Acórdão nº 4473/17.4T9PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelALBERTO BORGES
Data da Resolução06 de Outubro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Portimão, Juiz 2, correu termos o Processo Comum Singular n.º 4473/17.4T9PTM, no qual foi julgada a arguida DMEN – filha de AN e de MLD, natural da …, de nacionalidade …., nascida em …….., ….,…, portadora do título de residência n.º…….. e residente em ………. pela prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelos artigos 137 n.ºs 1 e 2, 15 al.ª b) e 69 n.º 1 alínea a), todos do Código Penal, e artigos 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1, todos do Código da Estrada

A final veio a decidir-se: - Absolver a arguida (DMEN)da prática do crime de crime de homicídio por negligência - previsto e punido pelos artigos 137 n.ºs 1 e 2, 15 al.ª b) e 69 n.º 1 alínea a), todos do Código Penal, e artigos 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1, todos do Código da Estrada – que lhe vinha imputado e, operando a sua convolação, condenar a arguida, pela prática, como autora material, de um crime de homicídio por negligência, previsto e punido pelos artigos 137 n.º 1, 15 al.ª b) e 69 n.º 1 alínea a), todos do Código Penal, e artigos 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1, todos do Código da Estrada, na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano; - Condenar a arguida na pena acessória de proibição de conduzir veículo com motor pelo período de um ano, ao abrigo do disposto no art.º 69 n.º 1 al.ª a) do Código Penal, de terminando que a mesma proceda à entrega da carta de condução de que é titular na secretaria do tribunal ou em qualquer posto policial no prazo de 10 dais a contar do trânsito em julgado desta sentença, nos termos do disposto no art.º 69 n.º 3 do Código penal, sob pena de, não o fazendo, incorrer na prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.º 348 n.º 1 al.ª a) do Código Penal

--- 2. Recorreu a arguida desta sentença, concluindo a motivação do recurso com as seguintes conclusões: 1 – Na douta acusação, na parte relativa à imputação do cometimento do crime, diz-se: “… Pelo exposto, cometeu a arguida DD, em autoria material e na forma consumada: - Um crime de homicídio voluntário, p. e p. pelos art.ºs 137 n.ºs 1 e 2, 15 al.ª b) e 69 al.ª a) do Código Penal

2 – Por conseguinte, na acusação a imputação do ilícito criminal em apreço é feita a pessoa que não corresponde com o nome de identificação da recorrente, que é cidadã belga, cujo nome é DMEN

3 – O que torna nula a acusação, por violação do disposto nos art.ºs 283 n.º 3 al.ª a) e 311 n.º 3 al.ª a) do Código de Processo Penal

4 – Por outro lado, conforme acima se alegou, a douta acusação omitiu ou padece de alegação de factos essenciais relativos aos elementos integradores do tipo de ilícito criminal de homicídio voluntário, nomeadamente, não alegou os factos que a arguida agiu de modo livre, voluntária e conscientemente, omitiu com o seu comportamento negligente violando as regras do Código da Estrada em vigor a que estava obrigada a respeitar

5 – Ao que acresce, ainda, não ter a douta acusação, em lado algum, indicado as concretas regras do Código da Estrada e do seu regulamento que a arguida devia ter respeitado e obedecido, mas não o fez, em razão do seu comportamento negligente

6 – Do que resulta, em nosso entender, ser a acusação nula, por violação do disposto, nomeadamente, no art.º 283 n.º 3 al.ªs b) e c) do Código de Processo Penal, pelo que deveria ter sido rejeitada, nos termos do disposto no art.º 311 n.ºs 2 al.ª a) e 3 al.ªs b) e c) do mesmo diploma legal

7 - Acontece que a Mm.ª Juiz a quo, ao invés de assim proceder, e sem qualquer contraditório por parte da arguida, procedeu à correção das omissões da acusação, fazendo constar dos eu relatório: “Para julgamento em processo comum e perante tribunal singular foi pronunciada a arguida DMEN… imputando-lhe a prática, em autoria material de um crime de homicídio voluntário por negligência, p. e . pelos artigos 137 n.ºs 1 e 2, 15 al.ª b) e 69 n.º 1 alínea a), do Código Penal, e artigos 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1, todos do Código da Estrada

8 – Ou seja, a douta sentença recorrida faz constar no seu relatório elementos que, ao contrário do que aí se afirma, não constavam em lado algum da acusação, como a imputação do crime de homicídio negligente, por referência aos art.ºs 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1 do Código da Estrada, razão porque - também por esta razão – deve a douta sentença recorrida ser considerada nula, por não poder o tribunal a quo suprir a falta de elementos essenciais que deviam constar da acusação, como fez neste caso, acrescentando-lhe, no seu relatório, a imputação do crime em nome da arguida DMEN, ora recorrente – quando na acusação se faz a DD – e os dispositivos legais do Código da Estrada relativos a circulação rodoviária supostamente violados, o que lhe está vedado, não podendo ser usados para o efeito os procedimentos previstos nos art.ºs 358, 359 e 379 n.º 1 al.ª b) do Código penal, conforma acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2015, de 27.01

