Acórdão nº 2286/19.8T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 03 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMOIS
Data da Resolução03 de Dezembro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Recorrente: M…, SA (arguida).

Recorrida: ACT – Autoridade para as Condições do Trabalho.

Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo do Trabalho de Santarém, J2.

  1. Nos presentes autos de contraordenação, a arguida nos autos à margem referenciados, veio impugnar judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições no Trabalho que lhe aplicou a coima única de € 9 384 (nove mil, trezentos e oitenta e quatro euros), pela prática de uma contraordenação prevista no n.º 1 e na al. a) do n.º 3 do artigo 108.º da Lei n.º 102/2009 de 10/09 e punida pelo n.º 7 do mesmo artigo e al. e) do n.º 3 e n.º 5 do artigo 554.º do Código do Trabalho e pela prática de uma contraordenação prevista no artigo 279.º n.º 1 da Lei 7/2009, de 12 de fevereiro e punida nos termos do n.º 5 do mesmo artigo.

    Após convite formulou, para tanto, as seguintes conclusões: A acusação não contem todos os elementos exigíveis à sua legalidade na medida em que não consta da mesma a descrição dos factos alegadamente praticados pela arguida e que consubstanciariam na violação das normas indicadas, devendo ser considerada nula.

    A acusação basta-se com a mera indicação dos autos e com a remissão para as normas legais aplicáveis, não se verificando assim a existência do elemento essencial exigido na “descrição sumária dos factos”, como impõe o art.º 25.º n.º 1 da Lei nº 107/2009.

    De acordo com o artigo 283.º n.º 3 al. b) do CPP aplicável ex vi artigo 4.º do RGCO e artigo 60º da lei nº 107/2009 e jurisprudência fixada no assento nº 1/2003 do Supremo Tribunal de Justiça, a acusação tem que conter, sob pena de nulidade, a narração de factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena incluindo se possível o lugar, o tempo e a motivação da sua prática; Ao não enunciar os factos que compunham os elementos objetivos das imputadas contraordenações à arguida, a acusação /decisão administrativa. da ACT incorreu numa omissão que tem como consequência a sua nulidade, importando a rejeição da acusação nos termos do n.º 2 do art.º 311 do Código Penal e a consequente absolvição da arguida.

    Não sendo admissível a remessa dos autos para a autoridade administrativa para saneamento da nulidade sob pena de violação do princípio da igualdade, da confiança e da segurança jurídica, uma vez que conhece antecipadamente a impugnação da arguida.

    O trabalhador identificado nos autos foi admitido na empresa em 12 de novembro de 2012, com a categoria profissional de motorista, sendo seu dever por estipulação contratual e legal, proceder zelosamente à manutenção da viatura que conduzia com a matrícula TX-62-59.

    Era também dever do trabalhador verificar as respetivas inspeções periódicas e alertar atempadamente a sua entidade empregadora sobre a necessidade de renovação das mesmas dentro dos prazos legais.

    O trabalhador estava ciente das suas obrigações na medida em que, aquando da sua contratação, lhe foi disponibilizado um manual, denominado Manual Normas e Procedimentos na Utilização das Viaturas P…, que recebeu e compreendeu, manual esse onde se refere que o motorista é o único responsável pela falta do selo de aferição do tacógrafo, devendo certificar-se periodicamente da validade dos respetivos documentos e inspeções.

    O trabalhador não cumpriu as regras e procedimentos sobre essa matéria, pelo que a empresa em dezembro de 2013, no âmbito de ação de fiscalização, foi condenada numa coima de € 400 acrescida de custas de € 42,50, devido falta de verificação periódica do aparelho de tacógrafo no 0600324 do veiculo com a matricula ….

    A arguida encetou diligências internas apurar as circunstâncias em que a relatada situação ocorreu, nomeadamente, inquirindo o trabalhador quanto aos factos, tendo o trabalhador assumido ser o único responsável por tal ocorrência reconhecendo ser sua a responsabilidade pelo pagamento da coima referida, tendo-se voluntariado para reembolsar a empresa pela quantia por esta paga em prestações mensais, o que a ora arguida aceitou, pelo que ajustaram que a mencionada quantia seria paga pelo trabalhador à empresa em prestações mensais de € 73,75, sendo descontando esse valor do vencimento liquido do trabalhador.

    Para formalização do referido acordo, foi elaborada uma declaração de confissão de dívida, tendo esta sido aceite e assinada pelo trabalhador.

    Assim, a arguida não teve necessidade de recorrer a um procedimento disciplinar uma vez que o trabalhador assumiu espontânea, inequívoca, livre e expressamente a sua responsabilidade.

    Considerando a voluntária assunção da sua responsabilidade pelo trabalhador e a sua pronta disponibilidade para suportar o dano causado com o seu comportamento, a eventual instauração dum procedimento disciplinar, para além de desnecessária, configuraria uma clamorosa injustiça perante o trabalhador que, voluntariamente, assumiu a sua responsabilidade e se prontificou a ressarcir a entidade empregadora pelos danos causados.

    Na decorrência do acordado, o pagamento fracionado da mencionada quantia, pelo trabalhador, ocorreu nos meses de dezembro de 2013 e maio de 2014, mediante dedução mensal no vencimento líquido do trabalhador; O trabalhador não manifestou qualquer oposição à decisão tomada nem interpelou a arguida no sentido de questionar a mesma, tendo o pagamento da quantia em causa sido realizado dentro de toda a normalidade e nos termos rigorosamente acordados.

    A arguida, ao agir da forma descrita, não compensou a retribuição com crédito que tinha sobre o trabalhador, por sua própria iniciativa e de forma unilateral.

    No caso em apreço, tendo a arguida atuado sem consciência da ilicitude da sua conduta, deve, pois, ser absolvida por ausência de culpa.

    Caso assim não se entenda – o que apenas por simples cautela de patrocínio se concebe, sem conceder – deve a coima ser especialmente atenuada, nos termos dos artigos 9.º, n.º 2 e 18.º, n.º 3 do RGCO, não podendo ultrapassar metade do mínimo fixado para a negligência.

    A referida coima, já objeto de atenuação especial, é, nos termos do n.º 2 do artigo 73.º, do CP, passível de substituição, nos termos gerais, por uma admoestação, o que se requer A entidade administrativa proferiu despacho a manter a decisão e remeteu o processo ao Ministério Público.

    Presentes os autos ao Juiz e recebido o recurso, com efeito suspensivo, foi realizada a audiência de julgamento, com a audição das testemunhas arroladas.

    De seguida foi proferida sentença com a decisão seguinte: Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente a impugnação apresentada pela M…, SA e, em consequência, revoga-se a decisão na parte que determina o cumprimento do pagamento à Segurança Social da quantia de € 153,77 (cento e cinquenta e três euros e setenta e sete cêntimos), mantendo-se no mais a decisão recorrida.

    Custas a cargo da recorrente fixando-se a taxa de justiça em 3 UC.

    Notifique e comunique à autoridade administrativa.

  2. Inconformada, veio a arguida interpor recurso, que motivou e concluiu do seguinte modo: (

    1. A decisão ora recorrida discorre sobre as caraterísticas da fundamentação, repetindo aquilo que foi trazido à liça pela arguida no recurso de contraordenação, que acompanhou - até porque não tinha outra alternativa - em toda a linha, em sede de alegações, concluindo, de súbito e sem mais, que “(…) somos do entendimento que a decisão não padece do invocado vício de falta ou insuficiência da matéria de facto provada e que contem os elementos mínimos que integram o elementos objetivo e subjetivo do ilícito. Improcede, assim, a invocada nulidade.” (b) Tribunal a quo não faz qualquer referência aos elementos concretos a que se reporta e ainda que, para cumprir a formalidade, se refira «vertendo ao caso concreto», facto é que não faz qualquer referência, mínima que seja, ao caso concreto dos presentes autos, não se referindo a qualquer facto que, sendo conclusivo, seja ainda assim ao conceito, aí plasmado, de “elementos essenciais”.

    (c) A decisão recorrida, no que respeita ao processo...

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