Acórdão nº 2/04.8GDFNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2011

Magistrado ResponsávelJORGE ALBERTO TEIXEIRA
Data da Resolução31 de Janeiro de 2011
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO No processo nº 2/04.8GDFNF-A.G1 das Varas de Competência Mista do Tribunal de Guimarães veio o arguido José M... interpor recurso do despacho do Mmo. Juiz, constante fls. 3 e 4, que, por considerar não se encontrarem numa relação de concurso os crimes que foram por si praticados e julgados nos presentes autos e os julgados no processo nº 88/02.0GBFLG, do 3º Juízo do Tribunal de Felgueiras, entendeu não proceder ao cúmulo jurídico das respectivas penas que aí lhe foram aplicadas.

No recurso interposto, a recorrente formulou as seguintes conclusões (transcritas): “1- Por douto despacho de fls. 1973 a 1974 foi decido não designar data para realização da audiência prevista no artigo 472° do Código Processo Penal, uma vez que o Mmo. Juiz a quo entendeu não haver lugar ao cúmulo jurídico de penas; 2- Ora, o recorrente José M... foi condenado nestes autos, por acórdão proferido em 04.112008 e transitado em julgado em 10.12.2009, na pena de 8 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.p., pelos art°s 21°, n° 1, e 24°, als. B) e c), do D.L. n" 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A e I-B, anexas a esse diploma; 3- De acordo com os pontos 1) e 2) da matéria de facto dada como provada no acórdão, a actividade delituosa do arguido ocorreu, pelo menos, entre Abril de 2004 e 8 de Fevereiro de 2006; 4- Por acórdão proferido em 11.06.2004 no Processo Comum Colectivo nº 88/02.0GBFLG, do 3° Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras, transitado em 10.12.2005, foi também o aqui recorrente condenado na pena única de 11 anos e 2 meses de prisão pela prática de um crime de homicídio simples, p. p., pelo art° 131 ° do Código Penal e de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p. p., pelo art° 6°, n° 1, da Lei nº 22/97, de 27 de Junho; 5- Contudo, sem prejuízo de melhor opinião, entendemos haver lugar, no caso sub Júdice, a cúmulo de penas; 6- Sobre a matéria do concurso de penas rege o disposto nos artigos 77° e 78° do Código Penal. Destas normas decorre uma distinção entre situações que resulta a necessidade de se proceder ao cúmulo jurídico e situações em que estamos perante uma sucessão de penas. O que distingue as duas situações é a data da prática dos factos, anterior ou posterior a uma decisão transitada em julgado. Os factos praticados posteriormente ao trânsito em julgado de outro crime não são englobáveis numa situação de cúmulo jurídico; 7- Conforme referido supra, o crime objecto deste processo, cujo acórdão condenatório foi proferido em 04.11.2008 e transitado em 10.12.2009, foi cometido entre Abril de 2004 e 8 de Fevereiro de 2006. Logo, em momento anterior e posterior à decisão proferida a 11.06.2004, transitada em julgado a 10.12.2005, no âmbito do processo 88/02.0GBFLG; 8- O crime de tráfico de estupefacientes é um crime exaurido, que se caracteriza como um ilícito penal que fica perfeito com o preenchimento dum acto conducente ao resultado previsto no tipo; 9- Assim, se a actuação do arguido José Medeiros, dada como provada nestes autos, tivesse ocorrido entre Abril de 2004 e 10.12.2005 (data em que ocorreu trânsito da 1 a condenação), o recorrente seria na mesma condenado na pena de tráfico de estupefacientes e, sem a menor margem de dúvida, haveria lugar à realização do cúmulo jurídico de ambas as penas; 10- Ora, pelo facto de a conduta do arguido se ter prolongado para além de 10.12.2005, não se devem tratar diferentemente as duas situações, pois tal entendimento contraria o principio da culpa, fazendo aumentar injustamente e para além do razoável a sua gravidade proporcional, e gera a possibilidade de ser, deste modo, ultrapassado o limite da culpa e resulta na violação do principio da igualdade, constitucionalmente consagrado no artigo 13° da Constituição da República Portuguesa, ao traduzir-se num tratamento díspar de situações substancialmente idênticas, cuja única diferença é a conduta do arguido se prolongar no tempo; 11- Não só o arguido não terá o direito a ser condenado numa única pena, como ser-lhe-á aplicável um regime de liberdade condicional díspar e mais prejudicial. Para tanto, seguindo o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo, bastaria que, um dia após o trânsito em julgado da 1 a condenação, o arguido fosse detido por exemplo a destruir ou a preparar-se para destruir os produtos estupefaciente que detinha em sua posse a qualquer título, ou a caminho de o fazer, ou "simplesmente" que, após trânsito ainda tivesse produto estupefaciente escondido num qualquer local que tivesse na sua exclusiva disponibilidade, sem prejuízo de não ser sua intenção - após a advertência solene ao arguido que constitui, conforme refere o Tribunal a quo, o trânsito em julgado da 1 a condenação - continuar a traficar ou a praticar qualquer acto subsumível no tipo legal do crime de trafico de estupefacientes; 12- No nosso entendimento, e salvo melhor opinião, o Legislador não quis distinguir ambas as situações, mantendo-se, ainda, nos quadros do sentido literal e, também, no contexto da lei fazer uma interpretação sistemática e coerente do sistema de concurso de penas, devendo-se efectuar um cúmulo jurídico quando a conduta do arguido começa antes da condenação e termina posteriormente a esta; 13- Esta posição é a que melhor se adequa à unidade do sistema jurídico e a que corresponde à ratio legis e aos interesses da política criminal que tem presidido ao instituto do concurso de penas; 14- Acresce que, o entendimento perfilhado pelo Tribunal a quo é também contrario – ou tem reflexos negativos – aos fins da penas, particularmente da prevenção especial positiva e na estabilidade e segurança jurídica; 15- Assim a decisão proferida pelo Mmo. Juiz a quo violou o preceituado nos artigos 77° e 78° do Código Penal, 13° e 32° da Constituição da República Portuguesa e 472, do Código Processo Penal e as demais disposições que V. Exas. suprirão.

