Acórdão nº 6673/07.6TBBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Janeiro de 2011

Data27 Janeiro 2011

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrente (s) e recorridos: - “R... – Companhia de Seguros de ... (ré), S.A.” e António F... (autor); Vara Mista de Braga – acção ordinária.

***** António F... demandou na presente acção de condenação a “R... Companhia de Seguros de ..., S.A.”, reclamando desta o pagamento da quantia de 45.000,00 Eur. (quarenta e cinco mil euros), a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, e da quantia mensal de 3.325,00 Eur. (três mil, trezentos e vinte e cinco euros), a título de renda vitalícia e enquanto perdurar a necessidade de custear despesas relativas a medicamentos, assistência médica e assistência domiciliária permanente, a primeira acrescida de juros de mora, taxa anual em vigor, a contar da citação, até integral pagamento.

Alegou, em síntese, que ocorreu um acidente de viação, no qual foram intervenientes o veículo de matrícula RO-..., objecto de seguro na ré, e o autor, enquanto peão.

Foi responsável o condutor do aludido veículo automóvel, por o ter atropelado numa passadeira, causando-lhe danos corporais.

A Ré contestou, assumindo a responsabilidade civil emergente da circulação do RO-... e aceitando que a responsabilidade pelo acidente descrito na petição pertenceu ao seu segurado, porém não aceita o valor peticionado a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, afirmando desconhecer factos atinentes à vida pessoal do autor.

Saneado o processo e seleccionados os factos provados e a provar, o autor procedeu à ampliação do pedido no início da audiência de julgamento, alegando que após a propositura da acção já suportou mais despesas, sendo 2.721,74 Eur. (dois mil, setecentos e vinte e um euros e setenta e quatro cêntimos) de tratamentos, medicamentos, fraldas, transportes e outros, e 36.769,00 Eur. (trinta e seis mil, setecentos e sessenta e nove euros) pela assistência de saúde domiciliária, que suporta desde Novembro de 2008.

Realizou-se a audiência de julgamento, decidindo-se, a final, sobre a matéria de facto.

Seguidamente foi proferida sentença em que se julgou a acção parcialmente procedente, por provada e, em consequência, se condenou a Ré a pagar ao autor a quantia de 79.490,74 Eur. (setenta e nove mil, quatrocentos e noventa euros e setenta e quatro cêntimos), respeitante à indemnização em dinheiro relativa ao ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida do valor que o autor vier a suportar, a partir de Fevereiro de 2010 até final da sua vida, relativo a assistência domiciliária permanente, deduzidos os valores já pagos mensalmente por força do arbitramento de reparação provisória.

A quantia fixada vence juros, à taxa legal em vigor de 4%, a contar desde a citação da ré para a acção – a 19.10.2007, até efectivo e integral pagamento.

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso a ré (recurso independente) e o autor (recurso subordinado), de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões: A – RECURSO DA RÉ: 1.ª A matéria de facto constante dos pontos 35 e 36 foi incorrectamente julgada, a qual devia ter sido considerada não provada.

  1. – O tribunal fundou a sua convicção na audição da testemunha Maria C... e cujo depoimento – artigo 24º da base instrutória – se encontra gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal, de 16:09:01 a 16:24:17.

11ª - Como o presente depoimento foi objecto de gravação, aqui se dando o mesmo integralmente por reproduzido para os devidos e legais efeitos, vejamos se o Tribunal andou bem ou mal ao fundar as respostas positivas à matéria factual aqui alegada, plasmando a sua convicção no depoimento da testemunha como o fez. Entendemos que não! 12.ª - Desta feita, violou, assim, o disposto nos artigos 552º a 567º do Código de Processo Civil, preceitos que se encontram inseridos em secção cuja epígrafe é “Prova por confissão das partes” a qual, por incidir exclusivamente sobre factos desfavoráveis à parte (cfr. art.º 352.º do Código Civil), é inadmissível quanto a factos alegados pelo depoente e em que este baseia a sua pretensão.

13.ª - Assim, não podia o Tribunal a quo aproveitar o depoimento prestado pelo Autor, face à ausência de outro depoimento e dar como provados os factos vertidos e acima indicados, apenas com o seu depoimento, desde logo, porque o mesmo nunca em momento algum pode ser considerado – e não é – principio de prova, sob pena de violar a substância endógena em que aquela figura assenta, subvertendo-se o principio do ónus da prova, plasmado no artigo 342º do Código Civil.

14.ª - Ao agir como agiu e ao permitir o depoimento de parte do Autor, considerando o seu teor para, assim, dar como provado determinados factos alegados pelo Autor no seu petitório que não foram sustentados por outro meio de prova, o Tribunal a quo violou, ainda, os princípios que dimanam do art. 20.º da Lei Fundamental.

