Acórdão nº 756/13.0TBTVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA ARAÚJO
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora: AA propôs contra Companhia de Seguros ...

acção declarativa de condenação, sob forma comum.

Alegou, em síntese, que: com o automóvel que conduzia no dia 13.9.10, colidiu um outro veículo, conduzido por BB e propriedade de CC... Unipessoal, Lda.; esta sociedade transferira para a ré a responsabilidade civil decorrente da utilização do veículo de sua propriedade; o acidente deveu-se ao referido BB; dele decorreram para o autor diversas lesões e despesas (parte das quais a ré já ressarciu); em consequência do acidente, não mais poderá exercer a sua actividade profissional; sofreu dores e ficou psiquicamente afectado.

Concluiu, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe: 1º - as despesas médicas já efectuadas, no montante de 6.850,00€, e aquelas que ainda for necessário efectuar; 2º - uma indemnização por danos futuros, a liquidar ulteriormente; 3º - uma indemnização pela perda de rendimentos no âmbito da sua actividade profissional, a liquidar ulteriormente; 4º - a quantia de 125.000,00€, a título de danos não patrimoniais.

A ré contestou, excepcionando a prescrição. Apresentou a sua versão do acidente, que atribuiu a culpa do condutor de um terceiro veículo. Concluiu pela sua absolvição do pedido.

O autor respondeu, pugnando pela improcedência da excepção. E ampliou o pedido, requerendo a condenação da ré a pagar-lhe, também, a quantia de 624,87€, despendida em tratamentos e medicamentos, desde a data da propositura da acção.

Posteriormente, veio de novo o autor ampliar o pedido, requerendo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 427.657,11€, correspondente aos suprimentos que prestou em sociedades de que é sócio e administrador e que lhe não foi possível recuperar em função da impossibilidade de trabalhar.

A ré contestou a ampliação deduzida em último lugar.

Admitidas as ampliações do pedido e dispensada a audiência prévia, foi fixado o valor da causa, saneado o processo, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

No decurso da instrução da causa, veio o autor, por duas vezes, ampliar o pedido, requerendo o pagamento das despesas com médicos, exames, medicamentos e deslocações, efectuadas, respectivamente, entre Janeiro de 2014 e Maio de 2015, no montante de 4.402,95€ e entre Outubro de 2015 e Março de 2016, no montante de 4.181,91€.

A ré respondeu.

Realizada a audiência final, foi proferida sentença que absolveu a ré do pedido.

O autor interpôs recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1ª.

O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal a quo datada de 5.08.2016 que decidiu “julgar procedente a excepção peremptória de prescrição e, por conseguinte, absolver a ré/seguradora do pedido contra si deduzido”; 2ª.

O ora Recorrente entende, ainda, que concretos pontos de facto foram incorrectamente julgados atenta a prova documental constante do processo e a prova produzida em audiência final, conforme adiante se demonstrará; 3ª.

Com efeito, salvo o devido respeito, entende o Recorrente que a decisão proferida pelo Tribunal da 1.ª Instância não procedeu à correcta aplicação da lei e à adequada apreensão da factualidade em apreço, o que desembocou na injustiça da sentença ora em crise; 4ª.

O Autor, ora Recorrente, instaurou a presente acção peticionando a condenação da Ré, ora Recorrida, no pagamento das seguintes quantias: a) €6.850,82 a título de despesas médicas efectuadas até à data da instauração da ação, e, ainda das despesas médicas a realizar; b) Indemnização por danos futuros a liquidar em execução; c) Indemnização por perda de rendimentos no âmbito da actividade profissional; d) €125.000,00 a título de danos não patrimoniais; 5ª.

Citada para contestar, a Ré, ora Recorrida, peticionou a procedência da excepção de prescrição e a improcedência da acção. Para o efeito, alegou que o acidente nos autos ocorreu no dia 13 de Setembro de 2010 e que a presente acção deu entrada em Tribunal no dia 13 Setembro de 2013, tendo sido citada para contestar em 24 de Setembro de 2013, alegando que entre a data do acidente e as da entrada da acção e citação da Ré decorreram mais de três anos, prazo que entendeu ser de considerar, nos termos do disposto no artigo 498.º, n.º 1 do Código Civil; 6ª.

Notificada para responder à excepção deduzida pela Ré/Recorrida, o Autor/ora Recorrente alegou que, como consequência do acidente resultante do embate da viatura com a matrícula ...-...-ZJ, conduzida por BB, na viatura conduzida pelo ora Recorrente, este sofreu vários danos na sua integridade física, conforme resulta dos relatórios médicos juntos à petição inicial como documentos números 2, 3, 6 e 76. E, por conseguinte, pugnou pela aplicação das disposições conjugadas dos artigos 498.º, n.º 3 do Código Civil e do artigo 118.º, n.º 1, c) do Código Penal, entendendo que o prazo de prescrição é de cinco anos; 7ª.

