Acórdão nº 481/17.3GAAMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 14 de Outubro de 2019
Magistrado Responsável | MÁRIO SILVA |
Data da Resolução | 14 de Outubro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório 1. Em processo comum (tribunal singular) com o nº 481/17.3GAAMR, a correr termos no Tribunal Judicial da comarca de Braga – Juízo Local Criminal de Amares, foi proferida sentença, datada de 13/03/2019 e depositada no mesmo dia, com a seguinte decisão (transcrição): “V – Decisão: Assim, em face do exposto, de facto e de direito, decide-se, julgar a acusação particular totalmente improcedente por não provada e, em consequência decide-se: 1 - Absolver a arguida M. F. da prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de injúria, previsto e punido pelo artigo 181.º do Código Penal.
2 - Julgar totalmente improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil formulado pela assistente C. D.
, absolvendo a arguida/demandada.
**Custas Criminais Custas a cargo da assistente, que se em 1 UC, em função da utilidade prática da instrução na tramitação global do processo, levando em conta o pagamento da taxa de justiça na constituição de assistente (art. 515º n.º 1 al. d) e 519º n.º 1, ambos do Código de Processo Penal e art. 8.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais).
*Custas Civis Sem custas civis (atenta a isenção prevista no artigo 4.º, n.º1, alínea m), do Regulamento das Custas Processuais - D.L. 34/2008, de 26 de Fevereiro).
**Proceda ao depósito da presente sentença na secretaria do Tribunal, conforme disposto no artigo 372.º, n.º 5, do Código de Processo Penal.
*Notifique.
*Após trânsito, declaro cessada a medida de coacção imposta à arguida (artigo 214.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal).”*2 – Não se conformando com a decisão, a assistente, C. D., interpôs recurso oferecendo as seguintes conclusões (transcrição): “CONCLUSÕES: 1. A matéria de facto que o Tribunal recorrido deu como não provada e não imputada à arguida M. F., designadamente os factos descritos nos parágrafos a), b), c), d), e), f) e g) do ponto II – FUNDAMENTAÇÃO – B - FACTOS NÃO PROVADOS da matéria de facto não provada da sentença recorrida, foi incorrectamente julgada.
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Mas, antes de analisarmos o erro na apreciação da prova, cumpre referir que o Tribunal a quo omitiu diligências probatórias que eram necessárias, imprescindíveis e adequadas a afastar o estado de dúvida em que alegadamente permaneceu a M. ma Juiz após toda a produção de prova realizada em audiência de julgamento.
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De facto, e de acordo com o art. 340º do C.P.P., o Tribunal quando se apercebe que permanece num estado de dúvida quanto à prática dos factos constantes na acusação, tinha o poder-dever de ordenar a notificação e inquirição da única testemunha que não foi ouvida no presente processo, e que esteve presente no local onde foram proferidas as primeiras expressões injuriosas pela arguida, na aludida varanda do restaurante X, no dia 25.8.2017, pelas 17:30 horas.
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A presença de tal pessoa de nome J. M. na aludida varanda, foi confirmada quer pelo assistente, quer pelas testemunhas R. F., R. A., e J. B., ao longo dos seus depoimentos, como tendo presenciado e assistido a todos os factos da acusação.
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Aliás, a testemunha J. B. conseguiu identificar o nome completo e morada de tal testemunha - a saber, J. M., residente em Rua …, Vila Nova de Famalicão. Cfr. J. B. (cujo depoimento se encontra gravado na aplicação Habilus Media Studio, CD de 00:00:01 a 00: 36:31 (07-03-2019 15:07:25 a 15:43:56) – Vide acta de 07-03-2019 - CD, de minutos 00:09:30 a 00:10:51.
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Nunca sequer passou pela cabeça da assistente que, atendendo à prova produzida em sede de audiência de julgamento, o Tribunal pudesse concluir que a prova produzida não foi bastante para se poder afirmar convictamente e dar como provado os factos de que a arguida vinha acusada.
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Segundo a mais corrente jurisprudência, nomeadamente o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 11-06-2003, proc. nº 0311296, “Se no decurso da audiência de julgamento o tribunal, oficiosamente ou a requerimento, considerar que uma prova antes não indicada é necessária para a descoberta da verdade e a boa decisão da causa deve, obrigatoriamente, ordenar a sua produção”.
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ORA, TENDO O TRIBUNAL RECORRIDO CONHECIMENTO DA RELEVÂNCIA DESSAS DILIGÊNCIAS PROBATÓRIAS E, NÃO OBSTANTE, NÃO TER PROMOVIDO A SUA REALIZAÇÃO, OMITE A REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS QUE REPUTA DE ESSENCIAIS PARA A DESCOBERTA DA VERDADE, ASSIM CONSUBSTANCIANDO A PRÁTICA DA NULIDADE, A QUAL SE ARGUI E REQUER SEJA DECLARADA COM A CONSEQUENTE ANULAÇÃO DA SENTENÇA RECORRIDA, COM TODAS AS DEMAIS E LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, DESIGNADAMENTE A DA REPETIÇÃO DO JULGAMENTO PARA REALIZAÇÃO DAS DILIGÊNCIAS DE PROVA REPUTADAS DE ESSENCIAIS À DESCOBERTA DA VERDADE E QUE FORAM OMITIDAS.
