Acórdão nº 418/13.9TVCDV.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA * I – Relatório 1. Os autores AA e mulher, BB, instauraram contra CC, S.A., a ação nº 418/13.9TBCDV, pedindo a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de 6.889,87€, a título de indemnização dos danos por eles sofridos em consequência do acidente e decorrentes da reparação do veículo e da sua paralisação, acrescida de juros à taxa legal de 4% a contar da citação até efetivo pagamento.

2. O autor DD, instaurou contra CC, S.A., a ação nº 419/13.9TBCDV, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 373.825,17 €, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por ele sofridos em consequência do acidente, acrescida de juros à taxa de 4% a contar da citação até efetivo pagamento, bem como no pagamento de todas as despesas com consultas médicas, tratamentos, intervenções cirúrgicas e cuidados médicos futuros que vier a necessitar para tratamento e recuperação das lesões sofridas em consequência do acidente, nas partes que não forem comparticipadas pelo Estado.

3. Como fundamento destes pedidos, alegaram os autores que, no dia 28 de Dezembro de 2008, pelas 11h00m, na Estrada Florestal de ..., ocorreu um acidente de viação entre o motociclo, moto quatro, de matrícula ...-BC-...2, conduzido pelo autor DD e propriedade dos autores AA e BB, e o veículo ligeiro de passageiros de matrícula ...-JE, conduzido por EE, e seguro na ré. O acidente consistiu num choque entre o BC e o reboque do JE, que circulavam em sentidos opostos e ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo ...-JE, por ter invadido a faixa de rodagem por onde circulava o veículo conduzido pelo autor DD.

4. A ré contestou ambas as ações, impugnando a descrição do acidente efectuada pelos autores e imputando a responsabilidade pela produção do mesmo ao autor DD, por circular em excesso de velocidade.

5. Apensadas estas ações, foi proferido despacho saneador e foram fixados o objeto do litígio e os temas da prova.

6. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que julgou improcedentes as duas ações.

7. Inconformados com esta decisão, os autores dela apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão proferido em 28.09.2017, julgou o recurso parcialmente procedente, revogando a sentença recorrida e, em sua substituição, condenou a ré a pagar: a) ao autor DD, a indemnização de 34.172,91€ a título de danos patrimoniais, e 50.000€ a título de danos não patrimoniais.

  1. e aos outros autores, a indemnização de 5.389,87€.

  2. juros de 4% ao ano, vencidos sobre cada uma das referidas quantias 34.172,91€ e 5389,87€ desde a data da citação, e vencidos sobre a quantia de 50.000€ desde a data desta sentença, acrescendo juros vincendos até integral pagamento.

    8. Inconformada com este acórdão, a ré seguradora dele interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1- Ao Supremo Tribunal de Justiça não está vedada a apreciação da legalidade do apuramento dos factos e, consequentemente, se for caso disso, a emissão de um juízo de censura, sobre a existência de algum obstáculo legal à convicção que no Tribunal da Relação se formou.

    2 - O STJ como Tribunal de Revista só pode proceder à análise da matéria de facto nas hipóteses contidas nos artigos 674° n° 3, e 682° n°s 2 e 3 do CPC, ou seja só pode usar os seus poderes censórios desde que esses erros estejam plasmados nos autos.

    3 - Erro evidenciado no douto Acórdão, ora recorrido, que estriba a revogação da Sentença absolutória, no desvalor que atribui, de forma escrita e expressa, da prova testemunhal produzida em audiência, aconchegando-se, em alternativa, na utilização de presunção judicial de culpa, para concluir pela condenação da Ré.

    4 - O Tribunal da Relação de Lisboa, partindo do dado objectivo - expresso e escrito a fls. 8 do Acórdão - de que : "Sobre a velocidade do BC e a parte da estrada por onde seguia, apenas se pronunciaram o autor DD e o condutor do JE. Ninguém mais viu o acidente e por isso ninguém mais podia saber algo sobre isto.", formula o seguinte juízo: " Os condutores do BC e do JE não merecem nenhuma credibilidade quanto a factos favoráveis às teses dos autores e da ré, respectivamente. Naturalmente o autor está interessado na procedência da acção e o condutor do JE está interessado em não ficar moralmente responsável pelas lesões sofridas pelo autor DD, quer aos olhos dos autores - que conhece pessoalmente - quer aos seus próprios. Ambos naturalmente atiram a culpa para o outro. Assim, na parte favorável às teses respectivas, apenas têm valor se corroborados por outros meios de prova.

    5 - Na apreciação da prova cometida às diversas instâncias judiciais, relativamente aos depoimentos prestados em audiência, prevalecem os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova.

