Acórdão nº 3820/17.3T8SNT.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Maio de 2020
Magistrado Responsável | ANA DE AZEREDO COELHO |
Data da Resolução | 07 de Maio de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM na 6ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I) RELATÓRIO[1] BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, SA, intentou, em 23 de Fevereiro de 2017, acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra A….
, MASSA INSOLVENTE DE A….
, representada em juízo pela Senhora Administradora de Insolvência Dra. M…, J…, I…,D..
, pedindo que sejam julgadas improcedentes doações feitas pela primeira Ré aos demais declarando-se que o Banco Autor tem direito à restituição da nua propriedade ou do usufruto dos bens doados, no que se mostrar necessário à satisfação integral do crédito que identifica.
Comprovado nos autos, a 12 de Dezembro de 2018, o falecimento da Ré A…, em 22 de Janeiro de 2019 a Ex.ma Senhora Juiz proferiu o seguinte despacho: “Atento o falecimento da R., documentalmente nos autos, declara-se suspensa a instância, cfr. art. 270º do C.P.C..
Notifique.” O despacho que se transcreveu foi notificado às partes em 23 de Janeiro de 2019.
Em 12 de Setembro de 2019, a Ex.ma Senhora Juiz proferiu a seguinte decisão: “(…) Volvidos que são mais de seis meses sem que as partes promovam o andamento dos autos, estando, portanto, parado o processo, declara-se deserta a instância nos termos do disposto no art. 281º do C.P.C..
Custas pelo A.
Registe, notifique e oportunamente arquive.
Sintra, 12.09.2019 A Juíza de Direito”.
Desta decisão o Autor interpôs o presente recurso cujas alegações concluiu como segue: 1. Pese embora o despacho de suspensão da instância já tivesse ocorrido há mais de 6 meses, o despacho recorrido, com a Refª 117216126, não estatui como cominação a previsão do Artº 281 do C.P. Civil.
-
Nunca o Tribunal a quo cumpriu o principio geral previsto no Artº 3 do C.P. Civil, de as partes de poderem pronunciar sobre a possibilidade de a instância vir a ser declarada deserta.
-
Não podia ter o Tribunal a quo presumido, sem sequer ouvir o Autor seja em que momento for, que a falta de impulso se deveu a negligência do Autor.
-
Com efeito, a interposição do incidente de habilitação de herdeiros tem de ser precedido de averiguação de quem são os mesmos e da reunião de toda a documentação certificada que possa ser junta ao requerimento de habilitação, sendo que é facto notório e de conhecimento público que as Conservatórias têm tido alargados períodos de greve que obstaculizam a obtenção em tempo dos pedidos dos utentes.
-
Pelo que caberia sempre ao Tribunal a quo, nos termos do Artº 3 do C.P. Civil, convidar o Autor a vir dizer o que tivesse por conveniente, sob pena da aplicação dos efeitos do Art 281 do C. P. Civil.
-
Pelo que deve ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro em que se convide o Autor, nos termos do Artº 3 do C.P. Civil, a vir pronunciar-se sobre a falta de impulso nos presentes autos, sob pena da aplicação do Art 281 do C.P. Civil. NORMAS VIOLADAS: 3º, 6º, 7º e 281º, todos do C.P. Civil.
NESTES TERMOS e nos melhores de Direito deve o presente recurso ser provido e, em consequência, ser revogado o despacho recorrido.
Assim decidindo farão V. Exas. Exmos. Senhores Dr. Juízes Desembargadores a costumada JUSTIÇA.
Os RR …apresentaram contra-alegações que concluíram como segue: 1º - O presente recurso vem interposto da douta sentença de fls.___, que ficou com a referência 120903194, datada de 12 de Setembro de 2019, encontrando-se confinado, como resulta do disposto nos artigos 608º, nº 2, ex-vi dos artigos 663º, nº 2, 635º, nº 4, 639º, nºs 1 a 3, 641º, nº 2, alínea b), todos do C.P.C., às questões que constam nas conclusões melhor identificadas de 1 a 6 do recurso apresentado.
-
- Com relevância factual para a decisão do caso em apreço, devem ser considerados os pontos (i) a (v) supra reproduzidos.
-
- O presente recurso baseia-se em disposição legal (nº 5 do artigo 281º do C.P.C.) e fundamentos que dizem exclusivamente respeito ao “processo de execução”, sendo que ao caso concreto é aplicável o artigo 281º, nº 1, do C.P.C..
-
- A deserção da instância depende da verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: a) A inércia de qualquer das partes em promover o andamento do processo, imputável a título de negligência (requisito subjectivo); e b) A paragem do processo por tempo superior a seis meses, a contar do momento em que a parte devia ter promovido esse andamento (requisito objectivo).
-
- “A conduta negligente conducente à deserção da instância consubstancia-se numa situação de inércia imputável à parte, ou seja, em que esteja em causa um ato ou actividade unicamente dependente da sua iniciativa, sendo o caso mais flagrante o da suspensão da instância por óbito de alguma das partes, a aguardar a habilitação dos sucessores.” (António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, em “Código de Processo Civil Anotado”, Volume I, Almedina, 2018, páginas 328 e 329) ( cfr., no mesmo sentido, Acórdão do S.T.J., datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.0TBBNV-H.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt).
-
- Era à Autora que cabia promover o competente incidente de habilitação de herdeiros, tal como resulta das disposições conjugadas dos artigos 269º, nº 1, alínea a), 270º, 275º, 276º, nº1, alínea a), e 351º, nºs 1 e 2, do C.P.C..
-
- Com o despacho de 21 de Janeiro de 2019 a Autora ficou bem consciente de que estava onerada com a iniciativa de dinamizar a instância e que a sua inércia processual por mais de 6 meses conduziria à deserção da instância, tendo sido por via deste despacho que as partes ficaram cientes que tinham de se pronunciar e requerer o que tivessem por conveniente.
-
- A sentença recorrida, que extingue os autos, é proferida não seis meses após este despacho de suspensão da instância, mas nada menos do que após cerca de sete meses e meio, o que se verificou por negligência da Autora.
-
- O Tribunal “a quo”, perante a situação em concreto, não estava obrigado a praticar mais qualquer diligência prévia à sentença de extinção da instância ( cfr., no mesmo sentido, os doutos Acórdãos do S.T.J., datado de 18-09-2018, processo nº 2096/14.9T8LOU-D.P1.S1, o datado de 05-07-2018, processo nº 5314/05.0TVLSB.L1.S2, o datado de 14-12-2016, processo nº 105/14.0TVLSB.G1.S1, e o datado de 20-09-2016, processo nº 1742/09.TBBNV-H.E1.S1, todos acessíveis em www.dgsi.pt).
-
- Os argumentos utilizados pela Autora para justificar a sua inércia são totalmente inúteis, para que fosse tomada qualquer outra decisão judicial que não fosse a verificada extinção da instância. Daí que, por força dos princípios da utilidade, economia e celeridade processual, o Tribunal “ad quem” não deve revogar decisões que, face às circunstâncias próprias do caso em apreciação e às diversas soluções plausíveis de direito, não tenham relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente.
-
- O comportamento negligente que opera para efeitos do artigo 281° do C.P.C., é , como a própria norma o indica, o comportamento processual.
-
- A Autora podia, querendo, ter evitado a deserção da instância...bastava que, em tempo, tivesse praticado o acto processual que se lhe impunha. Não o tendo feito, não pode a Autora desviar o foco cominatório para o julgador. O juiz não é parte no processo, não é sua função prestar assistência legal às partes, nem é esse o alcance que o legislador visou imprimir nos artigos 3º e 7° do C.P.C..
-
- Se violação houvesse dos referidos deveres, tal não podia ser conhecido pelo Tribunal “a quo” na medida em que esta não é uma nulidade de conhecimento oficioso e não foi, atempadamente, arguida.
-
- Ora, a Autora recorreu de um despacho quando a instância já se encontrava finda desde 26 de Setembro de 2019. Quisera a Autora atacar os efeitos da deserção por força da omissão de um dever, deveria ter sindicado pela omissão de um acto processual - o pretenso dever do Tribunal em ouvir as partes -, em momento oportuno e local próprio, nos termos do artigo 195° do C.P.C., o que, assim, lhe permitiria lançar mão do efeito ablativo da nulidade que apagaria a deserção, entretanto...
-
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO