Acórdão nº 599/22 de Tribunal Constitucional (Port, 22 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Assunção Raimundo
Data da Resolução22 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 599/2022

Processo n.º 1259/2021

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Assunção Raimundo

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., ora reclamante, foi condenado, em primeira instância (Instância Local de Bragança – Secção Cível e Criminal – J2), pela prática de um crime de falsidade informática e um crime de abuso de poder, respetivamente previstos e punidos pelos artigos 3.º, n.os 1 e 5, da Lei 109/09, de 15 de setembro, e pelo artigo 382.º do Código Penal. Em cúmulo jurídico, foi fixada a pena única de dois anos e onze meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

1.1. Inconformado, dessa decisão condenatória interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, tendo a assistente nos autos adotado postura idêntica. Por acórdão datado de 3 de julho de 2017 (cfr. fls. 15-104), negou-se provimento ao recurso do arguido, julgando-se parcialmente provido o recurso interposto pela assistente. Em consequência, acrescentou-se a condenação pela prática de um crime de violência doméstica, pelo qual vinha o arguido pronunciado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.os 1, alínea b), e 2, do Código Penal, na pena de dois anos e três meses de prisão e, em cúmulo jurídico desta pena com as restantes penas constantes da decisão recorrida, na pena única de quatro anos de prisão. Mais se determinou a suspensão da execução da referida pena, por igual período, fixando-se a condição de o arguido pagar à assistente, no prazo de um ano, a quantia de € 12.000 (doze mil euros), a título de indemnização cível, pelos danos morais sofridos.

1.2. Novamente inconformado, interpôs o arguido recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (cf. fls. 106-160) que, por acórdão datado de 15 de novembro de 2017 foi rejeitado, com fundamento em irrecorribilidade da decisão (cfr. fls. 204).

1.3. Na sequência da interposição, por parte do arguido, de um recurso para o Tribunal Constitucional, em 4 de dezembro de 2017 (cfr. fls. 206-232 dos autos), ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, doravante LTC), iniciou-se a competente tramitação neste Tribunal, que culminou com a prolação do Acórdão do Plenário n.º 525/2021, de 13 de julho, nos termos do qual se decidiu «não julgar inconstitucional a norma extraída do artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que, revertendo decisão absolutória parcial proferida pela 1.ª instância, agravem, sem ultrapassar o limite de cinco anos, a pena unitária de prisão, suspensa na sua execução em que o arguido havia sido condenado na 1.ª instância». Na mesma decisão determinou-se a revogação do Acórdão n.º 102/2021, da 2.ª Secção, proferido nos presentes autos; e, consequentemente (…) julg[ou-se] improcedente o recurso originariamente interposto» (cfr. fls. 255).

1.4. Por requerimentos constantes de fls. 256-265 e 266-267 dos autos, veio o reclamante, em 20 e 23 de setembro de 2021, interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, «do acórdão deste Tribunal da Relação de 03.07.2017».

1.5. Por despacho datado de 25 de outubro de 2021, proferido no Tribunal da Relação de Guimarães, não foi admitido o recurso interposto pelo reclamante, com a seguinte fundamentação (cfr. fls. 270-273):

«Proferido por este tribunal o acórdão de 3/07/2017, que mantendo a condenação do recorrente A. pela prática de um crime de abuso de poder, em concurso real, com um crime de falsidade informática, o condenou ainda pela prática de um crime de violência doméstica, veio este, interpor recurso para o STJ, restrito à parte em que o condenou pela prática deste último crime (conforme consta da referência citius 122619).

Admitido aquele recurso, veio o mesmo a ser rejeitado por douto Acórdão do STJ de 15/11/2017, por irrecorribilidade da decisão, nos termos da alínea e) do n. ° 1 do art. ° 400° do CPP.

Interpôs, então, aquele recorrente recurso para o Tribunal Constitucional (referência 112093), no qual além da questão da inconstitucionalidade daquele normativo, requer ainda:

(…)

No Tribunal Constitucional, no âmbito deste recurso, veio a ser proferido o douto Acórdão n.° 102/2021 de 4/02/2021, que declarou a inconstitucionalidade daquela alínea e) do n. ° 1 do art. ° 400° do CPP, na interpretação que impusera a rejeição pelo STJ do recurso para ele interposto pelo recorrente e supra referido (referência 7354775).

Porém, em 13/07/2021, pelo Plenário do Tribunal Constitucional foi proferida a decisão n.º 525/2021, que revogou aquele acórdão n.º 102/2021 e julgou “improcedente o recurso originariamente interposto” - (referência 7734353).

Veio, então, o recorrente, respectivamente, em 24/09/2021 e 27/09/2021 (referências 198817 e 198853), interpor recurso para o Tribunal Constitucional, o primeiro “(na parte relativa à condenação pelo crime de falsidade informática e de abuso de poder)”, e no qual pede a apreciação da constitucionalidade:

(…)

E o segundo, relativo à condenação pelo crime de violência doméstica, e para apreciação da constitucionalidade material:

(…)

Ora, a douta decisão do Plenário do Tribunal Constitucional n.° 525/2021, além de revogar o douto acórdão 102/2021, julgou "improcedente o recurso originariamente interposto", fazendo caso julgado relativamente às questões da inconstitucionalidade ou ilegalidade suscitadas nesses autos, nos termos do n.° 1 do art. ° 80° da LOTC, e fazendo também transitar a decisão recorrida, se estiverem esgotados, como estavam no caso sub judice os recursos ordinários (n.° 4 do mesmo normativo legal).

Assim, e quer pela existência de caso julgado nestes autos quanto às questões que o recorrente pretende ver apreciadas nos recursos interpostos em 21 e 24/09/2021 (referências citius respectivas 198647 e 198817), quer porque a decisão recorrida já se encontra transitada em julgado, não admito os recursos interpostos pelo arguido A.».

1.6. Notificado dessa decisão, deduziu o arguido reclamação ao abrigo do n.º 4 do artigo 76.º da LTC, argumentando (cfr. fls. 3-6):

«Dispõe o artº. 75º, nº. 1, da LCT que

“O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias (...)”.

Acrescentando o nº. 2, que

“Interposto recurso ordinário (...) que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão, o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional conta-se do momento em que se torna definitiva a decisão que não admite recurso.”

(…)

O que equivale a dizer, no caso vertente, com o trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional, e não antes.

Ora, o Tribunal da Relação de Guimarães não admitiu os recursos interpostos, pelo Reclamante:

a) Pela existência de caso julgado nestes autos quanto às questões que o aqui Reclamante pretende ver apreciadas, e

b) Porque a decisão recorrida já se encontra transitada em julgado.

Relativamente ao primeiro motivo, facilmente se alcança da consulta dos autos que as questões de constitucionalidade que o Reclamante ora pretende ver apreciadas não foram, ainda, objeto de análise e de decisão por parte do Tribunal Constitucional.

Com efeito, não obstante elas terem sido suscitadas no recurso anteriormente interposto para o Tribunal Constitucional, o certo é que este apenas se pronunciou quanto à (in)constitucionalidade do artº. 400º, nº. 1, al. e), do Código de Processo Penal, na interpretação de que é irrecorrível o acórdão da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1ª. instância, condene o Arguido em pena de prisão, suspensa na sua execução, por violação do direito ao recurso consagrado no artº. 32º, nº. 1, da Constituição da República Portuguesa.

Razão pela qual necessariamente inexiste caso julgado relativamente a tais questões.

Já no que se refere ao segundo motivo, importa ter em consideração a disciplina do art.º 75º, nº. 2 (supra enunciada), nos termos da qual o termo inicial do prazo para interpor recurso de fiscalização concreta de decisão cujo recurso ordinário não foi admitido, por irrecorribilidade, coincide com o momento em que o acórdão da não admissão desse recurso se torna definitivo.

No caso “sub iudice” o prazo de 10 dias para recorrer para o Tribunal Constitucional da decisão originariamente proferida (ou seja, do acórdão da Relação de Guimarães que realizou a aplicação normativa cuja constitucionalidade o Reclamante pretende questionar) apenas se iniciou no momento em que se tornou definitiva a decisão que não admitiu o recurso ordinário interposto daquele acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça.

Esta decisão foi proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e tomou-se definitiva com o trânsito em julgado do acórdão nº. 525/2021, de 13.07.2021, proferido pelo Plenário do Tribunal Constitucional.

A sua notificação, ao Reclamante, encontra-se datada de 14.07.2021, presumindo-se a respectiva concretização da notificação em 19.07.2021 por via do artº. 248º, do Código de Processo Civil.

Como o processo nº. 1465/17, da 2ª. Secção do Tribunal Constitucional, onde esta decisão foi proferida, não é urgente por não se enquadrar na previsão do artº. 43º, da LTC, o respectivo trânsito em julgado ocorreu em 10.09.2021.

O Reclamante dispunha, então, de 10 dias para interpor recurso para o Tribunal Constitucional da decisão original que contém as interpretações normativas desconformes com princípios constitucionais diversificados que ele pretende questionar e ver apreciadas.

Portanto, até ao dia 20.09.2021, ou seja, precisamente aquele em que deu entrada um dos recursos ora não admitidos pela Relação de Guimarães.

O outro recurso deu entrada em...

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