Acórdão nº 29/20.2GCPTG.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de processo comum (tribunal singular) nº 29/20.2GCPTG, do Juízo Local Criminal de Portalegre, e mediante pertinente sentença, a Exmª Juíza decidiu: “

  1. Condenar o arguido MD, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de coação, previsto e punido pelo artigo 154º, nºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 09 (nove) meses de prisão efetiva

  2. Condenar o arguido MD no pagamento das custas criminais (artigos 513º, nº 1, e 514º, nº 1, do Código de Processo Penal), fixando-se a taxa de justiça em 02 (duas) UC’s (artigo 513º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Penal, e artigo 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa ao Regulamento), e sendo responsável pelo pagamento dos encargos a que a sua atividade houver dado lugar (artigo 514º do Código de Processo Penal), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie”

    * Inconformado com a sentença condenatória, interpôs recurso o arguido, apresentando as seguintes (transcritas) conclusões: “1 - A Douta Sentença, proferida nos presentes autos, condenou o arguido, MD, pela prática, em autoria material e na forma tentada, de um crime de coação, previsto e punido pelo artigo 154º, nºs 1 e 2, do Código Penal, na pena de 09 (nove) meses de prisão efetiva, tendo ainda sido condenado no pagamento das custas criminais (artigos 513º, nº 1, e 514º, nº 1, do Código de Processo Penal), fixando-se a taxa de justiça em 02 (duas) UC’s (artigo 513º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Penal, e artigo 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa ao Regulamento), e sendo responsável pelo pagamento dos encargos a que a sua atividade houver dado lugar (artigo 514º do Código de Processo Penal), sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficie

    2 - Pelo que acima se expôs, entende-se que a integração dos factos no tipo de crime pelo qual foi condenado não é possível, não se vislumbrando elementos suficientes para sustentar uma condenação pelo crime acima identificado, uma vez que não está preenchido o elemento objetivo do tipo de crime em causa

    3 - No nosso modesto entendimento, o registo criminal do arguido não pode substituir a prova que não foi produzida em sede de discussão e julgamento

    4 - Apesar da douta condenação proferida pelo Tribunal a quo nos merecer, obviamente, o máximo respeito, o Recorrente tem esperança que V.ªs Ex.ªs, Venerandos Juízes Desembargadores, tenham em conta todas as circunstâncias acima descritas e lhe façam justiça

    5 - Para mais, considerando que se trata de um crime na forma tentada, desprovido de uma base probatória sustentada e com a incorporação de elementos de outro processo não transitado e alvo de recurso

    6 - A dimensão da condenação deixa o Recorrente absolutamente destroçado, desolado e indignado, sentindo que a sua vida é agora um tormento, vivendo em total desespero

    7 - O Recorrente apela a uma oportunidade para voltar a ter esperança de viver de forma digna

    8 - Relativamente à eventual renovação de prova, é entendimento do Recorrente, salvo melhor opinião, não haver, in casu, necessidade de produção da mesma, mas tão somente a reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo Tribunal a quo

    Termos em que e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente Recurso, e em consequência: - Serem dados como não provados os factos descritos nos Pontos 3, 4, 6, 7, 8 e 9 dos factos dados na sentença, absolvendo-se, consequentemente, o arguido do crime p. e p. pelo artigo 154º, nºs 1 e 2, do Código Penal, atendendo à ausência de prova e às circunstâncias do caso

    - Caso assim não se entenda, e em alternativa, ser decretada suspensa na sua execução, por igual período, a pena de prisão de 09 (nove) meses aplicada ao arguido”

    * O Exmº Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, e concluindo tal resposta nos seguintes termos (em transcrição): “1) O Tribunal apreciou criteriosamente a prova produzida e examinada em audiência de julgamento, tendo feito um exame coerente e lógico da mesma, sendo que os elementos probatórios, obtidos em audiência de discussão e julgamento e devidamente analisados na sentença apenas poderiam redundar na condenação do arguido

    2) O recurso da matéria de facto não se destina a postergar o princípio da livre apreciação da prova, que tem consagração expressa no art.º 127º do Código de Processo Penal

    3) No caso dos autos e em última análise, o que o recorrente pretende é substituir a convicção do Tribunal pela sua. Todavia, não basta que o recorrente pretenda fazer uma “revisão” da convicção obtida pelo Tribunal "a quo" por via de argumentos que permitam concluir que uma outra convicção ‘era possível’. Exige-se-lhe que indique a prova que imponha uma outra convicção e não que meramente a permita, o que não sucedeu

