Acórdão nº 456/14.4TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Dezembro de 2018
Magistrado Responsável | ILÍDIO SACARRÃO MARTINS |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO AA, Lda, agora denominada BB, S.A. intentou acção com processo comum, contra CC, PLC pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de € 2.605.856,50, acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até integral pagamento.
Em síntese, alegou que autora e ré celebraram um contrato de penhor das quotas da autora para garantia de todas as facilidades concedidas por aquele a esta e concedeu-lhe mais um crédito. A ré, na qualidade de credor pignoratício, decidiu reunir a assembleia geral da autora e destituiu o então gerente, nomeando um novo que se manteve no cargo desde 31 de Março de 2006 até Julho de 2009, data em que renunciou ao cargo. Neste período a ré geriu a sociedade de forma legítima, ao abrigo de um contrato de penhor, mas de forma negligente, de modo a aumentar o passivo, pois aumentou em 8 milhões de euros as responsabilidades da autora ao não prosseguir a execução do seu objecto e antes gastando milhares de euros em pareceres de duvidosa necessidade e acabou por ceder o crédito e deixar a autora sem gerência. Acresce que a ré deixou permanecer no CRC do Banco de Portugal um crédito abatido ao activo da ré, tendo tal facto culposo causado danos para a autora.
Alega ainda que só conseguiu que as responsabilidades da autora sobre o réu fossem levantadas do Banco de Portugal a 31.01.2011. A 31 de Julho de 2011 a ré voltou a colocar na Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal, as responsabilidades já cedidas à DD, só as tendo levantado em Novembro de 2013. Em consequência disso perdeu um financiamento junto do EE assim como a possibilidade de aquisição dos lotes que indica, tendo perdido o valor que obteria com a respectiva exploração, perdeu o sinal entregue para a aquisição de lotes que indica e ficou com má imagem.
Contestou o réu alegando que a autora não é parte no contrato de penhor, pelo que nunca poderá ser titular de quaisquer direitos e obrigações emergentes do mesmo e arguiu a excepção dilatória de ilegitimidade activa e de prescrição.
Por impugnação, referiu, em síntese, que a autora estava em insolvência técnica, havia uma situação de tensão entre os sócios, o que tudo se traduzia na incapacidade da autora dar resposta às suas responsabilidades perante os credores. Foi neste contexto e como forma de ultrapassar o impasse em que a autora se encontrava no que à gerência respeita, que o réu avocou para si o exercício dos direitos sociais inerentes às quotas empenhadas e nomeou um gerente. Esta nomeação era provisória e destinava-se a assegurar uma gestão racional e profissional da autora até que os sócios estivessem em condições de apresentar um plano de negócios viável para a autora.
Nenhum dos planos apresentados logrou demonstrar ser viável, uma vez que todos se baseavam na concessão adicional de crédito, o gerente nomeado faz parte de um painel de especialistas em reestruturação de empresas e insolvência a que o réu recorre internacionalmente em situações similares à dos presentes autos, o que era do interesse do réu que pretendia ver o seu crédito ressarcido, o gerente nomeado exerceu a gerência de forma independente do réu, que não interveio na gestão.
As despesas apresentadas pela autora não são prejuízos porque sempre teriam de ser pagas, pronuncia-se depois especificamente quanto a cada uma despesas e documentos de suporte juntos pela autora. Se a autora celebrou acordos de regularização com promitentes compradores, fê-lo por sua conta e risco, no que respeita aos contratos promessa anteriores à gestão do gerente nomeado, o mesmo não teve alternativa senão propor aos respectivos promitentes compradores a revogação, por acordo, de tais contratos, mediante o pagamento de contrapartidas, já que a conclusão das obras de construção das moradias acabou por se revelar inviável, a construção efectuada tinha graves defeitos, os quais, em alguns caso, punham em causa a segurança das moradias, devido à falta e capitais próprios e de financiamento não foi possível avançar com a construção, o réu nunca assumiu qualquer obrigação de construção.
Mais alega que, por mero lapso, o réu não procedeu à correcção do reporte à autora junto da Central de Responsabilidades de Crédito, o que se ficou a dever a questões de ordem técnica, a aplicação bancária do réu não permitia remover o reporte à CRC, não se vislumbra qualquer tipo de exploração capaz de gerar os rendimentos pretendidos pela autora. Se a autora celebrou um contrato promessa sem ter garantia do financiamento, o incumprimento só a si é imputável, os danos à imagem não estão sustentados em factos concretos.
A factualidade alegada na petição inicial não se enquadra na responsabilidade contratual e a autora não alega a violação de qualquer preceito legal nem um direito que tenha sido violado.
No final pede a condenação da autora como litigante de mé fé, o que se reporta ao alegado nos artºs 228º a 234º da contestação e em que se reporta à alegação da autora de que o direito à informação dos sócios havia sido coarctado pelo réu e à instauração de uma acção pela II II.
A autora respondeu às excepções e pretendeu rectificar o art° 79° da petição inicial., o que mereceu a oposição do réu, tendo o tribunal indeferido esse pedido.
Foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.
A autora recorreu e, por acórdão da Relação de … de 22.02.2018, a apelação foi julgada parcialmente procedente, condenando-se o réu a pagar à autora a quantia de € 300.000,00, acrescida dos juros a taxa legal, vincendos e vencidos desde a data de decisão.
Foi ainda julgado improcedente o recurso ampliado do réu.
Não se conformando com tal acórdão, dele recorreu o réu, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: (
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O presente recurso deve ser admitido, nos termos da alínea a) do n° 1 do artigo 674° e do artigo 629° do CPC, porquanto o recorrente entende que o Venerando Tribunal, com todo o devido respeito, ao socorrer-se da figura jurídica dos "juízos de equidade" para determinar a condenação do recorrente no presente caso, incorreu num erro de interpretação e aplicação das normas jurídicas em causa, tendo, por conseguinte, violado a lei substantiva.
(B) O presente recurso vem interposto da decisão de condenação do recorrente ao pagamento à recorrida de uma quantia de € 300.000 - determinada pelo Tribunal da Relação com recurso a juízos de equidade -, acrescida de juros à taxa legal, vincendos e vencidos desde a data da decisão recorrida. Sucede porém que, é entendimento do recorrente que não pode haver lugar a qualquer condenação do recorrente a pagar uma indemnização à recorrida, porquanto não ficou provado que a recorrida tivesse sofrido quaisquer danos com a actuação do recorrente.
(C) O recurso aos juízos de equidade levado a cabo pelo Venerando Tribunal da Relação revela-se totalmente arbitrário e contrário à lei, porquanto não contém qualquer fundamento legal e / ou factual e, além disso, não tem em conta os factos considerados provados nos autos, violando o preceituado no n° 3 do artigo 566° do CC; e (D) O montante indemnizatório fixado tem em consideração uma margem de lucro (ficcionada pela Veneranda Relação de …) de 25% que se revela absurda e irrealista, conforme demonstram os mais recentes estudos económicos internacionais. Senão vejamos, (E) No que respeita aos alegados danos sofridos pela recorrida que fundamentam o seu pedido de indemnização, dos factos provados nos presentes autos não podem resultar as consequências jurídicas retiradas pelo douto tribunal a quo, o que torna a decisão contida no acórdão recorrido, com o devido respeito, errada e injusta.
(F) A verdade é que afirmar que "uma intenção" (de finalizar, mobilar e arrendar as ditas moradias) e um "mero cenário hipotético" (relativo à obtenção de um rendimento anual ilíquido não apurado) consubstanciam um dano indemnizável fundado numa "perda de chance" - como o Venerando Tribunal da Relação afirma - não faz qualquer sentido e carece de acolhimento legal.
(G) O que resulta de certo da factualidade contida nos autos é que a recorrida queria adquirir as referidas moradias para depois as finalizar, as mobilar e as colocar no mercado de arrendamento e absolutamente mais nada.
(H) Não resulta de forma certa e inequívoca que, depois de adquirir, finalizar, mobilar e colocar as moradias no mercado de arrendamento, a recorrida iriar obter sequer lucro. A obtenção de lucro era uma possibilidade, tal como era uma possibilidade a sua não obtenção. Ou seja, estamos perante o campo da incerteza factual.
(I) Assim, o que apenas estará em causa é a eventual "perda de oportunidade para adquirir as moradias". "Oportunidade" essa que não tem qualquer valor económico, porquanto, como se referiu, a recorrida teria vários encargos associados à finalização das moradias e a mobilá-las e colocá-las no mercado de arrendamento que colocam no cenário meramente hipotético a possibilidade de obtenção de qualquer lucro! (J) A verdade é que a recorrida não logrou provar que a não aquisição das moradias - por facto ilícito imputável ao recorrente, que não se aceita - conduziu necessariamente à perda de uma oportunidade de obtenção de lucros.
(K) Salvo o devido respeito, carece em absoluto de fundamento o pressuposto - errado -segundo o qual o Venerando Tribunal da Relação fundamenta a condenação do recorrente: a susceptibilidade certa e inequívoca de a actividade da recorrida gerar uma margem de lucro.
(L) Ao afirmar isto, o Venerando Tribunal da Relação desconsidera a crise que empresas com o mesmo escopo social que a recorrida têm atravessado nos últimos largos anos. É do conhecimento geral que empresas do ramo do investimento e empreendimento turístico têm, nos últimos anos, procurado recuperar do efeito nefasto que as afectou durante a crise económica e financeira que se debateu perante o país. É também do conhecimento geral que grande parte das empresas deste ramo tornaram-se insolventes na última década, sendo uma importante...
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