Acórdão nº 3069/19.0T8VNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Fevereiro de 2021
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO VAZ TOMÉ |
Data da Resolução | 23 de Fevereiro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, I – Relatório 1. AA intentou a presente ação especial de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra o seu marido BB.
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Alegou, em síntese, que casou com o Réu a 1 de abril de 1979; desde setembro de 2018 deixaram de partilhar o mesmo leito; da parte da Autora não existe intenção de restabelecer a vida em comum com o Réu; o Réu pôs em causa o direito à privacidade da Autora, captando, em registo áudio e vídeo, atos da vida quotidiana da visada, e acedendo ao Facebook da mesma, tudo sem sua autorização e conhecimento.
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Foi designado dia para a tentativa de conciliação prevista no art. 931.º, n.º 1, do CPC.
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O Réu foi notificado para contestar nos termos do art. 931.º, n.º 5, do CPC.
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O Réu contestou, negando genericamente os factos alegados.
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Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação improcedente, absolvendo o Réu do pedido.
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A Autora interpôs recurso de apelação.
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O Réu respondeu às alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
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Por acórdão de 16 de junho de 2020, o Tribunal da Relação … decidiu o seguinte: “Pelos fundamentos expostos, julga-se a apelação improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.” Custas pela apelante (sem prejuízo do apoio judiciário).
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Inconformada, a Autora interpôs recurso de revista, apresentando as seguintes Conclusões: “1a A revista -excecional prevista no art° 672.° do CPC, admite o recurso para o STJ quando esteja em causa algum dos três pressupostos aí previstos: - questão com relevância jurídica para uma melhor aplicação do direito; - interesses de particular relevância social; -jurisprudência contrária no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.
2a O argumento, no acórdão de que se recorre, que o tempo de separação só é contado até ao momento da entrada da acção, sendo irrelevante o tempo já decorrido até à decisão dos factos provados, prejudica a recorrente que assim se vê forçada a um casamento que irreversivelmente não quer, violando o princípio da liberdade matrimonial.
3a O princípio da liberdade matrimonial é de relevância jurídica, havendo necessidade clara de conhecimento se a situação de facto contemporânea entre os cônjuges conta ou não para a melhor aplicação do direito ao divórcio.
4a O conhecimento dos requisitos previstos para o divórcio constitui interesse de particular relevância social para que o direito de divórcio seja concedido aos cidadãos em plano de igualdade, sendo do maior interesse com particular relevância social a sanação de divergências interpretativas no direito ao divórcio.
5a O acórdão-fundamento, cuja cópia vai em anexo pelo n°2 do art.° 637.° do CPC, proferido no mesmo quadro legislativo e sobre a mesma questão fundamental do divórcio, manda atender para conhecimento do divórcio a todos os factos decorridos até à audiência de julgamento, não consentindo casamentos forçados ("ninguém deve permanecer casado contra sua vontade").
6a O venerando acórdão, contra a recorrente, não contou o tempo decorrido até ao julgamento dos factos por considerar violador das garantias do contraditório fazê-lo; forçando-a, assim, a um casamento que há muito esta não quer e cujo tempo de separação ultrapassa mais de um ano, se contarmos o tempo até à audiência de julgamento ou até à decisão sobre a matéria de facto, errada comparação nesse acórdão com o caso de um mês de separação.
7a Deve ser revista a jurisprudência do venerando acórdão: - Entende a Autora que "Provando-se que o ano de separação ainda não estava corrido à data da entrada da petição inicial mas já estava corrido à data da sentença e à data da audiência de julgamento, não pode a sentença ignorar tal facto como não poderia ignorar se tivesse havido reatamento da vida conjugal após a entrada da petição inicial" (conclusão 2a). O n° 1 do artigo 611° do CPC permite, com algumas restrições, que na sentença sejam tomados em consideração factos que se produzam posteriormente à propositura da acção. A atender-se ao prazo decorrido até à sentença estaria a ser ampliada a causa de pedir, sem acordo da outra parte, o que além de ser vedado pelos artigos 264° e 265° do CPC ofenderia as garantias do contraditório (n° 3 do art. 3o do CPC).
8a Deve ser reiterada a melhor jurisprudência do acórdão-fundamento que manda contar todo o tempo decorrido até à instrução e julgamento dos factos, como também foi noutro acórdão, em contexto processual mais desfavorável, proferido em 3 de Outubro de 2013 pelo Supremo Tribunal de Justiça.
9a O art° 611.° do CPC, n°l,"in fine", não deixa dúvidas que, em questões de estado, a decisão deve corresponder à situação existente no momento do encerramento da discussão e não no momento de entrada da petição inicial...
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