9 - Além das razões antes aduzidas, conforme acima alegado, até por virtude das deficiências da acusação, a douta sentença recorrida padece de insuficiências e contradições manifestas: - Foi dado como provado (7) que “o local do acidente configura uma reta com boa visibilidade, atento o sentido de marcha da arguida”, quando as fotografias juntas aos autos feitas pela GNR demonstram que a via nesse local, e atento o sentido de marcha do ciclomotor, configura uma curva; - Foi dado como provado (8) que “a faixa de rodagem é composta por duas vias de trânsito, uma para cada sentido de marcha, com a largura total de 6,90 metros, em bom estado de conservação, com sinalização vertical e horizontal, sendo o limite de velocidade no local de 50 km/hora”, quando – conforme hierarquia estabelecida no art.º 7 do Código da Estrada – havendo concorrência de normas de direito estradal potencialmente aplicáveis (sinais de trânsito e regras gerais do Código da Estrada), teriam de ser invocados e provados os factos pertinentes para verificar a razão da escolha por umas outras, no mínimo, teriam de ser alegados e provados quais os sinais verticais e horizontais, por referência ao regulamento do Código da Estrada, e a sua exata localização no sítio da via onde ocorreu o acidente (por exemplo, para se dar como provado que o limite de velocidade no local é de 50 km/hora é mister indicar o facto e razão de ciência que permite essa conclusão, nomeadamente, se decorre da regra geral estabelecida no art.º 27 do Código da Estrada ou se por sinal de trânsito específico limitador de velocidade no local)

10 – Por outro lado, a factualidade dada como provada no ponto 8 da matéria de facto dada como provada é, a nosso ver, absolutamente contraditória e incompatível com a factualidade constante nos pontos 10 e 11 da matéria de facto e com a fundamentação da douta decisão: Por um lado dá-se por provado que a via tem sinalização vertical e horizontal reguladora do trânsito que nela circula, mas não se identificam nem se indica a sua localização; Por outro, e sem concorrência de outros factos pertinentes e provados, conclui-se – no referido ponto 10 dos factos provados – que “ao executar a referida mudança de direção para a esquerda a arguida seguia desatenta no tipo de condução que efetuava, não observou, de modo imprevidente, as precauções exigidas pelas regras de circulação rodoviária que era capaz de adotar e devia ter adotado para evitar o resultado verificado…”; Acrescendo, da mesma forma, o que consta do ponto 11 da matéria de facto provada, que “a arguida, ao exercer a condução sabia que o devia fazer com atenção, designadamente, cedendo passagem ao motociclo que circulava no sentido oposto”

11 – Daí que, nesta parte, na fundamentação da douta sentença recorrida devia o tribunal a quo ter laborado sobre as razões subjacentes à escolha das regras de circulação rodoviária convocadas à resolução do caso, se as impostas pelos sinais, verticais e horizontais, reguladores da circulação rodoviária local, ou as regras gerais do Código da Estrada aplicáveis na ausência de sinal regulador de trânsito, conforme a hierarquia estabelecida no art.º 7 do Código da Estrada

12 – No caso em apreço provou-se que existem sinais reguladores de trânsito verticais e horizontais, cuja localização e identificação não se faz, concluindo-se, no entanto, em contradição com a existência desses sinais, convocando à regulação da situação as regras gerais de circulação rodoviária consagrados nos art.º 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 31 n.º 1 do Código da Estrada, havendo, pois, uma situação de manifesta insuficiência da matéria de facto provada, erro na apreciação da prova e, até por via destas, contradição insanável entre a fundamentação ou entre esta e a decisão proferida, razão pela qual deve a sentença recorrida ser substituída por outra que proceda à absolvição da arguida

13 – Caso assim não se entenda, face à idade, situação económica e social e ausência de antecedentes criminais, deve a pena aplicada à arguida ser a pena de multa ou uma pena não superior a 6 meses de prisão, em qualquer caso suspensa a pena principal e a pena acessória de inibição de conduzir que, hipoteticamente, venham a ser aplicadas

--- 3. Responderam o Ministério Público e as assistentes (TAK, BK e BK) ao recurso interposto, concluindo a sua resposta nos seguintes termos: 3.1. O Ministério Público 1 - Por sentença de 8 de novembro de 2019 a arguida foi condenada, como autora material de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos art.ºs 137 n.º 1, 15 al.ª b) e 69 n.º 1 al.ª a) do Código Penal e art.ºs 29 n.º 1, 30 n.º 1 e 35 n.º 1do Código da Estrada, na pena de um ano e seis meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de um ano 2 - Foi ainda condenada na pena acessória de proibição de condução de veículos com motor pelo um período de um ano, ao abrigo do...

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