Acórdão nº 1/20.2GBEVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Janeiro de 2023

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução24 de Janeiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Neste processo comum n.º 1/20...., do Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo Local Criminal ... – Juiz ..., foi submetido a julgamento, com intervenção do Tribunal Singular, o arguido AA, melhor identificado nos autos, estando pronunciado pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica agravado, p. e p. pelo artigo 152º, n.ºs 1, alínea b), 2, alínea a), 4 e 5, do Código Penal.

1.2. Não tendo sido deduzido pedido de indemnização civil, em cumprimento do determinado no despacho que recebeu a acusação e designou data para julgamento, foi o arguido notificado para que se pronunciasse, querendo, sobre a eventual atribuição de indemnização à vitima, nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 82.º-A do Código de Processo Penal e 21.º n.º 2 da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, nada dizendo.

1.3. Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 21/01/2022, depositada nessa mesma data, com o seguinte dispositivo: «(…), julgo totalmente procedente por integralmente provada a acusação pública e decido: a) condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, de um crime de violência doméstica, previsto e punível pelo art.º 152.º n.º 1 alínea b), n.º 2 alínea a) e n.ºs 4 e 5 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na execução por igual período, subordinada a regime de prova, ao abrigo do previsto nos art.ºs 50.º n.ºs 2 e 3 e 53.º do Código Penal, de acordo com plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRSP com respeito das exigências constante do art.º 34.º-B n.º 1 da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, e das exigências de avaliação médica e eventual acompanhamento psíquico e terapêutico adequados à conduta comportamental que AA evidencia, o que se determina; b) na pena acessória de obrigação de frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica desenvolvido e com a duração fixada pela DGRSP, programa esse que pressupõe o acompanhamento individualizado assegurado pelo técnico de reinserção social; c) na pena acessória de proibição de contactar com a vítima, por qualquer meio, e proibição de permanência na residência onde a mesma habita, no seu local de trabalho e em qualquer local onde saiba que esta se encontre a menos de 300 (trezentos) metros de distância pelo período determinado para a suspensão da execução da pena de prisão aplicada; d) arbitrar, nos termos do art.º 82.º-A do Código de Processo Penal, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, a quantia de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros) à vítima BB, a ser paga pelo arguido AA; e) condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC’s, nos termos do previsto no art.º 513.º n.º 1 do Código de Processo Penal e art.º 8.º n.º 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais (…).» 1.4. Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso apresentada as conclusões que seguidamente se transcrevem: «I. Foi o arguido condenado, por decisão do Tribunal a quo, pela prática, dolosa (artigo 14.º, do Código Penal), como autor material (artigo 26.º, do Código Penal) e na forma consumada, um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b), n.º 2, alínea a), n.º 4 e n.º 5, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na execução por igual período, subordinada a regime de prova, ao abrigo do previsto nos artigos 50.º n.ºs 2 e 3 e 53.º do Código Penal, de acordo com plano de reinserção social a elaborar e a acompanhar pela DGRSP com respeito das exigências constantes do artigo 34.º - B n.º 1 da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, e das exigências de avaliação médica e eventual acompanhamento psíquico e terapêutico adequado à conduta comportamental que AA evidencia; II. Foi, ainda, condenado na pena acessória de obrigação de frequência do Programa para Agressores de Violência Doméstica desenvolvido e com a duração fixada pela DGRSP, programa esse que pressupõe a acompanhamento individualizado assegurado pelo técnico de reinserção social; III. Condenado na pena acessória de proibição de contactar com a vítima, por qualquer meio, e proibição de permanência na residência onde a mesma habita, no seu local de trabalho e em qualquer local onde saiba que esta se encontre a menos de 300 (trezentos) metros de distância pelo período determinado para a suspensão da execução da pena de prisão aplicada; IV. E, arbitrado, nos termos do artigo 82.º - A do Código de Processo Penal, a título de indemnização pelos prejuízos sofridos, a quantia de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros) à vítima BB, a ser paga pelo arguido AA.

Da Pena Principal V. O arguido não concorda com a condenação da pena principal e das penas acessórias, Porquanto, VI. O arguido, negou o envolvimento com BB como uma relação de namoro, considerando-a sempre como uma relação de amizade com o envolvimento de cariz sexual, vejam-se passagens mencionadas nos pontos 13, 14 e 15 das Motivações; VII. Para que haja uma relação de namoro não basta a existência de um relacionamento entre duas pessoas, é necessária factualidade concreta que o demonstre, terão que existir laços afetivos, emocionais, de partilha, de convivência e de cooperação mútua entre as duas pessoas, sem se exigir um projeto futuro de vida em comum; VIII. Os factos dados como provados na Douta Sentença, não avaliam, não fazem prova ou a demonstração que aquele relacionamento era de namoro, partindo apenas do pressuposto que essa relação existia, sem qualquer demonstração cabal.

