Acórdão nº 55/2017.9GBLGS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 20 de Dezembro de 2018

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução20 de Dezembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo: 55/17.9GBLGS Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: Nos autos de Processo Comum perante Tribunal Singular que corre termos no Tribunal de Faro – Lagos, 1 – foi acusada e condenada a cidadã alemã BB pela prática em autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punível pelos arts. 292º, nº 1 e 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal: - na pena de quarenta dias de multa à razão diária de seis euros, no montante total de duzentos e quarenta euros: - na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de três meses nos termos do disposto no art.º 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal; - nas custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em meia unidade de conta nos termos do disposto nos art.º 8º, nº 9 do Regulamento das Custas Processuais, por referência à tabela III anexa e 344.º, n.º 2, alínea c), 513º e 514.º, todos do Código de Processo Penal.

- mais determinou que, após trânsito, a arguida no prazo de dez dias procedesse à entrega da licença de condução de que seja titular e portadora na secretaria deste Tribunal ou em qualquer posto policial, nos termos do disposto nos art.º 69º, nº 3 do Código Penal e 500º, nº 2 do Código de Processo Penal.

* Inconformada com uma tal decisão dela interpôs a arguida o presente recurso pedindo a sua procedência, com as seguintes conclusões, após convite à sua apresentação: I – Desde a primeira intervenção no processo que a Recorrente refere expressa e inequivocamente que desconhece a língua portuguesa; II – Não existe nos autos qualquer (cópia de) documento da Recorrente que não seja emitido pelas autoridades competentes do seu país de origem – Alemanha.

III – Que se colhe dos autos, de modo algum a Recorrente foi submetida a qualquer teste ou prova sobre a sua aptidão escrita ou oral de língua diferente da sua.

IV – A não notificação da acusação à Recorrente na língua alemã, preenche nulidade insanável. Para cúmulo do absurdo, mesmo tendo o Mm.º Juiz a quo um tradutor em audiência de julgamento PAGO pela Recorrente, nem assim deu a conhecer à Recorrente na sua própria língua de que factos e incriminações era acusada; V – A não notificação da Arguida para o seu próprio julgamento em língua alemã, é igualmente omissão processual cominada com nulidade insanável.

VI – Considerando que o TIR que fizeram de conta que a Arguida prestou, não se encontra na língua alemã, obviamente que nunca se podia considerar a Arguida notificada com mera declaração de depósito em morada diferente da que esta declarou em audiência de Julgamento, em língua alemã.

V – A não entrega à Recorrente da toda a documentação da audiência de julgamento, como requerido oportunamente, dactilografada na sua própria língua e a expensas do Tribunal, também é cominado com nulidade insanável.

VI - Assim, são nulos e de nenhum efeito: O TIR prestado, logo é nula a notificação da acusação e das designações de data para julgamento a que a Arguida faltou, Bem como os restantes actos comunicados à Recorrente em língua portuguesa. Tudo em conformidade com o disposto nos artigos 64.º n.º 1 al. d) e 119.º al. c), ambos do CPP. Assim não se entendendo, VII – Torna tais normas inconstitucionais à luz do disposto nos artigos 13.º, 16.º n.º 2 (artigo 6.º n.º 3 al.s a e e) da CEDH) e 32.º todos da CRP.

VIII – Desde o momento da detenção até à prolação da sentença, todo o processado é nulo e de nenhum efeito nos termos do disposto no artigo 6.º n.º 3 al.s a e e) da CEDH.

Quanto ao mais, exactamente como se concluiu e requereu no articulado de alegações apresentado.

A recorrente havia formulado pedido como segue: Tudo são razões para que Vossas Excelências, Venerandos Juízes-Desembargadores, revoguem os despachos com as referências 106314357 (quanto ao segmento “Não se verificam nulidades, excepções ou questões prévias ou incidentais de que importe conhecer e que obstem à apreciação do mérito da causa” – só faltou a arguida conhecer a acusação – que nem na língua portuguesa ficou depositada em qualquer receptáculo postal), 106919699, despacho proferido na acta do dia 11.04.2018 pág 2 e o despacho inacreditável com a referência 109742200, substituindo-os por outros que reconheçam o direito da Recorrente a conhecer todos os actos praticados no processo que lhe digam directamente respeito, em língua alemã, anulando-se todos os actos posteriores à prolação da acusação com a necessárias consequências legais, à cabeça, que se declare nulo o próprio despacho que recebeu a acusação para julgamento atendendo à manifeste a grosseira ausência processual da Arguida, de defensor e de intérprete da língua alemã.

* A Digna magistrada do Ministério Público junto do Tribunal recorrido apresentou resposta, pugnando para que seja negado provimento ao recurso e mantida nos seus precisos termos a decisão recorrida, sem conclusões.

* A Exmª Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

Foi cumprido o disposto no artigo 417 n.º 2 do Código de Processo Penal e colhidos os vistos legais.

