Acórdão nº 142/17.3GTSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução27 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Nestes autos de processo comum, n.º 142/17...., do Tribunal Judicial da Comarca de ... – Juízo Local Criminal ..., foi submetido a julgamento, com a intervenção do Tribunal Singular, o arguido AA, melhor identificado nos autos, estando pronunciado da prática, como autor material, de: um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, n.º 1 e 69º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal e de um crime de homicídio negligente, p. e p. pelos artigos 137º, n.ºs 1 e 2 e 69º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal por referência às contraordenações p. e p. pelos artigos 13º, n.º 1, 24º, n.º 1, 25º, n.ºs 1, alínea h) e 2, 145º, n.º 1 alíneas a) e e), 146º, alínea o), todos do Código da Estrada e 60º, n.º 1, do Regulamento da sinalização de trânsito, aprovado pelo Decreto-Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10; e, ainda, de uma contraordenação grave, p. e p. pelo artigo 145º, n.º 1, alínea a), com referência aos artigos 13º, n.º 1, 24º, n.º 1, 25º, n.ºs 1, alínea h) e 2, todos do Código da Estrada; e de uma contraordenação muito grave, p. e p. pelos artigos 146º, alínea o), do Código da Estrada, e 60º, n.º 1, do Regulamento da sinalização de trânsito, aprovado pelo Decreto-Regulamentar n.º 22-A/98, de 01/10.

1.2. Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 25/11/2021, depositada nessa mesma data, com o seguinte dispositivo: «(...) julgo a acusação e a pronúncia procedente por provada e, em consequência: a) – Declaro a prescrição do procedimento contra-ordenacional e, em virtude da mesma, julgo extinto o procedimento no que concerne às contra-ordenações imputadas ao arguido AA.

  1. Condeno o arguido AA, como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punidos nos termos do disposto nos artigos 292º, n.º 1 e 69º, n.º , al a), do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à razão diária de 8€ (oito euros), o que perfaz o montante total de 480€ (quatrocentos e oitenta euros e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de três meses; c) – Condeno o arguido AA como autor material de um crime de homicídio negligente, previsto e punido pelo artigo 137º, n.º 1 do Código Penal, na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de seis meses; e) – Em cúmulo jurídico das penas acessórias aplicadas, condeno o arguido na pena única de quatro meses de proibição de conduzir veículos motorizados; f) - Condeno ainda o arguido no pagamento de 2 (duas) UC de taxa de justiça e demais encargos com o processo.

