Acórdão nº 405/09.1TMCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelSÍLVIA PIRES
Data da Resolução17 de Junho de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra O Autor intentou em 9.5.2009 a presente acção de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra a Ré, alegando, em síntese: - O casal está separado de facto desde 10 de Janeiro de 1982, na sequência do abandono do lar pelo Autor, que passou desde essa data a viver em Coimbra.

- O casal, desde então, deixou de ter vida em comum, nunca mais tendo partilhado cama, mesa e habitação.

Concluiu, pedindo o decretamento do divórcio, com fundamento na verificação da situação prevista na al. a) do art.º 1781º do C. Civil, pedindo também, nos termos do art.º 1789º, n.º 2, do mesmo diploma que os efeitos patrimoniais do divórcio retroajam a 10 de Janeiro de 1982.

A Ré contestou e impugnando a factualidade alegada pelo Autor, concluiu pela improcedência da acção.

No entanto, com fundamento na violação pelo Autor dos deveres conjugais de fidelidade, cooperação, respeito, assistência e coabitação, formulou pedido reconvencional, pedindo o decretamento do divórcio e a fixação de um regime provisório quanto à atribuição da casa de morada de família.

O Autor apresentou réplica, impugnando os factos alegados pela Ré no seu articulado e concluiu como na p. inicial.

Após incidentes variados veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos: Face ao exposto, julgo PROCEDENTE, por provada, a presente acção e reconvenção, decretando, assim, o divórcio entre J... e M..., o que tem por efeito principal a dissolução do casamento celebrado entre ambos em 25 de Setembro de 1966.

Nos termos do art. 1789º/2 do CC, porque tal foi requerido, fixa-se a data em que começou a separação no ano de 1982/1983.

A Ré, inconformada, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: ...

O Autor apresentou resposta, invocando como questões prévia a extemporaneidade do recurso e a deficiente impugnação da matéria de facto, defendendo a confirmação da decisão recorrida e peticionando a condenação da Ré como litigante de má-fé em multa.

  1. Da tempestividade do recurso O Autor, alegando que ao presente recurso se aplicam as disposições do Novo Código de Processo Civil, invoca o preceituado no art.º 248º daquele diploma, o qual, na sua leitura, contém uma presunção que pode ser ilidida por qualquer das partes, para concluir que, tendo o mandatário da Recorrente sido notificado em 6.11.2013 e o recurso interposto em 6.1.2014, o mesmo é extemporâneo, uma vez que o prazo para a sua interposição terminou em 16.12.2013, podendo ser interposto até ao dia 19.12.2013 com pagamento de multa.

    Vejamos: A sentença foi notificada aos mandatários das partes por via electrónica em 6.11.2013.

    A Ré em 12.11.2013 formulou pedido de aclaração da sentença, o qual veio a ser decidido por despacho de notificado, por via electrónica, às partes em 21.11.2013.

    O recurso deu entrada em tribunal em 6.1.2014.

    Sendo facto indiscutível que o pedido de aclaração deduzido não suspende o prazo para a interposição do recurso, temos que averiguar qual o seu termo, atendendo à data em que as partes se devem considerar notificadas da sentença.

    Defende o Réu que, tendo o mandatário da Recorrente lido a notificação da sentença no próprio dia em que a mesma lhe foi efectuada é esse o dia que a lei considera como data de notificação, iniciando-se nessa data o prazo para a interposição do recurso.

    O art.º 254º do anterior C. P. Civil, no que respeitava à notificação por transmissão electrónica, tinha a seguinte redacção: 5 - A notificação por transmissão electrónica de dados presume-se feita na data da expedição.

  2. As presunções estabelecidas nos números anteriores só podem ser ilididas pelo notificado provando que a notificação não foi efectuada ou ocorreu em data posterior à presumida, por razoes que lhe não sejam imputáveis.

    A tramitação electrónica dos processos judiciais foi regulamentada pela Portaria n.º 114/2008, de 6 de Fevereiro.

