Acórdão nº 97/17.4GGODM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelMARTINHO CARDOSO
Data da Resolução14 de Julho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: Nos presentes autos de Processo Comum com intervenção de tribunal colectivo acima identificados, do Juiz 4 do Juízo Central Cível e Criminal de Beja, os arguidos (...) e (…) foram, na parte que agora interessa ao recurso, condenados pela prática, em autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 15/93, de 22-1, nas penas de: Ø O arguido (...), 6 anos e 6 meses de prisão; e Ø O arguido (...), 5 anos de prisão.

2. O Presente Recurso versa unicamente matéria de Direito.

3. Decorre dos factos concretamente provados na matéria assente, que numa fiscalização levada a cabo por militares da GNR na herdade da casa branca o arguido (...) tinha consigo, no interior do bolso direito das calças que trazia vestidas, uma placa de “Canabis (resina)”, com o peso líquido de 85,298 gramas e com um grau de pureza de 30%, suficiente para 511 doses individuais.” 4. Quanto aos factos não provados e relevantes para o presente recurso, decidiu o Tribunal A Quo dar como não provado que desde 29.07.2017, o arguido (...), também conhecido por (…), e o arguido (...), em comum acordo, firmaram o propósito de ceder, a quem quer que lhes solicitasse, produtos estupefacientes de diversa natureza a troco da respetiva contrapartida monetária; 5. Quanto à subsumissão dos factos ao direito determina o TRIBUNAL A QUO que os factos apurados no que toca ao aqui recorrente (...) preenchem indubitavelmente o crime de tráfico de estupefacientes, em autoria material e na forma consumada, p. e p. pelo art. 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

6. Contudo acrescenta que “Ora, pese embora os Arguidos sejam, também eles, consumidores de produtos estupefacientes, e a matéria provada nos autos não permita, por si só, sustentar a existência de uma atividade altamente organizada e estruturada,” 7. E é contra esta posição assumida pelo Tribunal A QUO que nos erguemos, com todo o respeito que é merecido e o Recorrente não pode deixar de impugnar.

8. Pressupondo o Crime de Tráfico um tipo misto alternativo, uma vez que a lei prevê distintas ações, todas elas abrangidas pela mesma previsão legal, há que relevar o tipo e modalidade da acção e o comportamento comprovadamente assumido pelo agente.

9. As circunstâncias qualificativas modificativas agravantes ou atenuantes do tipo, transformam o crime de tráfico, num crime qualificado, ou num crime de trafico de menor gravidade ou de traficante consumidor.

10. A destrinça entre estes tipos legais, impõe a analise do tratamento jurisprudencial que tem vindo a ser feito ao vulgarmente chamado tráfico de rua, uma vez que toda a factualidade provada relativamente a este arguido, a esta natureza de tráfico se reposta.

11. A este respeito consultou-se o Acordão proferido no Tribunal da Relação de Lisboa, nos autos nº 874/2008 – 9, relatado pelo Sr. Desembargador João Abrunhosa, em 04-12-2008, que supra se transcreve e 12. Nesse mesmo sentido, encontra-se no Acórdão proferido em 22-06-2011, pelo Tribunal da Relação do Porto, nos autos 67/09.6GACHV.P1, relatado pela Sr' Desembargadora Maria Deolinda Dionísio que também supra se transcreveu e 13. – Cfr. Entre outros, os acórdãos do S.T.J. de 24/05/2002, 4/7/2003 e 5/4/2006, Procs 02P2122, 03P3298 e 06P673, rel., respetivamente, por Carmona da Mota, Costa Mortágua e Silva Flor, todos disponíveis in dgsi.pt.

14. “Conforme Jurisprudência do nosso mais alto Tribunal, “ A Tipificação do art. 25 parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do Natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza ( elevada gravidade considerando a grande relevância dos valores postos em perigo com a sua pratica e a frequência desta), encontre a medida justa da punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativo da tipificação do artigo 21º e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no art. 25º. “ 15. “Resposta que nem sempre seria viável e ajustada através dos mecanismos gerais de atenuação especial da pena (arts. 72° e 73° do Código Penal), cuja possibilidade de aplicação não podia ter deixado de estar presente no espírito do legislador ao decidir-se pelo tipo privilegiado do art. 25°.” 16. Este objectivo é de saudar, sabendo-se como é essencial à prossecução dos fins das penas o seu equilíbrio e justiça, por, além de respeitadoras dos limites da culpa, se apresentarem proporcionais às exigências concretas de prevenção geral e especial.

