Acórdão nº 2297/19.3T8PRT.P2 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-02-07

Ano2023
Número Acordão2297/19.3T8PRT.P2
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 2997/19.3T8PRT.P2
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Sumário:
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- Relatório
1- O Condomínio do Prédio sito na Rua ..., ..., instaurou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra AA, Advogada, e A..., alegando, em breve resumo, que, em Agosto de 2011, adjudicou à sociedade, B..., Ldª, a reparação do telhado do prédio onde se situa, pelo preço de 22.500,00€, que lhe pagou.
A execução dessa obra, todavia, não foi integralmente cumprida, nem o que foi feito obedeceu às boas regras técnicas de construção, daí derivando diversos defeitos, que enuncia.
Por isso mesmo, denunciou esses defeitos àquela sociedade, por mais de uma vez, mas a mesma não os eliminou totalmente.
Viu-se, assim, obrigada a contratar a 1ª Ré para, além do mais, a mesma demandar judicialmente a dita sociedade, com vista a compeli-la a eliminar os aludidos defeitos, cuja reparação importa em 24.000,00€.
Sucede que nem essa Ré deu cumprimento ao mandato que lhe conferiu, nem os ditos defeitos foram reparados, não tendo neste momento forma de exercer os direitos que lhe assistem, por, entretanto, os mesmos se terem extinguido.
Assim, além do prejuízo decorrente da deficiente execução da obra, a falta de oportuna reparação dos defeitos está a causar estragos em duas frações autónomas, estragos esses cujo custo de reparação não é possível ainda apurar, mas que nunca será inferior a 5.600,00€.
Ou seja, o prejuízo total que lhe causou a 1ª Ré não é inferior a 30.000,00€ e pretende por ele ser ressarcido, inclusive pela 2ª Ré, em virtude do contrato de seguro existente para cobrir esse risco.
Termina, assim, pedindo que a 1ª Ré seja condenada a pagar-lhe a referida quantia de 30.000,00€, a título de danos patrimoniais, acrescida dos juros de mora a contar da data da citação até efetivo e integral pagamento, e a 2ª Ré também solidariamente condenada no mesmo pedido, dentro dos limites da apólice de seguro contratada.
2- Contestou a Ré seguradora refutando este pedido. Desde logo, porque entende ser inepta a petição inicial. E, depois, invocando, para além do mais, o valor da franquia do contrato de seguro e a exclusão da sua responsabilidade, por não lhe ter sido atempadamente comunicado pela A. o alegado facto danoso, que, de qualquer modo, impugna.
Defende também que, a serem devidos juros de mora, só podem ser contados a partir do trânsito em julgado da decisão final que recair sobre este litígio.
Conclui, assim, pedindo a sua absolvição da instância ou, subsidiariamente, a sua absolvição do pedido.
3- O A. respondeu, defendendo, para além do mais, a aptidão da petição inicial.
4- Terminada a fase dos articulados, foi proferida sentença que julgou inepta a petição inicial e absolveu as RR. da instância.
5- Esta sentença, todavia, viria a ser revogada, em sede de recurso.
6- Prosseguindo os autos os seus termos, foi dispensada a audiência prévia, proferido despacho saneador, relegado o conhecimento da exceção de falta de conhecimento prévio invocada pela Ré para momento posterior e, entre o mais, também enunciado o objeto do litígio e fixados os temas da prova.
7- Por fim, teve lugar a audiência de julgamento, após a qual foi proferida sentença na qual se julgou presente ação parcialmente procedente e decidido condenar as RR. a pagar, solidariamente, ao A. a quantia de 27.200,00€, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar de tal decisão.
8- Inconformada com esta sentença, dela recorre a Ré seguradora, terminando a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:
“I. Os factos constantes dos pontos 6.º a 8.º da matéria de facto julgada não provada, alegada pela Apelante nos artigos 29.º a 32.º da sua contestação, devem ser julgados como provados.
II. Nos Despachos de 15.JAN.2021 (ref.ª 420724343) e de 20.MAI.2021 (ref.ª 424613429), o Tribunal “a quo” Considerou que “a matéria alegada nos artigos 29.º a 32.º da contestação não se mostra impugnada.” e, em sede de audiência final, o Tribunal recorrido reiterou a sua posição ao só ter admitido o depoimento de parte da ré advogada ao facto constante do artigo 33.º da contestação da Apelante, por a factualidade constante dos artigos 29.º a 32.º se encontrar assente.
III. Vem, agora, o Tribunal recorrido, em sede de Sentença, considerar que, afinal, tal matéria encontrava-se controvertida e, por esse motivo, não tendo sido produzida prova tendente à sua demonstração, essa matéria terá de ser julgada como não provada.
IV. O Tribunal “a quo” violou os princípios da confiança e do processo equitativo relativamente à fixação da matéria de facto elencada sob os pontos 6.º a 8.º dos factos não provados, uma vez que, por força do seu próprio comportamento, criou na Apelante a legítima convicção de que tais factos encontravam-se assentes e, por isso, insuscetíveis de prova, sendo que a recorrente não poderia razoavelmente contar com a decisão de facto que veio a ser proferida, agora, quanto a esses mesmos factos.
