Acórdão nº 661/20.4T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelPAULA DO PAÇO
Data da Resolução14 de Julho de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório Em 03-03-2020, Abelo José Joaquim apresentou o requerimento a que alude o artigo 98.º - C do Código de Processo do Trabalho, manifestando a sua oposição à comunicação escrita de cessação do contrato de trabalho, que lhe foi remetida pela empregadora, N…– Associação, por considerar que a mesma consubstancia um despedimento ilícito.

Juntou a referida comunicação escrita.

A 1.ª instância proferiu despacho liminar, com o teor que, seguidamente, se transcreve na íntegra: «A… apresentou formulário a que respeita o art.98º-C nº 1 do C.P.T. opondo-se ao despedimento promovido por N…– associação..

Juntou decisão (vide fls. 4) na qual se pode ler “(…) Venho por este meio ( …) por estar em curso o período experimental (…) comunicar a imediata cessação do contrato de trabalho iniciado no dia 02 de maio de 2019 (…)”.

Vejamos.

Prescreve o art.387º nº1 do Código de Trabalho que “1 - A regularidade e licitude do despedimento só pode ser apreciada por tribunal judicial.” Por seu turno estatui o nº 2 da mesma norma que “O trabalhador pode opor-se ao despedimento, mediante apresentação de requerimento em formulário próprio, junto do tribunal competente, no prazo de 60 dias, contados a partir da receção da comunicação de despedimento ou da data de cessação do contrato, se posterior, exceto no caso previsto no artigo seguinte”.

Dando concretização à ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, estatui o art.98º-C nº 1 do Código de Processo de Trabalho que “Nos termos do artigo 387.º do Código do Trabalho, no caso em que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja por inadaptação, a ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento inicia-se com a entrega, pelo trabalhador ou mandatário judicial por este constituído, junto do juízo competente, de requerimento em formulário eletrónico ou em suporte de papel, do qual consta declaração do trabalhador de oposição ao despedimento, sem prejuízo do disposto no número seguinte.” As modalidades de cessação do contrato de trabalho estão previstas no art.340º do Código de Trabalho nos termos do qual: “Para além de outras modalidades legalmente previstas, o contrato de trabalho pode cessar por: a) Caducidade; b) Revogação; c) Despedimento por facto imputável ao trabalhador; d) Despedimento coletivo; e) Despedimento por extinção de posto de trabalho; f) Despedimento por inadaptação; g) Resolução pelo trabalhador; h) Denúncia pelo trabalhador.” Em face de tal elenco e da inequívoca e clara referência a “despedimento” no art.387º do Código de Trabalho, para o qual remete o art.98º-C nº 1 do C.P.T., é manifesto que apenas as situações previstas nas alíneas c), e) e f) do art.340º do Código de Trabalho fundamentam o presente processo.

Neste sentido vide Ac. RP de 30/05/2011, proc. 1078/10.4TTGDM.P1 acessível in www.dgsi.pt, onde se pode ler que “… Desde o Livro Branco das Relações Laborais[6], passando pelo acordo de concertação social celebrado entre o Governo e os parceiros sociais para a reforma das relações laborais, de 25 de Junho de 2008, até ao Cód. do Trabalho de 2009 [CT2009] e sem esquecer, quer a lei de autorização de alteração do Cód. Proc. do Trabalho [CPT2010], quer o proémio do Decreto-Lei pelo qual este código foi alterado, que existiu o propósito claro de criar uma ação, com processo especial, de impugnação do despedimento individual, efetuado por escrito, com o objetivo de fazer corresponder a tramitação de tal ação - de impugnação do despedimento - às regras sobre o ónus da prova da justa causa e isto no seguimento das alterações propostas para a simplificação do procedimento.

