Acórdão nº 622//14.2GBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelFERNANDO CHAVES
Data da Resolução09 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório 1.

No processo comum singular n.º 622/14.2GBBCL, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga – Vila Verde – Instância Local – Secção Criminal – Juiz 1, realizado o julgamento, foi proferida a sentença de fls. 219 vº a 227 vº com o dispositivo seguinte: «Pelo exposto, o Tribunal decide: 1.º Absolver António F. e Carla A. da prática do crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347.º n.º 1 do Código Penal; 2.º Condenar António F. pela prática de um crime de condução ilegal, previsto e punido pelos artigos 3.º n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98 de 3 de janeiro, conjugado com os artigos 121.º n.º 1, 122.º n.º 1 e 124.º n.º 1 do Código da Estrada na pena de 6 (seis) meses de prisão; 2.º Condenar o arguido António F. pela prática do crime de condução perigosa, previsto e punido pelos artigos 291.º n.º 1 b) e 69.º a) do Código Penal na pena de 7 (sete) meses de prisão e na sanção acessória de proibição de conduzir por sete meses; 3.º Em cúmulo jurídico de penas condenar o arguido António F. na pena única de 9 (nove) meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano; 4.º Condenar António F. pela prática da contraordenação prevista a punida pelo artigo 4.º n.º 1 e n.º 3, 146.º l) e 147.º n.º 1 e n.º 2 do Código da Estrada na coima de € 500,00 (quinhentos euros) e decretar a apreensão do veículo de matrícula SA-17-58 por dois meses.

* Mais se condena o Arguido, no pagamento de taxa de justiça no valor de três U.C., e dos respetivos encargos (artigo 8.º n.º 9 do Regulamento das Custas Processuais).

* Após trânsito desta decisão, remeta boletim ao registo criminal.

Comunique ao I.M.T./A.N.S.R.

Solicite à Guarda Nacional Republicana que proceda à apreensão do veículo SA-17-58 que se encontra na morada do arguido, nomeando-se fiel depositário o titular do documento de identificação do veículo.

Notifique.» 2.

Inconformado com a parte absolutória da sentença, relativa ao imputado crime de resistência e coacção sobre funcionário, recorreu o Ministério Público, terminando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. O presente recurso limita-se à discordância quanto ao decidido na sentença proferida nos presentes autos na parte em que absolveu a arguida Carla A. e o arguido António F., da prática, por cada um deles, de um crime de resistência e coacção sobre funcionário, previsto e punido pelo artigo 347º, n.º 1 do Código Penal.

  1. Entendeu o Tribunal a quo que a actuação dos arguidos não atingiu o grau de violência exigido pelo legislador na previsão que faz do artigo 347º do Código Penal, fundamentando a sua conclusão no facto de a conduta dos arguidos não lograrem impedir a actuação dos militares da GNR, mais acrescentando que “a conduta dos arguidos causou embaraço na atuação dos militares, é verdade, contudo não é dotada de idoneidade suficiente para inviabilizar os atos funcionais dos mesmos, pois os militares concretizaram a detenção do arguido.” 3. Salvo o devido respeito por opinião contrária, entendemos que o Tribunal a quo incorreu em erro na subsunção jurídica que fez dos factos e das concretas circunstâncias em que os mesmos ocorreram ao direito aplicável, nomeadamente, ao conceito de violência exigido pelo artigo 347º, n.º 1 do Código Penal, violando, desta forma o artigo 347º, n.º 1 do Código Penal, ao absolver os arguidos do crime de resistência e coacção de que os mesmos vinham acusados.

  2. Com a incriminação prevista no n.º 1 do artigo 347º do Código penal pretendeu o legislador proteger a autonomia intencional do Estado, pretendendo evitar que não funcionários coloquem entraves à livre execução das intenções estaduais, tornando-as ineficazes.

  3. Estamos aqui, conforme a doutrina e jurisprudência têm vindo a afirmar, perante um crime de perigo o que significa que para sua consumação é tão só exigida a prática da acção coactora adequada a anular ou comprimir a capacidade de actuação do funcionário, 6. não se exigindo, contudo, ao contrário do que entendeu o Tribunal a quo, que o funcionário não consiga, de todo, levar a cabo a sua função, bastando que o agente do crime se oponha a que a autoridade pública exerça as suas funções, utilizando para tal violência ou ameaça grave.

  4. Efectivamente, não é elemento típico do crime de resistência e coacção sobre funcionário que o arguido tenha conseguido os seus intentos, não sendo necessária a efectiva lesão do bem jurídico que lhes está subjacente, mas apenas a possibilidade ou a probabilidade da correspondente conduta típica vir a afectar os interesses protegidos.

  5. Pelo que o tipo de ilícito penal em causa nos autos não se configura como um crime de resultado, mas tão só de mera actividade.

  6. Um dos elementos do tipo, e aquele que nestes autos está em causa, é a actuação violenta do agente.

  7. A jurisprudência e a doutrina têm entendido que a violência exigida pelo referido normativo deve ser definida nos mesmos termos em que o é no âmbito do crime de coacção, sendo que se deverá entender por violência todo o acto de força ou hostilidade que seja idóneo a coagir o funcionário ou membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, contudo, não se exige que à adequação do meio se siga um comportamento coagido, 11. pelo que se pune tanto a resistência eficaz como a ineficaz (desde que idónea).

  8. De notar que, a violência não terá de ser grave nem de configurar a prática de um ilícito contra a integridade física, bastando consistir “num acto de força ou hostilidade que seja idóneo a coagir, a impedir ou dificultar a actuação legítima do funcionário ou equiparado - vide Ac. R.P. de 1995/Mar./29, in CJ II/232 (JusNet 10808/1995); Ac. R. L. 1992/Fev./28 e 1991/Jun./01, in, respectivamente CJ I/188, III/186.- in Ac RP 22/2/2006 (JusNet 823/2006)” – Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/12/2011 (in www.dgsi.pt, processo n.º 76/11.5GCPRG.P1).

  9. A violência tanto pode ser física como psicológica, importando apenas que tenha a virtualidade suficiente para intimidar o visado e limitá-lo no exercício da sua liberdade pessoal, devendo ser exercida de modo sério e com a intensidade necessária para intimidar, atendendo-se, neste contexto, claro está às “sobre-capacidades” habitual dos agentes de autoridade em comparação com as habituais “sub-capacidades” do agente do ilícito.

  10. Ora, entendemos que em face do que resultou da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento encontram-se totalmente preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do crime de resistência e coacção, previsto e punido pelo artigo 347º, n.º 1 do Código Penal, sendo que, entendemos que a violência empregue pelos arguidos se mostra idónea, suficiente e adequada a dificultar, como de facto sucedeu e se deu como provado, a actuação legítima dos militares da GNR André C. e Carlos S..

  11. Efectivamente, da matéria dada como provada decorre que os arguidos procuraram evitar a sua detenção, dificultando a actuação dos militares da GNR, sendo o comportamento da arguida e do arguido, conforme descrito na motivação da matéria de facto que decorre das declarações dos militares da GNR ouvidos em sede de audiência de discussão e julgamento, é adequado a pelo menos dificultar de forma significativa a capacidade de actuação dos militares da GNR.

  12. Disso mesmo é evidência o facto de ter sido necessária a intervenção de ambos os militares para concretizar a detenção do arguido António, em face da actuação quer do arguido António quer da arguida Carla.

  13. Ambos os militares da GNR também tiveram necessidade de intervir na tentativa de deterem e algemarem a arguida, tendo estes tentado durante largos minutos procederem à sua imobilização e algemagem sem êxito.

  14. Daqui decorre que, na nossa modéstia opinião, os factos provados, e as circunstâncias e modo como os mesmos ocorreram, permitem concluir que se mostram preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do crime de resistência e coacção que foi imputado aos arguidos, mostrando-se verificado o conceito de violência legalmente exigido e que temos vindo a definir.

  15. Na verdade, a violência usada pelos arguidos foi idónea a dificultar a actuação dos militares da GNR.

  16. Como referimos a violência não tem de ser...

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