Acórdão nº 780/06.0TTLRA.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I - Versando o recurso sobre a matéria de direito, as conclusões da alegação devem indicar as normas jurídicas violadas e o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deveriam ter sido interpretadas e aplicadas [artigo 690.º, n. º 2, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil (CPC) — versão anterior à da revisão operada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto].

II - A falta daquelas indicações — como a falta de conclusões, a deficiência, obscuridade ou complexidade destas — dá lugar a convite para que o recorrente supra a omissão, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afectada (n.º 4 do artigo 690.º, do CPC); não equivale à falta da alegação que tem como consequência a deserção do recurso (n.º 3 do artigo 690.º do CPC).

III - Em acção em que a trabalhadora pede a reintegração (ou indemnização substitutiva) e as retribuições que deixou de auferir, alegando ter celebrado com a demandada um contrato de trabalho não escrito, que esta lhe comunicou a cessação do mesmo, e que essa comunicação configura um despedimento ilícito, constitui defesa por excepção a alegação, pela Ré, na contestação, de que fora convencionado que o contrato tinha a duração de um ano e que o vínculo cessou por caducidade.

IV - Uma tal defesa da Ré não constitui uma mera negação da existência dos factos dos quais a Autora fez decorrer o efeito jurídico invocado, factos esses aceites na contestação — celebração informal do contrato e comunicação da cessação; contém um elemento de facto novo, no sentido de que a ele não se fez alusão na petição — a estipulação verbal de uma cláusula de termo —, um contra-facto do qual decorre, na perspectiva da contestação, um efeito jurídico (caducidade) diferente do invocado na petição (despedimento), impedindo a produção deste.

V - A alegação desse facto, correspondente a uma causa impeditiva do direito invocado pela Autora, não se mostrando em oposição frontal aos fundamentos da acção expostos na petição inicial, apreciados no seu conjunto, apresenta-se como um ataque lateral ou de flanco à pretensão nela formulada, o que implicava que, em articulado de resposta, a Autora viesse a tomar posição sobre os elementos constitutivos da excepção, impugnando-os ou invocando elementos impeditivos, modificativos ou extintivos e do correlativo efeito jurídico — a caducidade do contrato.

VI - A dúvida relevante quanto à qualificação da defesa como impugnatória ou exceptiva, radica numa incerteza quanto ao carácter constitutivo ou impeditivo dos factos alegados, atenta a sua conexão com o direito invocado ou a pretensão formulada, caso em que, nos termos do artigo 342.º, n.º 3, do Código Civil, a alegação deve considerar-se reportada a factos constitutivos do direito invocado.

VII - Mostrando-se, com clareza, que o facto alegado, na contestação, é um contra-facto, que obsta à produção do efeito jurídico que se pretende fazer valer na acção, tanto basta para se considerar que ele integra defesa por excepção, sendo, para tanto, irrelevante a circunstância de não ter sido cumprida a formalidade, prevista no artigo 488.º do CPC, de, como tal, o destacar, em segmento da peça contestatória.

VIII - A omissão daquela formalidade, podendo dificultar a percepção da parte contrária, quanto à caracterização da defesa apresentada, é susceptível de ter reflexos no cabal exercício dos seus direitos processuais e, consequentemente, vir a influir no exame e na decisão da causa, desse modo se assumindo como irregularidade apta a produzir nulidade, nos termos do artigo 201.º, n.º 1, do CPC, a qual, porém, não pode ser conhecida se apenas for suscitada no recurso de apelação, caso em que deve considerar-se sanada, por não ter sido arguida tempestivamente (artigos 202.º, 203.º, n.º 1, e 205.º, n.º 1, do CPC).

IX - Não tendo a Autora produzido articulado de resposta, incumpriu o ónus de impugnar a factualidade integrante da excepção, devendo, por isso, nos termos das disposições combinadas dos artigos 60.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho e 490.º, n.º 2, do CPC, considerar-se admitida por acordo, no pressuposto de quanto a ela ser admitida confissão e a sua prova não se encontrar dependente da existência de documento escrito.

X - No regime especial de contratação de pessoal docente consignado no Estatuto da Carreira Docente da Universidade Católica Portuguesa, diversamente do que sucede no regime laboral comum, a celebração de contrato de trabalho de duração limitada não está sujeita a forma escrita.

XI - No quadro descrito nos pontos anteriores, que consequencia a inadmissibilidade, irrelevância e inexigibilidade de produção de prova (artigo 646.º, n.º 4, do CPC), é consentido ao Tribunal da Relação, alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto pelo tribunal de 1.ª instância, declarando provado o facto não impugnado, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 712.º do CPC.

