Acórdão nº 537/09.6GBPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Outubro de 2011
Magistrado Responsável | MARIA PILAR OLIVEIRA |
Data da Resolução | 19 de Outubro de 2011 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
-
Relatório No processo comum singular nº 537/09.6GBPBL do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal o arguido A...
, melhor identificado nos autos, foi submetido a julgamento mediante acusação pública da prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelos artigos 291º, nºs 1, alíneas a) e b), e 3 e 69º, nº 1, alínea a), ambos do Código Penal.
No decurso da audiência de julgamento foi comunicada eventual alteração da qualificação jurídica dos factos, susceptíveis de integrar a prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 e 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal.
Findo o julgamento foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: (…) julga-se procedente a acusação e, em consequência: a) Condena-se o arguido A... pela prática de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art.º 291.º, n.ºs 1, alínea a), e 3 do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à razão diária de 8 € (oito euros), o que perfaz a quantia de 720 € (setecentos e vinte euros); b) Condena-se o arguido A...
, ao abrigo do disposto no art.º 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor por um período de 105 (cento e cinco) dias; c) E ainda no pagamento das custas do processo, que compreendem 2 UC de taxa de justiça (artigos 513.º e 514.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, 8.º, n.º 5 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais).
Inconformado com esta decisão, dela recorreu o arguido A...
, rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: 1º O facto 3 dos factos provados, deveria ter sido dado como não provado, com base nas declarações do arguido e da testemunha B...; 2º Existe uma contradição insanável entre o ponto 3 dos factos provados e o facto 1 dos factos provados.
-
Ao ter condenado o arguido/recorrente, a douta sentença fez uma incorrecta aplicação do art. 291º, nº 1, alínea a) do Código Penal.
-
Deverá, desta forma, ser alterada a douta sentença por outra, que absolva o arguido.
V.ªs Exªs Farão, Como Sempre, A Costumada Justiça! Notificado, o Ministério Público respondeu ao recurso interposto, concluindo que deve ser negado provimento ao recurso.
Admitido o recurso e remetidos os autos a esta Relação, o Exmº Procurador- Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu réplica.
Corridos os vistos legais e realizada conferência, cumpre apreciar e decidir.
***II. Fundamentos da Decisão Recorrida Da sentença recorrida constam os seguintes fundamentos de facto e de direito: Matéria de facto provada Mostram-se provados com relevância para a decisão da causa os seguintes factos: 1. No dia …, por volta das …, o arguido A... conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula …, no sentido de trânsito Vila Cã/Outeiro de Moinho.
-
Em sentido contrário, seguia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula …, conduzido por C... .
-
A dada altura, os veículos conduzidos pelo arguido e por C... colidiram, tendo o veículo do arguido embatido na parte lateral esquerda traseira da viatura por aquela conduzida, daqui resultando estragos de valor não concretamente apurado.
-
Foi recolhida uma amostra de sangue ao arguido, cuja análise permitiu apurar que aquele conduzia a aludida viatura, nas referidas circunstâncias, com uma taxa de álcool no sangue de 1,25 g/l.
-
De facto, antes da condução, o arguido ingerira bebidas alcoólicas, sabendo do estado de alcoolemia em que se encontrava.
-
O arguido sabia que estava obrigado a circular na faixa da rodagem da direita, que não podia conduzir veículos sob o efeito do álcool e que ao fazê-lo punha em perigo todos os que ali transitavam, o que, não obstante, não o impediu de efectuar tal condução.
-
O arguido previu que ao actuar do modo descrito potenciava perigo de colisão com os demais veículos que circulavam na via pública e que, dessa forma, poderia colocar em perigo a vida e a integridade física dos seus condutores e passageiros, designadamente de C... ., bem como que poderia causar prejuízos de valor elevado, apesar de não se ter conformado com a realização de tais resultados.
-
Actuou de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
-
O arguido é casado e reside em casa própria com sua mulher (empregada de limpeza de profissão) e dois filhos (de 23 e de 18 anos de idade, o mais novo ainda estudante), ambos ainda dele economicamente dependentes.
-
Exerce a profissão de motorista em empresa de distribuição, auferindo um rendimento mensal de cerca de 600 €.
-
Tem como habilitações literárias o 7.º ano de escolaridade.
-
O arguido não tem antecedentes criminais.
Matéria de facto não provada Por sua vez, não resultaram provados os seguintes factos com relevância para a decisão da causa: 1. O arguido A... invadiu com a sua viatura a via de trânsito de sentido contrário, tendo perdido o controlo do veículo influenciado pelo seu estado de alcoolemia, provocando a colisão.
