Acórdão nº 43/09.9GATBU.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelORLANDO GONÇALVES
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de Tábua, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento, em processo comum e com intervenção do Tribunal Singular, o arguido, H...

, solteiro, serralheiro, residente na Rua … ..., imputando-se-lhe factos que integram, em autoria material, na forma consumada e em concurso real efectivo, um crime de condução sem habilitação legal p. e p. nos termos do disposto no art. 3.º, n.ºs 1 e 2 do Dec.-Lei n.º 2/98 de 03.01 e de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291.º, n.º1 al. b) do Código Penal e 69.º, n.º1 al. a), ambos do Código de penal por referência uma contra-ordenação ao disposto no art. 24.º e 25.º, .º 1 als. c) e) e f) e 145.º, n.º1, al. e) do Código da Estrada.

Realizada a audiência de julgamento o Tribunal singular, por sentença proferida a 28 de Junho de 2010, decidiu julgar a acusação do Ministério Público parcialmente procedente e, consequentemente, condenar o arguido H..., - pela prática, em 01.02.2009, de um crime de condução sem habilitação legal p. e p. nos termos do disposto no art. 3.º, n.ºs 1 e 2 do Dec.-Lei n.º 2/98 de 03.01 todos do Código da Estrada, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa; - pela prática, em 01.02.2009 de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo art. 291.º, n.º1 al. e b) do Código Penal na pena de 200 (duzentos) dias de multa, não se condenando em pena acessória; e - em cúmulo jurídico, condenar o arguido na pena única de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), num total de €1.430,00 (mil quatrocentos e trinta euros).

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o Ministério Público, concluindo a sua motivação do modo seguinte:

  1. A não aplicação da pena acessória de proibição de conduzir, prevista no art. 69°, n. ° 1, al. a) do Código Penal só encontrava justificação legal se o arguido tivesse sido apenas condenado pela prática de crime de condução sem habilitação legal questão pacífica na doutrina e jurisprudência desde a alteração introduzida na norma pela Lei nº 77/2001, de 13 de Julho.

  2. Tendo o arguido sido condenado pela prática do crime de condução sem habilitação legal, p. p. pelo art. 3°, n. ° 1 e 2 do Decreto-Lei nº 2/98, de 3/1 e do crime de condução perigosa de veículo rodoviário, p. p. pelo art. 291°, nº 1, al. a) do Código Penal, deveria o mesmo ter sido igualmente condenado na pena acessória de proibição de conduzir, também indicada em sede de acusação, por força da imputação deste último tipo de ilícito.

  3. Com efeito, o legislador, ao estabelecer esta punição a título de pena acessória, não distingue as situações em que o condutor está habilitado para conduzir daquelas em que não está, não podendo o intérprete, sem o mínimo de correspondência no texto da lei, proceder a tal distinção, sob pena de violação do disposto no art. 9° do Código Civil (ex vi do art. 4° do Código de Processo Penal) criando uma injustificada e incoerente desigualdade.

  4. Tal entendimento beneficiaria aqueles que, em vez de um, praticam dois ilícitos criminais, constituindo o cometimento do crime previsto no art. 3° do Decreto-Lei nº 2/98 um mecanismo de afastamento da condenação na pena acessória prevista para a condenação por outros ilícitos, com frustração dos objectivos de prevenção geral e especial ínsitos nessa pena.

  5. Assim é pois as penas acessórias, embora possam actuar também ao nível da prevenção da perigosidade, constituem verdadeiras penas, com a particularidade de estarem formalmente dependentes da pena principal e de serem material ou substancialmente condicionadas à existência de um particular conteúdo de ilícito que justifica a censura adicional ínsita na sua aplicação.

  6. De facto, embora esta pena vise também prevenir a perigosidade do agente não é essa a sua finalidade principal, sob pena de se confundir com a medida de segurança do art. 101 ° do Código Penal, para a aplicação e determinação concreta da qual estão em causa apenas exigência relacionadas com a perigosidade do agente.

  7. Excluir a protecção especial que se visa conferir com a pena acessória pelo facto de o arguido, além dos crimes previstos no art. 69°, n. ° 1, al. a) ter cometido também o crime de condução ilegal, não faz, pois, qualquer sentido.

  8. Acresce que o art. 126°, nº 1, al. d) do Código da Estrada, ao impedir que se atribua título de condução a quem se encontrar a cumprir proibição ou inibição de conduzir, só se compreende quando se aplica a mencionada pena acessória a quem não é titular de tal título.

  9. O mesmo sucedendo com o registo de infracções de não condutores que, nos termos do art. 4°, nº 1, al. e) do Decreto-Lei n° 98/2006, de 6 de Junho contempla as situações de "condenação por crime praticado em território nacional, no exercício da condução, por pessoa não habilitada para a condução".

  10. No mais, também o art. 101° do Código Penal, relativo à cassação do título e interdição da concessão do título de condução de veículo com motor, como medida de segurança faz referência, no seu nº 4, ao agente condenado por crime praticado na condução de veículo com motor ou com ela relacionado, que não seja titular de título de condução.

  11. Ou seja, também razões de interpretação sistemática e coerência normativa impõem a condenação na pena acessória de proibição de conduzir em situações como a dos autos.

  12. E a tal não obstam as questões atinentes à execução da pena, que se cumprirá com a comunicação ao IMTT e o decurso do prazo de inibição a partir do trânsito em julgado da decisão. Nem o argumento de que a comunicação da extinção da pena acessória configura como que um "convite" à prática do ilícito, pois bem sabe o arguido, até porque por isso foi também condenado, que a ausência de habilitação, enquanto subsistir, o impede de conduzir, sob pena de cometimento de um novo ilícito criminal.

  13. Nem o argumento de que a comunicação da extinção da pena acessória configura como que um “convite” à prática do ilícito, pois bem sabe o arguido, até porque por isso foi também condenado, que a ausência de habilitação, enquanto subsistir, o impede de conduzir, sob pena de cometimento de um novo ilícito criminal.

  14. E nenhuma incoerência existe face às situações suspensão da execução de penas de prisão com a condição de tirar a carta pois tais hipóteses apenas terão cabimento quando o único crime em que o arguido é condenado é precisamente o de condução sem habilitação legal e, nesta hipótese, qualquer que seja a pena principal, nunca se aplicará a pena acessória em referência.

  15. Impunha-se, assim, condenar o arguido na pena acessória...

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