XII - A tal não obsta a circunstância de a Ré não ter usado da faculdade, consignada no artigo 653.º, n.º 4, do CPC, de reclamar contra deficiências, obscuridades ou contradições da respectiva decisão ou contra a falta da sua fundamentação, visto que a reclamação ali facultada não se destina a impugnar o sentido da decisão, impugnação que se faz através de recurso, cuja admissibilidade a lei não faz depender do uso daquela faculdade.

XIII - Não configura litigância de má fé, por não preencher os pressupostos consignados no n.º 2 do artigo 456.º do CPC, a conduta processual da Ré que consistiu em invocar a seu favor, no recurso de apelação, a cominação do n.º 2 do artigo 490.º do CPC, tendo antes, na contestação, incumprido a formalidade imposta pelo 488.º do mesmo diploma, quanto à dedução das excepções.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

No Tribunal do Trabalho de Leiria, em acção com processo comum, intentada em 27 de Julho de 2006, AA demandou a Universidade Católica Portuguesa, alegando, em síntese, que foi admitida ao serviço da Ré em Setembro de 1996, por contrato de trabalho não escrito, exercendo as funções inerentes à categoria profissional de assistente convidada, tendo como local de prestação de trabalho a Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional das Beiras, Pólo de Leiria; que a ré a despediu ilicitamente; que houve violação do princípio da igualdade, uma vez que a ré em situações semelhantes procedeu ao despedimento colectivo; que toda a situação lhe provocou depressão, nervosismo, angústia e abalo moral.

Concluiu que deve a acção «ser julgada procedente por provada e em consequência: a) deve o despedimento ser declarado ilícito e a R. ser condenada nos termos dos arts. 436.º e 437.º do Código do Trabalho; b) deve a R. ser condenada a reintegrar a A. ao seu serviço, “sem prejuízo da sua categoria e antiguidade” ou em substituição, pode a A. optar por uma indemnização nos termos do disposto no artigo 439.º do Código do Trabalho; c) deve a R. ser condenada a pagar à A. a quantia a apurar em execução de sentença, a título de retribuições devidas e não pagas, bem como de outros montantes que se demonstrem devidos; d) deve a R. ser condenada a pagar à A. o montante de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais; e) deve a R. ser condenada no pagamento dos juros vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento.

» Na contestação, a Ré, para sustentar a improcedência da acção, alegou, em resumo, que o contrato em causa está sujeito a um regime especial, não se lhe aplicando a lei geral, uma vez que as normas que regulamentam tal contrato são as que constam do Estatuto da Carreira Docente da Universidade Católica Portuguesa, conforme decorre do artigo 5.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 128/90, de 17 de Abril, sendo que, de acordo com tal regulamentação, os contratos dos docentes não integrados, como é o caso da Autora, têm a duração de um ano lectivo, com o seu início em 1 de Outubro e o seu fim no dia 30 de Setembro do ano subsequente, e o último contrato celebrado com a Autora teve o seu fim em 30 de Setembro de 2005, pelo que caducou no prazo acordado; por outro lado, segundo o mesmo regime, o contrato também caduca quando se verifica a impossibilidade absoluta e definitiva de o docente prestar o trabalho a que se vinculou, pelo que, tendo o pólo de Leiria encerrado no ano de 2005, por falta de alunos, sempre o contrato cessaria por caducidade. Não violou o princípio da igualdade, uma vez que a Autora se manteve em funções até ao encerramento do pólo de Leiria, sendo certo que a promoção do processo de despedimento colectivo foi feita indevidamente.

Saneada e instruída a causa, veio a ser proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu declarar «ilícito o despedimento com que a Ré Universidade Católica Portuguesa sancionou a autora AA» e condenar a Ré a pagar-lhe: «

  1. Uma indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base e diuturnidades [€ 1.263,04] por cada ano completo ou fracção de antiguidade, desde a admissão ao seu serviço [Setembro de 1996] até ao trânsito em julgado desta sentença, nos termos do artigo 439.º do Código do Trabalho.

  2. As quantias referentes às retribuições [€ 1.263,04] que deixou de auferir desde 27 de Junho de 2006 até ao trânsito em julgado desta sentença, nos termos do artigo 437.º do Código do Trabalho.

  3. A quantia de dois mil e quinhentos euros a título de danos não patrimoniais.

  4. Relativamente às quantias referidas em a) e b) os juros à taxa legal desde a citação até efectivo e integral pagamento e à quantia referida em c) juros de mora a partir da prolação desta sentença.

» 2.

Apelou a Ré, a pugnar pela revogação da sentença, pedindo a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto atinente à alegada precariedade (anualidade) do vínculo contratual, com fundamento na falta de resposta ao que, a propósito, aduzira na...

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