Acórdão nº 28602/15.3T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | ANTÓNIO LEONES DANTAS |
Data da Resolução | 14 de Novembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA intentou a presente ação emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra BB, formulando os seguintes pedidos:
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Deve ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor; b) Deve ser a Ré condenada no pagamento ao Autor da importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da douta sentença que vier a ser proferida; c) Deve a Ré ser condenada a reintegrar o Autor sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, ou, em alternativa, que se aguarde até ao termo da discussão na audiência final do julgamento, deve ser a Ré condenada a indemnizar o Autor à razão de 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente do disposto no artigo 381.° do CT, contando todo o tempo decorrido desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial; d) Deve ser a Ré condenada a pagar ao Autor juros de mora legais, sobre as quantias acima peticionadas, a contar da citação e até efetivo e integral cumprimento; e) Deve ser a Ré condenada a pagar ao Autor juros, à taxa anual de 5% a acrescer às quantias peticionadas na alínea anterior, sobre o montante pecuniário em que a final for condenada, desde o trânsito em julgado da douta sentença até integral e efetivo cumprimento.
Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese, a ilicitude da cessação do contrato de trabalho que o ligava à Ré.
A ação instaurada prosseguiu seus termos e veio a ser decidida por sentença de 7 de março de 2016, que integrou o seguinte dispositivo: «IV - Pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação parcialmente procedente, e, em consequência, julgo lícita a cessação do contrato de trabalho efetivada pela ré em 24.08.2015, sob a invocação de nulidade do mesmo, e condeno a ré a pagar ao autor:
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A quantia de € 4.575,80, a título de proporcionais de férias e subsídio de férias relativos ao ano de 2015.
b) A quantia de € 554,35, a título de férias não gozadas no ano de 2015.
e) Juros de mora vencidos e vincendos sobre as quantias indicadas, à taxa legal, contados desde 31.08.2015 até integral e efetivo pagamento.
Custas pelo autor e pela ré na proporção do decaimento (art.° 527° do C. P. Civil).
Fixo o valor da causa em € 31.899,01 (art.° 305° do C. P. Civil) Notifique e registe.» Inconformado com esta decisão, dela apelou o Autor para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Terminava pedindo que fosse revista a sentença que considerou «nulo o contrato de trabalho de Diretor Geral exercido pelo recorrente, considerando o mesmo válido e consequentemente ilícito o despedimento do recorrente, devendo a recorrida ser condenada nos termos do pedido».
A Recorrida respondeu ao recurso e requereu a ampliação do respetivo objeto, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º do Código de Processo Civil, impugnando a matéria de facto dada como provada, nos pontos n.ºs 8, 9 e 10.
O Tribunal da Relação veio a conhecer do recurso por acórdão de 21 de março de 2018, tendo concedido parcial provimento à apelação, considerando, por um lado, o contrato de trabalho celebrado pelo Autor com a Ré como nulo, mas tendo considerado igualmente que o mesmo se convalidou, nos termos do artigo 125.º do Código do Trabalho.
Além disso, o Tribunal da Relação conheceu da matéria da ampliação do objeto do recurso, suscitada pela recorrida, tendo integrado sobre a mesma o seguinte dispositivo: «III - Decisão.
Termos em que se acorda conceder provimento à ampliação do recurso e, em consequência, revogar a sentença recorrida e determinar que o processo prossiga seus termos com vista à realização da consequente instrução e julgamento da causa no que concerne aos factos julgados provados em 8, 9 e 10 e depois até final.
