Acórdão nº 26/09.9GBFVN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Outubro de 2009

Data07 Outubro 2009
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de Figueiró dos Vinhos, sob acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento em processo sumário, o arguido C...

, casado, residente na Rua …., em Castanheira de Pera, imputando-se-lhe a prática de factos pelos quais teria cometido um crime de desobediência, p. e p. pelo artigo 152.º-1-a) e n.º 3 do Código da Estrada, com referência ao artigo 348.º-1-a) e artigo 69.º, ambos do Código Penal.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Singular, por sentença proferida a 27 de Março de 2009, decidiu julgar a acusação procedente, por provada e, em consequência, - condenar o arguido C..., como autor material de um crime de desobediência simples, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º1, al.a) e nº 3 do Código da Estrada, com referência ao artigo 348.º, n.º1, al.a) do Código Penal, na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à razão diária de 6,00 (seis euros) euros, perfazendo o montante de € 360 (trezentos e sessenta) euros; e - condenar o arguido na pena acessória de inibição do direito de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses , nos termos do artigo 69.º, n.º1, al.c) do Código Penal.

Inconformado com a douta sentença dela interpôs recurso o arguido, concluindo a sua motivação do modo seguinte: 1. O arguido não confessou ter-se recusado a fazer o teste de sopro para detecção de álcool.

  1. O arguido não estava em condições de expelir ar suficiente para a análise de álcool no sangue, devido ao “estado deplorável” de embriaguez em que se encontrava e não se conseguia equilibrar.

  2. Ao arguido foi "solicitado" que soprasse, pelo que inexiste ordem no sentido penalmente relevante.

  3. O princípio da livre apreciação da prova tem de respeitar as regras da experiência e a motivação da convicção do Tribunal tem de ser coerente e razoável, explicando o modo de génese da mesma e, não havendo nenhum elemento probatório que sustente ter havido não acatamento de qualquer ordem, a fundamentação da matéria de facto mostra-se ilegal, ferindo mortalmente a decisão, sobretudo porque as provas apontam para sentido diverso.

  4. Não tendo sido possível fazer teste de detecção de álcool por sopro ao arguido, deveria ter sido efectuado exame ao sangue, nos termos do n.º 8 do artigo 153.º, CE, e, apenas havendo recusa neste caso, se pode falar de crime de desobediência.

  5. Deve ser alterada a matéria de facto, passando a matéria não assente que o arguido recusou ou manteve decisão de se recusar submeter-se ao teste de alcoolemia pois nenhuma prova aponta para tal, devendo dar-se como provado que “O arguido não estava em condições de expelir ar suficiente para a análise de álcool no sangue” e que “O arguido não foi transportado a unidade de saúde para ser sujeito a colheita de sangue para realização do teste de alcoolemia”.

  6. Foi violado o disposto nos artigos 348.º, n.º 1, al. a) e 69.º, n.º 1, al. c), ambos do CP, por referência ao artigo 152.º, n.º1, al. a) e 3, CE e ainda os artigos 127.º e 374.º, n.º 2, ambos do CPP, 153.º, n.º 8, CE e os 4.ºe 7.º, ambos da Lei 18/2007, de 17.05.

  7. Dadas as matérias de facto e de direito alegadas, dúvidas não subsistem que outra deveria ter sido a decisão proferida pelo Tribunal a quo: a absolvição do arguido da prática do crime pelo qual vinha acusado.

Normas violadas: artigos 348.º, n.º 1, al. a) e 69.º, n.º 1, al. c), ambos do CP, por referência ao artigo 152.º, n.º1, al. a) e 3, CE e artigos 127.º e 374.º, n.º 2, ambos do CPP, 153.º, n.º 8, CE e os 4.º e 7.º, ambos da Lei 18/2007, de 17.05.

Assim, sem menosprezo pela douta Sentença de que se recorre e sempre com o mui douto suprimento de VV. Exa.s, espera-se que seja decretada a absolvição do arguido ora recorrente, C..., dada o erro notório na apreciação da prova, ora alegada, bem como procedendo-se à renovação da prova requerida, assim se fazendo JUSTIÇA.

O Ministério Público na Comarca de Figueiró dos Vinhos respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela manutenção da douta sentença recorrida e improcedência do recurso.

O Ex.mo Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da rejeição sumária do recurso, por manifesta improcedência, com as consequências fixadas no n.º4 do art.420.º do C.P.P..

Foi dado cumprimento ao disposto no art.417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação A matéria de facto apurada e respectiva motivação constante da sentença recorrida é a seguinte: Factos provados No dia 11/03/2009, pelas 23 horas e 20 minutos, o arguido conduzia a viatura automóvel, ligeiro de mercadorias, de matrícula ......, em Sarzedas de São Pedro, Castanheira de Pêra, área desta comarca.

Então, deparou-se com uma patrulha da Guarda Nacional Republicana, cujos militares, ali presentes, solicitaram ao arguido a sua submissão a exame de pesquisa de álcool no sangue.

O arguido recusou-se a realizar o exame em causa, quer pelo método do ar expirado quer por análise sanguínea.