O Autor ampliou o pedido inicial através dos requerimentos seguintes: 1) Com a referência 15357634 de 13.12.2013 no valor global de €624,87 respeitante a despesas médicas suportadas na sequência do acidente, 2) Com a referência 15716496 de 24.01.2014 no valor global de €427.657,11, respeitante aos investimentos, por si, realizados nas sociedades onde ocupava cargos de gerência e de administração, os quais não conseguiu recuperar por causa do seu estado de saúde após, e em resultado, do acidente de viação, e 3) Com a referência 22527521 de 29.04.2016, no valor de €4.181,91, sendo o valor da acção, em sequência, das ampliações dos pedidos indicados, de €568.717,66.

8ª.

Findos os articulados, foi proferido despacho a que alude o 596.º, n.º 1 do Código de Processo Civil, com identificação do objecto do litígio e dos temas da prova. Posteriormente procedeu-se à audiência final, sendo proferida a douta sentença da qual se recorre; 9ª.

Atendendo aos pedidos formulados pelas partes e à prova produzida, o Recorrente entende, salvo o devido respeito, que foi mal decidida a questão suscitada pela Recorrida da alegada excepção de prescrição do direito à indemnização do ora Autor contra a Seguradora. e, salvo o devido respeito, mal decidida, ainda, a matéria de facto constante da sentença como não provada; 10ª.

O ora Autor sofreu um acidente de viação no dia 13 de Setembro de 2010, na estrada nacional 125, no sentido Tavira/Vila Real de Santo António, quando conduzia o veículo automóvel de marca Toyota Linux com a matrícula ...-...-CZ, e, contra o veículo por si conduzido, embateu o veículo com a matrícula ...-...-ZJ, este conduzido por BB; 11ª.

Da sentença do tribunal a quo resultam provados, com interesse para a boa decisão da causa os pontos 1., 2., 4., 7., 8., 9. e 10. da matéria de facto; 12ª.

Na sequência do embate do veículo automóvel com a matrícula ...-...-ZJ, conduzido por BB, o ora Recorrente sofreu danos na sua integridade física, conforme descrito no requerimento com a referência 15357634, tendo sido diagnosticado ao ora Recorrente, logo após o acidente de viação em causa, pelo seu médico assistente “traumatismo craniano e da coluna cervical, contusão do braço direito, fortes cefaleias e tonturas”, “hipocousia e acufenos mais acentuados no lado direito, com dores na zona cervical direita, parestesias do membro superior direito e uma dificuldade em mexer os dedos da mão direita”, diagnóstico médico junto à petição inicial como documentos números 2 e 3; 13ª.

Os referidos danos à integridade física, sofridos pelo aqui Recorrente, foram consequência do acidente de viação, pois antes desse acontecimento na sua vida, era uma pessoa saudável e sem qualquer problema de saúde; 14ª.

Dispõe o artigo 143.º do Código Penal o seguinte: “Quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa é punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa” e, o artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal o seguinte: “Quem, com negligência, ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias.”; 15ª.

De referir, ainda, que resulta dos factos provados em 7. e 8. que: “Ao quilómetro 143,300, da Estrada Nacional 125, o veículo com a matrícula ...-...-ZJ embateu no rodado esquerdo do veículo do veículo com a matrícula ... BSW que seguia a alguns metros do veículo conduzido pelo Autor”, “Após o embate, o condutor do veículo com a matrícula ...-...-ZJ perdeu o controlo do seu veículo e colidiu com o veículo conduzido pelo Autor na parte traseira”; 16ª.

Em nossa opinião, era exigível ao condutor do veículo com a matrícula ...-...-ZJ, conduzido por BB, que, na sequência do embate no veículo a matrícula ... BSW, não prosseguisse a marcha, o que não fez e, em resultado dessa actuação, foi embater na parte traseira da viatura conduzida pelo Autor, ora Recorrente; 17ª.

O comportamento do condutor do veículo com a matrícula ...-...-ZJ, que transferiu a responsabilidade civil automóvel para a ora Ré, foi negligente, é susceptível ser enquadrado no tipo legal de crime por ofensas à integridade física por negligência previsto e punido no artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal; 18ª.

Dos termos conjugados do artigo 498.º, n.º 3 do Código Civil e dos artigos 118.º, n.º 1, alínea c) e 148.º, n.º 1, ambos do Código Penal, o prazo de prescrição é de cinco anos. Com efeito, na data da propositura da presente acção e citação da Ré, o direito à indemnização do ora Recorrente não se encontrava prescrito; 19ª.

Há, ainda, que salientar que a dedução de pedido de indemnização civil, em separado do processo penal, só é possível nas situações previstas no artigo 72.º, n.º 1 Código de Processo Penal. Nos termos da alínea c) do mencionado artigo, “quando o procedimento depender de queixa ou acusação particular”, “o pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado perante o tribunal civil”; 20ª.

O crime de ofensas à integridade física simples ou negligente depende de queixa, nos termos dos artigos 143.º, n.º 2 e 148.º, n.º 4, ambos do Código Penal. O direito de queixa deve ser exercido no prazo de seis meses a contar...

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