Acórdão nº 732/20.7GDLLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo Local Criminal de Loulé (J1) do Tribunal Judicial da Comarca de Faro corre termos o processo comum singular n.º 732/20.7GDLLE, no qual foi acusado FP, solteiro, nascido em …, filho de BP e JP, natural de …, residente na Rua …, …. …, tendo-lhe sido imputada a autoria material de um crime de tráfico de menor gravidade, na forma consumada, previsto e punido pelos artigos 21.º, n.º 1 e 25.º, al. a) do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência à Tabela I-B anexa àquele diploma legal

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida a seguinte decisão (transcrição): “Nestes termos, e de acordo com o exposto e de harmonia com o consagrado nos preceitos legais supracitados, decido julgar a acusação totalmente procedente e, em consequência: 1. Condeno o arguido FP pela prática, no dia 05-11-2020, como autor material, de um crime de tráfico de menor gravidade, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1 e 25.º, al. al. a), por referência à tabela I-B, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, substituída por 360 (trezentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis) Euros

2. Ordeno, em sede de cumprimento da pena, o desconto de 1 (um) dia de multa, pelo dia de detenção sofrido, nos termos do artigo 80.º, n.º 2 do Código Penal

3. Condeno o arguido FP nas custas criminais e nos demais encargos com o processo, englobando os honorários devidos à Ilustre Defensora que lhe foi nomeada, nos termos do artigo 39.º da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, fixando a taxa de justiça no montante de 2 (duas) unidades de conta, nos termos previstos no artigo 8.º, e nº 9 com referência à Tabela III do Regulamento das Custas Processuais, e artigos 513.º e 514.º, todos do Código de Processo Penal

4. Declaro perdida a favor do Estado a cocaína em cloridrato apreendida à ordem dos presentes autos, nos termos do artigo 109.º do Código Penal e 35.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro

5. Declaro perdido a favor do Estado o saco do lixo e a embalagem “Redrate” apreendidos à ordem dos presentes autos, com o destino a que alude o artigo 39.º nº1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro

6. Determino a restituição ao arguido FP dos telemóveis e do dinheiro apreendidos.” Inconformado, o arguido interpôs recurso da mesma, extraindo da motivação as seguintes conclusões (transcrição): “EM CONCLUSÃO: 1. Vem o presente recurso, que versa matéria de facto e de direito, interposto da douta sentença de fls. (…), que condenou o arguido Recorrente pela prática, como autor material, de um crime de tráfico de menor gravidade, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º1 e 25.º, al. al. a), por referência à tabela I-B, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão, substituída por 360 (trezentos e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis) Euros, no total de € 2.160,00 (dois mil cento e sessenta euros)

2. Não se conforma o recorrente com a decisão do tribunal «a quo», quer no que respeita ao julgamento de facto, quer no que concerne ao enquadramento jurídico-penal dos factos, quer ainda quanto à medida da pena, nos termos e com os fundamentos que de seguida passa a enunciar

III – A) DA NULIDADE DA SENTENÇA RECORRIDA III – A) 1. Do Erro notório na determinação da pena de substituição 3. O tribunal «a quo» condenou o recorrente na pena de 1 (um) ano e 8 (oito) meses de prisão pelo crime de tráfico de menor gravidade p. e p. pelo artigo 25.º do D.L. 15/93, de 22 de Janeiro, e ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 45.º do Código Penal, substituiu essa pena por 360 dias de multa dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis) Euros, no total de € 2.160,00 (dois mil cento e sessenta euros)

4. Ora, segundo o disposto nesse preceito legal (artigo 45.º do C.P.) a pena de prisão aplicada ao arguido, aqui recorrente (1 ano e 8 meses) não é substituível pela pena de multa como o fez o tribunal «a quo»

5. Essa pena de substituição apenas tem aplicação quando a pena de prisão aplicada não é superior a 1 (um) ano de prisão

6. In casu, a pena de prisão aplicada ao recorrente foi de 1 (um) ano e 8 (oito) meses, pelo que a lei não permite a sua substituição pela pena de multa como o fez o tribunal «a quo», sendo, por conseguinte, nula a douta sentença recorrida por erro notório na aplicação do direito

III – A) 2. Da omissão de pronuncia 7. O tribunal «a quo» não ponderou, como devia, a aplicação ao recorrente de qualquer uma das penas de substituição previstas na lei, mormente, a da suspensão da execução da pena ou a do trabalho a favor da comunidade, previstas nos artigos 50.º e 58.º do Código Penal, respectivamente, incorrendo assim em nulidade por omissão de pronuncia cfr. artigo 379º, nº 1, al. c) do CPP

