Acórdão nº 12/18 de Tribunal Constitucional (Port, 10 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução10 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 12/2018

Processo n.º 1195/2017

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são recorrentes A., B. e C. e recorridos o Ministério Público e D., foram interpostos recursos do acórdão daquele Tribunal, de 20 de setembro de 2017, ao abrigo das alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»).

2. Pela Decisão Sumária n.º 690/2017, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento dos objetos dos recursos interpostos. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«8. Os recorrentes apresentaram requerimentos de interposição de recurso de constitucionalidade autónomos, pelo que os mesmos serão apreciados separadamente.

Porém, em todos os casos a decisão recorrida é o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20 de setembro de 2017, que rejeitou os recursos que haviam interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23 de março de 2017, o qual, por sua vez, havia negado provimento aos recursos interpostos do acórdão condenatório proferido pelo Tribunal de 1.ª instância.

9. Apreciemos, em primeiro lugar, o recurso interposto pelo recorrente A..

O presente recurso foi interposto ao abrigo das alíneas b), c) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente começa por questionar o facto de não lhe ter sido aplicado o regime penal especial para jovens, previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de setembro: «[a] não aplicação do Regime especial para jovens, fls 58, 59 do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça já que o recorrente à data dos factos tinha 19 anos (…) Ou seja o regime está previsto no DL 401/82 de 23 de setembro e no princípio constitucional (…) A sua aplicação não é automática, porem face às premissas dadas como provadas de fls 61 Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça surge como imperativo por necessário a sua aplicação. Ao não aplicar este princípio geral e constitucional por omissão viola a lei constitucional».

Daí decorre, inequivocamente, que o recorrente pretende sindicar a constitucionalidade da própria decisão recorrida e não qualquer normal legal por aquela aplicada. Ora, como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem.»

A identificação do direito ordinário aplicável e das suas consequências na determinação da medida concreta da pena é matéria que se situa necessariamente no domínio reservado ao exercício da função jurisdicional, pelo que não constitui, em caso algum, objeto idóneo de recurso para o Tribunal Constitucional (v., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n.os 303/02 e 633/08).

A mesma conclusão vale para a aplicação, questionada pelo recorrente, do princípio da livre apreciação da prova, consagrado no artigo 127.º do Código de Processo Penal, matéria enunciada nos seguintes termos: «[o] artigo 127 do CPP na aplicação que é feita no Douto Acórdão ora em apreço é inconstitucional».

A apreciação da prova, ao abrigo do artigo 127.º do Código de Processo Penal, designadamente ao nível da sindicância do peso probatório de cada um dos meios de prova considerados e da sua suficiência para sustentar a base factual imputada aos agentes, constitui igualmente domínio reservado ao exercício da função jurisdicional, pelo que não constitui objeto idóneo de recurso para o Tribunal Constitucional.

Por ter objetos inidóneos ─ destituídos de caráter normativo ─, o presente recurso não pode ser admitido, justificando-se a prolação de decisão sumária, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.

10. O recorrente funda igualmente o seu recurso nas alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, as quais pressupõem uma questão de ilegalidade de determinada norma, designadamente por violação de lei de valor reforçado.

Porém, nem o Tribunal a quo recusou a aplicação de qualquer norma com tal fundamento, nem o recorrente suscitou a ilegalidade de qualquer norma, fosse por violação de lei de valor reforçado, fosse por violação de estatuto de região autónoma, o que obsta a que possa ser conhecido o objeto do presente recurso, também com fundamento nas aludidas alíneas.

11. Vejamos agora o recurso interposto pelo recorrente B., o qual se funda exclusivamente na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

O recorrente começa por definir assim o objeto do recurso: «apreciação da legalidade, [d]as normas previstas nos dispostos nos arts. 127º, 400º/1 als. a) e c) do CPP, artº 1º do DL 401/82 de 23 de setembro e arts 29º, 73 e 74º do CPenal, na interpretação que lhe foi dada por este ST, segundo a qual a arguição dos vícios apontados à matéria de facto, excede os poderes de sua cognição, enquanto tribunal de revista, que apenas compete... conhecer matéria de direito.», embora depois conclua que «as referidas doutas interpretações violam o disposto no artº 32º da Constituição da Republica, quanto a garantia de defesa, na medida em que todos têm de defesa, incluindo o direito ao recurso».

Não obstante se verifique uma notória imprecisão na formulação do objeto do presente recurso, é ponto assente que, de acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que deve ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).

Nos presentes autos, não pode dar-se como verificado tal requisito da suscitação prévia.

Com efeito, na motivação do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça – momento relevante para aferir do preenchimento deste pressuposto processual, face ao que dispõe o citado artigo 72.º, n.º 2, da LTC –, o recorrente não suscitou a inconstitucionalidade (nem a ilegalidade) da norma que constitui objeto do presente recurso. Nessa peça processual, limitou-se a argumentar que «23. o artº 127º do CPP interpretado como o foi no sentido de que para dar os factos como provados e não provados basta a livre convicção do julgador, sem ter em conta as provas dos factos, viola o princípio constitucional, do artº 32º/2, segundo o qual todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação". 24. Normas violadas, artº 27º,127º, do CP, 374/2º e 410º do CPP, 4º do DL 401º/82 de 23/09 e ainda 32º da CRP.», o que consubstancia uma diversa questão de constitucionalidade, além de que incidente sobre um objeto destituído de caráter normativo.

A ausência de suscitação prévia e adequada da questão de constitucionalidade obsta a que este Tribunal possa conhecer do objeto do recurso, justificando-se a prolação de decisão sumária, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.

12. Apreciemos agora o recurso interposto pelo recorrente C., o qual se funda exclusivamente na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

Nessa peça processual, o recorrente pretende a apreciação da constitucionalidade das seguintes normas: (i) a norma da alínea a) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal; (ii) a norma dos artigos 283.º, n.º 3, alínea b) e 374.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal; (iii) a norma do artigo 71.º, n.º 3, do Código Penal; e (iv) a norma do artigo 127.º do Código de Processo Penal;

De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que deve ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2...

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