Acórdão nº 16995/17.2T8LSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelLEONOR CRUZ RODRIGUES
Data da Resolução17 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Procº nº 16995/17.2T8LSB.L2.S1 4ª Secção Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça.

I 1. Relatório 1. No Juízo do Trabalho ... do Tribunal Judicial da Comarca ... AA, mediante a apresentação em 19 de Julho de 2017 do respectivo formulário, propôs acção especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento promovido pelo seu empregador “CLUBE TAP PORTUGAL”, por carta datada de 6 de Julho de 2017.

2.

Realizada a audiência de partes e frustrada a conciliação a Empregadora apresentou articulado de motivação do despedimento, invocando, em síntese, que a. foi despedida com processo disciplinar, cumprindo todas as formalidades legais, e justa causa, defendendo a regularidade e licitude da decisão de despedimento, e invocando que a mesma foi enviada à A. por carta de 29 de Junho de 2017, recebida pela A. a 29 ou 30 de Junho, e que, em 14 de Julho de 2017 enviou ao mandatário da A. a carta datada de 29 de Junho de 2017 dirigida à A. acompanhada do relatório e conclusões do procedimento disciplinar, e que por carta da mesma data, recebida pela A. em 17 de Julho de 2017, lhe deu conhecimento da missiva e anexos enviada ao seu mandatário.

3.

A este articulado respondeu a Autora apresentando contestação, impugnando, excepcionando e deduzindo pedido reconvencional, invocando, em síntese, que a decisão disciplinar tomada é ineficaz e/ou inexistente, pois quando foi enviada já o contrato de trabalho tinha cessado com a comunicação de 6.7.2017, devendo, por isso, o despedimento ser declarado ilícito. Alegou também a violação dos seus direitos de defesa e que o despedimento carece de justa causa, impugnando os factos imputados e pedindo a declaração de ilicitude do seu despedimento, com a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 25.000 a título de danos morais, a quantia de € 934,94 desde 30 dias antes da propositura da acção até ao trânsito em julgado, a quantia de € 21.036,15 caso opte pela indemnização, e a quantia de € 2.257,50 de créditos de formação profissional não ministrada durante a relação laboral, acrescidos de juros de mora.

4.

Apresentada resposta à contestação da trabalhadora, proferido despacho saneador, instruída, com a realização de prova pericial, e discutida a causa, em 2 de Março de 2019 foi proferida sentença que reconheceu a licitude do despedimento e condenou a Ré no pagamento de créditos relativos a formação profissional.

5.

Inconformada com a decisão dela apelou a Autora, vindo o Tribunal da Relação, por acórdão de 09 de Outubro de 2019, a ordenar a remessa dos autos à 1ª instância, a fim de que o tribunal recorrido procedesse à adequada fundamentação da decisão da matéria de facto.

6.

Cumprida esta determinação, em 22 de Dezembro de 2019 foi proferida nova sentença, que julgou a acção nos seguintes termos: “Nos termos e fundamentos expostos decide-se: 1. Julgo totalmente improcedente a oposição apresentada pela trabalhadora AA ao despedimento, que se considera regular e lícito e, em consequência, julgo improcedente os pedidos formulados em reconvenção de declaração de ilicitude, de reintegração e de pagamento de indemnização de antiguidade, salários intercalares e compensação por danos morais.

2. Julgo parcialmente procedente o pedido reconvencional e, em consequência, decido: a) Condenar o réu Clube TAP Portugal a pagar à autora a quantia de € 1.462,67 (mil quatrocentos e sessenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos) referentes à formação profissional e créditos relativos à mesma dos 2003, 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2013, 2014, 2015, 2016 e 2017, acrescida aquela quantia de juros de mora à taxa legal desde a data de vencimento até integral e efectivo pagamento.

3. Custas da acção principal a cargo da autora/trabalhadora.

4. Custas da reconvenção a cargo da autora/trabalhadora e empregadora/ré, na proporção de 35% e 65%, respectivamente.

[…]” 7.

Novamente inconformada com a decisão dela interpôs recurso a Autora, impugnando a decisão relativa à matéria de facto e de direito, tendo o Tribunal da Relação, em 9 de Setembro de 2020, proferido acórdão que decidiu: “[…] 5.1. julgar parcialmente procedente o recurso interposto em matéria de facto, alterando o facto 43. considerado provado e aditando aos factos “não provados” um ponto com o n.º 40.; 5.2. aditar oficiosamente aos factos provados um ponto com o n.º 6-A.; 5.3. conceder provimento ao recurso da A. AA no que diz respeito ao acto que operou a cessação do contrato de trabalho que vinculou as partes, e consequentemente, declarar que aquele contrato de trabalho cessou no dia 07 de Julho de 2017 por despedimento ilícito perpetrado pelo R. Clube TAP Portugal e condenar este: 5.3.1. a reintegrar a. AA ao seu serviço, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; 5.3.2. a pagar à A. AA as retribuições de base e diuturnidades (incluindo subsídios de férias, Natal) vencidas desde 10 de Julho de 2017 e vincendas, à razão de € 835,50 por mês, até ao trânsito em julgado do presente acórdão, a que se deverão deduzir as quantias que a. haja recebido, nesse período, a título de subsídio de desemprego - que deverão ser entregues pelo R. à Segurança Social, em conformidade com o estabelecido na al. c) do n.º 2 do art. 390º do Código de Trabalho -, acrescidas dos juros de mora computados à taxa legal desde a data de vencimento de cada prestação, até efectivo e integral pagamento, tudo a liquidar em oportuno incidente de liquidação [arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC], se necessário; 5.4. absolve-se o R. Clube TAP Portugal do pedido de indemnização por danos não patrimoniais; 5.5. no mais – créditos de formação profissional – mantém-se a sentença impugnada.

[…]”.

Pronunciando-se sobre a verificação e procedência dos fundamentos invocados para o despedimento, por aplicação do disposto no artigo 387º, nº 4, do Código do Trabalho, o acórdão recorrido concluiu nos seguintes termos: “(…) perante o juízo expresso na sentença, que sufragamos, resta-nos afirmar que o comportamento apurado da recorrente é violador de deveres de conduta inerentes à disciplina laboral – a ora recorrente violou essencialmente o dever de lealdade que se mostra previsto no artigo 128º, nº 1 alínea f) do Código do Trabalho –, culposo e grave.

Além disso, tendo presente o critério do “empregador razoável”, pode afirmar-se que constitui um comportamento apto a quebrar a confiança que constitui a base do contrato de trabalho e, nos termos assinalados na sentença, integra o conceito de justa causa, tal como este é enunciado no artigo 351.º, n.º 1, do Código do Trabalho.

Pelo que, não fora o vício formal já acima assinalado, verificado na fase do procedimento disciplinar que rege os termos da comunicação da comunicação da cessação do contrato de trabalho, seria de considerar que o despedimento a que tendia aquele procedimento se fundava em justa causa”.

8.

Deste acórdão recorre agora o Réu de revista, formulando a final as seguintes conclusões: “1 - O Tribunal recorrido, decidiu considerar que a Recorrida foi despedida em 7 de Julho de 2017, data em que nem a própria Recorrida tal alegou como sendo do invocado despedimento, no formulário com base no qual os presentes autos tiveram início e se afere também do art. 146º da contestação onde afirmou: “A. foi despedida por carta datada de 6 de Julho de 2017”.

2 - Ou seja, a Recorrida não submeteu à apreciação ao Tribunal, a regularidade e licitude do seu despedimento datando-o de 7 de Julho de 2017, mas sim em 6 de Julho de 2017, não tendo sido pedida a resolução de qualquer conflito de interesses datado de 7 de Julho de 2017.

3 - Pelo que, não podia o tribunal recorrido ter concluído, por esta razão, que o contrato de trabalho celebrado entre o Recorrente e a Recorrida cessou no dia 07 de Julho de 2017 por despedimento ilícito perpetrado pelo Recorrente.

4 - Está assim a decisão proferida, no entender do Recorrente, ferida de nulidade, porquanto, em sede da mesma, este Venerando Tribunal, conheceu de questões que não podia tomar conhecimento, nos termos do disposto no art. 668º nº 1 alínea d) do C.P.C., violando o consignado no art. 3º nº 1 e 3 e 608º nº 2 do C.P.C. – Código de Processo Civil-, aplicável ex vi art. 1º nº 2 alínea a) do C.P.T. – Código do Processo do Trabalho- e devendo em consequência ser revogada com este fundamento.

5 - O Recorrente não foi chamado a deduzir oposição sobre se no dia 7 de Julho de 2017 a Recorrida foi despedida, nem foi sobre tal exercido contraditório pelo mesmo, pelo que não pode o Recorrente deixar de vislumbrar no acórdão proferido um caso de decisão surpresa, de resto proibida no ordenamento jurídico português, instituto este que radica no disposto n.º 3 do art. 3º do CPC, 34 que visa precisamente evitar tais decisões, obrigando o Tribunal a ouvir as partes antes da prolação de qualquer decisão que as possa afectar e para a qual as mesmas não estivessem alerta, atento o estado dos autos e posições espelhadas até à decisão.

6 - Estamos perante a omissão de uma formalidade de cumprimento obrigatório, como ocorre com o respeito pelo princípio do contraditório destinado a evitar “decisões-surpresa”, o que configura a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º nº 1 alínea d) do C.P.C. e o mesmo ser revogado e conferido o direito às partes de se pronunciarem sobre o facto da Recorrida ter sido objecto ou não de um despedimento ilícito em 7 de Julho de 2017.

7 - As quantias que forem eventualmente devidas à Recorrida a título de salários intercalares e apuradas nomeadamente nos termos do art. 390º do Código do Trabalho, terão de ser objecto dos legais descontos para a Segurança Social e retenções na fonte em sede de Imposto Sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS), o que não está expresso no acórdão recorrido e traduz a sua nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º nº 1 alínea d) do C.P.C., aplicável ex vi art. 674º nº 1 alínea c), do mesmo diploma legal.

8 - Devendo o mesmo ser revogado, na parte em apreço e...

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