Acórdão nº 2151/18.6T8VCT.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelGRAÇA AMARAL
Data da Resolução26 de Janeiro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça, I – relatório 1. AA., em 11 de Junho de 2018, propôs a acção declarativa para investigação da paternidade contra BB.

pedindo: a) Seja declarada e reconhecida, nos termos do disposto no art. 204º da nossa Lei Fundamental, a inconstitucionalidade material da norma ínsita art. 1817º, nº 1 do Código Civil (ex vi art. do Código Civil ), porque violadora, entre outros, dos arts.16.º, n.º1, 18.º, n.º 2 e 26.º, n.º 1, da CRP b) Seja reconhecido e decretado que o Autor é filho do réu BB.

  1. Seja ordenado o averbamento de tal paternidade e da avoenga daí resultante ao assento de nascimento do Autor; d) Ser o réu condenado em custas e demais acréscimos.

Alegou para o efeito e essencialmente: - ter nascido em …. de Agosto do ano de 1968 e encontrar-se registado como filho de CC., não constando do respectivo registo a identidade de seu pai; - ter tomado conhecimento, em Agosto de 2017, por uma amiga da família, DD., que o Réu era seu pai, facto que ao confrontar sua mãe foi por esta confirmado; - ter realizado nesse mesmo mês um teste de ADN que, segundo lhe transmitiram, confirmou a paternidade do Réu; - ter-lhe o Réu proposto, em Fevereiro de 2018, mediante o pagamento de € 270.000,00 e para evitar acção judicial com vista ao estabelecimento da filiação, assinar documento onde declarava que há mais de 10 anos tinha conhecimento de que o Réu era seu pai.

- ter assinado tal documento na convicção de que o mesmo não punha em causa o facto de o Réu ser seu pai.

  1. Após citação, o Réu contestou impugnando a factualidade alegada quanto à pretensa paternidade, excepcionando o caso julgado e a caducidade do direito de propor a presente acção (por o autor ter completado 18 anos em 24-08-1986, tendo há muito decorrido os 10 anos previstos no artigo 1817.º, do Código Civil).

    Referiu que o Autor nos últimos vinte anos o vem abordando procurando respostas quanto à sua filiação resultando o documento assinado por aquele dessas insistências por forma a evitar acções judiciais que o mesmo ameaçava propor.

    Invocou ainda abuso de direito do Autor ao propor a acção por a mesma ter por finalidade razões meramente de interesse monetário e por ter intentado acção após ter subscrito o acordo e recebido a quantia de € 270.000,00.

    Concluiu pela procedência das excepções ou, caso assim não se entenda, a sentença a proferir de estabelecimento de paternidade limite as consequências desse reconhecimento, excluindo os efeitos patrimoniais, designadamente os direitos sucessórios.

  2. O Autor respondeu às excepções pugnando pela sua improcedência.

  3. No decurso da acção, em face do falecimento do Réu, foram julgados habilitados EE., FF., GG., HH., II. e JJ..

  4. Foi proferido saneador que julgou improcedente a excepção de caso julgado e relegou para final o conhecimento das excepções de caducidade e abuso de direito.

  5. Realizado julgamento foi proferida sentença, que julgou procedente a excepção de caducidade do direito de acção, considerou prejudicado o conhecimento da excepção de abuso de direito invocada pelo Réu e absolveu os Habilitados do pedido.

  6. Inconformado o Autor apelou impugnando a matéria de facto fixada pela 1ª instância.

  7. O Tribunal da Relação …… julgou improcedente o recurso, mantendo a sentença.

  8. Interpôs o Autor recurso de revista excepcional ao abrigo do disposto no artigo 672.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Civil; subsidiariamente a alínea c) - (oposição entre o acórdão ora recorrido e o proferido por este Supremo Tribunal de Justiça de 15-11-2011, no âmbito do Processo n.º 49/07…….).

    Formulou as seguintes conclusões: “I. Vem o presente recurso de revista excepcional interposto do douto acórdão da Relação …….., notificado ao recorrente a 28/09/2020, que decidiu “(...) nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente o recurso e, em consequência, negando provimento à apelação, confirmam a decisão recorrida”.

    1. A questão de Direito que ora se traz a juízo deste Supremo Tribunal consiste em determinar se o prazo de caducidade para a acção investigatória da paternidade, previsto no art. 1817º, nº 1 do Código Civil (ex vi art. 1873º CC) é ou não conforme à nossa Constituição.

    2. A este propósito, entendeu a Relação recorrida, em síntese, que: “Mantendo-se válidos os argumentos e fundamentos desde há muito considerados e relevados em forte corrente jurisprudencial de todas as Instâncias no sentido de que a norma do artº 1817º, nºs 1 e 3, alínea c), do Código Civil – prazos para a propositura de acção de investigação de paternidade –, não enferma de inconstitucionalidade, e tendo em conta idêntico entendimento maioritária do Plenário do Tribunal Constitucional reiterado e recentemente renovado no Acórdão nº 394/2019 – que a prudência e o pragmatismo aconselham a respeitar, dada a natureza e função de tal Órgão e a sua autoridade jurisdicional nesta matéria – reafirma-se a concordância e adesão a tal tese.” (cfr. sumário do douto acórdão recorrido).

    3. No modesto entendimento do impetrante, o entendimento sufragado pela Relação a quo viola os Princípios ínsitos nos arts. 18º, nºs 2 e 3, 26º, nº 1, 36º, nºs 1 e 4, todos da Constituição da República Portuguesa.

    4. O douto acórdão recorrido – que confirmou na íntegra a decisão de primeira instância, com igual fundamento jurídico quanto à questão da inconstitucionalidade ora suscitada – manteve o desfasamento entre a verdade biológica e verdade jurídica, que se afigura inadmissível.

    5. Isto porque foi realizado, nestes autos, exame hematológico (vulgo “exame de ADN”), de fls. 59 e ss dos autos, que determinou, com 99,9999999999999% de certeza que o recorrente AA. é filho do réu-investigado BB. – v. ainda Ponto 4 dos Factos Provados da sentença de primeira instância.

    6. A prova irrefutável da paternidade do investigado, produzida nestes autos, torna injusta a manutenção de uma situação jurídica que não o respectivo vínculo.

    7. O direito fundamental ao “desenvolvimento da personalidade", constante do artigo 26º, nº 1, da CRP...

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