    (...).» 1.3. Inconformado com o assim decidido recorreu o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação apresentada, as seguintes conclusões: «I - O presente recurso é interposto da decisão do Tribunal de 1.ª Instância que, para além do mais, condenou o arguido como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, sendo limitado à apreciação do cometimento deste crime pelo arguido, sem prejuízo de, da decisão a proferir no presente recurso, terem que retirar-se todas as consequências em relação à totalidade da decisão; II - O recorrente não se conforma com a sentença objecto do recurso na parte em que o condenou pela prática do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, porquanto entende que a mesma efectuou um incorrecto julgamento da matéria de facto nos pontos que infra se referirão, o que teve igualmente como consequência a incorrecta decisão de Direito, pelo que o recurso é de facto e de Direito; III - O correcto julgamento quer de facto, quer de Direito, impõem a absolvição do arguido quanto ao crime de condução de veículo em estado de embriaguez; IV - A decisão judicial recorrida, no que respeita aos pontos 10º, 17º e 22º da matéria de facto julgada como provada, considerando a prova produzida, está em desacordo com esta, pelo que o julgamento de tais factos não foi correcto; por considerar que existiu erro de julgamento quanto aos factos constantes de 10º, 17º e 22º da matéria de facto julgada como provada, o arguido submete o julgamento de tais pontos à apreciação do Tribunal ad quem, sendo estes os concretos pontos da matéria de facto que constituem objecto do presente recurso; V - A taxa de álcool mencionada no facto 10º é o resultado do exame de sangue realizado ao arguido pelas 5:28h da manhã, mais de três horas após o acidente; VI - Não consta quer da Acusação, quer da decisão, designadamente da matéria de facto julgada como provada, o motivo pelo qual não foi realizado ao arguido o exame por ar expirado; sequer resulta o estado de consciência do arguido após o acidente; VII - A recolha de sangue ao arguido, para efeitos do exame quantitativo da TAS carecia do seu consentimento esclarecido, salvo estando demonstrado que este consentimento era impossível de prestar, o que não acontece in casu; VIII - Considerando o que dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Regulamento de Fiscalização da Condução sob a Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, aprovado pela Lei 18/2007, de 17 de Maio, bem como os artigos 153.º, n.º 8 e 156.º do Código da Estrada, que a recolha de sangue constitui um método invasivo da integridade física do arguido e que este, para tanto, não deu consentimento, e que a impossibilidade de realização do teste através do ar expirado constitui um requisito para o recurso aos demais métodos de recolha de prova, expressamente se invoca a nulidade do exame para quantificação da taxa de álcool no sangue realizado ao arguido, por constituir um meio de prova proibido, o que se faz ao abrigo do disposto no artigo 126.º do Código de Processo Penal; IX - A colheita de sangue para efeitos de análise do grau de alcoolémia do condutor, ao abrigo do disposto nos artigos 152.º, n.º 3, 153.º, n.º 8 e 156.º, n.º 2 do Código da Estrada, sem possibilitar ao condutor a sua recusa, está ferida de inconstitucionalidade orgânica, que se invoca com todos os efeitos legais; X - Dos autos sequer resulta o consentimento tácito do arguido; XI - Assim, a concreta recolha de sangue realizada ao arguido, constante de fls. e que serviu de base para apurar o grau de alcoolémia, constitui prova ilegal, inválida ou nula, não podendo produzir efeitos em juízo, o que se invoca; Sem conceder: IX - A afirmação de que o arguido conduzia, no momento do acidente, “com uma taxa de álcool no sangue de 1,48 g/l”, constante de 10º dos factos provados, não tem sustentação na prova produzida; X - Tal é reconhecido pelo próprio Tribunal recorrido na fundamentação do seu julgamento, ao afirmar que a taxa não foi apurada e mas sempre seria, pelo menos, de 1,29g/l; XI - Não tendo a taxa de álcool presente no sangue no momento do acidente sido concretamente apurada, como não foi, não pode julgar-se como provado que o arguido conduzia com uma taxa de álcool de 1,48g/l; XII - Não é possível determinar, com certeza e segurança, a taxa de álcool que o arguido alegadamente tinha no momento do acidente de viação; XIII - O raciocínio utilizado pelo Tribunal parte de pressupostos que se desconhecem e que sequer estão demonstrados, a saber: que o arguido ingeriu bebidas alcoólicas ao jantar; que o arguido saiu do jantar e dirigiu-se, conduzindo, directamente para o local do acidente; que entre a última ingestão, ao jantar, e o acidente decorreram menos de uma hora; ora, nenhum destes factos está provado; XIV - Os pressupostos de que o Tribunal partiu não têm necessariamente que ter acontecido e não está provado que tenham acontecido, desconhecendo-se, na realidade, qual a taxa de álcool que o arguido tinha no momento do acidente; XV - Tal dúvida, insanável, implica que se dê como provado, em 10º, que o arguido conduzia, no momento do acidente, com uma taxa de álcool no sangue não concretamente apurada; XVI - Do exposto resulta igualmente o incorrecto julgamento da matéria de facto efectuada nos pontos 17º e 22º da matéria de facto constante da decisão recorrida; XVII - Desconhecendo-se a taxa de álcool no sangue no momento do acidente e demonstrado que está que a mesma poderia ser inferior a 0,5 g/l (no exemplo que deixámos exposto na motivação seria de 0,38g/l), não pode afirmar-se como estando provado que o arguido “sabia que tinha ingerido bebidas alcoólicas e em quantidades tais que determinar-lhe-iam necessariamente uma TAS superior a 1,2 g/l”, assim como não pode julgar-se como provado que “por esse facto, as suas faculdades psicológicas necessárias à condução daquele veículo estavam consideravelmente reduzidas, designadamente no que respeita à coordenação das funções de sensação e de percepção e à coordenação motora”, pelo que deve julgar-se como não provado o facto 17º da matéria de facto; XVIII - Por outro lado, desconhecendo-se a taxa de álcool no sangue no momento do acidente, não é possível julgar como provado que o arguido quando “podia e devia ter-se abstido de o conduzir com referida taxa de álcool”, pois que esta se desconhece e desconhece-se até se era superior ou inferior ao limite mínimo legalmente estabelecido, pelo que deve alterar-se o julgamento de 22º da matéria de facto julgada como provada, de forma a subtrair da mesma tal segmento; XIX - O correcto julgamento da matéria de facto, nos termos acima expostos, tem consequências na decisão de Direito, em face do tipo de crime constante do artigo 292.º, n.º 1 do Código Penal e respectivos elementos constitutivos; XX - A invocada nulidade do meio de prova utilizado para quantificação da taxa de álcool no sangue do arguido, como a inconstitucionalidade orgânica acima invocada, importam que se desconheça em absoluto da presença de álcool no momento do acidente, já que o meio de prova é inválido, facto que determina a absolvição do arguido do crime de que vem condenado em 1ª Instância; sem conceder, XXI -...

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