Acórdão nº 10416/18.0T8PRT.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2021

Data14 Janeiro 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1997_01,Supreme Court of Justice (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NOS AUTOS DE ACÇÃO DECLARATIVA ENTRE AA (aqui patrocinada por BB, adv.) Autora / Apelada / Recorrente CONTRA BANCO SANTANDER TOTTA, SA (aqui patrocinado por CC, adv.) Réu / Apelante / Recorrido I – Relatório A Autora intentou a presente acção pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 103.722,88 €, e juros desde 09ABR2015.

Alega para fundamentar tal pedido que enquanto cliente (com conta de títulos) do Réu subscreveu uma ordem de aquisição obrigação no valor de 100.000, 00 €, tendo-lhe sido em contrapartida debitado, em 09ABR2015,), na sua conta à ordem a quantia de 103.722,88 €. Que a decisão de adquirir essa obrigação assentou na informação prestada pelo Réu quanto à disponibilidade desse título (Obrigação NOVO BANCO) e suas características (dívida da responsabilidade do NOVO BANCO, com vencimento em 15JAN2018), omitindo deliberadamente, no entanto, que tal dívida havia sido transmitida para o NOVO BANCO pelo BES, através da Medida de Resolução de 03AGO2014, e que havia a possibilidade de ser retransmitida ao BES (como foi, de forma que nada veio a receber do referido título), não obstante saber que se a Autora conhecesse aquelas circunstâncias jamais subscreveria aquela obrigação e invoca anulabilidade por erro, por dolo e responsabilidade civil do intermediário financeiro por incumprimento do dever de informação.

O Réu contestou por impugnação e invocou as excepções de caducidade do direito de anulação do contrato, de caducidade da responsabilidade do intermediário financeiro e de prescrição da responsabilidade civil da entidade bancária, impetrando a sua absolvição do pedido.

A final foi proferida sentença que, considerando inoperante a excepção de caducidade do direito de anulação do contrato, improcedentes as excepções de prescrição da responsabilidade civil da entidade bancária e da caducidade da responsabilidade do intermediário financeiro, bem como que ao não transmitir os riscos reais do produto financeiro ao omitir que a obrigação foi transmitida do BES para o NOVO BANCO e que poderia ser retransmitida o Réu violou, enquanto intermediário financeiro, o seu dever de informação, julgou a acção totalmente procedente, condenando o Réu no pedido.

Inconformado, apelou o Réu tendo a Relação, depois de alterar a matéria de facto e considerando que não tendo ocorrido qualquer serviço de assessoria por parte do Réu era à Autora que competia inteirar-se das características do produto financeiro que pretendia adquiris, pelo que não se verifica o pressuposto da ilicitude, revogado a sentença recorrida e absolvido o Réu do pedido.

Agora irresignada, interpôs a Autora recurso de revista concluindo, em síntese, pela violação do direito processual ao admitir a impugnação da matéria de facto e ao alterar a mesma e por erro de julgamento, uma vez que se verificam todos os pressupostos da responsabilidade civil do Réu.

Houve contra-alegação onde se propugnou pela inamissibilidade da revista e pela manutenção do decidido na Relação.

II – Da admissibilidade e Objecto do Recurso A situação tributária mostra-se regularizada.

O requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC).

Tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC.

O Recorrido invoca a inadmissibilidade da revista na medida em que o Recorrente pretende discutir a matéria de facto, cuja apreciação está vedada ao STJ.

Regra geral o Supremo Tribunal de Justiça não conhece de matéria de facto, competindo-lhe apenas aplicar o regime jurídico que julgue adequado aos factos materiais fixados pelas instâncias (art.º 682º, nº 1, do CPC).

Se bem que não tenha de se ater exclusivamente aos factos selecionados pelas instâncias, estando antes vinculado aos factos materiais adquiridos nos autos, o que inclui os factos notórios e os factos tidos em conta, mas não enunciados no elenco factual (acórdão do STJ de 02FEV2017, proc. 200/11.8TBFVN.C2.S1).

São muito limitados (e delimitados) os casos em que, excepcionalmente, o Supremo Tribunal de Justiça pode apreciar matéria de facto (e que, verdadeiramente, apesar da imbricação com as circunstâncias factuais, são ainda ‘questões de direito’, porquanto se reconduzem à apreciação da correcção da aplicação dos complexos normativos que regulam a selecção, averiguação e fixação do circunstancialismo factual da lide), a saber: a) ocorrendo violação de direito probatório material (artigos 682º, nº 2, e 674º, nº 3, do CPC) i. por ofensa de disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova; ii. por ofensa de disposição expressa da lei que fixe a força de determinado meio de prova; b) ocorrendo violação de direito probatório adjectivo (art.º 674º, nº 1, al. b), do CPC, acórdãos do STJ de 05FEV2020, proc. 13097/17.5T8LSB.L1.S1, 20FEV2020, processos 1893/12.4TBSCR.L2.S2 e 6126/15.9T8BRG.G1.S1 e Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., págs.434-436), designadamente por mau uso que a Relação fez dos seus poderes de reapreciação da matéria de facto, i. por um uso meramente formal dos poderes de reapreciação; ii. pelo estabelecimento de presunções judiciais em oposição a norma legal, em oposição com os factos apurados ou com insuficiência dos mesmos, ou mediante patente ilogicidade; iii. pela anulação de respostas em desconformidade com as regras processuais; c) ocorrendo insuficiência da matéria de facto apurada para a correcta solução jurídica da causa (art.º 682º, nº 3, do CPC); d) ocorrendo contradição essencial na matéria de facto (art.º 682, nº 3, do CPC).

Ora insurgindo-se contra a alteração da matéria de facto levada a cabo pela Relação o Recorrente invoca precisamente a violação do direito probatório adjectivo em duas vertentes: a admissão da impugnação da matéria de facto sem que se encontrassem satisfeitos os ónus impostos pelo art.º 640º do CPC e a violação do princípio do dispositivo ao introduzir factos não alegados. Situação essa que se enquadra nas situações acima elencadas (al. b)).

Já a pretendida ‘correcção por imposição de sintaxe gramatical’ do ponto 35 do elenco factual se encontra fora do referido âmbito, pelo que nessa parte a revista não é admissível. Mas, verdadeiramente, o que aí está em causa não é qualquer alteração da matéria de facto mas a mera (e obviamente necessária) alteração da enunciação verbal do mesmo facto, contextualizada em face da alteração introduzida no ponto 34, motivo pelo qual, se necessário for, este tribunal não está impedido de intervir efectuando essa clarificação.

O acórdão impugnado é, pela sua natureza, pelo seu conteúdo, pelo valor da causa e da respectiva sucumbência, recorrível (artigos 629º e 671º do...

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