Acórdão nº 4343/21.1T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR CHAVES DOS SANTOS BARROSO
Data da Resolução22 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

RELATÓRIO J. G. intentou acção declarativa com processo comum contra Automóvel Clube de ….

Pedido: A — declarar-se que o motivo justificativo invocado pela Ré para a caducidade do contrato de trabalho do Autor não é válido; B - declarar-se ilícito o despedimento do Autor por invocada caducidade do contrato de trabalho; C — condenar-se a Ré a pagar quantia de 29.270,55€ (vinte e nove mil, duzentos e setenta euros e cinquenta e cinco cêntimos), a título de indemnização pela ilicitude do despedimento ou condená-la a reintegrá-lo, caso o Autor assim o venha a decidir; D - condenar-se a Ré a pagar a quantia de 2.000,00€ (dois mil euros) de danos não patrimoniais); E — condenar-se a Ré pagar ao Autor todos os salários que se vencerem desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento.

Causa de pedir: alega, em suma, ter sido contratado pela ré, em 8-10-2007, para desempenhar as funções de examinador de condução, auferindo a retribuição actual líquida mensal de €1.440,65. Em 29-06-2021, por carta registada recepcionada pelo autor em 30-06-2021, a ré fez cessar o contrato de trabalho invocando a sua caducidade nos termos do artigo 343º, alínea b) do Código do Trabalho. Invocando como fundamento a condenação do autor em pena de prisão pela prática de um crime de corrupção no exercício da profissão de examinador ao serviço do ACP, no processo crime 3110/13.0JFLSB e que, por essa razão, estaria impedido de exercer aquela actividade profissional por força do disposto no artigo 4º alínea a) da Lei n.º 45/2012, de 29 de Agosto. Acontece que o Autor foi condenado nesse processo não em pena de prisão, mas na pena de substituição de 4 anos e 8 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, o que não determina de forma automática a caducidade do contrato de trabalho, sendo certo que o que habilita o Autor a exercer a sua profissão é a credencial de examinador de condução, emitida pelo IMT, que está válida e em vigor. Assim, é inválido o motivo justificativo que deu origem à comunicação efectuada pela ré, o que consubstancia um despedimento ilícito e lhe causou danos não patrimoniais. Ademais, a ré deu início a um processo disciplinar com base nos mesmos factos, que nunca concluiu, apenas lhe enviando a nota de culpa e sem que tenha sido proferida decisão final.

Contestação: a ré alega que o autor foi condenado pela prática de 14 crimes de corrupção passiva, previstos e puníveis pelo artigo 373°, n.º 1, do Código Penal, cometidos no exercício da sua actividade profissional de examinador e no âmbito da sua relação de trabalho com a ré. Tendo-lhe sido comunicada a caducidade do seu contrato de trabalho precisamente por ter sido condenado pela prática de um crime no exercício da sua profissão de examinador o que fez com que deixasse de cumprir um requisito fundamental de idoneidade para o exercício da profissão previsto na Lei n.º 45/2012, de 29 de Agosto, que aprovou o regime jurídico de acesso e exercício da profissão de examinador de condução. Tudo independentemente de o Autor ser possuidor de carteira profissional de examinador, tendo o contrato de trabalho caducado por impossibilidade superveniente absoluta e definitiva de o autor exercer a actividade para que foi contratado.

PROLACÇÃO DE DESPACHO SANEADOR A CONHECER DO MÉRITO DA CAUSA/DECISÃO RECORRIDA: (entendeu-se que os autos reuniam todos os elementos de prova necessários à decisão): julgou-se a acção improcedente e absolveu-se a ré totalmente do pedido.

FOI INTERPOSTO RECURSO PELO AUTOR -CONCLUSÕES: 1.

O Recorrente não se conforma com a apreciação do Tribunal a quo que julgou improcedente o pedido deduzido pelo Autor e, em consequência, considerou preenchidos os pressupostos para que a Ré pudesse fazer caducar, validamente, o contrato de trabalho.

  1. O Tribunal recorrido, ao decidir quanto ao mérito da causa, tinha que analisar todas as provas juntas com a petição inicial e com a contestação e pronunciar-se quanto a todas as questões alegadas pelas partes, o que não ocorreu.

  2. O Tribunal a quo limitou-se a fazer uma análise simples e vaga do artigo 4º, da Lei nº 45/2012, de 29 de agosto, tendo ignorado, por completo, os factos alegados pelo Autor na petição inicial, que fundamentam o pedido ali deduzido.

  3. Não foram apreciados e alvo de pronúncia todos os factos alegados e documentos juntos pelo Recorrente na petição inicial e que são essenciais para a boa decisão da causa, designadamente, os constantes dos artigos 8º e 25º a 30º.

  4. No artigo 8º da petição inicial, alegou o Autor que foi condenado, por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, no processo crime nº 3110/13.0JFLSB, não em pena de prisão, mas antes na pena de substituição de 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

  5. A condenação numa pena de prisão, suspensa na sua execução, não determina, muito menos de forma automática, a caducidade do contrato de trabalho, uma vez que, o Recorrente não ficou impossibilitado, em qualquer momento, de exercer a sua profissão.

  6. A Ré, apesar de ter tido conhecimento dos termos da condenação definitiva do Recorrente no dia 27 de janeiro de 2021, manteve-o ao seu serviço até ao dia 29 de junho de 2021.

  7. Deste modo, deveria o Tribunal a quo ter-se pronunciado quanto a esta questão e ter concluído que uma condenação em pena de prisão, suspensa na sua execução, não impossibilita, de forma definitiva e absoluta, o Autor de exercer a profissão de examinador, uma vez que, este continuou a exercer aquelas funções até cinco meses após a condenação definitiva.

  8. É, assim, nula a sentença proferida, uma vez que o Tribunal a quo não se pronunciou, quando deveria ter-se pronunciado, quanto à aplicação do artigo 4º, da Lei nº 45/2012, de 29 de agosto, na hipótese de condenação em pena de prisão, suspensa na sua execução, como ocorreu neste caso concreto.

  9. Refere, ainda, o Recorrente, nos artigos 25º a 30º da petição inicial, que a Ré, assim que teve conhecimento da condenação definitiva no âmbito do processo crime, instaurou contra o Autor um processo disciplinar, com vista ao despedimento com justa causa.

  10. Procedimento disciplinar esse, cujas formalidades foram cumpridas até à resposta à Nota de Culpa enviada pelo Recorrente para a Recorrida.

  11. Após o envio dessa resposta, o Recorrente nada mais recebeu, inclusive a decisão final do procedimento.

  12. No dia 29 de junho de 2021, mais de um mês após a instauração do processo disciplinar, a Ré enviou uma carta registada ao Autor com a comunicação de caducidade do contrato de trabalho.

  13. A instauração de um processo disciplinar, com vista ao despedimento, fundamentado na condenação do Recorrente por sentença transitada em julgado, por crimes praticados no exercício da profissão de examinador, sem que a decisão do mesmo tivesse sido notificada ao trabalhador, impede a adoção, por parte da Ré, de outra modalidade de cessação do contrato de trabalho.

  14. Ou seja, a Ré estava impedida de cessar o contrato de trabalho por caducidade sem ter procedido à...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT