Acórdão nº 2298/19.1YRLSB.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Agosto de 2021

Data27 Agosto 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

Acordam em Conferência na 3ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, I Por Acórdão proferido nestes Autos, o Tribunal da Relação ….., na qualidade de autoridade de execução do anterior MDE que legitimou a entrega às autoridades alemãs do cidadão AA, decidiu prestar consentimento a que o referido cidadão, possa na Alemanha figurar como arguido no procedimento criminal, também por tráfico ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas a que se refere o novo MDE e que foi recebido nestes Autos em data posterior àquela entrega, nos termos do disposto nos artigos 7° n° 2 g) e n° 4 a) e d) e 8° nºs 4 e 5 da Lei n° 65/2003 de 23 de agosto, na redação dada pela Lei n° 35/2015 de 4 de maio.

II Inconformado com esta decisão, o Requerido veio interpor recurso. Da respetiva Motivação retirou as seguintes Conclusões: 1.ª – O arguido está em cumprimento de pena à ordem do processo n.º 900 js 20121/19 do Tribunal da Comarca ........, da República Federal da Alemanha, mas com promoção ........ Públic Prosecutor´s Ofice (Secção Local do Ministério Público) para que aquele veja suspensa ali a execução da referida pena para que possa ser transferido para Portugal, onde cumprirá o remanescente da mesma segundo as regras do direito penitenciário nacional; 2.ª – O arguido foi presente ao referido Tribunal em 12.02.2020, na sequência da emissão pela Justiça Alemã do Mandado de Detenção Europeu inserido no Sistema de Informação Schengen sob o n.º ........30000000.01, com data de 19.07.2019, e da sua execução pela Justiça Portuguesa; 3.ª – Aquando da sua audição por este Alto Tribunal da Relação de ….. no âmbito do processo de execução daquele Mandado a 13 de Setembro de 2019, o arguido declarou opor-se à sua entrega às autoridades alemãs e não renunciou ao “principio da especialidade”.

4.ª – Foi agora recebido nos autos um novo MDE, este emitido em 05 de Maio de 2021 pelo Juiz Presidente do Tribunal ....., ..ª Secção Penal, da República Federal da Alemanha, para procedimento criminal pelo crime de tráfico de estupefacientes; 5.ª – O referido MDE tem em vista sujeitar o arguido a procedimento criminal por factos ocorridos entre Maio de 2019 e 10 de Setembro de 2019, tendo aquele praticado esses factos em território nacional; 6.ª – Por sua vez, o arguido é filho de pais portugueses e ele próprio tem nacionalidade portuguesa; 7.ª – Assim, o que agora está em causa é uma ampliação do pedido de entrega do arguido à Justiça Alemã já apresentado com o MDE de 19.07.2019, com derrogação do consentimento do arguido e do “principio da especialidade” ao qual ele não renunciou; 8.ª – Posto isto, tratando-se de um novo MDE, emitido por um tribunal diferente e por factos distintos daqueles a que se reporta o MDE de 19.07.2019, parece-nos, salvo melhor opinião que o arguido deveria ser pessoalmente ouvido acerca daquela derrogação e bem assim para tomar novamente posição acerca do “principio da especialidade”; 9.ª – Sob pena de a Justiça Alemã poder entender que este novo MDE de 05.05.2021 lhe confere a possibilidade de sujeitar o arguido a todos e quaisquer outros processos por ventura pendentes em território alemão, uma vez que, quando ao referido principio o arguido nada disse neste outro processo de execução: 10.ª - Tendo o novo MDE sido emitido em momento posterior, por diferente autoridade judiciária e com diferente fundamentação e âmbito, não poderá deixar de se proceder à audição pessoal do Requerido nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 17.º, n.º 1 e 18.º, n.ºs 2, 5 e 6, da Lei n.º 65/2003 de 23 de Agosto, o que não se verificando, nem no momento do recebimento do MDE emitido em 05.05.2021, pelo Tribunal Regional de Tribunal ....., nem em momento subsequente, constituindo a não audição pessoal do Requerido «preterição de acto obrigatório, consubstanciando uma nulidade insanável nos termos das disposições conjugadas dos artigos 17.º, n.º 1, 18.º, n.ºs 2, 3, 5 e 6 e 21.º, da Lei n.º 65/2003, de 23 de Agosto e art.º 119.º, al. c), do Código de Processo Penal, aplicável ex vi do art.º 34.º daquela Lei e do disposto no art.º 32.º, n.º 1 da CRP e art.º 6.º da CEDH, e, bem assim, ”falta de inquérito” que decorre do facto e o Requerido não ter sido pessoalmente ouvido e, consequentemente, inteirado do conteúdo do MDE contra si requerido, consubstancia violação daqueles mesmos normativos e comando constitucional, que não se pode ter por suprido com a resposta da mandatária do arguido, sob pena de violação de um direito fundamental, integrando a nulidade insanável prevista no art.º 119.º, al. d) do Código de Processo Penal. Nulidades que devem ser declaradas, determinando a invalidade de todos os actos subsequentes ao recebimento pelo Tribunal do Estado de Execução; Sem prescindir, subsidiariamente sempre se acrescentará, 11.ª – No caso dos autos estamos perante um cidadão nacional, que praticou os factos que fundamentam a emissão do MDE em território nacional onde se encontrava, os quais são suscetíveis de integrarem a pratica de um crime previsto e punido pela legislação nacional; 12.º – Os Tribunais nacionais são competentes para julgar os referidos factos segundo a lei nacional portuguesa (artigo 4.º, al. a) do Cód. Penal e artigo 19.º, n.º 1 e 3 do C.P.P.).

13 – O que no caso não irá suceder, apenas porque o arguido, encontrando-se em território nacional aquando da sua prática, e até mesmo nos meses que se lhe seguiram, foi “deportado” para território alemão no âmbito de um outro MDE, aproveitando a Justiça Alemã, de forma abusiva, a presença daquele cidadão nacional em território alemão, contra a sua vontade à margem das suas expetativas, para o reter ali ao abrigo deste novo MDE; 14.ª – Assim “roubando a resolução do conflito à jurisdição do Estado Português”, o que, na nossa modesta opinião, constitui um autêntico “pedido fraudulento” da justiça alemã, justificando-se, por isso, a concessão de prevalência ao “principio da especialidade” como salvaguarda da própria soberania do Estado Português; 15.ª – Como é sabido, a Lei n.° 65/2003, de 23 de Agosto (lei interna de implementação da Decisão Quadro do Mandado de Detenção Europeu), consagra nos seus artigos 11.º e 12.º os fundamentos de recusa – necessária e facultativa - de execução do mandado por parte do Estado Requerido; 16.ª - Uma das situações de recusa facultativa é a ora invocada, qual seja a prevista nas alíneas h) e i) do n.º 1 do artigo 12º da LMDE, segundo a qual a execução do mandado pode ser recusada quando tiver por objecto infracção que, segundo a lei portuguesa, tenha sido cometida, em todo ou em parte, em território nacional ou a bordo de navios ou aeronaves portuguesas.

17.ª– Na nossa modesta opinião, os fundamentos de facto e de direito elencados supra nos pontos 1, 5, 6, 15, 16, 21, 22 e 23 das alegações são por si só suficientes para justificar a recusa de execução, aguardando a colocação do arguido à ordem da jurisdição nacional, nos termos referidos no ponto 1, para então as autoridades nacionais procederem criminalmente contra o arguido, se for caso disso; 18.ª - O que se requereu ao Tribunal recorrido.

19.ª – Porém o acórdão recorrido, desviando a, linha de argumentação, acaba por não fundamentar expressamente a decisão de desaplicação nas alíneas h) e i) do n.º 1 do artigo 12º da LMDE, recusando fazer operar os fundamentos previstos na lei de “recusa facultativa” do consentimento para que o recorrente possa figurar como arguido em novo processo; 20.ª – Essa omissão de pronuncia implica a nulidade do acórdão corrido, nos termos e com fundamento nas disposições conjugadas dos artigos 379.º e 425.º, n.º 4 do C.P.P. e artigo 205.º, n.º 1 da C.R.P. ; 21.ª – Nulidade essa que aqui se invoca para todos os devidos e legais efeitos; Ainda sem prescindir do que se acaba de expor, e em via subsidiária, sempre se acrescentará, 22.ª- Os fundamentos de facto e de direito elencados supra nos pontos 1, 5, 6, 15, 16, 21, 22 e 23 desta peça processual são por si só suficientes para justificar a recusa de...

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