Não obstante ter sido advertido de que a sua actuação representava uma recusa à realização do exame e que tal implicaria a prática de um crime de desobediência, o arguido não alterou a sua atitude inviabilizando a realização daquele.

O arguido actuou com vontade livre e consciente, bem sabendo que, com a sua conduta vedada por lei, estava a recusar submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool e que, em consequência de tal, desobedecia a uma ordem legitima, regularmente comunicada, imposta por disposição legal e emanada da entidade competente.

Provou-se, ainda, que: O arguido havia ingerido bebidas alcoólicas ao jantar.

Que seguia acompanhado de uma senhora.

Antecedentes criminais: Inexistem.

Situação pessoal e económica do arguido: O arguido não tem ocupação definida, vivendo de biscates.

Vive com a esposa e um filho de 19 anos de idade.

A sua esposa recebe uma pensão de cerca de € 400,00/mês.

A casa onde habitam é sua.

Tem o 8º ano de escolaridade.

Factos não provados Com interesse para a decisão da causa, ficou por provar toda a matéria fáctica constante da contestação apresentada pelo arguido que se encontre em contradição com a acima julgada provada, e designadamente o constante dos artigos 6º (“...apercebeu-se de um veículo atrás de si”), 7º, 8º, 10º (“...tendo um deles retirado o veículo...da vala”), 13º, 14º, 19º (“Mas encontraram-no acidentado”), 22 (“...o arguido não estava em condições de expelir ar suficiente para analisar o álcool no sangue”), 23º e 26º.

Tudo o mais, ali expresso, ou é conclusivo ou não revela interesse para a boa decisão da causa.

Motivação O Tribunal respondeu à matéria de facto da forma supra descrita tendo em consideração as declarações do arguido, em audiência de julgamento, conjugado com o depoimento das testemunhas, e com a análise do teor dos documentos juntos aos autos, designadamente o auto de notícia.

Vejamos, então, começando pelo arguido.

Este começou por reconhecer ter bebido “um copo a mais”, ao jantar de 11/03/2009.

Porém, sentia-se perfeitamente capaz de conduzir. Disse, aliás, que “percebia o que andava a fazer” e que “conseguia andar bem”.

Resolveu, então, levar G... a casa.

Seguiram pela estrada nacional e, depois, por uma estrada de terra batida.

Aí, a dado passo, sentiu-se encadeado pelos faróis da viatura que seguia imediatamente atrás de si, pelo que deixou o carro “sair um pedaço para a berma, para a esquerda”. Mas, pegando nas suas próprias palavras, “não houve acidente”.

De notar que se trata de uma via estreita, onde só passa uma viatura de cada vez e que o carro não registou quaisquer danos, nas suas próprias palavras.

Foi, então, que se apercebeu que a viatura que o seguia era um veículo da GNR.

Seriam, então, umas 22 ou 23 horas.

Do que se recorda, limitou-se a acompanhou os militares da GNR até ao Posto, “só para dar a identificação”. Na sua versão, em momento algum aqueles militares, ou quaisquer outros, lhe pediram para “soprar no balão”, nem sequer lhe mostraram o aparelho.

No Posto, recorda-se perfeitamente de ter assinado “uns papéis”, que em audiência reconheceu tratar-se do expediente junto aos autos.

Seguiu-se M...

.

É militar da GNR.

Esta testemunha estava no exercício da sua actividade profissional, em serviço de patrulha naquele dia 11/03/2009. Conhece o arguido há cerca de 30 anos, nada tendo contra o mesmo. Pelo contrário, denotou, até, possuir alguma amizade pelo arguido.

A dado momento, foram alertados pelo Posto que ali tinham recebido uma mensagem anónima, informando que o arguido se aprestava para conduzir embriagado.

Foi assim que, vendo o arguido ao volante da sua viatura, o resolveram seguir.

Após algumas peripécias, feitas de encontros e desencontros, voltaram a encontrar o arguido junto da fábrica de lanifícios “Morgado”, em Sarzedas.

A viatura da GNR e a do arguido circulavam, então, em sentidos opostos.

Uma vez que se trata de via estreita, em empedrado, o arguido teve necessariamente de deter a sua marcha. Por ali havia uma zona em terra, devido a obras, mas à esquerda, atento o sentido de marcha do arguido.

Nas palavras desta testemunha, o arguido por ali não se despistou ou acidentou; limitou-se simplesmente a parar, por não poder prosseguir a sua marcha, uma vez que topou com a viatura policial.

Abeirando-se da viatura do arguido, pediu a este que apresentasse os seus documentos. O arguido reagiu, dizendo que os não tinha ali consigo.

O arguido exalava um forte cheiro a álcool.

Esta testemunha disse, então, ao arguido, para fazer “o teste do álcool”, mas este recusou-se terminantemente a fazê-lo.

Recusou, de igual sorte, fazer “o teste do sangue” Esta testemunha andou de volta do arguido cerca de meia hora, tendo advertido o mesmo que, caso persistisse na sua recusa em se submeter ao exame ao álcool, incorria na prática de um crime de desobediência.

Nem isso demoveu o arguido, que persistiu na sua recusa.

Assim, esta...

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