Acórdão nº 122/17.9GCSEI.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelBRIZIDA MARTINS
Data da Resolução23 de Maio de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

*I – Relatório.

1.1. No âmbito dos autos supra mencionados, o arguido AA, entretanto já mais identificado, foi submetido a julgamento, porquanto alegadamente incurso na prática de factos que o instituiriam na prática, em autoria material e em concurso efectivo de infracções, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos art.ºs 292.º e 69.º do Código Penal e de um crime de desobediência qualificada, p. e. p. nos termos dos art.ºs 348.º, n.º 2, do Código Penal e 154.º, n.º 2, do Código da Estrada.

Realizado o contraditório, proferiu-se sentença que, além do mais por ora irrelevante, determinou a sua condenação pela prática, em autoria material, e em concurso efectivo, dos propalados ilícitos, isto é, i) de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p., nos termos dos (citados) art.ºs 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, al. a), na pena parcelar de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), no total de € 300,0 (trezentos euros), bem como em 3 (três) meses e 15 (quinze) dias de proibição de conduzir veículos com motor; ii) de um crime de desobediência qualificada, p. e p., nos termos do art.ºs 348.º, n.º 2 e 154.º, n.º 2, na pena parcelar de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco), no total de € 600,00 (seiscentos euros).

Em cúmulo jurídico de tais penas parcelares de imediato operado, o arguido acabou condenado na pena única de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), no total de € 650,00 (seiscentos e cinquenta euros), e na proibição de conduzir veículos com motor durante um período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias.

1.2. Inconformado com o teor do assim decidido, cingindo-se unicamente ao enquadramento jurídico dos factos realizado na 1.ª instância, o arguido interpôs recurso (constante de fls. 56/7), retirando da correspondente motivação as seguintes conclusões e pedido (transcrição): «1. Ao arguido foi instaurado um processo-crime (facto provado 1), por condução de veículo em estado de embriaguez.

  1. Na mesma noite foi novamente interceptado, fiscalizado, e foi-lhe instaurado novo processo, com novo crime de condução de veículo em estado de embriaguez (o que consta destes autos).

  2. O arguido foi condenado nestes autos pelo crime de condenação de veículos em estado de embriaguez.

  3. Tal condenação é indevida uma vez que existe “um concurso aparente de crimes, pois que autonomizar o conteúdo de ilícito desta (segunda) condução com álcool, significaria uma dupla valoração do mesmo substrato de facto, em violação do art.º 29.º 5 da CRP: punir o arguido duas vezes pelo mesmo facto.” 5. Assim sendo a decisão a tomar seria a da absolvição.

  4. Sobrescrevemos, para tanto, na defesa desta posição, os argumentos e fundamentos do acórdão prolatado no processo 810/15.4PFPRT.P1, de 03/03/2016, pelo Desembargador Neto de Moura, no TRP, disponível em www.dgsi.pt.

  5. Foi violado o artigo 29.º 5 da CRP.

    Termos em que deve a decisão recorrida ser revogada, e o arguido absolvido do crime de condução em estado de embriaguez, assim como da pena acessória de inibição de conduzir veículos.» 1.3. O recurso foi admitido por despacho de fls. 56.

    1.4. Entretanto, nos termos expressos de fls. 50/52, já o Ministério Público respondera ao mesmo, sustentando que constituindo o seu objecto apurar se a pessoa que depois de ter sido submetida a teste de pesquisa de álcool no sangue e de ter apresentado resultado positivo, ficando consequentemente impedida de conduzir pelo período de doze horas, voltar a conduzir e for novamente submetida a teste e apresentar resultado positivo comete apenas o crime de desobediência qualificada, previsto nos art.ºs 348.º, n.º 2 do Código Penal e 154.º, n.º 1 do Código da Estrada, ou também, em concurso real, um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, a resposta deve ser neste último sentido e daí que a dever improceder a impugnação do condenado.

    1.5. Observadas as formalidades devidas, foram os autos remetidos para este Tribunal da Relação, onde, aquando do momento previsto pelo art.º 416.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto (a fls. 59/63), emitiu parecer conducente a idêntico improvimento da impugnação.

    1.6. No âmbito do subsequente art.º 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, não foi apresentada qualquer resposta.

    1.7. Porque não vinha requerida a realização de audiência, e nenhum fundamento obstava ao prosseguimento do recurso, ordenou-se a recolha dos vistos devidos, o que sucedeu, e sua submissão a conferência.

    Dos trabalhos desta emerge a presente apreciação e decisão.

    *II – Fundamentação.