IX. Baseando-se o Tribunal, na Fundamentação de Direito, nos depoimentos das testemunhas CC, DD e EE, bem como, em duas mensagens enviadas pelo arguido à ofendida.

X. Testemunhas que não podem merecer qualquer credibilidade, pois todas elas são amigas da vítima e, a testemunha DD é, presentemente, seu companheiro.

XI. Já quanto às mensagens, demonstram, contrariamente à interpretação dada pelo Tribunal “a Quo”, que se tratou, sempre, de uma relação de amizade com cariz sexual.

XII. Fazendo, assim, com o devido respeito, o tribunal “a Quo” uma errónea apreciação dos factos.

XIII. A testemunha CC, não conhece o arguido, terá assistido a alguns episódios em que arguido e vítima se apresentavam de mãos dadas junto ao local de trabalho desta, não sendo tais factos suficientes para provar a relação de namoro.

XIV. Quantos às outras duas testemunhas, relataram episódios, pouco claros, passados em ..., que não provam essa relação de namoro.

XV. É a própria filha da vítima, a FF, que refere no minuto 04mn:27ss., que a mãe o apresentou como amigo, bem como refere em várias passagens que nunca teve muito contacto com ele (AA), mais concretamente ao minuto 05mn:36ss, ao minuto 05mn:50ss e 07mn:03ss, bem como minuto 06mn:04ss.

XVI. Quanto às restantes testemunhas, nomeadamente GG e HH o Tribunal a quo, desvaloriza o depoimento dos mesmos, quando estes referem que entre o arguido e a vítima apenas havia uma relação de amizade, por estes serem amigos do arguido, não fazendo a mesma interpretação quantos às testemunhas acima mencionadas que, por seu lado, são amigas da vítima. Em claro erro notório da apreciação da prova.

XVII. Constata-se na douta sentença, nas motivações de direito, uma clara contradição entre o parágrafo 4.º e o 5º, quando é dito no parágrafo 4º “…em refeições em lugares públicos…, … conviveram ainda com outras pessoas (como por exemplo a testemunha CC), como um casal” e o que é dito no parágrafo 5º “…o arguido apenas assumiu a relação amorosa com a BB na localidade onde a mesma vivia com a filha…”.

XVIII. De todos os factos constantes na motivação de facto, não se pode concluir pela existência de uma relação de namoro entre AA e BB por não estarem preenchidos os elementos essenciais da relação de namoro, como tal deve o arguido ser absolvido do Crime de Violência Doméstica p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1 da al. b) do Código Penal, de que vem acusado, pelo qual foi condenado pelo Tribunal a quo.

Por outro lado, XIX. Para que esteja preenchido o tipo legal de crime, é exigido uma relação de proximidade afetiva em que os factos praticados terão de ser, entre outros, maus-tratos físicos ou psíquicos, em que o agente denota um especial desrespeito pela dignidade e liberdade da pessoa humana, uma evidente desconsideração pela vítima e, onde o agente tem uma posição de domínio e controlo da vítima; XX. Dos factos dados como provados na Douta Sentença, não se consegue daí extrair que estejam preenchidos os pressupostos do tipo legal de Crime de Violência Doméstica, pois não há qualquer “abuso” psíquico, domínio sobre a vítima ou demonstração de desconsideração pela mesma.

XXI. Já quantos aos pontos 2 e 3 da fundamentação de facto, os mesmos não correspondem à realidade, veja-se as próprias declarações da ofendida entre o minuto 10mn:21ss e o dos factos minuto 12:00mn “… ele não gostava dos meus colegas de trabalho…, …, ele dizia que tinha problemas anteriores … ele dizia que tinha tido complicações com o chefe…, … eu nunca me quis meter nisso porque a mim também não me dava jeito estar ali no meio daquele conflito… não gostava dos meus colegas…porque me poderiam prejudicar no serviço…dizia-me para não contar nada da minha vida…que eles não eram de confiança…,…, mas eu nunca… (o Digníssimo Magistrado do MP interrompeu a ofendida, não permitindo que esta terminasse a frase) e, quando a instâncias do Digníssimo Magistrado do MP que pretende saber se o arguido tentava isolar em relação a outras pessoas, a mesma diz ao minuto 11mn:38ss …“não, eu cá estava sozinha com a minha filha, eu também não tinha grandes amizades, os amigos que eu tinha eram os meus colegas de trabalho e os amigos que ele me apresentou:” XXII. Havendo um erro notório na apreciação da prova por parte do Tribunal a quo relativamente a estes pontos...

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