17. Da factualidade provada resulta que, quanto ao aqui Recorrente (...), tinha consigo uma placa de cannabis (resina) com o peso líquido de 85,298 gramas e com um grau de pureza de 30%, suficiente para 511 doses individuais.

18. Mais nenhuma outra substância ilícita tinha na sua posse.

19. Não resultou provado nenhuma transação de estupefaciente ou qualquer tentativa de ato de venda levado a cabo pelo Recorrente.

20. Não foi encontrado na sua posse quaisquer quantias monetárias que sequer indiciassem que o Recorrente tivesse transacionado produto estupefaciente.

21. Decorre da própria fundamentação que o Recorrente assumiu que era seu o produto estupefaciente encontrado na sua posse e que é consumidor.

22. De toda a analise do acórdão posto em crise, a factualidade demonstrada quanto ao aqui recorrente, em nada se mistura com o co-arguido, (...), no processo, e por assim ser, deveria o Tribunal A QUO, destrinçar um de outro, o que não aconteceu e urge ser reparado por V. Exas.

23. Dúvidas não podem restar de que tudo aponta, no caso sub judice, para o clássico tráfico de rua, que têm vindo a ser entendido como integrador do crime de tráfico p. ep. No artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01, isto é, Tráfico de menor gravidade, o que se requer a V. Exas.

24. No que toca à medida da pena, o crime de tráfico de droga de menor gravidade p.e p. pelo artigo 25º do DL 15/93 de 22/01, na sua alínea a) prevê uma moldura penal abstrata de prisão de um ano a cinco anos, se se tratar de plantas, substancias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, V e VI, ao invés da moldura penal abstrata de que veio condenado – de 4 anos a 12 anos.

25. Os seus antecedentes criminais não são todos eles pela prática do mesmo crime pelo qual aqui vem condenado.

26. De acordo com o disposto no artigo 71º do C. Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. E, de acordo com o disposto no nº 2 de tal artigo, na determinação concreta da medida da pena, o Tribunal atende a todas as circunstancias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, considerando, nomeadamente: o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente; a intensidade do dolo ou da negligência; os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram; as condições pessoais do agente e a sua situação económica; a conduta anterior ao facto e a posterior a este; especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime; a falta de preparação para manter uma conduta licita manifestada no facto quando essa falta deva se censurada através de aplicação da pena.

27. Deveria ter o Tribunal a quo não ponderou a favor do Arguido quaisquer circunstâncias como por exemplo o mesmo ter sido o único a prestar declarações em audiência de julgamento ou o facto de o produto estupefaciente que estava na sua posse não ter sido disseminado pelos consumidores. Nada foi tido em conta a favor deste arguido.

28. De facto não é com penas elevadas que se combate o crime de trafico de droga.

29. O Recorrente não pode deixar de observar as penas cominadas em processos cuja gravidade é bem mais acentuada que a sua conduta.

30. A titulo exemplificativo, e numa breve passagem por acórdão dos Tribunais de 1ª instância e dos tribunais superiores, evocamos: Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça , Proc 7/10.OPEBJA .S1 apreensão de 2.089gramas de cannabis (resina e e 4.021gramas de cocaína, condenação a 6 anos de prisão e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, processo nº 622/15.5 T9VFX-3, apreensão de 2.861,20 gramas de haxixe, i.e. 2 Kg e 861 gramas, com uma condenação de 5 anos e nove meses de prisão.

31. Pelo supra demonstrado e fazendo fé numa alteração do crime a que foi condenado o aqui recorrente, requeremos uma redução substancial da pena concreta aplicada.

32. Em suma a medida da pena de 5 anos de prisão efectiva, mostra-se excessiva de acordo com o supra exposto.

Nestes termos e nos demais de direito que V. Exas. não deixarão de doutamente suprir, deve ser dado provimento ao presente recurso, e revogada a decisão de que ora se recorre e consequentemente absolver-se o Recorrente do crime que foi condenado ou caso assim não se entenda alterar-se a condenação pelo crime do artigo 25º do DL 15/93 de 22 de Janeiro – Trafico de menor gravidade e substituir-se a pena a que foi condenado por uma menor dentro dos limites mínimos do supra mencionado artigo 25º.

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