    6 - Tendo sido apresentados, o autor para declarações de parte (art° 466° do CPC) e o condutor do JE como testemunha (art° 498° n° 1 do CPC), é lícito e, até exigível, que o Tribunal no âmbito do princípio da sua livre apreciação, em concreto, valorize uma em detrimento de outra, até nem confira credibilidade a nenhuma, baseada no conteúdo da oralidade produzida.

    7 - O STJ tem como imperativo legal, conhecer do Juízo formulado pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, quanto à matéria de facto, já que este, deu como provados factos, sem, ou a produção de prova indispensável para demonstrar a sua existência ou, em desrespeito por normas reguladoras da força probatória dos meios de prova admitidos no nosso ordenamento jurídico, maxime, a prova testemunhal.

    8 - A lei oferece solução para os casos em que é compreensível a dificuldade e dúvida do julgador, colocado perante duas teses divergentes quanto à "culpa", determinando o n° 2 do art° 506° do C.Civil : "Em caso de dúvida, considera-se igual a medida da contribuição de cada um dos veículos para os danos, bem como a contribuição da culpa de cada um dos condutores".

    9 - O bom uso do processo judicial não pode, arbitrária e previamente desconsiderar prova testemunhal, substituindo-a pelo recurso ao uso de presunções naturais ou judiciais.

    10 - " Em caso de dúvida, face a depoimentos contraditórios entre si e à fragilidade da prova produzida, deverá prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, com a consequente improcedência do recurso nesta parte" (Ana Luísa Geraldes," Impugnação e reapreciação da decisão sobre a matéria de facto" in Estudos em Homenagem ao Prof. Dr. Lebre de Freitas, Vol I pág. 609.

    11 - "O Supremo não faz censura da convicção formada pelas instâncias quanto à prova, limita-se a reconhecer e a declarar a existência de obstáculo legal a que tal convicção se tivesse formado" (Rodrigues Bastos, in Notas ao Código de Processo Civil, 3a ed. vol. III, pág. 278).

    12 - O erro na apreciação das provas e fixação dos factos materiais da causa não pode, em princípio, ser sindicado pelo STJ; apenas o poderá ser se houver ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto, ou que fixe a força a determinado meio de prova. E especificamente no que ao uso de presunções judiciais concerne o Supremo poderá censurar a decisão da Relação, quando o uso de presunções tiver conduzido à violação de normas legais, isto é, decidir se, no caso concreto, era ou não permitido o uso de tais presunções." Ac de 22-05-2012, CJSTJ, Tomo III, pág. 90.

    13 - O Acórdão recorrido, desconsidera a presunção legal constante do normativo do nº 3 do art. 503º do CPC.

    14 - A factualidade provada nos pontos 54, 19 e 20 teria necessariamente, de implicar por parte do condutor do veículo BC, a prova de que “ não houve culpa da sua parte”, nos termos do nº 3 do art. 503 do C. C.

    15 - O Acórdão recorrido, ao alterar para: provada a factualidade dada como não provada e como não provada a que vinha da 1ª instância, desconsiderando a prova testemunhal e substituindo essa prova, utilizando, para tanto, presunções judiciais, violou o art. 351 do C. Civil. E ao não considerar a presunção legal constante do nº3 do art. 503º do C.C., violou os arts 349 e 350º do C. C.

    16 - Em defesa e aplicação dos princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova, se requer seja revogado o Douto Acórdão recorrido, por violação das regras legais na apreciação da prova, designadamente a desconsideração da prova testemunhal produzida, substituindo-a pela aplicação de presunção judicial.

    17 - Do elenco dos factos, ressalta, desde logo, que não se provaram quaisquer danos patrimoniais, porquanto a incapacidade parcial, não tem qualquer rebate profissional como expressamente é referido nos pontos 123 e 124 - O autor ficou com um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica fixável em 5 pontos que, em termos de repercussão permanente da actividade profissional, é compatível com o exercício da actividade habitual, mas implica esforços suplementares”.

    18 - Assim a decisão sufragada no douto Acórdão recorrido de “ Condenar a Ré a pagar ao Autor DD a indemnização de 34.172,91 € a título de danos patrimoniais assenta em pressuposto não verificado, já que, mesmo ponderada a incapacidade nada nos autos faz inculcar a ideia de que o A. em virtude da incapacidade esteja afectado numa diminuição da capacidade de ganho.

    19 - Dos factos provados nada resulta em favor do entendimento de que o lesado sofreu, directa ou indirectamente qualquer incapacidade que lhe diminua ou incapacite o exercício da sua actividade no presente ou no futuro, podendo e estando na realidade o mesmo a exercer a sua profissão na plenitude das suas funções, não estando a sua capacidade afectada.

    20 - Deveria ter sido arbitrada indemnização única e exclusivamente a título de dano não patrimonial. E quanto a este segmento...

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