Acórdão nº 662/19.5GBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Janeiro de 2020

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução27 de Janeiro de 2020
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1.

No processo sumário nº 662/19.5GBBCL, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Barcelos – J1, em que é arguido J. P., com os demais sinais nos autos, por sentença proferida e depositada em 07.08.2019, foi decidido, nomeadamente, o seguinte [transcrição]: Pelo exposto, o Tribunal julga provada a acusação pelo que condena o arguido J. P. pela prática de um crime de desobediência previsto e punido pelo artigo 348.º n.º 1 a) do Código Penal e artigo 152.º n.º 3 do Código da Estrada numa pena de cinco meses de prisão.

Mais se condena o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria por um período de um ano e oito meses, devendo para o efeito entregar todos os títulos de condução que possua na secretaria deste Tribunal ou no posto policial da área da sua residência, no prazo máximo de dez dias após trânsito em julgado desta sentença (cf. art.º 69.º, nºs 2 e 3, do Cód. Penal) sob pena de incorrer em crime de desobediência.

  1. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: 1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão que condenou o arguido pela prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 348º, n.º 1, alínea a) do Código Penal 292º, n.º 1 e 69º, n.º 1, alínea a) do Código Penal: na pena de cinco meses de prisão; na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria por um período de um ano e oito meses; e, no pagamento de ½ U.C. de taxa de justiça, a reduzir a metade em virtude da confissão e nos encargos.

  2. Salvo o devido e merecido respeito, a douta decisão merece a reapreciação por este Venerando Tribunal, no que tange à medida da pena e sanção acessória aplicadas.

  3. Em audiência de discussão e julgamento, o arguido pretendeu prestar declarações e confessou todos os factos que lhe foram imputados, conforme confissão que se encontra gravada em suporte digital.

  4. Efetivamente, confessou o arguido que, no dia 23/07/2019, pelas 20h20, conduzia o veículo com matrícula QC, após uma situação de violência doméstica, que deu origem ao inquérito n.º 661/19.7GBBCL, quando foi convidado a submeter-se ao exame qualitativo de pesquisa ao álcool expirado pelo militar da GNR, R. S., tendo-se recusado a tal.

  5. Ao agir como agiu, quis e sabia que, praticando tal ato omissivo de não concretização do exame de pesquisa de álcool, praticava conduta que era proibida e punida por lei.

  6. O arguido, confessou integral e sem reservas os factos que lhe eram imputados.

  7. Ora, a confissão do arguido constituiu verdadeira e imprescindível colaboração na descoberta da verdade, para além de inequívoca manifestação de culpabilidade.

  8. Assim, ao condenar o arguido, que confessou todos os factos, numa pena privativa da liberdade, o Tribunal a quo violou, por conseguinte, o disposto no artigo 71º do Código Penal, traduzindo-se a pena aplicada numa pena demasiado severa, atenta a factualidade considerada e as circunstâncias em que foram praticados os factos.

  9. O Arguido atravessa enormes problemas depressivos e alcoólicos, resultado de problemas familiares e não é uma pessoa, na sua essência, com personalidade delituosa. Praticou crimes, mas sempre num quadro de resposta, desadequada obviamente, à sua situação clínica que é bastante preocupante.

  10. Há que ter ainda em consideração: a alteração do estado emocional do arguido; a prática dos factos de forma negligente e não dolosa e a manifestação de arrependimento pela prática dos factos.

  11. Acresce que, parece-nos que a pena aplicada aos factos dados como provados deveria situar-se na pena de prisão, mas suspensa na sua execução, o que pretendemos, atendendo à situação pessoal e económica do arguido, nos termos do artigo 50º do Código Penal.

  12. Conforme supra defendido, in casu, temos de concluir que a simples censura e a ameaça de prisão são suficientes para assegurar as finalidades da punição, estando a defesa convicta de que estas situações não se irão repetir.

  13. Ora, considerando a situação, não pode o tribunal, sem mais, passar diretamente para a situação mais gravosa e privar o arguido da sua liberdade, pelo que devia o douto tribunal a quo ter-lhe concedido o benefício da dúvida e concedido a oportunidade de se ressocializar sem estar privado da liberdade.

  14. Ora, o arguido está plenamente inserido na sociedade e no seu seio familiar.

  15. Pelo que, o facto de ser condenado numa pena detentiva e efetiva, irá afasta-lo do seu meio social, obrigando-o a estar esse período longe da sociedade, o que em nada irá contribuir para a reinserção do mesmo e não lhe vai permitir adquirir a estabilidade psico-emocional de que o mesmo necessita neste momento, pois a adaptação ao contexto prisional são fatores que o irão conduzir posteriormente a maiores dificuldades de reinserção.