*** B - Fundamentação: B.1.a) – Resulta dos autos: i. A arguida foi interceptada e detida em 06-05-2017, pelas 02:23 em Aljezur; ii. Do auto consta: “O arguido percebe perfeitamente a língua portuguesa falada e escrita; iii. É dada como tendo a nacionalidade alemã e portadora do passaporte nº … emitido, segundo ali se diz, em 23-02-2015 por Portugal; iv. A sua constituição como arguida, TIR, a relação dos seus direitos, o auto de libertação, todos em português, estão assinados pela arguida; v. Foi junta procuração passada a mandatário em 08-05-2017; vi. Nessa mesma data entra requerimento onde se afirma que a arguida é cidadã alemã e é desconhecedora da lingua portuguesa e se solicita que sejam traduzidos para a língua alemã todas as “peças de expediente” que a arguida assinou, bem como do auto de notícia, certificado periódico do alcoolímetro e posteriores notificações; vii. Tal requerimento foi indeferido por despacho do Sr. Procurador-Adjunto, também de 08-05-2017, com fundamento no disposto no artigo 92º do C.P.P.; viii. Em 26-05-2017 foi deduzida acusação em processo abreviado e a arguida dela notificada em língua portuguesa (fls. 37-40 e 42); ix. O processo seguiu a forma de processo comum perante tribunal singular a partir do despacho de 26-06-2017 que recebeu a acusação (fls. 49); x. Por requerimento de 11-07-2017 a arguida vem informar que não foi notificada em lingua alemã e portanto, arguindo a nulidade do despacho lavrado nos ternos do artigo 311º do C.P.P., não se considera notificada; xi. Por despacho de 20-09-2017 o tribunal recorrido indeferiu o requerido por constar do auto de notícia – e de despacho do Ministério Público já referido supra em vii – que a arguida “percebe perfeitamente a lingua portuguesa falada e escrita”; xii. Com fundamento na não notificação, ao menos, da tradução da acusação a arguida deduziu incidente de recusa do Mmº Juiz subscritor do despacho de 20-09-2017; xiii. Por acórdão de 21-12-2017, este Tribunal da Relação de Évora veio a recusar e considerar improcedente o dito incidente de recusa de juiz; xiv. Na audiência de julgamento de 08-05-2018 e após a leitura da decisão condenatória a arguida requereu: “nos seja entregue cópia da gravação áudio da audiência de julgamento; requer que seja providenciada pelo Tribunal a transcrição e tradução das alegações finais proferidas pelo Ministério Público e pelo defensor da arguida a fim de lhe ser entregue; Por fim e atendendo a manifesto desconhecimento da língua portuguesa, que o fribunal providencie pela integral transcrição e tradução da sentença na língua da arguida a fim de a mesma lhe ser entregue, o que se requer.

” xv. Nada opondo o Ministério Público o Mmº juiz lavrou despacho nos seguintes termos: “proceda nos precisos termos requeridos”.

xvi. Em 11-05-2018 o sr. escrivão notificou o mandatário da arguida – com guia anexa – para proceder ao pagamento da dita guia, quantia referente ao custo “das requeridas transcrição e tradução das alegações orais realizadas em audiência de julgamento”.

xvii. Em 24-05-2018 a arguida vem insurgir-se contra a dita emissão de guia – que indica ter um valor de 816 €; xviii. Por conclusão com informação de 28-05-2018 o mesmo sr. escrivão vem indicar que a guia se refere a 4 UC por transcrição e 4 UC por tradução, por se não enquadrarem no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem “aprovada” (!!!) pela Lei 65/78; xix. Por despacho de 07-06-2018 as pretensões da arguida – incluindo a pretensão de suspensão do decurso do prazo de recurso – foram indeferidas; xx. A arguida interpõe recurso em 12-06-2018.

* B.2.a) - São estes os factos considerados provados pelo tribunal recorrido: 1) No dia 06/05/2017, pelas 02h23m, na Avenida …, em Aljezur, a arguida conduzia um veículo automóvel ligeiro de passageiros, com matrícula …, com uma TAS de 1,397 g/l, deduzido o valor do erro máximo admissível da TAS de 1,47 g/l.

2) A arguida conhecia as características da referida viatura e do local onde conduzia, sabendo , também que tinha ingerido bebidas alcoólicas.

3) Admitiu que podia ter uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,20 g/l, não obstante, decidiu conduzir a viatura nessas circunstâncias.

4) A arguida agiu livre, voluntária e conscientemente, sabendo que tal conduta é proibida e punida por lei.

5) A arguida não tem antecedentes criminais.

6) É empresária e aufere um rendimento de cerca de 1.000 € mensais.

7) Reside na Alemanha.

* B.2.b) – Não há factos não provados.

* B.2.c) - O tribunal recorrido fundamentou a matéria de facto, do seguinte modo: «Nas declarações da arguida que confirmou que em dada ocasião conduzia uma viatura e que foi interceptada e sujeita a exame e revelou a sua situação económica e social. No depoimento do agente autuante, militar da GNR, CC, que confirmou factos e sujeição da arguida a exame de alcool no...

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