    Esta Portaria foi alterada pela Portaria 1538/2008, de 30 de Dezembro, que implementou o CITIUS, visando, através da utilização de sistemas informáticos, criar condições para uma tramitação mais célere, dispondo o n.º 1 do art.º 21º-A desta Portaria que as notificações por transmissão electrónica de dados são realizadas através do sistema informático CITIUS, que assegura automaticamente a sua disponibilização e consulta no inerente endereço.

    O n.º 5 deste art.º 21º-A dispunha: O sistema informático CITIUS assegura a certificação da data de elaboração da notificação, presumindo-se feita a expedição no terceiro dia posterior ao da elaboração, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o final do prazo termine em dia não útil.

    Daqui resulta que o legislador visou uma equiparação do sistema da notificação electrónica ao sistema da notificação postal, nomeadamente no respeitante a prazos, o mesmo acontecendo quanto ao modo de ilisão das presunções, pois ambas só podiam ser ilididas pelo notificado [1].

    Assim, antes da entrada em vigor do Novo C. P. Civil, para efeitos de determinação das datas das notificações electrónicas, existiam duas presunções: 1ª – a contida no art.º 254º, n.º 5, do C. P. Civil de que a notificação por transmissão electrónica de dados se presume feita na data da expedição e, 2ª – a contida no n.º 5 do art.º 21º-A da Portaria 1538/2008, de 30 de Dezembro, que presume que a expedição é feita no terceiro dia posterior ao da elaboração da notificação, ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o final do prazo termine em dia não útil.

    No que respeita a notificações dispõe o art.º 248º do Novo C. P. Civil: Os mandatários são notificados nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º, devendo o sistema informático certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no 3.º dia posterior ao da elaboração ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando o não seja.

    Esta disposição, universalizando o regime da notificação electrónica, incorpora a presunção que constava do nº 5 do art.º 21º-A da Portaria nº 114/2008, de 6 de Fevereiro, nada resultando da mesma que a notificação se considere ou presuma efectuada no dia em que o correio electrónico for lido, mas tão somente que a mesma se considera efectuada no 3º dia posterior ao da sua elaboração no sistema informático.

    Pelo facto da lei não ter estabelecido a forma da ilisão desta presunção – tanto no Novo C. P. Civil, como na Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, que regulamenta a tramitação electrónica dos processos, na sequência da revogação da Portaria 114/2008, não se pode concluir que a legitimidade para tal pertence a qualquer uma das partes.

    Esta presunção foi estabelecida tendo em vista a uniformização das datas de notificação [2], tal como a que anteriormente contava do art.º 254º do anterior Código de Processo Civil, não atribuindo a lei qualquer relevância ao facto da mesma ter ocorrido em data anterior àquela que presume, pois daí só resultariam complicações para as contagens dos prazos com início na data de notificação.

    Assim, mantêm-se o mesmo sentido da lei anterior, segundo o qual as presunções da notificação só podem ser ilididas pelo próprio mandatário notificado para alargamento do prazo, provando que não foram efectuadas ou que ocorreram em data posterior à presumida, por razões que lhe não sejam imputáveis, não podendo essa ilisão ser efectuada pelo critério da leitura da peça processual, critério que não encontra qualquer apoio no texto da lei.

    Assim, tendo as partes sido notificadas em 11.11.2013, o prazo para interposição do recurso terminava em 6.1.2014, uma vez que no mesmo é impugnada a matéria de facto.

    Tendo o recurso sido interposto no último dia do prazo, julga-se o mesmo tempestivo.

  3. Da impugnação da matéria de facto O Autor, no que respeita à impugnação da matéria de facto, alega que a Recorrente não deu cumprimento às exigências contidas no art.º 640º do Novo C. P. Civil, porquanto não especificou os concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, não indicou os concretos meios probatórios que impõem uma decisão diferente, não indicou a decisão que no seu entender deve ser proferida em cada uma das questões de facto, nem indicou com precisão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, limitando-se a transcrever toda a prova.

    Conclui pela rejeição do recurso na parte respeitante à impugnação da matéria de facto.

    Dispõe o art.º 640º do diploma referido: 1 — Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

    2 — No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

    3 — O disposto nos n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636º.

    Da leitura das alegações do recurso interposto resulta manifesta a discordância da Ré quanto às respostas dadas aos quesitos formulados na base instrutória...

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