Acórdão nº 464/07.1GTVCT de Tribunal da Relação de Guimarães, 16 de Novembro de 2009
Magistrado Responsável | FERNANDO VENTURA |
Data da Resolução | 16 de Novembro de 2009 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório [1] Nos autos com o NUIPC nº 464/07.1GTVCT.G1 do Tribunal Judicial de Monção, foi o arguido ... condenado pela prática de um crime de condução em estado de embriaguez, p. e p. pelo artº 292º, nº1 e 69º, nº1, al. a) do CP, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), perfazendo a multa global de €660,00 (seiscentos e sessenta euros) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, pelo período de 8 (oito) meses.
[2] Inconformado, veio o arguido interpor recurso, extraindo da motivação as conclusões Observa-se que o esforço de síntese imposto pelo artº 412º do CPP não se mostra adequadamente respeitado, mas sem justificar convite ao aperfeiçoamento.
que seguem: 1. Contrariamente ao que foi decidido na sentença em recurso, o arguido não fez confissão integral da matéria da acusação, designadamente, não confessou que a sua taxa de alcoolemia era de 1,31 gramas por litro, como, aliás, reconhecidamente, o próprio Juiz de Primeira Instância o reconheceu e expressou (está gravado) na audiência de Julgamento. Nesta parte a sentença estabeleceu como assente uma confissão inexistente, o que determina o vício enunciado no art. 410°, n.° 2 Alínea c) do Código de Processo Penal.
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À data dos factos da acusação, estava aprovada a Lei n.° 18/2007 de 17 de Maio, que revogou o Decreto Regulamentar 24/98, de 30 de Outubro e aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas mas, ainda não estava aprovada e publicada a portaria de regulamentação do controlo metrológico dos alcoolímetros, a qual só veio a ser publicada em 10.12.2007 — por via da Portaria n.° 1556/2007.
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Ou seja, à data dos factos, não estava ainda regulamentado o processo de controlo metrológico dos aparelhos de medição do álcool.
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Logo, todo o processo técnico de medição do álcool que consta dos autos não pode ser considerado validamente obtido, uma vez que há, in casu, uma ausência da regulamentação legal de medição e consequentemente, faltam os pressupostos de verificação da conduta factual e típica (a aferição metrológica observando o formalismo legal da sua formação), susceptível de censura penal ou de qualquer outra.
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Por outro lado, embora irrelevando para o caso sub Júdice, sempre é oportuno anotar que, de conformidade com o regime jurídico que viria a ser aprovado mais tarde, e já depois dos factos da acusação, concretamente, o disposto no art. 9° do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros aprovado pela dita Portaria n.° 1556/2007, os registos de medição devem conter, entre outros elementos, ..."a marca, o modelo e o número de série do alcoolímetro assim como a data da última verificação metrológica." (é nosso o sublinhado).
O aparelho "DRAGER" ALCOOLTEST 7110MKIIIP, utilizado na medição que acusou, ao arguido, a taxa de álcool no sangue de 1,31 g/I, não exibe a data da última verificação metrológica (ou no mínimo, a acusação recebida para julgamento é omissa quanto a tal facto essencial).
Também por aqui, pelo regime jurídico, cujo vazio se verificava à data dos factos da acusação, mas que em seguida viria a ser implementado, a medição de álcool efectuada ao arguido não poderia, nunca, ser considerada válida.
Da mesma sorte faltariam os pressupostos de verificação da conduta factual e típica (a aferição metrológica observando o formalismo legal da sua formação), susceptível de censura penal ou de qualquer outra.
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A sentença acabou por condenar o arguido em crime inexistente, fruto da ausência de regulamentação da Lei que instituiu o crime, mas que fez depender a sua aplicação e existência, da lei de regulamentação.
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Desta sorte, a sentença violou o disposto no art 1°, n.° 1 do Código Penal.
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A sentença, invocando o decidido no Acórdão da Relação do Porto de 21.06.1995, sustenta que a lei não estabelece qualquer proporcionalidade entre a taxa de álcool e a sanção acessória, devendo esta ser fixada pelo tribunal perante todas as circunstâncias apuradas.
Se é verdade que a lei não estabelece essa proporcionalidade, a verdade é que essa circunstância - e é uma das circunstâncias que deverá ser levada em conta - se assume, claramente, relevante.
O Julgador não fixará, seguramente, a mesma sanção acessória para quem conduzia com a taxa de 1,3 gr/litro (o caso dos autos) e para quem conduzisse com 2,00 gr/ litro ou mais Esta é, a nosso ver, uma circunstância que desmereceu a devida consideração do Tribunal.
É certo que há uma anterior condenação mas, a mesma remonta ao ano de 2000.
Por outro lado, o Tribunal não elencou qualquer outra circunstância justificativa para esta fixação em 8 meses.
Neste conspecto, entendemos que a sanção acessória de inibição de condução deverá fixar-se em menos de 8 meses.