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Sem prescindir, entende a Recorrente que o Tribunal incorreu em erro na apreciação da prova produzida, quando, por um lado, descredibilizou, sem razões para tal, o depoimento da assistente e namorado da assistente - R. F. -, e, por outro lado, deu credibilidade ao depoimento de J. B., o qual se apresenta em insanável contradição com o depoimento do seu irmão, R. A., testemunha que apresentou um depoimento completamente isento, imparcial, objectivo, e sincero.
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Contudo, o depoimento de R. F. e da assistente não apresentaram, contrariamente ao que sufragou o Tribunal recorrido, versões manifestamente contraditórias em relação ao depoimento da testemunha R. A., nem são depoimentos incoerentes e sem suficiente credibilidade incriminatória.
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E não se consegue perceber como considerou o Tribunal a quo que a testemunha J. B. e a testemunha R. A. tiveram ambos depoimentos credíveis, embora contraditórios! 12. Se, em consequência, tivessem sido submetidos ao crivo das boas regras de apreciação da prova testemunhal, da lógica e da objectividade, tais depoimentos (o da testemunha R. F. e R. A., e da assistente) teriam de ter merecido toda a CREDIBILIDADE !!!!!!!!! 13. As declarações de C. D. e o depoimento da testemunha R. F., apresentam uma versão totalmente concordante e harmónica dos factos ocorridos no dia 25.08.2017, cerca das 17h30, no Restaurante X, sito na Rua …, Amares.
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De facto, tanto a testemunha R. F., como a Assistente referiram que esta última no dia 25 de Agosto de 2017, cerca das 17:30 horas, foi injuriada pela aqui arguida quer na varanda desse restaurante, quer ainda posteriormente no exterior desse mesmo restaurante, onde o veículo da testemunha estava estacionado.
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Ambos descrevem que no referido dia e local que a arguida apercebendo-se que a assistente estaria naquele restaurante, não se conseguindo conter, decidiu interpelar a assistente, tirando satisfações de factos que teriam ocorrido no passado, e acabando por injuriá-la, chamando-a badalhoca, víbora, e acusando-a de ter separado o pai da filha.
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Ambos são peremptórios em afirmar que, como a assistente não ripostou (muito embora lhe tenha dirigido a palavra), a arguida, não contente, e quando a assistente já estava a entrar no seu veículo para ir embora do local (volvida uma hora depois), a arguida injuriou a mesma, em viva e alta voz afirmando “és uma puta, vaca, badalhoca, besta, porca”.
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Perante este comportamento da arguida, a testemunha R. F. “explodiu”, tendo-se dirigido à cozinha do restaurante e advertido a arguida que parasse de injuriar a sua namorada, futura esposa.
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Nenhuma prova ou sequer indício probatório foi produzido que fosse susceptível de infirmar o depoimento da testemunha R. F. e da assistente C. D., maxime em relação aos factos ocorridos no exterior do restaurante X, quando se dirigiram para o veículo que estava estacionado e a assistente foi injuriada pela arguida.
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De resto, todo o circunstancialismo, anterior, contemporâneo e ulterior, corroboram e reforçam a credibilidade do depoimento da testemunha R. F. e da assistente C. D.. A arguida admite que, em visível estado de nervosismo, saiu para o exterior do restaurante pela porta da cozinha, quando a testemunha R. F. e a assistente C. D. se dirigiram para o exterior do restaurante pela porta principal, tendo-os visto a dirigirem-se ao veículo que estava estacionado junto da porta principal. Logo após as injúrias dirigidas pela arguida à assistente, a testemunha R. F. regressou ao interior do restaurante, e, visivelmente irritado, dirigiu-se à cozinha, local onde já se tinha recolhido a arguida, e dirigiu-lhe um aviso de que admitia que a assistente voltasse a ser injuriada.
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Ambos também são peremptórios em afirmar que permaneceram em tal restaurante porque ora o primo de ambos insistiu que ficassem, ora porque sentiam que não tinham feito mal a ninguém e estariam a aguardar que a arguida saísse do local. Cfr. Testemunho de R. F. (cujo depoimento se encontra gravado na aplicação Habilus Media Studio, CD de 00:00:01 a 00:03:54 (07-03-2019 12:49:15 a 12:53:10) – Vide acta de 07-03-2019 - CD, de minutos 00:00:01 a 00:03:53) 21. Aliás, é o depoimento da arguida que é incompreensível, ilógico, contraditório, sendo sim a arguida a pessoa que não consegue justificar o porquê de não ter sequer entrado no restaurante ou lá permanecido, perante a presença da assistente, e ainda o porquê de, por exemplo, ter saído da cozinha no exacto momento em que a assistente e marido decidiram ir embora, ou até o porquê de ter de “… beber um copo de água…” se nada de mal tinha acontecido e tudo, nas suas palavras, estaria normal. Cfr. DECLARAÇÕES DA ARGUIDA (cujo depoimento se encontra gravado na aplicação Habilus Media Studio, CD de 00:00:01 a 00:28:49 (07-03-2019, 11:55:47 a 12:24:36) – CD, de minutos 00:07:31 a 00:10:52; minutos 00:15:31 a 00:16:00; minutos 00:16:30 a 00:17:59; minutos 00:18:30 a 00:25:00) 22. Dito, isto, e analisado os depoimentos das testemunhas presenciais, ou parcialmente presenciais, a saber R. A., J. B. e E. G., pai daqueles dois, dúvidas não temos de que efectivamente a assistente foi injuriada pela arguida, só que uns decidem omitir tais factos pois atenderam à relação “familiar existente”, outros (R. A.)...
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