-
C... . viu a sua integridade física afectada com a colisão, sendo que o seu veículo tinha valor superior a 5 000 €.
Motivação da decisão de facto O Tribunal alicerçou a sua convicção na análise crítica do conjunto da prova produzida, desde logo nas declarações do arguido A..., o qual precisou as circunstâncias de tempo e de espaço descritas na acusação, reconhecendo que conduzia o veículo automóvel identificado na acusação, no sentido de trânsito ali apontado, tendo sido interveniente em acidente de viação, factos que em conformidade lograram ver-se, desde logo, demonstrados.
Admitiu também o arguido ter ingerido bebidas alcoólicas antes de efectuar a condução, sabendo que era legalmente vedada tal actuação no caso de ingestão de álcool em excesso, aduzindo, porém, ter ingerido bebidas em quantidade que à luz das regras da experiência comum não se coaduna com a taxa de alcoolemia apurada e que transparece do relatório de fls. 13.
Efectivamente, o arguido denotou nesta parte das suas declarações alguma hesitação, comprometimento e muito pouca confiança, bem patente na forma lacónica como respondeu às questões com que foi confrontado, não tendo apresentado justificação com solidez argumentativa e não respondendo, por vezes, de forma directa, ao que lhe foi questionado, motivos pelos quais não foi aqui merecedor de qualquer crédito.
O mesmo se diga do concreto local de embate por si apontado, ainda que também não tenha sido dada como provada a versão constante da acusação.
Com efeito, o arguido referiu sempre de forma peremptória, ainda que aos olhos do Tribunal de forma algo evasiva e sem muita segurança, escudando-se sempre nos mesmos argumentos, ter embatido na sua própria faixa de rodagem.
Já a testemunha C...., igualmente interveniente no acidente de viação, apesar de transparecer maior objectividade, com um discurso mais fluente e descomprometido, assim corroborando as circunstâncias de tempo e de espaço atrás referidas, o veículo que conduzia e o seu sentido de trânsito, acabou por reconhecer que o local é estreito, configura uma curva muito acentuada e não tem marcas no pavimento, não tendo assim o Tribunal alcançado, quanto ao apuramento do local do embate, apesar da testemunha ter referido que a colisão teve lugar na sua mão de trânsito, qualquer convicção segura e firme, acima de qualquer dúvida razoável, quanto à dinâmica da colisão descrita na acusação, fazendo-se aqui funcionar o princípio de valoração da prova in dubio pro reu, dando-se como não provado, consequentemente, que o arguido perdeu o controle do seu veículo e invadiu a via de trânsito em sentido contrário, provocando a colisão.
É que também a testemunha D..., militar da G.N.R. que acorreu ao local do embate e elaborou a participação do acidente de viação junta aos autos, confirmou aquelas características físicas, enunciando ainda com imparcialidade que não vislumbrou quaisquer vestígios no pavimento que indiciassem o preciso local da colisão. Limitou-se esta testemunha, por conseguinte, a confirmar o dia, hora, local, veículos intervenientes no acidente e respectivos condutores, fazendo-o de forma espontânea, ainda que com algum esforço de memória, atestando também a sujeição do arguido a análise sanguínea com vista ao apuramento da taxa de alcoolemia, contribuindo para o apuramento de tal factualidade.
Em todo o caso, a testemunha C... . denotou firmeza na descrição da parte do seu veículo embatida pelo arguido, respondendo sempre de forma peremptória, simples e natural, sem vacilar, tendo a correspondente matéria de facto constante da acusação resultado provada em conformidade com os esclarecimentos prestados em audiência.
Relativamente às condições económicas, familiares e profissionais do arguido relevaram as suas próprias declarações, prestadas nesta parte com maior naturalidade.
Devidamente conjugados com as declarações e depoimentos anteriores, baseou-se o Tribunal nos documentos de fls. 13 (no que respeita ao apuramento do resultado do teste de detecção de álcool no sangue efectuado ao arguido, do qual extraiu também o Tribunal a ilação do carácter culposo da sua conduta, face ao teor das declarações por ele prestadas, acima enunciadas, não podendo o arguido deixar de saber, mesmo à luz das regras da experiência comum, que havia bebido em demasia e as consequências gravosas que daí podiam resultar, ao nível do seu comportamento estradal) e 5 a 6 (participação do acidente de viação, da qual resultam os elementos relativos à data e local em que ocorreu o acidente, a caracterização dos veículos intervenientes e identificação dos respectivos condutores).
Tomou o Tribunal ainda em consideração o C.R.C. do arguido junto aos autos no que respeita aos seus antecedentes criminais.
Finalmente, os restantes factos dados como não provados, ainda não aflorados, relativamente à ausência de ferimentos...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO