Acórdão nº 173/14.5T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | ANTÓNIO SOBRINHO |
Data da Resolução | 22 de Outubro de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrentes e recorridos: J. S. (autora); X – Sucursal Portugal (ré) e A. M. (autor); ***** Pedido: Os autores J. S. e A. M. instauraram a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra X – Sucursal Portugal e Fundo de Garantia Automóvel peticionando a condenação dos Réus: - A pagar ao Autor a quantia de € 842,96 para reparação do veículo HD e o valor de € 7,50 por dia desde o sinistro até à reparação do HD ou até ao trânsito em julgado de sentença que conheça do mérito da ação; - A pagar à Autora a quantia de € 6 394,50 a título de remunerações desde a data do sinistro até à data de entrada da presente ação, bem como nas remunerações vencidas na pendência do presente processo e nas que se vençam até a consolidação das lesões sofridas pela Autora; - A pagar à Autora a quantia de € 27,85 por despesas de medicamentos e exames médicos realizados; - A pagar à Autora a quantia de € 15 000,00 a titulo de danos não patrimoniais já suportados; - A pagar à Autora a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença por danos patrimoniais e não patrimoniais que ainda venha a sofrer; Causa de pedir: Alegou a autora que, em consequência de acidente de viação, em que foram intervenientes o seu veículo “HD” e o veículo “RE”, seguro na ré, e ainda um terceiro veículo de matrícula desconhecida, por culpa exclusiva dos condutores destes últimos, sofreu os danos reclamados.
Os réus contestaram.
Proferida sentença, foi julgada a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e em consequência:
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal no pagamento ao Autor da quantia de € 350,00 a título de indemnização pelos danos materiais ocasionados ao motociclo acidentado, acrescidos de juros de mora à taxa legal, desde 8-1-2020 até efetivo e integral pagamento.
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal no pagamento ao Autor da quantia de € 5,00 diários, desde o acidente a 2-12-2013 até à disponibilização da indemnização mencionada em a), vencendo-se juros sobre as quantias devidas até hoje a partir da presente data, e sobre as quantias devidas futuramente desde cada um dos dias que decorrerem, sempre à taxa legal em vigor, e até à disponibilização da indemnização mencionada em a).
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal e o Fundo de Garantia Automóvel no pagamento solidário à Autora da quantia de € 27,85 por despesas de medicamentos e exames médicos realizados e da quantia de € 21.059,25 a título de retribuições perdidas até à consolidação das suas lesões, vencendo-se juros de mora à taxa legal sobre tais quantias desde 8-1-2020 até efetivo e integral pagamento.
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal e o Fundo de Garantia Automóvel no pagamento solidário à Autora da quantia de € 25.000,00 a título de perda de capacidade de ganho (dano biológico na vertente patrimonial), vencendo-se juros sobre tal quantia desde a presente decisão até efetivo e integral pagamento da mesma.
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal e o Fundo de Garantia Automóvel no pagamento solidário à Autora da quantia de € 25.000,00 a título de danos morais, vencendo-se juros sobre tal quantia desde a presente decisão até efetivo e integral pagamento da mesma.
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Condenada a Ré X – Sucursal Portugal e o Fundo de Garantia Automóvel no pagamento à Autora do montante, a liquidar em eventual ulterior incidente, necessário para os tratamentos médicos, cirúrgicos e medicamentosos, e eventuais próteses, que futuramente se mostrem necessários com relação às lesões decorrentes do sinistro dos autos.
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Absolvidos os Réus do demais peticionado.
Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso independente a ré X - Sucursal Portugal e recurso subordinado a autora J. S., de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões: A – Apelação da Ré X – Sucursal Portugal; 1ª – A condenação no pagamento da indemnização pela privação do uso do motociclo de matrícula “HD”, a qual, na presente data, ascende a mais de Eur. 11 500, 00, mostra-se injustificada, indevida e viola as regras do justo ressarcimento.
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- O art.º 566º, n.º 1 do CCivil e o art.º 41.º do DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto têm subjacente a ideia de que o sacrifício incomportável para o devedor faz parte do conceito de justa indemnização, e constitui um travão ou limite a eventual exagero.
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– O motociclo “HD” encontra-se em situação de perda total, o que ficou provado, designadamente porque o valor da reparação, adicionado do valor do salvado, perfaz Eur. 1 042, 96 - quase o dobro do seu valor venal, fixado em Eur. 550, 00.
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- O principal pedido do A. – o pagamento do custo da reparação, soçobrou, pois o “HD” vai ficar imobilizado… para sempre – a reparação não é viável.
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- Dado que não pode haver dano neste ponto concreto, falha um dos pressupostos da obrigação de indemnizar – verifica-se a impossibilidade objectiva de fruição do HD.
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- A perda total impede a fixação de indemnização pela privação do uso, salvo pelo período razoável à aquisição de veículo similar.
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- A indemnização pela privação do uso visa compensar danos temporários, o que não sucede no presente caso, uma vez que o motociclo se encontra paralisado há mais de seis anos e irá continuar paralisado para sempre, por se encontrar em perda total.
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- A condenação da Ré no pagamento da quantia de € 5,00 diários, desde 2.12.2013 até à disponibilização da indemnização pela perda total do motociclo, no total de Eur. 11 500, 00, constitui uma sanção compulsória extraordinária – sem nenhum sentido.