    2.1. Constitui jurisprudência corrente dos tribunais superiores que o âmbito do recurso se afere e delimita através das conclusões formuladas na motivação apresentada (art.º 412.º, n.º 1, in fine, do CPP), sem prejuízo das que importe conhecer, oficiosamente por obstativas da apreciação do seu mérito, como são os vícios da sentença previstos no art.º 410.º, n.º 2, do mesmo diploma, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito (Ac. do Plenário das Secções do S.T.J., de 19/10/1995, D.R. I – A Série, de 28/12/1995).

    No caso vertente, tal como transposto nas conclusões apresentadas, porque não intercede fundamento conducente a qualquer intervenção oficiosa, mantendo-se, em consequência, toda a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida, a questão decidenda consiste efectivamente em apurarmos se a pessoa que depois de ter sido submetida a teste de pesquisa de álcool no sangue e de ter apresentado resultado positivo, ficando consequentemente impedida de conduzir pelo período de doze horas, voltar a conduzir e for novamente submetida a teste e apresentar resultado positivo, comete apenas o crime de desobediência qualificada, previsto nos art.ºs 348.º, n.º 2 do Código Penal e 154.º, n.º 1 do Código da Estrada, ou também, em concurso real, um crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

    2.2. Antecedendo tal ponderação, vejamos o acervo fáctico e respectiva motivação acolhidos na decisão sob censura. Consignou-se, a propósito: «2.1. Factos Provados Com relevo para a decisão, provaram-se os seguintes factos: 1. No dia 17.12.2017, cerca das 0h44, na Vila de …, o arguido AA conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ---.

  6. O arguido foi fiscalizado e submetido ao teste quantitativo ao ar expirado, acusando uma TAS de pelo menos 1,767 g/l.

  7. Os factos descritos em 1. e 2 deram origem ao Processo n.º 175/17.0GTVIS e depois de ter sido constituído arguido e sujeito a Termo de Identidade e Residência pelo destacamento de Trânsito da GNR de Viseu, foi notificado pela mesma entidade policial, de que ficava impedido de conduzir veículos automóveis, pelo período de doze (12) horas, com a advertência de que, se o fizesse, praticaria um crime de desobediência qualificada, do que ficou ciente.

  8. Não obstante, nesse mesmo dia, pelas 02H50m, o arguido conduziu o mesmo veículo automóvel de matrícula ---, na Estrada Nacional n.º 231, na localidade de …, onde foi novamente interceptado por militares da GNR afectos ao Posto Territorial de Paranhos da Beira.

  9. Na sequência do qual veio o arguido a ser conduzido ao posto territorial de …, e submetido a novo teste de alcoolemia no aparelho 6810, modelo ARFC – 0718, acusando uma TAS de pelo menos 1,288 g/l, correspondente à TAS de 1,40 g/l registada, deduzido o erro máximo admissível.

  10. O arguido sabia que a qualidade e a quantidade de bebidas alcoólicas que ingeriu até momentos antes de iniciar a condução lhe determinariam necessariamente uma TAS superior a 1,20 g/l e, não obstante, não se absteve de conduzir o seu veículo na via pública.

  11. O arguido sabia que estava impedido de conduzir pelo período de doze horas, na sequência de ter acusado uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida e, não obstante, não se absteve de conduzir antes de decorrido aquele período, em violação da ordem que lhe foi regularmente comunicada.

  12. Agiu em todas as circunstâncias descritas voluntária e conscientemente.

  13. Sabia que as descritas condutas o faziam incorrer em responsabilidade criminal.

    Mais se provou: 10 - O arguido confessou os factos de forma integral e sem reservas e verbalizou arrependimento.

  14. O arguido é … e exerce funções de …, auferindo o rendimento mensal líquido de € ---.

  15. Vive com a mãe e um irmão mais velho, em casa própria da progenitora.

  16. A progenitora paga mensalmente a quantia de € 160,00 para amortização do crédito contraído para aquisição de habitação própria.

  17. O arguido contribui com € 200,00 para as despesas do agregado familiar.

  18. A mãe do arguido é reformada e aufere nessa qualidade uma pensão mensal no valor de € 280,00.

  19. O irmão do arguido é … e aufere um rendimento mensal líquido de € ---.

  20. O arguido tem o 6.º ano de escolaridade.

  21. O arguido não tem antecedentes criminais registados.

    2.2. Factos não provados Inexistem factos por provar.

    2.3. MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO A convicção do tribunal fundou-se na análise crítica e ponderada da prova produzida e examinada em audiência.

    O...

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