  16. O recorrente necessita de medidas de reinserção, mas sobretudo de não ser afastado da sua família e do seu emprego.

  17. Face à posição do arguido nestas alegações e a ser procedente este recurso, a sua pena terá de ser suspensa na sua execução, mesmo que sujeita a deveres ou regras de conduta, nos termos dos artigos 51º e 52º do Código Penal.

  18. No entanto, a douta sentença recorrida vai mais longe: como pena acessória, impõe a proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 1 (um) ano e 8 (oito) meses.

  19. Tendo, uma vez mais, o Tribunal a quo violado o disposto no artigo 71º do Código Penal, doseando imponderadamente a medida da pena concretamente aplicável, abstendo-se de tecer quaisquer considerações que fundamentem minimamente a sua decisão.

  20. Foram, assim, violados os artigos 50º, 69º, 70º, 71º, 72º e 348º do Código Penal e artigo 344º do Código de Processo Penal.

    Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA! 3.

    O Ministério Público, na primeira instância, respondeu ao recurso interposto pelo arguido, tendo concluído no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso.

  21. Nesta instância, a Exa. Senhora Procuradora - Geral Adjunta emitiu parecer de que o recurso não merece provimento, 5.

    Cumprido que foi o disposto no artigo 417º nº2 do CPP, não foi apresentada resposta.

  22. O recorrente, notificado para o efeito, deu o seu consentimento a que a pena de cinco meses de prisão em que foi condenado seja cumprida em regime de permanência na habitação.

  23. Após ter sido efetuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

    II- FUNDAMENTAÇÃO 1- Objeto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso(1) do tribunal, cfr. artigos 402º, 403º e 412º, nº 1, todos do CPP.

    O nº 1 do artigo 412º do C.P.P. estabelece que “A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.

    Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto no sentido acabado de referir, as questões a decidir são: - A substituição da pena de prisão efetiva; - Medida da pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados.

    2- A decisão recorrida 1.

    A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos, seguidos da respetiva motivação de facto [transcrição]: MATÉRIA DE FACTO PROVADA: 1. No dia 23/07/2019, pelas 20h20, a Guarda Militar Republicana foi chamada à residência do arguido, sita na Travessa … Barcelos, a fim de participar uma situação de violência doméstica, que deu origem ao inquérito n.º 661/19.7GBBCL, tendo o arguido conduzido, nessas circunstâncias de tempo e lugar, o motociclo de matrícula QC.

  24. Tendo, em tais circunstâncias, sido convidado a submeter-se ao exame qualitativo de pesquisa ao álcool expirado, pelo militar, no exercício de funções, R. S..

  25. Após lhe ter sido solicitada a realização do aludido exame qualitativo de pesquisa ao álcool expirado, o arguido consciente e deliberadamente, sem qualquer justificação, recusou-se a soprar no referido aparelho e, por conseguinte, a submeter-se ao referido exame qualitativo de pesquisa de álcool no ar expirado.

  26. O aludido R. S. - Guarda n.º … - advertiu o arguido das consequências da sua recusa.

  27. Não obstante o arguido estar ciente desta ordem e de a ter entendido, bem como do relevo criminal do incumprimento do que lhe tinha sido ordenado, decidiu recusar-se a fazer o supra referido exame.

  28. Faltando assim à obediência devida à obrigatoriedade legal de se sujeitar aos testes para despistagem do álcool.

  29. O arguido agiu ainda, de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo, além do mais, que tal conduta era proibida e punida por lei.

  30. O arguido reside em casa dos pais, tem dois filhos de 9 e 18 anos de idade, pagando uma prestação de alimentos global no valor de € 195,00, estando em dívida os últimos três meses. Toma medicação para controlo do seu temperamento nervoso e exaltado e para o seu problema de alcoolismo. Consome diariamente bebidas alcoólicas. Conduz habitualmente o motociclo identificado nos autos, que colocou em nome do seu pai, sendo que este não conduz, e ainda um veículo de marca Citroën, modelo Saxo, conduzido igualmente pela sua mãe. Já fez quatro tratamentos de desintoxicação alcoólica. Tem o 9.º ano de escolaridade e trabalha como jardineiro na Câmara Municipal ....

  31. O arguido tem os seguintes...

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