Parecendo justo, equilibrado e prudente que a mesma seja fixada em quatro meses.
Nesta conformidade, deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença proferida, absolvendo-se o arguido, ou, subsidiariamente, reduzindo a inibição de condução nos termos sustentados.
Assim se fará Justiça.
[3] O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu, terminando com esta síntese conclusiva: 1- O arguido confessou integralmente e sem reservas os factos que lhe eram imputados conforme bem resulta das declarações por aquele prestadas em sede de audiência; 2- O facto de o arguido não saber que ia acusa a taxa exacta que acusou não significa que o mesmo não tenha confessado os factos integralmente e sem reservas na medida em que teve conhecimento da taxa que acusou aquando da aludida fiscalização, que não duvidou, sendo que o mesmo admitiu inequivocamente que havia ingerido bebidas alcoólicas, em excesso, antes de ter iniciado a condução do seu veículo automóvel.
3- Aquando da fiscalização efectuada ao arguido foram observadas todas as normas vigentes à data da prática dos factos, no que respeita às condições de utilização dos alcoolímetros (artigo 2.° do C.Penal).
4- Pelo que a taxa de alcoolemia foi validamente obtida.
5- Atendendo à determinação da medida da pena principal — às circunstâncias que depõem a favor e contra o arguido - afigura-se-nos adequada e proporcional aos factos praticados a aplicação ao arguido da pena acessória de inibição de conduzir veículos motorizados pelo período de oito meses, fixado na sentença recorrida Concluindo, dir-se-á, pois, que se nos afigura que o recurso do arguido não merece provimento, devendo manter-se integralmente a douta decisão recorrida.
[4] Neste Tribunal, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no qual considera que a sentença é nula porque omissa na apreciação de questão de validade da prova suscitada na contestação. Mais considera que o despacho que acolheu a confissão do arguido formou caso julgado e que não se verifica vício de contradição insanável da fundamentação ou contradição insanável entre esta e a decisão. Por fim, e quanto à questão que considera não ter obtido do Tribunal a devida pronúncia, entende que o recorrente não tem razão.
[5] Cumprido o disposto no artº 417º, nº2 do Código de Processo Penal, o arguido não respondeu.
[6] Foram colhidos os vistos e procedeu-se a conferência.
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Fundamentação 2.1. Âmbito do recurso [7] É pacífica a doutrina e jurisprudência Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, II, 2ª ed., Ed. Verbo, pág. 335 e Ac. do STJ de 24/03/99, in CJ (STJ), ano VII, tº 1, pág. 247.
no sentido de que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso Cfr., por exemplo, art.ºs 119.º, n.º 1, 123.º, n.º 2, 410.º, n.º 2, alíneas a), b) e c), do CPP e acórdão de fixação de jurisprudência obrigatória do STJ de 19/10/95, publicado sob o n.º 7/95 em DR, I-A, de 28/12/95.
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As questões colocadas nas motivações e reflectidas nas conclusões são as seguintes, elencadas pela ordem das respectivas consequências potenciais: i. Nulidade da sentença, por omissão de pronúncia; ii. Nulidade, por ponderação de prova inválida; iii. Impugnação da decisão em matéria de facto; iv. Erro notório na apreciação da prova; v. Ausência de tipicidade penal, por falta de regulamentação do controlo metrológico; vi. Medida da pena acessória de proibição de conduzir.
2.2. Elementos pertinentes ao recursoDa sentença recorrida [8] Para a decisão do recurso importa considerar a acta de audiência de fls. 99 a 101. Nela vem exarada a presença do arguido e do seu defensor – o mesmo que subscreve o recurso – e que o arguido «declarou pretender confessar de forma livre, integral e sem reservas, os factos que lhe são imputados, fazendo-o livre de qualquer coacção» e, depois do Ministério Público prescindir do depoimento da testemunha arrolada na acusação, foi proferido o seguinte despacho: Julgo validamente prestada a confissão pois a mesma mostra-se livre, integral e sem reservas, não havendo lugar a produção de prova, atenta a promoção do Digno Magistrado do MºPº, bem como o disposto no artº 344º, nº2 alínea a) do C.P.Penal.
[9] Nada foi dito ou requerido pela defesa do arguido, seguindo-se a inquirição das testemunhas arroladas pelo mesmo, as alegações finais e, depois de curta interrupção, a prolação da sentença, nestes termos: FACTOS PROVADOS Da audiência de discussão e julgamento, de relevante para a discussão da causa, resultou demonstrado o seguinte circunstancialismo fáctico: 1. No dia 07.11.2007, pelas 15h58, em Pousa, Monção, o arguido conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula 1618HG33, quando foi interceptado pela GNR.
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De imediato submetido ao teste de alcoolemia através do aparelho "DRAGER" ALCOOLTEST 7110MKIII P, acusou uma T.A.S. de 1,31 g/I.
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