Acórdão nº 64/15.2 PTFAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 21 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA LEONOR BOTELHO
Data da Resolução21 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – RELATÓRIO 1. 1. – Decisão Recorrida No processo com o n.º 64/15.2 PTFAR do Juízo Local Criminal de Faro – J2 do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o arguido F, mediante acusação do Ministério Público, foi submetido a julgamento pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo art.º 348.º, n.º 1, alínea a), do C. Penal, por referência ao art.º 152.º, nº 3, do C. Estrada.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, a final, condenou o arguido pela prática do crime de desobediência simples, p. e p. nos termos dos art.º 348.º, n.º 1, alínea a), do C. Penal, por referência ao art.º 152.º, nº 3, do C. Estrada, na pena de 70 (setenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,50, o que perfaz o total de 455,00 €, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor, prevista no art.º 69.º, n.º 1, do C. Penal, por um período de 4 meses.

Interposto recurso daquela sentença, veio a mesma a ser confirmada por acórdão de 15.09.2016 deste Tribunal da Relação de Évora, transitado em julgado em 21.10.2016.

Por requerimento de 27.09.2016, requereu o arguido que o tempo em que a carta esteve "na posse" do Tribunal fosse considerado para fins de cumprimento da pena acessória de proibição de condução em que fora condenado, pedido que foi indeferido por despacho de 09.06.2017.

  1. 2. – Recurso 1.2.1. - Inconformado com essa decisão, dela recorreu o arguido pugnando pela sua revogação e substituição por outra que leve em conta o cumprimento da sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor antes do trânsito em julgado da sentença, que voluntariamente o requerente já cumpriu, com carta de condução entregue na secretaria do tribunal e que esta manteve junta nos autos, até decorrer o período em que foi condenado.

    Finaliza a sua motivação com as seguintes conclusões: «1. Em 06.07.2015 o requerente foi condenado pela prática de um crime de desobediência, p. e. p. no art. 348° n? 1 al. a) do C.P., com referência ao artigo 152° n° 1 al. a) e 3 do Código da Estrada, na pena de 70 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 4 meses, nos termos do disposto do art. 69° n° 1 al, c) do C.P.

  2. Inconformado com a sentença proferida interpôs recurso o qual veio a ser considerado totalmente improcedente, mantendo integralmente a sentença recorrida.

  3. Em 20.01.2016 o arguido foi notificado do parecer do Ministério Publico do Tribunal da Relação de Évora e acatando a posição daquele Ministério Publico, sem esperar pelo acórdão final, procedeu à entrega da guia de substituição de documento da titulo de condução na Secretaria do Tribunal a quo em 22.02.2016.

  4. O Recorrente conformou-se com a prática que havia cometido do ilícito criminal e com a entrega da Guia de substituição da carta de condução declarou expressamente que aceitava a proposta do Ministério Público do Tribunal a quem e que, tacitamente, desistia do recurso apresentado; 5. Com a entrega voluntária da carta de condução na Secretaria do Tribunal a quo o requerente iniciou o cumprimento da sanção acessória de inibição de conduzir; 6. Durante o período em que carta de condução do requerente esteve apreendida pelo Tribunal dos autos, (4 meses), o Recorrente esteve sempre convicto de que estava a cumprir a sanção acessória de inibição de conduzir; 7. Só quando o Recorrente requereu para lhe ser entregue o documento que o habilita a conduzir veículos automóveis em 30.06.2016 é que foi confrontado com a posição vertida no douto despacho junto a folhas 398, 395 e 397 [ref" 102378417) no qual a Mma. Juiz do Tribunal a quo refere que "inexiste sentença a cumprir pelo requerente!, sendo incompreensível e de nenhum feito a entrega nos autos da carta de condução."; 8. Em momento algum anterior aquela data a Mma. Juiz do Tribunal a quo veio alegar que o seu poder jurisdicional se encontrava esgotado sobre a matéria em questão, antes pelo contrario, durante 4 meses o Tribunal a quo manteve-se na inercia perante o "depósito" da guia da carta de condução do requerente.

  5. Aquando efetuou a entrega da guia da carta de condução o requerente entregou requerimento no qual se lê que a mesma visa o cumprimento da douta sentença do processo à margem referenciado.

  6. O requerente voluntariamente aceitou a proposta do Ministério Público do Tribunal a quem e interiorizou que se tratava da condenação definitiva e como tal entregou a carta de condução na Secretaria do Tribunal a quo, onde ficou apreendida junta aos autos, a partir de 22.02.2016 até perfazer 4 meses.