V. Ao Decidir como Decidiu o Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 2.º e 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa e o artigo 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
VI. A violação da garantia do processo equitativo terá de conduzir à inexistência jurídica da Sentença na parte por ela afetada, devendo ser ordenada a revogação da Decisão recorrida nessa parte e a sua substituição por outra que Julgue como provados os factos elencados nos artigos 29.º a 32.º da contestação da recorrente.
Ainda que assim não fosse,
VII. Os factos alegados pela recorrente nos artigos 29.º a 32.º da contestação não foram impugnados pelo autor nem pela co-ré, motivo pelo qual se encontram admitidos por acordo e, como tal, sempre teriam de ser julgados como provados.
VIII. Nos artigos 31.º e 32.º da contestação a recorrente não fez referência a qualquer situação concreta – limitou-se a alegar dois factos: a ré advogada teve conhecimento dos factos que lhe são imputados, e bem assim da intenção do autor lhe imputar responsabilidade pelos mesmos antes do dia 1.JAN.2018.
IX. Dos factos provados (pontos N)” e O)”) resulta que a 1.ª ré não intentou a ação judicial para a qual havia sido mandatada pelo autor, tendo-o ludibriado acerca da sua interposição durante o período temporal de Setembro de 2014 a Fevereiro de 2017, pelo que a 1.ª ré não pode deixar de ter tido conhecimento/consciência de que as suas omissões poderiam vir a gerar a sua responsabilização profissional, como efetivamente veio a suceder, em data anterior a 1.JAN.2018
X. Do depoimento da testemunha BB resulta que aquando da sua deslocação ao Palácio da Justiça e perante a informação que recebeu de que os n.ºs indicados pela 1.ª ré não correspondiam a processos judiciais a testemunha “passou-se um bocadinho da cabeça”, tendo saído do tribunal e logo ligado para a 1.ª ré, tendo encetado uma discussão, em face da informação que por ela lhe havia sido transmitida.
XI. Para além de assim o indicar todas as regras da normalidade e da experiência comum, também o depoimento da testemunha BB, à data dos factos administrador do autor, demonstra que, pelo menos aquando da deslocação do mesmo ao Palácio da Justiça, a 1.ª Ré não poderia deixar de ter conhecimento da intenção do autor de a responsabilizar pela omissão da propositura da ação judicial para a qual havia sido mandatada.
XII. Essa deslocação terá ocorrido em data anterior a outubro de 2016, uma vez que, de acordo com a factualidade provada sob os pontos E)” e F)”, a partir dessa data, o autor não mais recebeu qualquer informação ou contacto da 1ª ré, nem do alegado advogado CC.
XIII. Em consequência, os pontos 7.º e 8.º da matéria de facto não provada deverão ser julgados provados, ainda que com a seguinte redação: (i) A 1.ª ré teve conhecimento dos factos que lhe são imputados antes do dia 1 de Janeiro de 2018; e (ii) A 1.ª ré teve conhecimento da intenção do autor lhe imputar responsabilidade pelos factos imputados antes do dia 1 de Janeiro de 2018.
Por outro lado,
XIV. Em sede de Saneador-Sentença datado de 12.DEZ.2019, com a ref.ª 408790319, o Tribunal recorrido, considerou que “O autor não alegou factos concretos que fundamentem a possibilidade de procedência da ação, a probabilidade de ganho.”.
XV. Sem que a petição inicial tenha sido objeto de aperfeiçoamento, de forma absolutamente contraditória, o Tribunal recorrido vem, agora, em sede de Sentença, Considerar que, afinal, e, a factualidade alegada pelo autor é, agora, suscetível de determinar “com elevado grau de probabilidade, que a falta da propositura da acção judicial por parte da1.ª ré foi causa adequadada perda de oportunidade de obter a almejada eliminação dos defeitos, sendo consistente a chance de vencimento”.
XVI. O Tribunal recorrido adotou uma conduta incoerente e contraditória, violando, o disposto nos artigos 2.º e 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, bem como o artigo 6.º, n.º 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
XVII. Em consequência, deve ser determinada a invalidade da Decisão proferida na parte afetada e ordenada a revogação da Decisão recorrida nessa parte e a sua substituição por outra que seja compatível com a sua atuação anterior, considerando-se que não foram alegados elementos de facto que permitam concluir (ou sequer apreciar) a consistência da chance de vencimento que justifique a procedência da presente ação judicial.
Ademais,
XVIII. Para o fundamentar aquela (segunda) conclusão, o Tribunal recorrido levou a cabo a tarefa de realizar o designado “julgamento dentro do julgamento” por mera remissão (literalmente) para a factualidade apurada.
XIX. O autor, na petição inicial, focou-se exclusivamente na narração de um enredo atinente às pretensas criações fantasiosas da 1.ª ré, olvidando a alegação de factos suscetíveis de desmontar a probabilidade de
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