15.ª - Do que vai acima exposto, é apodíctico afirmar-se que, em nossa modesta opinião e salvo o devido respeito, ao decidir como efectivamente decidiu, e ao valorar o depoimento do Autor para dar como provados o artigo 24.º da base instrutória, mormente no que à fixação dos actos da causa diz respeito, o tribunal não procedeu à melhor e mais correcta valoração das provas produzidas.

16.ª - Perante tudo o exposto, entende-se que a indemnização por danos não patrimoniais é exagerada, devendo, antes, situar-se no máximo € em 15.000,00.

17.ª - Do que acima vai exposto, é pacifico concluir-se que, ao decidir nos termos da douta Sentença em recurso, o Tribunal a quo fez uma incorrecta interpretação e aplicação, sendo manifesto o erro na apreciação da prova, tudo a determinar os termos do art. 712 nº1 als. a) e b), nº2, 3, 4 e 5 do CPC e bem assim dos art. 496. e 494.º do CC e 494º e 495 º do CPC.

(sic).

B – RECURSO DO AUTOR: 1 - O apelante formulou nos presentes autos pedido de indemnização no montante global de € 45000,00, como forma de compensação dos danos não patrimoniais e do dano funcional ou biológico sofridos, correspondendo a quantia de € 30000,00 aos primeiros e a quantia de € 15000,00 aos segundos, que qualificou na categoria de danos patrimoniais.

2- A douta sentença recorrida fixou essa indemnização no montante de € 30000,00, considerando que nesse montante já se encontra integrado o dano funcional resultante da incapacidade geral fixada, o qual foi considerado, também, como um dano de natureza não patrimonial.

3- Independentemente da sua qualificação jurídica nas categorias do dano patrimonial ou do dano moral – ou eventualmente como «tertium genus», como dano de natureza autónoma e específica, por envolver prioritariamente uma afectação da saúde e plena integridade física do lesado, 4- “o dano biológico, com todo um cortejo de incapacidades funcionais provenientes das sequelas de um acidente de viação, representando uma alteração morfológica do lesado, limitativa da sua capacidade de viver a vida como vivia antes do mesmo acidente, por violação da sua personalidade humana, traduz-se aqui num prejuízo concreto, consistente na privação ou diminuição do gozo de bens espirituais, insusceptíveis de avaliação pecuniária, como a saúde, a inteligência, os sentimentos, a vontade, a capacidade afectiva e criadora, a liberdade, a reserva da privacidade individual e o prazer pela vida e pelos bens materiais” – cfr.

Ac da RP, de 07-04-1997, in CJ Ano XXII – 1997 – Tomo II, Pág. 204.

5- Dano esse cuja verificação não depende do exercício de qualquer actividade profissional remunerada, porquanto incide sobre a valoração da incapacidade do lesado, não como trabalhador, mas como pessoa que se encontra afectada por incapacidade fisiológica significativa. 6- Sendo certo que, “a mera afectação da pessoa do ponto de vista funcional, isto é, sem se traduzir em perda de rendimento de trabalho, releva para efeitos indemnizatórios” – cfr. Ac. STJ, de 09-10-2008, proferida no proc. 08B2686; Ac STJ de 19-05-2009, proferida no proc. 298/06.0TBSJM.S1, in www.dgsi.pt.

7- O dano biológico sofrido pelo apelante consiste, assim, na perda genérica de potencialidades funcionais, na degradação do padrão de vida do apelante, na penosidade acrescida e, até, na privação no exercício das tarefas do dia a dia constatados nos autos, danos esses que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito.

8- A indemnização a arbitrar pelo dano biológico sofrido pelo apelante deverá compensá-lo da acrescida penosidade e esforço no exercício da sua vivência actual, de modo a compensar as deficiências funcionais que constituem sequelas das lesões sofridas, por forma a compensar um mesmo nível de vida de que se viu absolutamente privado.

9- Indemnização esta que deverá ser atribuída a par da que é devida a título de danos não patrimoniais pelas dores físicas e sofrimentos psíquicos (pretium doloris).

10- Cumpre, assim, rememorar os factos descritos sob os nºs 13 a 26 da matéria de facto provada, onde se descrevem as lesões que o A. sofreu, os tratamentos a que foi submetido, e as sequelas que aquelas lesões deixaram, quer ao nível físico, quer psíquico, bem como os transcritos sob os nºs 30 e 31, que retratam o estado de saúde daquele antes do sinistro, factos esses que aqui se dão por reproduzidos para os...

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