Tal desiderato consta do LBRL, ponto 4.2.1, pág. 110. No entanto, o sentido da alteração é mais vasto, como logo se verifica no ponto 4.2.3., pág. 111, na redação proposta para substituir o disposto no Art.º 435.º do Cód. do Trabalho de 2003, donde resulta que o prazo de caducidade de propositura da ação será reduzido de 1 ano para 60 dias, a contar da receção da comunicação do despedimento. Só que, assim, para além de se reduzir drasticamente o prazo de caducidade da ação, está-se também a restringir o número de casos em que o despedimento é impugnado através desta ação, pois ela apenas abrange aquelas hipóteses em que o despedimento foi formalmente comunicado, o que significa, por outro lado, que se trata de despedimentos provados, assumidos como tal pelo empregador, em que o trabalhador não tem, a este nível, qualquer ónus da prova para cumprir. Significa também que apenas o empregador o tem e que consiste na demonstração da justa causa do despedimento ou dos fundamentos da extinção do posto de trabalho ou da inadaptação do trabalhador (…) no desenvolvimento de (…) Art.º 387.º, n.º 2 do CT2009 - no plano processual, pela Lei n.º 76/2009, de 13 de Agosto, foi o Governo autorizado a, nomeadamente: n) Criar uma ação declarativa de condenação com processo especial para impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, de natureza urgente, que admite sempre recurso para a Relação, aplicável aos casos em que seja comunicada por escrito ao trabalhador a decisão de despedimento individual, seja por facto imputável ao trabalhador, seja por extinção do posto de trabalho, seja ainda por inadaptação.

Por outro lado, como se refere no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 295/2009, de 13 de Outubro, que alterou o CPT2010, “Nestes casos [do processo especial], a ação inicia-se mediante a apresentação pelo trabalhador de requerimento em formulário próprio, junto da secretaria do tribunal competente, no prazo de 60 dias previsto no n.º 2 do artigo 387.º do CT...” e “Todas as demais situações continuam a seguir a forma de processo comum e ficam abrangidas pelo regime de prescrição previsto no n.º 1 do artigo 337.º do CT.” Assim, sendo o despedimento declarado por escrito pelo empregador, a ação de impugnação segue os trâmites do processo especial e nos outros casos – por exemplo, despedimento declarado pelo empregador, mas verbalmente, cessação de contrato em que as partes divergem sobre a sua qualificação como contrato de trabalho ou de prestação de serviços ou se a forma de cessação foi o despedimento ou a caducidade de contrato a termo – segue a tramitação do processo comum.”. Ora, no caso vertente, em face do teor da comunicação da cessação do contrato de trabalho, não estamos perante uma situação das reconduzíveis ao conceito de despedimento, importando discutir se a mesma se subsume à figura da denuncia durante o período experimental. Tal discussão não pode, como se viu, ter lugar no âmbito da ação especial da impugnação da regularidade e licitude do despedimento mas apenas em ação comum.

E assim sendo quid iuris? Como bem refere Abrantes Geraldes, in Temas da Reforma do Processo Civil, Almedina, 1997, p. 247, “a forma do processo escolhida pelo autor deve ser adequada à pretensão que deduz e determinar-se pelo pedido que é formulado e, adjuvantemente, pela causa de pedir.” No caso vertente, como se viu, a forma de processo não é a adequada à pretensão formulada e, por isso, está-se perante erro na forma do processo.

Ora a existência de erro na forma do processo consubstancia nulidade processual que, por força do art.193º nº 1 do Código de Processo Civil ex vi art.1º nº 2 al. a) do Código de Processo de Trabalho, importa a anulação dos atos que não possam ser aproveitados.

Radica tal solução no principio do aproveitamento processual dos atos praticados, com respetiva adequação do processo, porquanto o fundo deve prevalecer sobre a forma.

Assim, verificado o erro na forma de processo, o juiz deve convolar a forma de processo que foi utilizada para a que devia ter sido utilizada, só devendo anular os que de todo em todo não puderem ser aproveitados para a forma adequada ou se desse aproveitamento resultar uma diminuição das garantias do réu.

No caso vertente «tal aproveitamento não pode, manifestamente, fazer-se porquanto o formulário apresentado não contém os requisitos exigidos pelo disposto no art.552º nº 1 do C.P.C. ex vi art.1º nº 2 al. a) do C.P.T. e, por isso, não se...

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