Acórdão nº 0902/20.8BEBRG-R1 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução15 de Dezembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. Relatório 1.1. A……………..

, veio, ao abrigo do artigo 643.º, do Código de Processo Civil (CPC), reclamar do despacho do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que, com fundamento em extemporaneidade, não admitiu o recurso “per saltum" para este Supremo Tribunal Administrativo da sentença que julgou improcedente a acção de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de apoio judiciário formulado pelo ora Reclamante junto do Instituto de Segurança Social.

1.2.

A 27 de Setembro de 2022 foi, pelo ora relator, proferido despacho com o seguinte teor: “(…) No caso, em face dos termos em que foi enunciada a reclamação, as questões que cumpre decidir subsumem-se a saber se a decisão vertida no despacho reclamado, que não admitiu o recurso da impugnação da decisão de indeferimento que recaiu sobre o apoio judiciário, por entender ser a decisão irrecorrível nos termos dos artigos 27º e 28º da Lei do Apoio judiciário, não se lhe aplicando o nº 1 do artigo 150º do CPTA, padece, em primeiro lugar, de nulidade por falta de notificação prévia da decisão que iria tomar sobre a inadmissibilidade do recurso e, em segundo, de desconformidade com Directiva comunitária da norma da Lei do Apoio Judiciário que estabelece que a decisão judicial que aprecia a impugnação da decisão de indeferimento do apoio judiciário ser irrecorrível.

Acompanhando a resenha efectuada pelo Ministério Público no seu douto Parecer, objectivam os autos que da análise do processo principal através do SITAF que do termo de “Remessa para distribuição” registado em 29-06-2020 consta “ … foram os presentes autos remetidos à Seção Central para efeitos de distribuição, em sede da respectiva espécie em matéria fiscal.“ Ainda se apura que da “Resposta” registada em 19-10-2020 consta que o pedido de apoio judiciário respeita a processos de contraordenação fiscal.

Por fim e como decorre da seu traslado supra efectivado, o despacho ora reclamado, proferido em 22-03-2022, não admitiu o Recurso de “Revista per saltum” apresentado pelo ora Reclamante para o STA, ao abrigo do disposto nos artigos 151º, nº 1 e 148º, nº 1 do CPTA, da sentença proferida pelo TAF de Braga que indeferiu a impugnação da decisão de indeferimento que recaiu sobre o apoio judiciário, por entender ser a Decisão irrecorrível nos termos dos artigos 27º e 28º da Lei do Apoio judiciário, não se lhe aplicando o nº1 do artigo 150º do CPTA.

De tudo o que acabou de dizer-se resulta cristalino que o recurso interposto pela recorrente foi rejeitado, não com fundamento na falta de valor da causa, mas com fundamento na sua irrecorribilidade legal.

Feita esta precisão, aquilatemos da justeza dos fundamentos da reclamação a começar pela nulidade do despacho que não admitiu o recurso, por falta de notificação prévia da decisão que iria tomar sobre a inadmissibilidade do recurso.

Assim, existirá a invocada nulidade por existir uma decisão surpresa e esta deriva, segundo bem perscrutamos do alegado pelo reclamante, do facto de a decisão recorrida conhecer da questão precedentemente supra, sem atender aos princípios do contraditório e da confiança, como era imposto pelo artigo 3.º, nº 3 do NCPC, o que torna nulo o despacho proferido.

Vejamos.

O artigo 3°, n° 3, do Código de Processo Civil é plenamente aplicável em processo judicial tributário e tem como finalidade declarada evitar, proibindo-as, as denominadas decisões - surpresa.

Assim, caso não seja dada possibilidade às partes de se pronunciarem sobre a sobredita questão, poderá vir a entender-se que o despacho reclamado incorreria em nulidade, por violação do princípio do contraditório e do artigo 3°, do Código de Processo Civil.

Na verdade, o artigo 3º nº. 3 do C. Processo Civil estipula que o Juiz deve observar e fazer cumprir ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.

É certo que o princípio do contraditório, que é um dos princípios fundamentais do nosso direito processual geral, assegura não só a igualdade das partes, como, no que aqui interessa, é um instrumento destinado a evitar as decisões -surpresa.

Todavia, a questão da irrecorribilidade em apreço, em nada afectou quer a pretensão deduzida, quer a defesa.

É que a audição das partes será dispensada nos termos do artigo 3º nº. 3 em casos de manifesta desnecessidade e naqueles em que, objectivamente, as partes não possam alegar de boa-fé, desconhecimento das questões de direito ou de facto a decidir pelo Juiz e das respectivas consequências, o que sucedeu precisamente no caso concreto.

Na verdade e como bem refere o Ministério Público no caso sub judice é por demais manifesta a desnecessidade da observância daquele princípio porquanto é a própria lei do Apoio Judiciário que declara que a decisão é irrecorrível, conforme resulta do art. 28.º, n.º 5, da Lei n.º 34/2004, de 29-07, na redacção dada pela Lei n.º 47/2007, de 28-08).

De resto e ainda na senda do Ministério Público, já anteriormente à Lei n.º 47/2007, e desde a Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, que se vem entendendo que a regular tramitação do procedimento sobre o pedido de apoio judiciário apenas confere um grau de recurso, para o Tribunal de 1.ª instância, que decide em definitivo desse pedido e, portanto, sem possibilidade de novo recurso para tribunal hierarquicamente superior.

Em reforço do que vem dito, chama-se à colação o doutrinado pelo Tribunal Constitucional, entre muitos, no seu acórdão n.º 40/2008 (no D.R. n.º 42, Série II, de 28-02-2008), ao decidir “ … "não julgar inconstitucional a norma do artigo 29.º, n.º 1, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, interpretada no sentido de que não é admissível recurso da decisão judicial que julgue improcedente a impugnação da decisão administrativa que indeferiu pedido de concessão de apoio judiciário…”.

No mesmo sentido e como bem assinala o EPGA, se pronunciou o STJ no seu Acórdão proferido em e 31/3/2022 (proc nº 12/21), em www dgsi.pt. decidindo que “É irrecorrível a decisão proferida sobre a impugnação judicial da decisão sobre o pedido de protecção jurídica (n.º 5 do artigo 28.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho)”, pois “Não resulta da Constituição a imposição da possibilidade de recurso de uma...

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