Acórdão nº 776/22 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Novembro de 2022

Data17 Novembro 2022
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 776/2022

Processo n.º 621-A/2022

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele tribunal, de 26 de janeiro de 2022.

2. Pela Decisão Sumária n.º 428/2022, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«3. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente define o objeto do recurso nos seguintes termos: «inconstitucionalidade material da sentença, particularmente na não aplicação do art.° 70.° do Código Penal, interpretada no sentido do previsto no artigo 18.°/2 da CRP, que, consequentemente, concluirá pela inconstitucionalidade/ilegalidade da sentença, nomeadamente no que concerne à escolha e medida da pena».

Este enunciado demonstra que o recorrente pretende questionar o acerto da concreta pena que lhe foi aplicada, designadamente a opção por uma pena privativa da liberdade em detrimento de uma pena não privativa, por considerar que viola o artigo 27.º, n.os 1 e 2, da Constituição, bem como os princípios do «acesso à Justiça, do Direito de Defesa, bem como o da proporcionalidade o princípio da proporcionalidade» e ainda o artigo 18.º, n.º 2, da mesma Constituição.

Trata-se da violação da Constituição pelo Tribunal recorrido e não da violação da Constituição pela lei, o que equivale a dizer que o recorrente pretende sindicar a constitucionalidade da própria decisão recorrida – sublinhe-se que é o próprio recorrente a especificar que pretende «ver apreciada pelo douto Tribunal Constitucional a inconstitucionalidade material da sentença» –, sem que se vislumbre equacionar alguma questão de inconstitucionalidade normativa.

Ora, a determinação da medida concreta da pena e a opção pela aplicação de penas substitutivas não detentivas, sujeitas aos princípios da culpa e da proporcionalidade, situa-se necessariamente no domínio reservado ao exercício da função jurisdicional, pelo que não constitui objeto idóneo de recurso para o Tribunal Constitucional (v., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n.ºs 303/02 e 633/08). Como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem.».

A omissão deste pressuposto processual obsta ao conhecimento do objeto do recurso, justificando-se a prolação da presente decisão sumária, segundo o previsto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. A Decisão foi notificada ao mandatário judicial do recorrente por via postal registada, expedida no dia 21 de junho de 2022.

Nada tendo dado entrada nos autos, foram estes remetidos à conta e, em 13 de julho de 2022, devolvidos ao Tribunal da Relação de Coimbra.

Posteriormente, foram os autos novamente remetidos a este Tribunal, acompanhados de requerimento de reclamação para a conferência, remetido por via postal com registo de dia 11 de julho de 2022.

Notificado o recorrente para se pronunciar sobre a eventual extemporaneidade do requerimento, apresentou as seguintes razões:

«A., arguido nos autos à margem identificados, notificado para se pronunciar quanto à tempestividade da reclamação apresentada, vem expor o seguinte:

- o reclamante foi notificado no dia 01 de Julho de 2022 da decisão de não admissão do recurso;

- pois que, tal decisão veio em correio registado, tendo sido

levantada a missiva/decisão no dia referido conforme resulta do documento 9, junto à notificação ora sub judice;

- o arguido tem 10 dias para reclamar de tal decisão;

tendo-o feito no dia 11 de Julho, cumpriu o prazo legal para o efeito, pelo que tudo foi cumprido, não havendo qualquer extemporaneidade na reclamação apresentada;

- devendo por isso, e salvo o devido respeito, ser a mesma aceite e apreciada, nos melhores termos legais.

R. assim a V. Excias. se dignem admitir a sobredita reclamação, e,
consequentemente, que o recurso seja "admitido a subir imediatamente,
nos próprios autos e com efeito suspensivo, devendo 'o recorrente ser
notificado para apresentar alegações.
»

4. O Ministério Público respondeu nos seguintes termos:

«O Magistrado do Ministério Público neste Tribunal Constitucional, notificado da “reclamação” deduzida no processo em epígrafe, pelo arguido-recorrente A., vem dizer o seguinte:

1.º

Pela douta Decisão Sumária n.º 428/2022, de 20 de junho de 2022, foi decidido não se conhecer do objeto do recurso interposto para o Tribunal Constitucional pela ora reclamante, por inverificação dos respetivos pressupostos de admissibilidade.

2.º ...

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