Acórdão nº 34/17.6GTCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Março de 2019

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução27 de Março de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência, na 4ª Secção (competência criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra.

I 1.

Nos autos supra identificados, foi o arguido …, casado, distribuidor, nascido a 23.08.1954, filho de … e de …, natural da freguesia de (...) , concelho de , e residente na Rua … (...) , , Julgado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal tendo, a final, sido absolvido.

  1. Não se conformando com esta decisão, dela recorre o Ministério Público, que formula as seguintes conclusões: 1. Verifica-se o vício da sentença a que se refere o art. 410º/2 a) do Código de Processo Penal: A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada 2. Ora, resulta, claramente, quer das citadas normas do Código da Estrada, quer das normas do Regulamento de Fiscalização, que a regra é que a detecção de álcool no sangue seja efectuada através de teste ao ar expirado, efectuado com os alcoolímetros.

  2. Excepcionalmente, a fiscalização da condução sob influência do álcool faz-se através de análise de sangue, de que é recolhida uma amostra em estabelecimento público de saúde.

  3. Assim acontecerá nas seguintes situações: • A)- em caso de impossibilidade de efectuar o teste em analisador quantitativo; • B)- no caso de contraprova, quando o examinando a requeira e opte pelo método da análise de sangue.

  4. No nosso caso, pedido de contraprova não houve.

  5. Contudo, importaria apurar adequadamente se se verificou alguma situação enquadrável na impossibilidade de realização do teste pelo método do ar expirado.

  6. In casu, resulta dos autos que o arguido foi interveniente num acidente de viação quando conduzia na via pública um veículo ligeiro de passageiros. 8. Do acidente, resultaram para o arguido ferimentos, tendo sido encaminhado para o CHUC, a fim de lhe serem ministrados os cuidados médicos necessários.

  7. E, por tal motivo (facto 3, 1ª parte), não foi feito no local o exame de ar expirado.

  8. Já no hospital, onde se encontrava a receber tratamento médico, foi realizada no arguido colheita de sangue para posterior análise e pesquisa de álcool no sangue.

  9. Temos assim recolha de amostra de sangue para análise, a condutor sinistrado, transportado a um estabelecimento de saúde, ao qual desconhecemos se foi diagnosticada a impossibilidade de realizar teste de pesquisa de álcool no ar expirado.

  10. O tribunal a quo discorre sobre isso na motivação de facto da sentença mas não extrai nos factos provados o resultado dessa lucubração (é dos factos que se retira ou não a perfectibilização dos elementos objectivos e subjectivos de um tipo de crime).

  11. Porque é que se passou, no CHUC, logo para o exame de sangue, sem passar pelo teste ao ar expirado? 14. Qual seria o real estado de saúde do sinistrado? 15. Da decisão recorrida decorre tão-só que o arguido foi interveniente em acidente de viação e que lhe foi efectuado no CHUC um exame de pesquisa de álcool no sangue, adiantando-se ainda no FACTO 3 que «a recolha de sangue não foi precedida de teste de ar expirado, por no local o arguido/condutor se encontrar a ser assistido por equipa do INEM, devido aos ferimentos resultantes do acidente, após o que foi conduzido ao CHUC, onde apenas foi pedida autorização médica para a colheita de sangue que foi concedida».

  12. Ora, não resulta apurado qualquer facto que permita concluir se tal exame de sangue ocorreu «por não ter sido possível a realização» de «exame de pesquisa de álcool no ar expirado». 17. Aquele «apenas» não significa que se tenha olvidado necessariamente essa fase do teste de ar expirado (pode ter sido logo ponderado que era caso de impossibilidade de feitura do mesmo).

  13. O apuramento daquela matéria constitui elemento pertinente à validação do exame de sangue realizado, na medida em que apenas a impossibilidade de realização de exame de pesquisa de álcool no ar expirado torna válido e, por isso, eficaz, o respectivo exame de sangue, determinando a condenação do arguido (o tribunal preferiu o caminho mais fácil, absolvendo o arguido sem se apoiar, para tal desiderato, nos devidos fundamentos legais, sendo certo que só poderia absolver, desde logo, o arguido caso concluísse que não estávamos perante uma clara situação de impossibilidade de realização, em sede hospitalar, do exame de pesquisa de álcool no ar expirado, o que não resulta do acervo dos factos provados). 19. Tal não consta, contudo, da acusação, nem da decisão recorrida, e deve ser objecto do devido contraditório, afigurando-se ainda necessário saber, nomeadamente, porque é que não foi possível efectuar no próprio hospital a pesquisa quantitativa de álcool no ar expirado, matéria factual que excede o âmbito de competência desse venerando Tribunal da Relação, justificando o reenvio parcial do presente processo ao Tribunal recorrido.

  14. Haverá que se justificar, na ribalta do julgamento, a excepcionalidade que pudesse justificar o afastamento da determinação da TAS através do método de pesquisa no ar expirado. 21. Só assim se poderá considerar inválida a perícia efectuada à amostra de sangue recolhida ao recorrente (se é detectável a capacidade de o visado ser submetido a exame menos intrusivo, não se justifica a opção por outro mais gravoso, no caso, o exame ao sangue, mais restritivo de direito individuais), o que conduziria à sua absolvição, por ora e desde já prematura, face aos factos que se dão por apurados.

  15. O apuramento daquela matéria factual e subsequente aditamento da decisão de facto em conformidade constitui uma alteração não substancial dos factos da acusação uma vez que o referido aditamento nem representa a «imputação ao arguido de um crime diverso», nem implica uma «agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis». 23. Neste termos, uma vez que o Tribunal recorrido não apurou se o exame de sangue foi efectuado por impossibilidade de realização de exame quantitativo de pesquisa de álcool no ar expirado ou muito embora a possibilidade de tal exame, e tal revela-se determinante para o desfecho dos autos, é nosso parecer que há insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, devendo, por isso, ser anulada a decisão recorrida e os autos reenviados à 1.ª instância para nova decisão, antecedida de novo julgamento, tão só para apurar em concreto se existiu ou não na situação vertente a apontada possibilidade (apurando-se o real estado de saúde do sinistrado), conforme disposto no artigo 426.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (aí se dispõe que «o tribunal de recurso determina o reenvio do processo» quando «existirem os vícios referidos nas alíneas do n.º 2 do artigo 410.º»).

  16. O novo julgamento deve ser realizado pelo Tribunal que se mostrar competente nos termos do artigo 426.º-A do Código de Processo Penal, com suprimento do vício apontado e prolação da respectiva decisão de direito em ordem ao desfecho do caso. 25. Foram violados os artigos 127º e 410º/2 a) do CPP.

    Deve, assim, em consequência, ser revogada a douta sentença proferida e substituída por outra que a anule e determine o reenvio do processo para nova decisão, antecedida de novo julgamento, a efectuar pelo Tribunal competente nos termos do artigo 426.º-A do Código de Processo Penal, tão-só para apurar concretamente se o exame de sangue foi efectuado no CHUC por impossibilidade de realização de exame quantitativo de pesquisa de álcool no ar expirado, proferindo-se subsequentemente a respectiva decisão de direito em ordem ao desfecho do caso.

    TERMOS em que se pede a procedência do presente recurso, com as legais consequências, desta forma se fazendo a costumada e pretendida J U S T I Ç A! 3. Respondeu o arguido, dizendo: 1-Da contraposição entre os elementos objectivos do tipo legal e a matéria da acusação é manifesta a conclusão de esta não contem os elementos necessários e suficientes para integrar estes elementos objectivos, ou seja, não é apta a integrar o ilícito penal que pretende configurar e imputar. Na...

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