Acórdão nº 6540/20.8T8VNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Novembro de 2022
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso de apelação n.º 6540/20.8T8VNG.P1 Origem: Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Gaia – J1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO AA (Autora) instaurou contra “R... Lda.
” (Ré) a presente ação, com processo comum, pedindo fosse: i. reconhecida e declarada a existência de contrato de trabalho sem termo entre Autora e Ré desde 07/10/2019, com todas as devidas e legais consequências; ii. caso assim não se entenda, reconhecido e declarado o incumprimento do prazo de aviso prévio para cessação do contrato de trabalho pela Ré à Autora; iii. reconhecida e declarada a ilicitude do despedimento da Autora por violação do disposto nas alíneas b) e/ou c) do art.º 381º do Código do Trabalho; iv. condenada a Ré no pagamento da compensação do montante que vier a apurar-se como devido desde o despedimento da Autora até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, acrescida dos respetivos juros até efetivo e integral pagamento, tudo nos termos do previsto no nº 1 do art.º 390º do Código do Trabalho; v. condenada a Ré no pagamento de € 500,00 à Autora, a título de indemnização por danos não patrimoniais; vi. comunicado à ACT a factualidade exposta para averiguação de eventual responsabilidade contraordenacional; Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que em 06/10/2018 celebrou com “R1..., S.A.” contrato de trabalho (temporário) a termo certo; em 06/10/2019 a referida empresa fez cessar o contrato, e em 07/10/2019 celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo incerto para prestar trabalho à mesma empresa utilizadora; a Ré é uma das empresas integrante do grupo “R1..., S.A.”; com a celebração do segundo contrato materialmente nada se alterou em relação ao primeiro; em 26/03/2020 a Ré informou a Autora de que o contrato de trabalho a termo incerto cessaria em 01/04/2020, como ocorreu; no entanto, o contrato tem que se considerar sem termo, pelo que ocorreu um despedimento ilícito.
Realizada «audiência de partes», e frustrada a sua conciliação, foi notificada a Ré para poder contestar, o que fez, apresentando contestação na qual alegou, em resumo, por um lado ser parte ilegítima para discutir o contrato celebrado com outra empresa, e por outro lado que celebrou contrato de trabalho com a Autora porque havia celebrado em 07/10/2019 contrato de prestação com “Sociedade B..., SL”, o qual cessou em 31/03/2020, tendo-se verificado o termo do contrato celebrado com a Autora; no caso de procedência da ação deve ser deduzido ao pedido da Autora o pago pela Ré a título de compensação de caducidade; termina dizendo deverem as exceções ser julgadas procedentes, ou, se assim não se entender, ser a ação ser julgada totalmente improcedente.
A Autora requereu a intervenção principal da “R1..., S.A., como associada da Ré.
Foi proferido despacho a: -- convidar a Autora a apresentar articulado complementar à petição inicial (PI), no qual proceda à concretização da matéria que, de forma vaga, genérica ou conclusiva, alegou na petição inicial, designadamente alegando factos objetivos que permitam concluir pela existência de uma relação de grupo entre a Ré e a sociedade identificada no artigo 2º da petição inicial (em conformidade com o disposto nos artigos 482º e seguintes e 488º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais).
-- convidar a Ré a apresentar nova contestação com obediência dos requisitos de apresentação de reconvenção, porquanto o reconhecimento do seu crédito tem que ser por essa via.
A Autora apresentou articulado complementar à PI, sendo de seguida proferido despacho a: -- julgar improcedente a exceção de compensação de créditos invocada na contestação por não ter a Ré apresentado “nova contestação”; -- admitir a intervenção principal provocada da sociedade “R1..., S.A.” (Interveniente).
Citada a Interveniente, apresentou articulado alegando, em síntese, por um lado verificar-se a prescrição dos créditos dos contratos celebrados antes de 07/10/2019, e por outro lado desconhece os contratos celebrados após a cessação do contrato que celebrou com a Autora; conclui dever a exceção deduzida ser julgada procedente e absolvida, ou se assim não se entender deverá a ação ser julgada totalmente improcedente.
Foi fixado o valor da ação em € 5.000,01.
Foi proferido despacho saneador, julgando improcedente a exceção de ilegitimidade, sendo relegado para final o conhecimento da exceção da prescrição, sendo dispensada a realização de audiência prévia bem como dispensada a prolação de despacho identificando o objeto do litígio e enunciando os temas de prova.
Realizada «audiência de discussão e julgamento», foi proferida sentença decidindo o seguinte: a) absolver a Ré “R... Lda.” de todos os pedidos formulados pela Autora; b) condenar a Interveniente “R1..., S.A.” a: − reconhecer a existência de contrato de trabalho sem termo entre ela e a Autora desde 06/10/2018; − reconhecer a ilicitude do despedimento da Autora e, consequentemente, a reintegrá-la no mesmo estabelecimento da empresa; − pagar à Autora as retribuições que esta deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento, sendo que a tal montante terão que ser deduzidas as quantias mencionadas no ponto 26) dos factos provados, sendo que as quantias recebidas a título de subsídio de desemprego terão que ser entregues pelo empregador à Segurança Social, bem como a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da ação.
− a pagar à Autora o montante de € 500,00 (quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Não se conformando com a sentença proferida, dela veio a Interveniente interpor recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[1]: ……………………………… ……………………………… ……………………………… Termina dizendo dever o recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser revogada a sentença, absolvendo a Interveniente do pedido.
A Autora apresentou resposta, mas em 14/07/2022 foi proferido despacho com o seguinte teor: “em face do não pagamento pela Autora da multa devida pela apresentação no primeiro dia após o termo do prazo, nos termos do art.º 139º, nº 6 do CPC, não admito as contra-alegações da Autora”.
Assim, não se considera a resposta apresentada pela Autora.
Foi proferido despacho a mandar subir o recurso de apelação apresentado pela Interveniente, imediatamente, nos próprios autos, e com efeito suspensivo (dado ter sido prestada caução, julgada válida).
O Sr. Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), pronunciando-se no sentido de ser negado provimento ao recurso e confirmada a sentença recorrida, dizendo essencialmente o seguinte: 2. Impugna a Recorrente a matéria de facto. Cremos, porém, salvo melhor opinião, que não lhe assiste razão.
Na verdade, da leitura dos depoimentos que foram transcritos não se conclui como o faz a Recorrente.
Além disso existem documentos bastantes, demonstrativos de diferente opinião, constando do contrato o motivo da celebração dos mesmos.
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Quanto ao direito, do mesmo modo, não assiste razão à Recorrente. O motivo da celebração de contrato de trabalho a termo deverá constar do contrato de trabalho, não pode ser tão vago e indefinido que impeça o trabalhador e, depois, a ACT e o tribunal de trabalho, de compreender e fiscalizar, devida e efetivamente, as razões em que se radica a necessidade de firmar um tal contrato, também não reclama que o empregador escreva e descreva o motivo explicativo com o máximo de detalhe ou pormenor que, materialmente, lhe for possível, bastando-lhe fazê-lo de maneira a que se ache suficientemente definida e percetível a situação de facto real e concreta que reclama a celebração do contrato de trabalho a termo certo em questão, possibilitando, dessa forma, a um qualquer declaratário colocado na mesma posição do trabalhador, a exata e objetiva compreensão do motivo invocado pela entidade patronal.
A fronteira entre a licitude ou ilicitude do motivo justificador da aposição do termo certo passa exatamente pela existência ou inexistência de uma realidade factual concreta e verdadeira a que aquele necessariamente se tem de referir e à inerente possibilidade ou impossibilidade de acompanhamento e controlo pelo trabalhador e, depois, pela inspeção do trabalho e pelos tribunais do foro laboral, daquela correspondência e conformidade.
A desconformidade material entre o motivo invocado no contrato e renovações e a realidade sócio laboral que justificou a sua celebração implica a nulidade do termo do respetivo contrato de trabalho bem como a aquisição da qualidade de trabalhador permanente do Autor, desde o momento inicial da sua celebração.
A nulidade da aposição do termo pelos fundamentos expostos é de conhecimento oficioso pelo julgador”, como se lê no Ac. da RL de 04/05/2016 Proc. nº 1992/15.0T8FNC.L1-4, www.dgsi.pt.
Ora neste caso o motivo invocado era o mesmo nos contratos celebrados, era vago e confuso não permitindo alcançar aqueles objetivos.
Por isso, a consequência é a nulidade e o contrato ser considerado sem termo, como se concluiu na douta sentença em recurso.
Assim a ela aderimos, e evitando desnecessárias repetições, concluindo pela improcedência do recurso.
Procedeu-se a exame preliminar, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
*Questão prévia: A Recorrente alega verificar-se “insuficiência para a decisão da matéria de facto provada”, sem indicar norma jurídica que o sustente, mas, uma vez que cita dois acórdãos, já de 1998, da Secção Criminal do STJ [o Ac. do STJ de 12/03/1998, publicado no BMJ nº 475, págs. 492-497 (relator Dias Girão) e o Ac. do STJ de 02/07/1998, publicado no BMJ nº 479, págs. 233-243 (relator Sousa Guedes)], parece estar a pensar no art.º 410º, nº 2, al. a) do Código de Processo Penal, que prevê esse...
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