Acórdão nº 345/18.3IDLSB.L1-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 16 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelCRISTINA ALMEIDA DE SOUSA
Data da Resolução16 de Outubro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes que integram a 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: Por sentença proferida em 28 de Março de 2019, no processo comum singular nº 345/18.3IDLSB do Juízo local Criminal, Juiz 5, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, a acusação foi julgada parcialmente procedente, por provada e, em consequência, foi decidido o seguinte: a)- Absolver o arguido ______ da prática como co-autor material, sob a forma consumada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 6º, n.º 1 e 105º, n.ºs 1 e 4 do RGIT; b)- Condenar a arguida Rec..., Lda., pela prática como autora material e na forma consumada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 105º, n.º 1 por referência ao artigo 7º, n.º 1 todos do RGIT, aprovado pela Lei n.º 15/2001 de 5 de Junho, na pena de multa de 180 (cento e oitenta) dias à razão diária de €7,00 (sete euros), perfazendo um montante total de €1.260,00 (mil, duzentos e sessenta euros); c)- Condenar o arguido G..., pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105º, n.º 1 por referência ao artigo 6º, n.º 1 todos do RGIT, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros) que corresponde, caso o arguido não pague a pena de multa, voluntária ou coercivamente, a pena de prisão subsidiária reduzida a dois terços (cfr. artigo 49º, n.º 1 do Código Penal (CP)); d)- Condenar os arguidos Rec..., Lda. e G no pagamento de custas do processo fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC para cada um, ao abrigo do disposto nos artigos 513º, n.º 1, 514, n.º 1 ambos do Código de Processo Penal (CPP) e, bem assim, artigos 8º, n.º 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais, ex vi artigo 524º do CPP, reduzidas a metade atenta à confissão integral dos factos, nos termos do disposto no artigo 344º, n.º 2 c) do CPP, sem prejuízo do apoio judiciário se aplicável; e)- Consignar que não haverá ligar ao pagamento das custas criminais do processo ao abrigo do disposto nos artigos 513º, n.º 1 e 514º, n.º 1, ambos do CPP (à contrário) e, bem assim, o artigo 522º, n.º 1 do mesmo diploma legal pelo arguido R...; f)- Ordenar que, após o trânsito em julgado do presente acto decisório se: f.1) envie o boletim aos serviços de registo criminal (artigo 374º, n.º 3, al. d) do CPP) e ao registo Nacional de Pessoas Colectivas (artigo 5º, n.º 1, al. a) da Lei n.º 57/98 de 18 de Setembro e artigo 8º da Lei n.º 59/2007 de 4 de Setembro); f.2) comunique a presente decisão à Direcção Geral de Finanças de Lisboa – cfr. artigo 50º, n.º 2 do RGIT; g)- Consignar, para os devidos efeitos que, após o trânsito em julgado do presente acto decisório, as medidas de coação de termo de identidade e residência a que os arguidos Rec..., Lda. e ______se encontram sujeitos mantêm-se até à extinção da pena, nos termos do disposto no artigo 214º, n.º 1, al. e) do CPP, cessando de imediato quanto ao arguido R..., nos termos do disposto no artigo 214º, n.º 1, al. d) do CPP. Os arguidos Rec..., Lda e G por não se conformarem com esta decisão, interpuseram recurso da mesma para este Tribunal da Relação de Lisboa, no qual extraíram dos argumentos aduzidos na motivação, as seguintes conclusões: I.

– A nulidade da sentença, nos termos do disposto pelos arts. 379º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Penal (CPP), “…o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar”.

II.

– Impugnando a decisão proferida quer sobre a matéria de facto, quer sobre a matéria de direito, por se verificar contradição insanável da fundamentação e erro notório na apreciação de prova, bem como de factos incorrectamente julgados, requerendo a reapreciação da prova gravada, tudo de acordo com o disposto pelos art.ºs 410º, n.ºs 1 e 2 al.s b) e c), 411º, n.º 5 e 412º, n.º 3, 426º, 427º, 430º, n.º 1 e 431º todos do CPP.

III.

– A sentença padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.º 410º, n.º 2, al. c) do CPP), porquanto os ora Recorrentes foram condenados em autoria material, ao arguido ______de um crime de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelos artigos 6º, n.º 1 e 105º, n.ºs 1, 2 e 4 do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e à sociedade arguida Rec..., Lda., em autoria material, sob a forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelos artigos 7º, n.º 1 e 105º, n.º 1 e 4 do RGIT. IV.

– Deveriam ter sido os ora Recorrente julgados pelo Tribunal a quo em co-autoria com o arguido R... e este ter sido julgado e condenado pela mesma prática do crime que os ora Recorrentes o foram.

V.

– A sentença recorrida padece de nulidade (arts. 379º, n.º 1, al. c) do CPP), por ter deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.

VI.

– Pelo que não houve lugar ao princípio in dubio pro reo, na medida em que estamos perante a um princípio geral do processo penal relativo à prova da questão de facto, sendo que este princípio foi integralmente violado na óptica dos ora Recorrentes.

VII.

– A acusação e posterior pronúncia desrespeita por total ausência de elementos típicos e objectivos e subjectivos imputados as ora Recorrentes, impondo-se a sua rejeição, a possibilidade de suprir as deficiências da investigação, mesmo por recurso à figura da alteração dos factos – art.º 32º da CRP.

VIII.

– A estrutura acusatória do processo penal português veda ao Tribunal, órgão de julgamento; IX.

– Mesmo que tal faculdade lhe estivesse conferida, sempre estaríamos perante uma alteração substancial dos factos e que como não foram admitidos pelo Tribunal a quo, determina a nulidade da própria sentença (art.º 379º, n.º 1, al. c) do CPP); X.

– A sentença padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.º 410º, n.º 2, al. c) do CPP), porquanto os ora Recorrentes foram condenados em autoria material, sob a forma continuada ao arguido ______de um crime de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelos artigos 6º, n.º 1 e 105º, n.ºs 1, 2 e 4 do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) e à sociedade arguida Rec..., Lda., em co-autoria material, sob a forma continuada, de um crime de abuso de confiança fiscal, previstos e punidos pelos artigos 7º, n.º 1 e 105º, n.º 1 e 4 do RGIT, sendo que o arguido R... foi absolvido tendo agido em co-autoria material com os ora Recorrentes.

XI.

– O que nos leva a concluir pela inexistência e consequente nulidade da sentença por falta de fundamentação ao abrigo do art. 374º, n.º 2 do CPP; XII.

– E assim deve o tribunal ad quem julgar procedente quer a nulidade da sentença por falta de exame crítico das provas e consequente insuficiência de fundamentação da matéria provada, não havendo uma análise crítica sobre esta matéria nem o ónus da prova, para que houvesse um julgamento justo e equitativo para ambas partes.

XIII.

– À data dos factos, da falta de pagamento do Imposto sobre o Valor Acrescentado referente ao 3º Trimestre de 2017, a sociedade ora Recorrente tinha 3 sócios gerentes.

XIV.

– O Sr. P... era sócio gerente de direito, sendo que o arguido R... e o ora Recorrente ______ eram sócios gerentes de direito e de facto.

XV.

– A forma de obrigar a sociedade ora Recorrente, bastava a assinatura de um dos sócios gerentes, ou seja, do arguido R... ou do ora Recorrente G.

XVI.

– Ambos os sócios-gerentes tinham acesso à conta bancária da sociedade ora Recorrente através da internet (serviços homebanking), tendo cada um um cartão de débito da conta da sociedade em causa.

XVII.

– Se é facto que maioritariamente era o ora Recorrente ______ quem fazia as transferências e os pagamentos, também é certo, que o arguido R... tinha acesso à conta da sociedade, possuía cartão e, de igual forma, podia movimentar a conta bancária.

XVIII.

– Podendo assegurar-se, deste modo, que o arguido R... tinha acesso à conta da sociedade ora Recorrente, podendo consultar a liquidez da mesma, até porque tal como este depôs o mesmo fazia compras na Makro, deixava cheques assinados para que os funcionários pudessem pagar aos fornecedores, sendo que esta prática é reveladora que o arguido era efectivamente sócio gerente quer de direito quer de facto! XIX.

– Mandam as boas regras de gestão consultar os extratos, os saldos e a liquidez da conta da sociedade para ver se há montante disponível para esses efeitos.

XX.

– Ora o arguido R... podia em todo o tempo proceder a este tipo de consultas de saldos e sendo este empresário há mais de 20 anos, sabia e estava consciente que tinha de proceder em conformidade, ou seja proceder aos pagamentos ao Estado da sociedade ora Recorrente.

XXI.

– Ademais, ao ter acesso à conta da sociedade ora Recorrente, tinha permanentemente acesso aos pagamentos efectuados por si mesmo bem como do ora Recorrente G.

XXII.

– Bem como poderia proceder, de igual forma, ao pagamento de qualquer montante ao Estado, quer fosse à Autoridade Tributária quer fosse à Segurança Social, se assim o entendesse.

XXIII.

– Sendo o arguido R... empresário há 23 anos tinha a obrigação/dever de verificar os movimentos e o saldo da conta da sociedade ora Recorrente, se não o fez é porque era negligente na gestão da sociedade ora Recorrente e, por conseguinte, cometeu o crime p.p. de abuso de confiança fiscal.

XXIV.

– E assim foi, o caso afigura-se, ainda, mais grave, pois mandam as boas regras de gestão confirmar o saldo de uma conta antes de praticar qualquer movimento de débito da conta tal como aliás o mesmo fazia nomeadamente pagamento junto de fornecedores.

XXV.

– Se assim o fizesse poderia verificar previamente se as obrigações fiscais declarativas se encontravam cumpridas para que saber em que medida poderia fazer uso do saldo disponível, não sendo o mesmo arguido um mero funcionário como quis fazer crer.

XXVI.

– Pois tanto competia ao arguido R... como ao ora Recorrente ______ proceder aos pagamentos a fornecedores e pagamentos das...

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