    4) O Tribunal fundou a sua convicção, no depoimento do ofendido J, que depôs de forma credível, circunstanciando os factos na medida em que a sua memória o permitiu, e esclareceu que o arguido se dirigiu-se ao estabelecimento comercial, onde trabalha, e onde se encontrava sozinho, pretendendo que desistisse da queixa apresentada, e não satisfeito com a atitude do ofendido, tentou igualmente envolver-se em confrontos físicos, desafiando o queixoso para se dirigir ao exterior, com o intuito de o agredir. Como este se recusou, mantendo-se dentro do estabelecimento, e como o se negou a desistir da queixa que havia apresentado, o arguido, dirigindo-se-lhe, disse “vai ser muito pior do que foi da outra vez!”, “Eu vou voltar e não venho sozinho”

    5) Importa referir que foi deduzida acusação e proferida sentença - ainda que não transitada em julgado - a imputar e a condenar o arguido, em conjunto com outros dois aí arguidos, pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, praticado na pessoa de J, por factos ocorridos em setembro de 2018, no estabelecimento comercial do queixoso (cf. Certidão extraída do proc…., junta aos autos, a fls. 50 a 86). Assim, é perfeitamente legítimo e natural que a testemunha com as expressões proferidas se tenha sentido amedrontada e intimidada, a par da postura do arguido (que pretendia envolver-se até em confrontos físicos)

    6) Relativamente ao depoimento da testemunha J, não identificou o Tribunal qualquer incoerência ou contradição insanável ou sinal de falsidade, tendo o mesmo prestado um depoimento sério e credível, circunstanciando a factualidade que relatou, na medida do possível, no tempo e espaço, razão pela qual se atribuiu total credibilidade ao seu depoimento em detrimento das declarações prestadas pelo arguido, que se limitou a negar a factualidade imputada, afirmando que apenas se dirigiu ao estabelecimento do ofendido para lhe pedir desculpa

    7) Ora é totalmente contrário às regras da experiência comum que uma pessoa (pelo menos o homem médio, suposto pela ordem jurídica), após um singelo pedido de desculpa, se dirigisse à autoridade policial denunciando ter sido vítima de ameaças por parte da pessoa que lhe apresentou um pedido de desculpa, revelando além do mais medo pelo que lhe pudesse acontecer

    8) Tais declarações do arguido foram entendidas, e bem, pelo Tribunal, como uma mera tentativa de fuga às responsabilidades, de resto não corroborada por qualquer outro elemento probatório e contrária às regras da experiência comum

    9) Ao proferir as expressões supra, o arguido atuou, inequívoca e diretamente, com a intenção de atemorizar o ofendido, colocando-o num estado de receio de que algum mal contra a sua integridade física lhe acontecesse, provocado por si (arguido), caso aquele não desistisse da queixa apresentada no processo com o número …, objetivo que o arguido só não conseguiu alcançar por circunstâncias alheias à sua vontade

    10) Pelo que dúvidas não restam sobre o preenchimento do elemento objetivo e subjetivo do tipo de ilícito por que foi condenado

    11) Andou bem o Tribunal ao não suspender a execução da pena de prisão aplicada

    12) Não se pode olvidar as elevadíssimas exigências de prevenção especial que no caso se verificam

    13) O arguido, à data dos factos, contava com 16 condenações averbadas no registo criminal. O arguido já beneficiou anteriormente por quatro vezes da suspensão da execução da pena de prisão, inclusive com regime de prova e/ou sujeição a deveres, e, não obstante, voltou a delinquir. Acresce que o arguido já foi condenado em penas de prisão efetiva, por mais do que uma vez, encontrando-se atualmente a cumprir pena no Estabelecimento Prisional

    14) A postura adotada pelo arguido em sede de audiência de julgamento (negando os factos e pretendendo fazer crer ao Tribunal que apenas se dirigiu ao estabelecimento do ofendido para lhe pedir desculpa), atestam que o mesmo não interiorizou minimamente o desvalor da sua conduta, o que também aponta desfavoravelmente à possibilidade de substituição da pena de prisão, atendendo a que a sua conduta traduz uma personalidade avessa às regras do direito

    15) Na determinação da natureza e medida concreta da pena, não restam dúvidas de que, no caso concreto, o Tribunal ponderou adequadamente e na sua justa medida todas as circunstâncias que se impunha considerar

    16) Em conclusão, foram respeitados os critérios de escolha e de fixação da medida da pena previstos nos artigos 40º, 47º, 50º, 70º, 71º, nºs 1 e 2, do Código Penal, mostrando-se a pena aplicada de forma justa, adequada e equilibrada em função dos princípios político-criminais, da necessidade e da proporcionalidade das penas e atentas ainda as finalidades destas

    Nestes termos deverá ser julgado totalmente improcedente o recurso ora interposto pelo Recorrente”

    * Neste Tribunal da Relação, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, entendendo também que o recurso deve ser julgado improcedente

    Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi apresentada...

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