Acórdão nº 810/21 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 810/2021

Processo n.º 176/2021

1.ª Secção

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – A Causa

1. O A., S.A. (o ora recorrente) impugnou, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o ato de autoliquidação da Contribuição sobre o Setor Bancário (CSB) relativa ao exercício de 2013.

1.1. Por sentença de 27/02/2020, o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a impugnação improcedente.

1.1.1. Desta decisão recorreu o impugnante para o Supremo Tribunal Administrativo (STA). Das alegações de recurso consta, designadamente, o seguinte:

“[…]

16.º E o princípio da legalidade impõe, por um lado, que os impostos e respetivos elementos essenciais – incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes – sejam criados por lei (artigo 103.º, n.º 2, da CRP) e por outro lado que esta lei seja da iniciativa da Assembleia da República, isto é, sendo a própria a legislar sobre o tema (assumindo a forma de Lei) ou autorizando o governo a legislar sobre a matéria (caso em que assumirá a forma de Decreto-Lei).

17.º No caso da CSB, o artigo 141.º da Lei do OE para 2011, tendo definido as linhas gerais do regime deste imposto, remeteu para regulamentação através de portaria a definição dos seus elementos essenciais, nomeadamente a taxa e a respetiva base de incidência (cf. artigo 8.º do regime da CSB).

[…]

c) Da violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal

[…]

64.º Vale dizer, com interesse para o presente caso, que a correspondência entre a situação contabilística da sociedade e a realidade relatada nas contas aprovadas pelos seus acionistas, tem um efeito meramente confirmativo – mas não constitutivo ou modificativo – da situação da sociedade.

65.º Ora, de acordo com o número 2 do artigo 6.º da Portaria n.º 121/2011, a base de incidência da CSB “é calculada por referência à média anual dos saldos finais de cada mês”.

66.º Ou seja, a CSB liquidada em cada exercício incide, necessariamente, sobre factos tributários ocorridos e consolidados no exercício anterior.

67.º Em concreto, relativamente à CSB devida no exercício de 2013, e ora impugnada, a base de incidência é constituída pelos saldos finais de cada mês do ano de 2012.

68.º No presente caso, portanto, não pode senão entender-se que a CSB se reporta a factos tributários ocorridos até 31 de dezembro do ano anterior aquele que é devida: ou seja, que tem eficácia retroativa.

[…]” (sublinhados acrescentados).

1.1.2. No STA, o recurso foi julgado improcedente por acórdão de 02/12/2020.

1.2. O impugnante interpôs recurso desta decisão para o Tribunal Constitucional, ao abrigo das alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, tendo em vista um juízo de inconstitucionalidade relativamente a quatro questões que enunciou conforme ora se transcreve:

“[…]

15.º

Neste sentido, o recorrente esclarece que as desconformidades à Constituição da República Portuguesa que foram objeto de discussão ao longo do processo de Impugnação Judicial apresentado se prendem com:

i) a norma contida no artigo do artigo 8.º do Regime da Contribuição sobre o Setor Bancário (CSSB), aprovado pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), violar o princípio da legalidade consagrado no artigo 103.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, na medida em que o 8.º do Regime da CSSB remete para regulamentação, através de Portaria, a definição dos elementos essenciais do tributo, no sentido em que viola a determinação constitucional de que os impostos sejam criados por lei formal e material;

ii) as normas contidas no artigo 2.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), e n.º 2 do Regime da CSSB violarem os princípios da igualdade e da equivalência tributárias, concretizados no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, em conjugação com os artigos 103.º e 104.º da CRP, no sentido em que preveem uma tributação exclusiva e discriminatória do setor financeiro, limitada subjetivamente às instituições de crédito;

iii) as normas contidas no artigo 3.º, alíneas a) e b), do Regime da CSSB, em conjugação com o n.º 2 do artigo 6.º da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, violarem o princípio da não retroatividade da lei fiscal, consagrado no artigo 103.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, no sentido em que as respetivas incidência objetiva e taxa de imposto recaem sobre factos tributários já ocorridos;

iv) a omissão, na Lei 66-B/2012, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2013), nomeadamente nos seus Mapas Orçamentais, do montante exato da receita prevista arrecadar com a CSSB, violar o princípio da discriminação e a regra da especificação orçamentais, consagrados nos artigos 103.º, 105.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, e 165.º, n.º 1, al. c), da CRP, em conjugação com o artigo 8.º da LEO, aprovada pela Lei n.º 91/2001, de 20 de agosto (e, a partir de 2015, com os artigos 15.º a 17.º da Lei n.º 151/2015, de 11 de setembro), a qual tem valor reforçado, nos termos do n.º 3 do artigo 112.º da CRP.

