Acórdão nº 218/18.0T8CTB.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | JÚLIO GOMES |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA (doravante designado por Autor) instaurou a presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, com processo especial, contra BB S.A. (doravante designado por Réu).
O Réu apresentou articulado de motivação do invocado despedimento, no qual alegou, em síntese, que o procedimento disciplinar foi válido e que o Autor cometeu factos integradores de justa causa de despedimento.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva transcrevemos: “Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar procedente a presente ação e, consequentemente: 1. Declara-se ilícito o despedimento do Autor, nos termos do disposto no artigo 381º, al. b) do Código do Trabalho.
2. Condena-se o BB, S.A., a pagar ao autor:
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As retribuições que o autor deixou de auferir desde a data do despedimento (em 24.01.2018) e até ao trânsito em julgado da presente sentença, somando as já vencidas 11.898,46€; b) As retribuições referentes a férias, subsídios de férias e subsídios de Natal que se forem vencendo em idêntico período; e c) A indemnização por antiguidade substitutiva da reintegração correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, a fixar em incidente de liquidação, nos termos e pelas razões acima referidas; 3. Condeno ainda o réu a pagar ao autor juros de mora, à taxa legal e anual de 4%, sobre as quantias referidas, a contar das datas do respetivo vencimento.
Custas da ação pelo réu, nos termos do artigo 446º do Código Processo Civil.” Inconformado, o Réu recorreu.
Foi proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação que julgou a apelação do Réu procedente, revogando a sentença recorrida, considerando lícito o despedimento e absolvendo o Réu da totalidade do pedido reconvencional, tendo, igualmente, considerado prejudicado o conhecimento da apelação do Autor.
O Autor recorreu de revista, apresentando o seu recurso com as seguintes Conclusões: 1. O Acórdão objeto de recurso decidiu erradamente a questão de fundo, porque não conheceu das questões levantadas pelo trabalhador, ao longo do processo, com a profundidade que se exigia, nomeadamente não conheceu da desproporcionada opção pela sanção aplicada e no reconhecimento da ilicitude na justa causa de despedimento.
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Deve ser julgada a ilicitude do despedimento, revogando-se o Acórdão proferido pela Relação de Coimbra, mantendo-se a decisão da Primeira Instância, desde logo porque, como se encontra provado à saciedade no presente processo, o trabalhador não praticou nenhum dos factos que constam da acusação e da decisão de despedimento, no quadro subjetivo apresentado pela entidade patronal, nem atuou dolosamente – tudo o que fez foi em benefício do Banco e dos Clientes do Banco, que ali permanecem e não o abandonaram.
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Realça-se que resultaram, também, evidentemente provados na audiência de discussão e julgamento, quatro factos essenciais à demonstração de inexistência de justa causa para despedimento: a) Todas as operações realizadas pelo A. foram enquadradas em normativos internos, o que é uma clara e inequívoca demonstração de licitude e regularidade das mesmas; b) Não se verificou qualquer ato ilícito, com gravidade suficiente para produzir e justificar a sanção de despedimento.
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Nenhuma das situações diversas configura qualquer irregularidade ou violação de regulamento interno; d) Todas as testemunhas foram unânimes em desconsiderar os factos que o R. trouxe aos autos, à exceção dos auditores. Sucede, porém, que estes são os responsáveis pela investigação e pretenderam, apenas, sustentar o seu relatório final, que resulta de meras deduções e nenhuma prova.
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O Acórdão recorrido sustenta a tese em que se fundamenta, baseado, como afirma logo na página 24, na convicção que o trabalhador tem a categoria profissional de gerente de agência, quando, na verdade, é gestor de clientes, desempenhando as funções de Gestor Prospetor de Negócios no Balcão de ..., o que torna o comportamento do trabalhador totalmente compreensível, em função das suas responsabilidades e das necessidades dos clientes e do Banco, sobretudo na consideração dos deveres de um Prospetor e da especial relação destes profissionais com os clientes, principalmente nos meios pequenos em que todos se conhecem.
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Da matéria provada, não resulta nenhum facto que indicie que o trabalhador atuou em “conflito de interesses entre as funções de gerente do Autor e as conveniências pessoais dos clientes em questão, de violação dos seus poderes de crédito, de concessão indevida de empréstimos, de descoberto não autorizado, e de movimentação, também indevida, de contas de clientes com o objetivo de regularizar saldos devedores e fazer pagamentos.” (SIC) 6. Bem pelo contrário, resultou provado, como vimos, que o trabalhador não praticou nenhum facto ilícito, com a carga axiológica que a entidade patronal lança sobre o trabalhador.
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Assim, ainda que se considerem praticados alguns factos ilícitos, o que não se aceita, mas se analisa por imperativo de patrocínio, pelo recorrente, os mesmos factos não são, só por si, suscetíveis de integrar o conceito de justa causa de despedimento, atento o princípio da proporcionalidade e adequação da sanção em relação à gravidade da infração.
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No caso dos autos não houve lesão de interesses patrimoniais sérios da empresa, não há quebra de confiança, nem nexo de causalidade, não existindo justa causa para o despedimento, nos termos previstos no art. 351.º do Código do Trabalho.
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Antes de mais, nem no processo disciplinar, nem nos factos provados em audiência, resultou a prova de que dos atos imputados ao A. tenham resultado consequências que, pela sua gravidade, determinassem a necessidade de pôr termo ao contrato de trabalho.
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Muito mais quando a entidade patronal não logrou provar a impossibilidade de manter o trabalhador ao seu serviço, o que seria fundamental para considerar o despedimento como lícito.
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Mais, o comportamento do A. não integra só por si o conceito de justa causa de despedimento, por não virem invocadas na nota de culpa consequências decorrentes do comportamento do A. que, pela sua gravidade, pudessem determinar a necessidade imediata de pôr termo ao contrato de trabalho – art. 351.º do Código do Trabalho, e acórdãos do STJ de 15/05/87, BMJ, 3767, 411 do STJ de 26/5/88, BMJ, 377, 411 do STJ de 13/01/92, BMJ, 383, 462 da Relação de Coimbra de 14/03/89, CJ, 1989, 2, 98, da Relação de Coimbra de 6/6/91, CJ; 1991, 3, 120, do STJ de 9/2/93, CJ, 1993, 1, 249, e da Relação de Coimbra 7/7/94, CJ, 1994, IV, pág. 163.
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O trabalhador, com mais de 30 anos no sector bancário, com passado impoluto, sem antecedentes disciplinares, merecia, ainda que se considerem verificados alguns factos, o que se admite, sem conceder, enunciados na nota de culpa e nos articulados posteriores, ser castigado com uma sanção tão gravosa como o despedimento? 13. Os trabalhadores bancários, sobretudo os que trabalharam para o Banco CC e, depois, para o BB, foram os grandes responsáveis pela viabilidade comercial dos Bancos, encarando de frente os problemas e ajudando os clientes na perceção dos problemas.
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Este trabalhador foi um desses abnegados bancários, que conseguiu manter clientes no BB.
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Ainda assim, foi despedido, por desempenhar, bem, sublinhe-se, a sua atividade de bancário, não tendo gerado um único dano patrimonial ou não patrimonial à entidade patronal – e conseguindo manter os clientes no banco, com base na relação de confiança que tinham consigo! 16. É, por isso, repetimos, chocante a insensibilidade social do presente despedimento: o trabalhador, exemplar, sem falhas, é atirado para o desemprego, sem direito a qualquer proteção! 17. Esse juízo de culpa é incompatível com a excecionalidade do regime do despedimento com justa causa, nos termos da proporção exigida pelos artigos 328.º e 330.º do Código do Trabalho, bem assim com a imposição constitucional de considerar excecional o despedimento...
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...nesta matéria, nomeadamente, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 26/06/2019, prolatado no âmbito do processo n.º 218/18.0T8CTB.C1.S1, é possível antever que, a final, venha a ser declarada a ilicitude do despedimento aplicado à trabalhadora, sendo assim de concluir pela pertinência......
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