Acórdão nº 1880/16.3T8BJA.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | ACÁCIO DAS NEVES |
Data da Resolução | 09 de Abril de 2019 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA, S.A., intentou ação declarativa comum contra BB, pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe a quantia de € 1.223.179,87 (um milhão, duzentos e vinte e três mil, cento e setenta e nove mil e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora contados à taxa legal desde a citação até integral pagamento.
Fundamentou tal pedido no invocado direito de regresso, ao abrigo do disposto no art.º 27.º, n.º1, al. c) do DL 291/2007, de 21 Agosto, alegando para o efeito e em resumo que o valor cujo pagamento peticiona corresponde ao valor das indemnizações pagas aos sinistrados passageiros, e familiares, que seguiam no veículo acidentado (despiste), seu segurado, que era conduzido pelo réu sob influência de álcool.
O réu contestou, defendendo que o acidente não resultou de imperícia ou negligência suas, mas sim de encadeamento e gravilha existente na estrada. Mais alegou que o art.º 27.º do DL 291/2007, de 21 de Agosto, exige a prova, a cargo da seguradora, de que a alcoolemia de que o segurado é portador foi causal do acidente e ainda que as lesões sofridas pelos passageiros do veículo foram agravadas pela circunstância de nenhum deles ter o cinto de segurança colocado no momento do acidente - razão pela qual apenas poderá responder em função do seu grau de contribuição para os danos e na medida em que as indemnizações pagas se revelem justas e equitativas.
Realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença, nos termos da qual a ação foi julgada totalmente procedente, sendo o réu condenado no pagamento à autora da peticionada quantia de € 1.223.179,87 (um milhão, duzentos e vinte e três mil, cento e setenta e nove euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Na sequência e no âmbito de apelação do réu, a Relação de Évora, julgando parcialmente procedente o recurso, condenou o réu no pagamento à autora, apenas, da quantia de € 856.225,90 (oitocentos e cinquenta e seis mil, duzentos e vinte e cinco ml euros e noventa centavos), acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
Inconformado, interpôs o réu/apelante o presente recurso de revista (subsidiariamente, revista excecional), no qual formulou as seguintes conclusões: Relativamente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto: 1ª - O presente acórdão da Relação de Évora, objeto de recurso, veio confirmar no que respeita aos factos “constitutivos do direito de regresso da seguradora a posição da Ma. Juíza “a quo", ou seja: a) ser o condutor culpado pela ocorrência do acidente (tinha dado causa ao acidente); b) ser o condutor portador de uma TAS em medida superior ao legalmente permitido. 2ª - Tal posição repousa na interpretação literal decorrente da alteração da redação conferida pelo art. 27° nº 1 al. c) do DL 291/2007 à pretérita da al. c) do artº 19° do DL 522/85 de 31 de Dezembro, cujo teor foi entendido por numerosa jurisprudência no sentido de que, para procedência do direito de regresso das seguradoras, estas teriam de provar o nexo de causalidade entre a condução do efeito do álcool e o acidente.
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- Tal interpretação maioritária levou a que tivesse sido proferido o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do S.T.J. em 28/05/2002 que, confrontado com as três correntes jurisprudenciais principais existentes sobre a matéria, veio pugnar pela maior justeza daquela que exigia que as seguradoras, para efetivação do seu direito de regresso, provassem o nexo de causalidade entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, dando assim maior consistência à tese que, até recentemente, dominou de forma notória, criando maior estabilidade jurisprudencial. Porém, 4ª - Mesmo após a alteração legislativa do DL 291/07 e a introdução pelo mesmo de “segmento normativo, muito mais objetivado”, não deixou de ser seguida, embora em menor proporção, a tese propugnada pelo A.U.J. de 28/05/2002, que continua, afinal, a coexistir. Os acórdãos do S.T.J. de 15/11/2007 (07B2998) wwwdgsi.pt e de 27/10/2009 (www.dgsi.pt), bem como o acórdão da Relação de Évora de 30/05/2010 (Procº 351/08.6TBPTM.E1) são exemplo dessa existência. Todos posteriores ao DL 291/2007, de 21 de Agosto.
E como bem se refere no primeiro dos Acs. STJ, “se é facto notório que a embriaguez é causa de muitos acidentes de viação, já não é notório que todos os condutores embriagados sejam os causadores dos acidentes em que intervieram” (Ac. STJ de 15/11/2007).
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- O certo é que a alteração legislativa do DL 291/2007, de 21/08, tem vindo a ter como consequência, em grande parte dos casos, “dispensar a seguradora do ónus da demonstração de um concreto nexo causal entre o erro ou falta cometido pelo condutor e a situação de alcoolemia envolvendo o condutor alcoolizado…” - Ac. do STJ de 6/04/2017 (Procº 658/14.9tbvlgp1.s1). O facto é que, 6ª - As seguradoras conseguiram o seu “desideratum”, beneficiando claramente do estabelecimento desta presunção legal, deixando de estar oneradas com a prova efetiva do facto a que conduz essa presunção, nos termos do artº 350° nº 1 do C. Civil (o acórdão inclui uma declaração de voto do Exmº Sr. Conselheiro Silva Gonçalves (nota de pé de página do acórdão recorrido).
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- A nova redação do artº 27° nº 1, al. c), suscetível de criar situações de injustiça relativa, ao eliminar qualquer ónus de prova por parte da seguradora e transferindo-o para o condutor do imóvel que passou ele, afinal, a ter de ilidir a presunção legal decorrente da excessiva objetivação do segmento normativo trazido pelo DL 291/2007 que pode levar a uma solução demasiado “automática”, passe a expressão, na subsunção da definição da conduta culposa do condutor no acidente.
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- Infelizmente são muitos os casos de acidente graves causados em circunstâncias de etilização dos condutores, mas tal não pode levar à ostracização do condutor, presumindo-o sempre culpado só pelo facto de lhe ser detetada uma taxa de álcool superior à legalmente autorizada...
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