8. A jurisprudência e a doutrina são concordantes na necessidade de ponderar a sua aplicabilidade ou não e isto porque a pena suspensa assume a natureza de verdadeira pena, de pena autónoma 9. A suspensão da pena reveste assim a natureza jurídica de uma pena autónoma de substituição a impor uma fundamentada decisão quanto à sua aplicação ou não, desiderato que o tribunal recorrido não cumpriu, pelo que a douta decisão é nula

10. A assim, doutamente, se não entender, vai desde já arguida a Inconstitucionalidade material dos artigos 50.º nº 1 do CP e 374.º, n.º 2, e 375.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretados no sentido de não imporem a fundamentação da decisão de não suspensão da execução de pena de prisão aplicada em medida não superior a três anos por violação do artigo 205.º, nº 1 da da Constituição da República Portuguesa

SEM PRESCINDIR, NEM CONCEDER, III – B.1) DO ERRO DE JULGAMENTO DOS PONTOS 1 E 2 DA DECISÃO DE FACTO 11. No ponto 1. da matéria assente, deu o tribunal «a quo» como provado que “No dia 05-11-2020, cerca das 18:40, na Rua …, sita em …, o arguido detinha 21 (vinte e um) pacotes de cocaína em cloridrato, com o peso global de 22,828 gramas e grau de pureza que mediava entre 27,9%/29,8%, equivalente a 32 doses individuais para consumo e venda a consumidores. “ 12. Ora, salvo o devido respeito mal andou o tribunal «a quo» ao dar como provado aquele facto nos termos em que o fez, concretamente, no segmento que refere que o produto em poder do arguido se destinava ao seu consumo e a[(…) venda a consumidores.] 13. Pois, da conjugação da prova produzida e examinada em audiência de discussão e julgamento, não resultou provado que o arguido destinasse o produto que lhe foi apreendido à venda a terceiros

14. Em audiência de julgamento o arguido quis e prestou declarações que ficaram gravadas no sistema integrado de gravação digital em uso no tribunal com início pelas 00”00” e o seu términus aos “19”45” - cfr. acta de audiência de 21-09-2021, 15. Nessas declarações afirmou que na data dos factos (05-11-2020) era consumidor de cocaína – cfr. aliás, resulta do ponto 14 dos factos provados

16. Resulta ainda que o arguido afirmou perante o Tribunal que o produto apreendido (cocaína) era para seu consumo pessoal, mas não para ser todo consumido naquela noite, como afirma a douta decisão recorrida

17. O que o arguido afirmou a instâncias da MMª Juiz foi que “por vezes consumia mais de 2-3 pacotes por noite.” Para justificar ter em seu poder todos os pacotes apreendidos

18. Da restante prova produzida e examinada em audiência, mormente, testemunhal, pericial e documental dos autos não resultou provado que o arguido destinasse o produto apreendido a cedência a terceiros, ou que tivesse efectuado qualquer venda do mesmo

19. Em audiência de julgamento foram inquiridas duas testemunhas: a testemunha P, (militar da GNR) cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o seu início aos minutos 00’00’’ e o seu termo aos minutos 08 0ì7 ì ì confirmou o teor do auto de notícia de fls. 11 e seguintes cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos

20. Desse auto de notícia resulta basicamente que nas circunstâncias aí aludidas foi “verificado que um individuo do sexo feminino entrou no veículo matricula …

O referido individuo do sexo feminino, e conhecido do participante como consumidora de produtos estupefacientes, perante os factos foi abordado o condutor da viatura (…) sic.” 21. Por seu turno o aludido individuo do sexo feminino, G, inquirida como testemunha e cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso neste Tribunal, tendo o seu início aos minutos 00’00’’ e o seu termo aos minutos 02 2ì7”, negou ter adquirido ou pretender adquirir produto estupefaciente ao arguido, ora recorrente

22. Aliás, nem tal facto vinha imputado ao arguido no libelo acusatório

23. Deste modo, analisada toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento verifica-se que as declarações prestadas pelo arguido afirmando que o produto estupefaciente que detinha era para seu consumo não foram contrariadas nem pela demais prova produzida aí produzida e examinada, nem por qualquer outro meio de prova constante dos autos

24. Conjugada a prova constante dos autos verifica-se inexistir qualquer prova que permita afirmar com convicção segura que o arguido se dedicava ao tráfico de estupefacientes ou que destinava o produto estupefaciente por si detido à venda ou cedência a terceiros

25. O depoimento da testemunha P é insuficiente para que se conclua que o arguido se dedicava ao tráfico de estupefacientes

26. Tanto assim que o tribunal «a quo» julgou NÃO PROVADO que “A quantia de €15,00 euros em numerário detido pelo arguido fosse resultado da venda de estupefacientes a terceiros.” – cfr. ponto 15 dos factos não provados

27. Isto porque o douto tribunal «a quo» carecia de elementos probatórios nesse conspecto

28. Assim, salvo o...

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