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- Não se provou que o A, tenha despendido um único cêntimo por via da paralisação do “HD”, sendo que esse ónus recaía exclusivamente sobre si – cfr. art.º 342.º do C. Civil.
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- A mera privação do uso, desacompanhada da alegação e prova da existência de um concreto dano não cria, por si só, uma obrigação de indemnizar, de modo que, à partida, nada é devido a este título ao A. – vide, entre outros, os Ac.s do S.T.J. de 8.06.2006 (Proc. n.º 06ª1497), de 30.10.2008 (Proc. n.º 07B2131), de 4.06.2013 (Proc. n.º 5031/07.7TVLSB.L1.S1) e de 12.01.2012 (Proc. n.º 1875/06.5TBVNO.C1.S1) e os Ac.s do T.R.P. de 19.12.2012 (Proc. n.º 3610/10.4TJVNF.P1) e de 10.02.2015 (Proc. n.º 5046/12.3TBMAI.P1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.
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- Quando muito, o A. poderá ser indemnizado pela privação do motociclo no tempo razoável para a aquisição de outro de valor semelhante, uma vez que com a aquisição desse motociclo, cessa por completo o dano.
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- O “HD” tinha um valor venal de Eur. 550, 00. O salvado, foi valorizado em Eur. 200,00. Assim, o A. necessitava de Eur. 350, 00 para adquirir um motociclo idêntico ao “HD”.
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- Dada a profusão de motociclos com as características do “HD” à venda, e considerando o valor em questão (Eur. 350, 00) é manifesto que no prazo de uma a duas semanas tudo poderia ficar resolvido - cfr. Ac. do T.R.P. de 18.05. 2000, in www.dgsi./trp.
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- Os juízos de equidade têm de atender à situação de perda total, combinada com o valor para a aquisição de veículo semelhante (Eur. 350, 00), valor acessível a qualquer cidadão, como é notório, porque abaixo do salário mínimo nacional.
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- Para ressarcir o Autor no caso concreto, equitativamente, atento o exposto, bastariam Eur. 175, 00, metade do valor necessário à aquisição de idêntico veículo.
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- Atento o valor de aquisição de novo veículo, Eur. 350, 00, é facto notório que o A. teria de dispôr dessa quantia, ou teria toda a possibilidade de a grangear. Tal facto não carece de alegação, nem de prova – art.º 412.º n.º 1 do CPC.
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– Usando o raciocínio do Tribunal recorrido, considerando os Eur. 350, 00 de que o A. carecia para adquirir um veículo semelhante, e os Eur. 5, 00 por dia (perda de utilidade desse veículo), bastavam setenta dias (Eur. 5, 00 x 70 dias = Eur. 350, 00) para esse efeito.
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- Os Eur. 11 500, 00 fixados na sentença recorrida constituem um enriquecimento ilegítimo E INJUSTIFICADO do Autor. Violam as regras da justa indemnização, que atende – et pour cause – às posições de ambas as partes.
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- O A. soube, logo em 2013, que o veículo se encontrava em perda total, e nada fez.
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- Nada legitima a inércia e total passividade do lesado perante os danos sobretudo nos casos de estes estarem sujeitos a evolução expansiva, como é o do dano da privação de uso de veículo - cfr. Acórdão do S.T.J. de 17 de Janeiro de 2013 (Proc. n.º 2395/06.3TJVNF.P1.S1), disponível em www.dgsi.pt.
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- Constitui dever do lesado afastar um dano e reduzir o já produzido – vide Vaz Serra, RLJ, ano 105, p. 168), e ainda, de forma primordial, Brandão Proença “A conduta do Lesado como Pressuposto e Critério de Imputação do Dano Extracontratual”, Almedina, Coimbra, 1997.
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- O A. contribuiu para o agravamento dos seus danos, e como tal este agravamento – o que exceda os 70 dias de indemnização - terá de lhe ser imputado - vide Ac. do S.T.J. de 5.5.1971, in BMJ nº 207-228 – a título de culpa. Vide ainda os Ac.s do S.T.J de 14.04.2013 (Proc. n.º 7002/08.7TBVNG.P1.S1) e 11.12.2012 (Proc. n.º 549/05.9TBCBR-A.C1.S1), in www.dgsi.pt.
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– O valor fixado pela privação do uso é um total contrassenso, e de uma desproporção inaudita, sendo vinte vezes superior ao valor do motociclo.
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- A indemnização destina-se a ressarcir prejuízos sofridos, não podendo conduzir a um gritante desequilíbrio, designadamente não podendo servir para um enriquecimento injusto à custa do lesante – cfr. Ac. do S.T.J. de 29.11.2005 (Proc. n.º 3122/05).
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- A indemnização pela privação do uso do “HD”, deverá ser reduzida à justa medida, sendo certo que jamais deverá ultrapassar o valor necessário para a aquisição de motociclo semelhante, ou seja, Eur. 350, 00, como se provou.
…\...
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- A indemnização de Eur. 25 000, 00 concedida pela incapacidade que afecta a A. assenta em dois falsos pressupostos, favoráveis à A., mostrando-se sobredimensionada.
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- O cálculo da indemnização a conceder por via da I.P.P. que afecta a Autora deve contemplar a sua perda de...
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