Termos em que se deverá revogar o douto despacho e substituir-se por outro que designe data para realização da audiência prevista no artigo 472, do Código Processo Penal, assim se fazendo, uma vez mais, JUSTIÇA!” A Magistrada do Ministério Público na 1ª instância respondeu ao recurso, no sentido de ser negado provimento ao mesmo e mantida a decisão recorrida (fls. 33 a 36).

Nesta Relação, aquando da vista a que se reporta o art. 416.º do C. P. Penal, a Exmª. Procurador-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de a competência para conhecer do presente recurso pertencer ao S.T.J., requerendo a remessa do processo para este tribunal (fls. 114).

Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2 do C.P.Penal, não foi apresentada resposta.

Foram colhidos os vistos legais.

Procedeu-se à conferência, cumprindo, agora, apreciar e decidir.

II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

O teor do despacho recorrido é o seguinte: “O arguido José M... foi condenado nestes autos, por acórdão proferido em 2008/11/04 e transitado em julgado em 2009/12/10, na pena de 8 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p.p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1, e 24.º, als. b) e c), do D.L. n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A e I-B anexas a esse diploma.

De acordo com os pontos 1) e 2) da matéria de facto dada como provada no acórdão, a actividade delituosa do arguido ocorreu, pelo menos, entre Abril de 2004 e 8 de Fevereiro de 2006.

Por acórdão proferido em 2004/06/11 no Processo Comum Colectivo n.º 88/02.0GBFLG, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Felgueiras, transitado em 2005/12/10, foi o mesmo arguido José M... condenado na pena única de 11 anos e 2 meses de prisão pela prática de um crime de homicídio simples, p.p. pelo art.º 131.º do Código Penal, e de um crime de detenção ilegal de arma de defesa, p.p pelo art.º 6.º, n.º 1, da Lei n.º 22/97, de 27 de Junho.

O presente processo foi remetido para designação de audiência de cúmulo.

Contudo, sem prejuízo de melhor opinião, entendemos não haver lugar a cúmulo de penas. Vejamos.

O crime pelo qual o arguido foi condenado nos presentes...

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