto Provada, na medida em que deu o Tribunal a quo como assente que os contactos sexuais entre recorrente e a vítima tiveram o seu início em Setembro de 2012.

  6. A ponderação das declarações da ofendida, tomadas para Memória Futura e gravadas de 09:54:11 a 10:46:19, conjugadas com o teor do Relatório de Perícia de Natureza Sexual em Direito Penal a fls. 185 a 187 dos autos e do relatório Médico-legal junto a fls. 212 a 218 dos autos impunham, necessariamente, decisão diversa.

  7. Devem, pois, tais pontos da Matéria de Facto serem modificados, deles constando que os contactos de cariz sexual entre o recorrente e vítima tiveram o seu início em data não concretamente apurada mas sempre a partir de Jan. de 2013.

  8. Impugna-se o ponto 6. da Matéria de Facto Provada, uma vez que as declarações da ofendida, nos excertos que se deixaram transcritos, gravadas de 09:54:11 a 10:46:19, conjugadas com o Relatório Médico-legal de fls. 212 a 218 dos autos, impunha decisão de facto diversa, apenas permitindo estabelecer que os contactos sexuais entre a vítima e o arguido ocorreram em número de vezes não concretamente apuradas.

  9. Impugnam-se os pontos 13., 14., 16., 20. e 21. da decisão da Matéria de Facto Provada, uma vez que a correcta ponderação das declarações da ofendida nos excertos que se deixaram transcritos e que se encontram gravadas de 09:54:11 a 10:46:19, conjugadas com o relatório da Perícia De Natureza Sexual em direito Penal de fls. 185 a 188 dos autos e com o relatório Médico-legal de fls. 212 a 219 dos autos, impunham decisão de facto diversa.

  10. Assim, impõe-se a modificação do Ponto 20. dos factos provados, do qual deverá ser eliminado “bem sabendo que a mesma não tinha capacidade para querer e entender o significado social dos actos nela praticados”.

  11. Impõe-se a modificação do ponto 21. dos Factos Provados, retirando-se deste a parte em que se estabelece “estava entregue aos seus cuidados, protecção e educação e ainda assim aproveitando-se da sua superioridade física, ascendência e autoridade que exercia sobre a mesma”.

  12. Existe contradição da sentença entre os Pontos 13., 14., 16., 20. e 21. dos factos Provados e os Pontos 9., 11. e 12. dos factos Provados e alínea d) dos Factos não provados.

  13. Face ao alegado no presente Recurso, mais concretamente no Capítulo IV, alínea a) da impugnação da matéria de facto provada, não poderá operar a agravante prevista no artigo 177º, n.º 1 alínea a) do Código Penal, seja para os crime de Abuso sexual de crianças, seja para os crimes de abuso sexual de menores dependentes.

  14. Face ao que se deixou dito neste recurso, mais concretamente no Capitulo IV, Alínea b) da impugnação da decisão de facto, não foi produzida prova segura e credível de terem ocorrido quaisquer contactos sexuais entre arguido e vítima antes de Janeiro de 2013, data em que esta teria já completado a idade de 14 anos.

  15. Assim, e por não se encontrarem preenchidos os elementos do tipo de ilícito previsto no artigo 171º nº 1 do Código Penal deve o arguido ser absolvido de todos os crimes de abuso sexual de crianças pelos quais foi condenado.

  16. Face ao que se deixou alegado no presente recurso, mais concretamente no Capítulo IV, Alínea d) da impugnação da decisão de facto proferida, temos que, não foi produzida qualquer prova de que a vítima estivesse confiada para educação ou assistência ao arguido, sendo ainda pertinente evidenciar o que provado não ficou na alínea d) dos factos não provados.

  17. A circunstância de a vítima residir conjuntamente com o arguido, não constitui presunção de que aquela estivesse confiada para educação e assistência deste.

  18. Assim, e por não preenchimento dos elementos do tipo de ilícito previsto no artigo 172 nº 1 do Código Penal, deve o arguido ser absolvido dos crimes de abuso sexual de menor dependente pelos quais foi condenado.

  19. Não se provou que a ofendida estivesse ao cuidado do arguido, à sua guarda, sob a sua responsabilidade e educação, pelo que, e por não preenchimento dos elementos do tipo previsto no artigo 152º -A, nº 1 alínea a) do C.P, deve o arguido ser absolvido do crime de maus tratos pelo qual foi condenado.

  20. Caso o supra exposto não seja atendido, o que apenas se concede a título de cautela de patrocínio, deveria o arguido ter sido condenado pela prática de um crime de trato sucessivo, fazendo-se a respectiva punição pelo ilícito mais grave.

  21. Caso assim não se entenda, mais se dirá que, atendendo ao acervo de factos provados e à prova carreada para os autos, deverá, à cautela de patrocínio considerar-se que os contactos sexuais entre a vítima e o arguido tiveram o seu início em data não apurada de Janeiro de 2013, findando em data não apurada, mas sempre antes do dia 23 de Dezembro de 2013, estabelecendo-se uma média nunca superior a um contacto sexual por cada mês.

  22. Quanto à pena concreta a determinar, considerando a moldura penal abstracta respectiva, o facto do arguido não registar antecedentes criminais e as suas circunstâncias de vida, nomeadamente as estabelecidas no ponto 29. dos factos provados, deveria o arguido ter sido condenado em pena que se situasse perto do limite mínimo da moldura penal.

  23. Ao assim não decidir, não fez o Tribunal a quo, com o devido respeito, a aplicação do disposto nos artigos 71º, 72º e 50º do Código Penal. Por todo o exposto, e pelo mais que Vªs. Exas, doutamente, suprirão, deverá ser revogado o acórdão recorrido e em sua substituição proferir-se outro que decida nos moldes reclamados nas conclusões do presente recurso. O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo: “1- O âmbito do recurso retira-se das respectivas conclusões as quais por seu turno são extraídas da motivação da referida peça legal, veja-se por favor a título de exemplo o sumário do douto Acórdão do STJ de 15-4-2010, in www.dgsi.pt,Proc.18/05.7IDSTR.E1.S1.

    2- “Como decorre do artigo 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, exceptuadas as questões de conhecimento oficioso.

    3- São assim, as conclusões quem fixam o objecto do recurso, artigo 417º, nº3, do Código de Processo Penal.

    4- Não contém a douta decisão impugnada qualquer erro de julgamento da matéria de facto, ou outro vício que a inquine.

    5- As provas produzidas e analisadas em audiência de julgamento foram avaliadas pelo Tribunal “a quo” no seu todo e segundo o que preceituam os arts.124º a 127º, do Código de Processo Penal, entre outros preceitos legais.

    6- O arguido não tem antecedentes criminais.

    7- O Tribunal “a quo” baseou a sua decisão na prova produzida e analisada em audiência de julgamento, e, também nas regras da experiência, aliás como o impõe o art.127º, do Código de Processo Penal.

    8- As provas foram avaliadas pelo Tribunal “a quo” no seu conjunto e não foram violados quaisquer dispositivos legais, porém teve o Tribunal uma leitura distinta do recorrente, mas que se baseia numa análise global e sensata da prova.

    9- No que concerne ao vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, que o arguido invoca, sabe-se que este “ se refere à insuficiência da matéria de facto provada para fundamentar a solução de direito e não à insuficiência da prova produzida e examinada em audiência para alicerçar a decisão sobre a matéria de facto proferida, tendo de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”.

    10- Não ocorreram nos autos quaisquer elementos que tivessem de ser...

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