[…]”.

1.2.1. O recurso foi admitido no STA.

1.2.2. No Tribunal Constitucional, o relator proferiu despacho com o seguinte teor:

“[…]

Notifique as partes para alegarem (artigo 79.º da LTC).

Prefigurando-se a possibilidade de não conhecimento do objeto do recurso relativamente

– às questões indicadas nos pontos “15.º/ii)” e “15.º/iii)” do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, por não corresponderem, com o recorte agora apresentado, ao enunciado de qualquer questão normativa suscitada perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (ou seja, nas alegações de recurso dirigidas ao Supremo Tribunal Administrativo) e

– à questão indicada no ponto “15.º/iv)” do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, por falta de dimensão normativa,

de tal possibilidade se dá conhecimento ao recorrente para, querendo, sobre ela se pronunciar em sede de alegações (artigo 3.º, n.º 3, do CPC, ex vi artigo 69.º da LTC), sem prejuízo de – caso se conforme com tal possibilidade e apenas nesse caso – poder desde logo restringir as alegações em conformidade.

[…]”.

1.2.3. O recorrente apresentou alegações, que culminaram nas seguintes conclusões:

“[…]

a) O recorrente, tendo procedido à autoliquidação da CSB referente ao período de 2013, e com ela não se conformando, apresentou a competente Impugnação Judicial, a qual correu os seus termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, sob o n.º de processo 2517/15.3BEPRT, e foi julgada totalmente improcedente.

b) Não se conformando com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, o ora recorrente interpôs recurso daquela decisão, para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (STA), tendo aí suscitado, exclusivamente, matéria de direito que fundamenta a inconstitucionalidade (e a ilegalidade) de determinado conjunto de normas que instituem e regulam a CSB – mormente o artigo 8.º, o artigo 2.º, n.º 1, al. a), b) e c) e n.º 2, o artigo 3.º, al. a) e b) (em conjugação com o disposto no artigo 6.º, n.º da Portaria n.º 121/2011, de 20 de março), todos do Regime jurídico da CSB, e, bem assim o artigo 252.º da Lei 66-B/2012, de 31 de dezembro e o artigo 141.º da Lei 55-A/2010, de 31 de dezembro.

c) Por Ofício de 9 de dezembro de 2020, o recorrente foi notificado do Acórdão do STA que negou provimento ao recurso por si interposto e onde as questões da inconstitucionalidade das normas relativas à CSB foi apreciada e decidida, não tendo o STA desaplicado as referidas normas por inconstitucionalidade, nem por ilegalidade.

d) Não se conformando com a decisão do STA no sentido de – apesar de esta ter conhecido a questão das inconstitucionalidades normativas suscitadas - não recusar a aplicação das indicadas normas que instituem e regulam a CSB, por inconstitucionalidade ou ilegalidade abstrata, o aqui recorrente interpôs recurso para fiscalização concreta da constitucionalidade, junto do Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, al. b) e al. f), através do Requerimento de interposição de recurso apresentado em 21 de dezembro de 2020, delimitando aí o objeto de recurso o qual se consubstancia na apreciação das questões de constitucionalidade conexas com:

(i) a norma contida no artigo do artigo 8.º do Regime da CSB, aprovado pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), violar o princípio da legalidade consagrado no artigo 103.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, na medida em que o 8.º do Regime da CSB remete para regulamentação, através de Portaria, a definição dos elementos essenciais do tributo, no sentido em que viola a determinação constitucional de que os impostos sejam criados por lei formal e material;

(ii) as normas contidas no artigo 2.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), e n.º 2 do Regime da CSB violarem os princípios da igualdade e da equivalência tributárias, concretizados no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, em conjugação com os artigos 103.º e 104.º da CRP, no sentido em que preveem uma tributação exclusiva e discriminatória do setor financeiro, limitada subjetivamente às instituições de crédito;

(iii) as normas contidas no artigo 3.º, alíneas a) e b), do Regime da CSB, em conjugação com o n.º 2 do artigo 6.º da Portaria n.º 121/2011, de 30 de março, violarem o princípio da não retroatividade da lei fiscal, consagrado no artigo 103.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, no sentido em que as respetivas incidência objetiva e taxa de imposto recaem sobre...

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