Custas da apelação são provisoriamente pela recorrida (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil e 6.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais e Tabela I-B a ele anexa).» Irresignada com esta decisão, dela vem a Ré recorrer de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «1.ª - A alteração legislativa decorrente da aprovação do D.L. n° 172-A/2014 não pode - ao contrário do decidido no Acórdão recorrido - ter o efeito de convalidar o contrato; 2.ª - Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; 3.ª - Os negócios nulos só podem convalidar-se nos casos expressamente previstos na lei; 4.ª - O que não foi previsto no novo diploma legal invocado no Acórdão recorrido; 5.ª - Portanto, o contrato de trabalho dos autos não pode considerar-se convalidado em virtude da entrada em vigor do D.L. n° 172-A/2014; 6.ª - O requisito legal exigido no momento da celebração do contrato de trabalho de o trabalhador admitido não fazer parte dos Corpos Gerentes da Instituição era essencial para que o contrato pudesse ser validamente celebrado; 7.ª- A existência e a relevância desse impedimento legal no momento da celebração do contrato justificava-se exatamente para evitar fins fraudulentos em benefício de quem estava impedido de celebrar contratos em seu benefício; 8.ª - A nova redação do art. 15.º n.° 1 não afasta tal proibição, admitindo tão-somente que trabalhadores, que já o eram, possam vir a exercer cargos nos corpos gerentes; 9.ª - Mas não o contrário, ou seja, que Membros de Corpos Gerentes possam passar a ser simultaneamente trabalhadores da Instituição à qual presidem e dirigem, celebrando contratos de trabalho diretamente com esta; 10.ª - Nesta situação continuam a justificar-se os receios do Legislador que impuseram aquela proibição: isto é, que os membros dos Corpos Gerentes da Instituição, servindo-‑se da influência do cargo e dos poderes de direção, administração e fiscalização de que dispõem, possam celebrar contratos direta ou indiretamente, retirando benefícios para si em detrimento da Instituição; 11.ª - Mesmo tendo em consideração as alterações legislativas apontadas pelo Acórdão recorrido, o contrato dos autos sempre seria nulo; 12.ª - Acresce que os autos não permitem saber qual a percentagem de trabalhadores que ocupavam cargos de administração e fiscalização à data em que o contrato foi celebrado, nem à data da entrada em vigor da nova Lei nem sequer à data da prolação do Acórdão recorrido; 13.ª - Como tal, por falta de demonstração de um pressuposto considerado essencial na interpretação que o próprio Acórdão recorrido confere à nova redação do art. 15.º n.°1, nunca se poderia ter optado pela validação do contrato dos autos; 14.ª - Só os vícios que conduzem à anulabilidade podem ser sanados; 15.ª - O mesmo não sucedendo com os que dão origem a nulidade, a não ser nos casos expressamente previstos na lei - o que não sucede no tocante às normas em apreço; 16.ª - O artigo 15.º, n.°2 do D.L. n°119/83 (na redação posterior ao D.L. n°172-A/2014) estipula que o Presidente do Órgão a quem caibam poderes de fiscalização não pode ser trabalhador da Instituição; 17.ª - Os cargos de Diretor Geral e o de Presidente da Comissão Executiva -ocupados e desempenhados simultaneamente pelo Autor - incluem necessariamente funções de superintendência, ou seja, de fiscalização; 18.ª - Logo, o Autor não podia exercer poderes de fiscalização e ser concomitantemente trabalhador; 19.ª - O que, se mais não houvesse, sempre tornaria o contrato dos autos nulo por violação do disposto no art. 15.º, n° 2 do D.L. n°119/83 (mesmo na redação posterior ao D.L. n° 172-A/2014); 20.ª - O contrato dos autos também é nulo por a sua celebração violar o disposto no art. 21.º - B, n° 2 do citado Decreto-Lei, mesmo após a última redação dada em 2014 (cuja redação é equivalente à do antigo art. 21.º, n°4), norma que dispõe que: "2. Os titulares dos órgãos de administração não podem contratar direta ou indiretamente com a instituição salvo se do contrato resultar manifesto benefício para a instituição"; 21.ª - 0 Autor, enquanto Presidente da Comissão Executiva da Ré, estava impedido celebrar diretamente com a Instituição um contrato de trabalho - como fez; 22.ª - Sendo certo que do contrato que celebrou com a Instituição não resulta qualquer benefício para esta, muito menos manifesto; 23.ª - O contrato dos autos violou normas legais de interesse público, padecendo de nulidade, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 280.º e 294.º do C. Civil; 24.ª - Sendo, pois, lícita a cessação do contrato dos autos com base na invocação dessa invalidade; 25.ª - Não decidindo assim, o Acórdão recorrido violou, nomeadamente, os arts. 15.º, n.° 2 do D.L. n 119/83 (na redação anterior ao D.L. n° 172-A/2014), 15.º, n.°s 1 e 2 do D.L. n°119/83 (na redação posterior ao D.L. n°172-A/2014), 21.º n.°4 do D.L. n°119/83 (na redação anterior ao D.L. n° 172-A/2014), 21°-B n.°2 (na redação posterior ao D.L. n° 172-A/2014); 177.º, 280.º e 294.º do C. Civil e 125.º do C. do Trabalho.
Termos em que, com os mais que resultarão do douto suprimento de V. Exas, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, revogado o Acórdão recorrido, como é de Justiça.» O recorrido respondeu ao recurso interposto, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «A - O recorrido revê-se na parte do Acórdão proferido pelos Meritíssimos Desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa quando conheceram e decidiram pela convalidação da nulidade do contrato de trabalho celebrado com o recorrido pela recorrente: "..... o contrato de trabalho, que era inicialmente nulo, convalidou-se no dia 14 de Novembro data em que entrou em vigor o Decreto-Lei n.º172-A/2014, de 14 de Novembro e com isso cessou a causa da sua nulidade”.
B - Concluindo pela revogação da sentença na parte que julgou “...licita a cessação do contrato de trabalho efetivada pela Ré em 24/08/2015, sob...
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