  7. A Secretaria praticou um ato de aceitação da carta de condução, quando em bom rigor o não devia, pelo que 12. O Requerente não pode ser prejudicado pelos erros ou omissões dos atos praticados pela Secretaria, conforme artigo 157°, n° 6 do Código de Processo Civil, 13. O Requerente não pode cumprir duas vezes a sanção acessória, sob pena de violação do princípio non bis in idem, consagrado no artigo 29°, nº 5 da Constituição da República Portuguesa.

  8. Detetado o erro deveria a secretaria do Tribunal a quo ter notificado o requerente para devolver a Guia da carta de condução, sem necessidade de requerimento a solicitar que se desse por cumprida a sanção acessória e a devolução da carta de condução.

  9. A secretaria tinha conhecimento de que o processo se encontrava em fase de recurso e que "a sua entrega não iria produzir nenhum efeito pois o processo ainda não transitara em julgado"; 16. A secretaria devia ter recusado ou advertido o recorrente para não proceder à entrega da mesma ou suas consequências.

  10. Em 27.09.2016 o requerente apresentou requerimento no qual solicitou que, pese embora tivesse interposto recurso, havia procedido à guia de substituição da sua carta de condução na secretaria do Tribunal a quo e que esta ali se manteve pelo período em que estava inibido de conduzir, ou seja, 4 meses, e requereu que o tempo em que a carta esteve na posse do Tribunal fosse considerado para fins de pena acessória dando-se apenas como em falta o cumprimento da pena de multa.

  11. Em 13.12.2016 o Tribunal a quo enviou Sentença transitada em julgado em 21.10.2016 respeitante ao processo à margem identificado para a ANSR - Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária na qual, no que diz respeito ao cumprimento da inibição de condução informa aquela entidade que "A carta de condução do Requerente foi entregue neste tribunal em 22.02.2016 e devolvida em 22.06.2016, encontrando-se o período de inibição totalmente cumprido." (sublinhado nosso) 19. Da comunicação efetuada à ASNR conjugado com o requerimento apresentado pelo Requerente em 27.09.2016, concluiu-se que o Tribunal a quo contabilizou o tempo em que a guia da carta de condução esteve junto aos autos para cumprimento do período de inibição.

  12. Em 20.06.2016 foi o requerente notificado pela GNR de Loulé do despacho ora recorrido no qual, a Mma. Juiz do Tribunal a quo considera que o seu poder jurisdicional se encontra esgotado desde 30.06.2016; 21. No mesmo despacho ora recorrido o Tribunal a quo, indevidamente, determina a apreensão da carta de condução nos termos do art. 500° nº 3 do CPP e que se "Desfaça de imediato a informação prestada à ANSR quanto ao cumprimento do período de proibição de conduzir".

  13. A manter-se a posição defendida no douto despacho o Recorrente é punido duas vezes cumprindo oito meses de inibição de conduzir e não quatro; 23. O Recorrente não pode ser responsabilizado por o Tribunal ter aceite a entrega do documento em causa dando a entender ao Recorrente que tudo estava bem; 24. O Recorrente não pode acatar o despacho contraditório proferido pelo Tribunal a quo que visa "desfazer" as informações que o mesmo Tribunal a quo prestou anteriormente, sendo que o próprio admite que o seu poder jurisdicional se encontra esgotado para tal; 25. O Recorrente já cumpriu a sanção acessória, o que a não ser contabilizado implica uma dupla condenação do Recorrente pelo mesmo crime; 26. A condenação do requerente a cumprir novamente a sanção acessória de proibição de conduzir veículos com motor é um "abuso de direito" por parte do Tribunal a quo 27. A decisão proferida viola, assim, o disposto nos artigos 40.° e 69.°, do Código Penal.

  14. Os art. 69.°, n.º 3, do CP e o art. 500.°, n.º 2, do CPP, ao estipularem que a licença de condução fica retida na Secretaria do tribunal pelo período de tempo que decorrer a proibição e que decorrido esse período é devolvida ao titular, têm em vista o controle, da legalidade e da transparência do cumprimento da sanção acessória.

  15. Estes requisitos verificaram-se.

  16. O requerente já cumpriu o período de 4 meses de proibição de conduzir veículos com motor, ficando afetado de forma real e efetiva no seu direito de conduzir, não podendo ser culpabilizado pelo cumprimento antes de transitar a...

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